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Consciência de risco e situacional, fadiga e o impacto na segurança em comissários de voo

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CONSCIÊNCIA DE RISCO E SITUACIONAL, FADIGA E O IMPACTO NA SEGURANÇA EM COMISSÁRIOS DE VOO

Palhoça 2016

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CONSCIÊNCIA DE RISCO E SITUACIONAL, FADIGA E O IMPACTO NA SEGURANÇA EM COMISSÁRIOS DE VOO

Monografia apresentada ao Curso de graduação em Ciências Aeronáuticas, da Universidade do Sul de Santa Catarina, como requisito parcial para obtenção do título de Bacharel.

Orientação: Prof.ª Alessandra de Oliveira, Msc.

Palhoça

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CONSCIÊNCIA DE RISCO E SITUACIONAL, FADIGA E O IMPACTO NA SEGURANÇA EM COMISSÁRIOS DE VOO

Esta monografia foi julgada adequada à obtenção do título de Bacharel em Ciências Aeronáuticas e aprovada em sua forma final pelo Curso de Ciências Aeronáuticas, da Universidade do Sul de Santa Catarina.

Palhoça, 25 de novembro de 2016.

_____________________________________________________ Professor orientador: Prof.ª Alessandra de Oliveira, Msc.

Universidade do Sul de Santa Catarina

_____________________________________________________ Prof. Dr. Maurici Amantino Monteiro

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Incontáveis somos todos nós nessa grande malha da vida, incontáveis são os agradecimentos pelas causas e condições propícias, as afinidades e elos que nos unem e dão sentido à própria existência.

O mérito vai aos meus pais, a começar pela inspiração de minha mãe que em seus 60 anos de idade estudou curso superior e ao meu pai, in memoriam, imigrante cujo primeiro emprego foi no Campo de Marte no final dos anos 50 e admirador da aviação.

Às empresas VASP, VARIG e atual Air France, as quais ao longo de duas décadas acumulei experiência e me dão seguro e tranquilo embasamento para realizar este trabalho.

Ao notável empenho e paciência da Professora Mestre Alessandra de Oliveira durante a orientação e construção deste trabalho.

Aos meus amigos no encorajamento constante.

E a todos os comissários de voo que enveredam esforços pela paixão de voar, atender e assegurar a continuidade da vida de tantas pessoas de um ponto a outro, em meio a situações tão díspares.

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Este trabalho de conclusão de curso apresenta os elementos que causam fadiga aérea em comissários de voo, o seu impacto sobre a consciência situacional e de risco, o seu reflexo na aplicação dos procedimentos de segurança em situações de emergência e o Sistema de Gestão de Risco de Fadiga. O presente trabalho consiste de uma pesquisa exploratória com procedimento documental e bibliográfico. A análise de dados foi feita com base em estudos, artigos, regulamentação aérea e conteúdos bibliográficos, de acordo com a fundamentação teórica. A abordagem foi qualitativa. Após a apreciação da pesquisa, observa-se que a fadiga em comissários de voo fica evidenciada como componente inevitável da atividade aérea, mas gerenciável por meio de práticas sugeridas no Sistema de Gestão de Risco de Fadiga (FRMS) recomendado pela Organização Internacional de Aviação Civil (ICAO) em uma nova metodologia, observando a fadiga de forma científica e sistêmica.

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This graduation conclusion essay presents the elements that cause air fatigue to flight attendants, the impact on situational and risk awareness and their consequences on the implementation of security procedures for possible emergencies. This paper consists of an exploratory research as well as documentary and bibliographic procedures. The data analysis was based on studies, articles, air regulation and bibliographic content, in accordance with the theoretical foundation. The approach applied was a qualitative one. The research analyses demonstrates that the occurrence of fatigue in flight attendants is an inevitable component of the air activity, nevertheless, this can be manageable by means of certain practices suggested by the Fatigue Risk Management System (FRMS) recommended by the International Civil Aviation Organization (ICAO), which tackles the problem of fatigue with a new methodology and handles it in a scientific and systemic manner.

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Imagem 1 – Consequências de débito de sono……… 39

Imagem 2 – Cadeia de ações……… 43

Imagem 3 – Teoria do Queijo Suíço………. 44

Imagem 4 – Momentos de risco………...… 45

Imagem 5 – Tríade Homem – Meio – Máquina………..…. 47

Imagem 6 – Turbulências………. 47

Imagem 7 – Turbulência severa no voo Singapore Airlines………...…. 48

Imagem 8 – Inflação indevida de escorregadeiras………...…… 49

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ANAC – Agência Nacional de Aviação Civil

ANVISA – Agência Nacional de Vigilância Sanitária CAT – Clear Air Turbulence (Turbulência de Céu Claro)

CENIPA – Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos

CAAP – Civil Aviation Advisory Publication (Publicação Recomendada de Aviação Civil) CS – Consciência Situacional

CR – Consciência de Risco

DECEA – Departamento de Controle de Espaço Aéreo DO – Despacho Operacional

FAA – Federal Aviation Administration (Administração Federal de Aviação)

FRMS – Fadigue Risk Management System (Sistema de Gestão de Risco de Fadiga)

IATA – International Air Transportation Association (Associação Internacional de Transporte Aéreo)

ICAO – International Civil Aviation Organization (Organização Internacional de Aviação Civil)

REM – Rapid Eye Moviment (Movimento Rápido dos Olhos) RBHA – Regulamento Brasileiro de Homologação Aeronáutica

SERIPA – Serviços Regionais de Prevenção e Investigação de Aeronáuticos SIPAER – Sistema de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos SMS – Safety Management System (Sistema de Gerenciamento de Segurança) SNA – Sindicato Nacional dos Aeronautas

VASP – Viação Aérea São Paulo VARIG – Viação Aérea Rio-Grandense

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1.1 PROBLEMA DE PESQUISA...….17 1.2 OBJETIVOS...….18 1.2.1 Objetivo Geral...…..18 1.2.2 Objetivos Específicos...…...18 1.3 JUSTIFICATIVA...…18 1.4 METODOLOGIA...…….19

1.4.1 Natureza da pesquisa e tipo de pesquisa...….19

1.4.2 Materiais e métodos...……….…20

1.4.3 Procedimentos de coleta de dados...…20

1.4.4 Procedimento de análise dos dados...….20

1.5 ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO...…..20

2 REFERENCIAL TEÓRICO...…..22

2.1 A PROFISSÃO DE COMISSÁRIOS DE VOO...….22

2.2 FADIGA AÉREA...…………. 23 2.2.1 Ciclo circadiano...…………24 2.2.2 Fuso horário...………….….25 2.2.3 Vibração e ruído...………...27 2.2.4 Alimentação...………….….27 2.2.5 Sono...……….…..28

2.3 CONSCIÊNCIA SITUACIONAL E CONSCIÊNCIA DE RISCO...….…..29

2.4 SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIAS A BORDO...…..….31

2.4.1 Fogo...……….…..31

2.4.2 Despressurização...…....………..….32

2.4.3 Pousos de emergência...…...….32

2.4.4 Abertura inadvertida de portas e inflação de escorregadeiras...….33

2.5 REGULAMENTAÇÃO AÉREA BRASILEIRA...…….33

2.5.1 Lei do Aeronauta...……….…..33

2.5.2 Tempo de voo e escalas de trabalho...…...…...34

2.5.3 Tempo de repouso e folgas...…..…...35

2.5.4 Descanso dos comissários e fases do voo...……..35

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3.2 O RISCO DA FADIGA NA SAÚDE OCUPACIONAL……….. 40

3.3 A CONSCIÊNCIA SITUACIONAL E DE RISCO EM SITUAÇÕES COTIDIANAS...42

3.4 AS SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA PREVISTAS AOS COMISSÁRIOS DE VOO...45

3.5 O SISTEMA DE GESTÃO DE RISCO DE FADIGA………. 49

3.5.1 O voo VP 880……… 51

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS...……….. 53

REFERÊNCIAS...…… 55

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1 INTRODUÇÃO

A ampliação da atividade aérea comercial se desenvolveu notadamente após a Segunda Grande Guerra pela ociosidade de aeronaves produzidas com propósito primário o combate bélico. Antes mesmo, a aviação civil começou timidamente em empresas como Air France (1933), Varig (1927), KLM (1919) e Lufthansa (1926) operando rotas curtas em aviões pequenos a um público seleto e receoso na nova modalidade de transporte. Nesse período, a precariedade dos voos estava atrelada aos tipos de aeronaves, às condições do tempo e a própria tecnologia dos instrumentos rudimentares de pilotagem.

A segurança dos passageiros em uma aeronave é confiada aos comissários de voo de uma forma estruturada desde os anos 50. Esta função foi promovida inicialmente pela americana Ellen Church em 1930, enfermeira e piloto brevetada. Sob o preconceito masculino de mulheres ao comando, Ellen foi convidada pela Boeing Cie., futura United Airlines, a ajudar os pilotos com carregamento de malas, suas refeições e acompanhar os poucos ocupantes nas cabines acometidos pelo medo de voar, somado ao enjoo e desconforto das inabituais subidas, descidas e trepidações do voo. O sucesso da novidade fez a empresa contratar em poucos dias mais setes outras enfermeiras e futuramente garçons com a implantação dos serviços de bar (TIME, 2015).

A nova profissão aprimorou seus procedimentos de segurança ao longo das décadas com o desenvolvimento da tecnologia aeronáutica, mas também na implantação de novas regras provenientes de erros em acidentes e incidentes aéreos, erros estes corrigidos e adequados a novos procedimentos de segurança.

Entretanto, com a propagação de rotas, empresas e aeronaves a jato em números exponenciais nos anos 50, 60 e 70 as novas tecnologias trouxeram igualmente novos agravantes na saúde dos aeronautas. Estes questionamentos passam por estudos mais acuradamente nos anos 80 por conta de acidentes e incidentes por fatores humanos e assim como sobre a saúde ocupacional e novas noções de trabalho em equipe, as quais podemos apontar o surgimento do Gerenciamento de Recursos de Tripulações (CRM) cujo objetivo é trabalhar a sinergia nas tripulações, concentração no funcionamento dos membros das equipes em termos de comunicação, alerta situacional, liderança, tomada de decisões e administração de estresse (ANTONELLO, 2009).

No Brasil, a regulamentação da profissão do aeronauta pela Lei 7.183 de 5 de abril de 1984 (BRASIL, 1984) se fez necessária em detrimento do estresse e fadiga no organismo e os efeitos nos tripulantes tanto técnicos (pilotos) quanto comerciais

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(comissários). O estresse ocupacional apontado por Lipp (2009, p.115) definida com “ênfase nos fatores do trabalho que excedem a capacidade de enfrentamento do indivíduo (estressores organizacionais) ou nas respostas fisiológicas, psicológicas e comportamentais dos indivíduos aos estressores”. Conforme a Organização Internacional de Aviação Civil (ICAO), fadiga é definida como:

Um estado fisiológico da capacidade de desempenho mental ou física reduzida resultante da perda de sono ou a vigília estendida, fase circadiana, ou carga de trabalho (atividade mental e /ou física), que pode prejudicar o estado de alerta de um membro da tripulação e capacidade de operar com segurança uma aeronave ou executar tarefas relacionadas com a segurança (ICAO, 2012, p.03, tradução nossa). Os elementos da fadiga tornaram-se redutores em potencial da consciência de risco e consciência situacional e na aplicação dos procedimentos de segurança pelos comissários quando se faz necessários em situações de emergência ou na simples rotina de vigilância durante o voo. Consciência situacional caracteriza-se pelo “exercício constante da percepção dos elementos no ambiente de trabalho dentro de um volume de tempo e espaço, a compreensão do significado desses elementos e a projeção dessa situação em um futuro próximo” (DECEA, 2012, p.10). A consciência de risco pode ser compreendida na percepção do próprio conceito como:

A identificação e o controle do risco, conforme parâmetros de probabilidade de ocorrência, gravidade dos resultados e exposição ao perigo, que conduzem à sua classificação, variando de muito elevado a inexistente. Para o controle do risco, os parâmetros, definidos pelo operador, são o adiamento, a modificação ou mesmo o cancelamento da atividade (SERIPA, 2013)

A privação do sono, um dos elementos básicos da fadiga, gera efeitos negativos nestas duas esferas do cognitivo como baixo desempenho, julgamento, irritabilidade, desatenção, diminuição da memória, cefaléias, mau humor, baixa de testosterona e alteração do ciclo circadiano, como aponta Mello (2012). Representam parte dos sintomas ocasionados pela excessiva carga de horas voadas ou a recente estratégia de diversas empresas na diminuição da quantidade de comissários de voo por avião em busca de redução de custos e consequente aumento de tarefas a bordo antes partilhadas com demais tripulantes.

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Como a fadiga aérea pode contribuir com a redução da consciência situacional e de risco dos comissários de voo e os meios preventivos?

1.2 OBJETIVOS

1.2.1 Objetivo Geral

Analisar a fadiga aérea como redutor da consciência situacional e de risco dos comissários de voo e os meios preventivos.

1.2.2 Objetivos Específicos

 Identificar os fatores da fadiga aérea em comissários de voo.  Identificar o risco da fadiga na saúde ocupacional.

 Analisar a consciência situacional e de risco em situações cotidianas.  Conhecer as situações de emergência previstas aos comissários de voo.  Apresentar o Sistema de Gestão de Fadiga de Risco.

1.3 JUSTIFICATIVA

A função essencial dos comissários de voo em companhias aéreas, sem dúvida, é a de segurança de voo dos passageiros. O relevante neste trabalho é o efeito da fadiga da atividade aérea, os impactos colaterais no organismo e por consequência o reflexo nas ações e tomada de decisões em situações de emergência ou na simples rotina do voo.

Elementos como fuso horário, noites em claro, microvibração, pressurização e alimentação irregular incidem no organismo e, se extrapolados, desenvolvem a chamada fadiga aérea, fenômeno bem conhecido no meio dos pilotos, mas igualmente importante nos comissários de voo, que coercitiva e comercialmente à profissão é disfarçado em um elegante sorriso. A relação da fadiga e seus os componentes implicam na fragilização da consciência situacional e de risco.

A Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC) define em seu glossário a consciência de situacional como “percepção correta da realidade, revestida de capacidade crítica de determinada situação, envolvendo todos os seus elementos, de forma a possibilitar que decisões apropriadas sejam tomadas, dentro do tempo disponível, para o cumprimento

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bem-sucedido da missão” e o risco como “avaliação das consequências de um perigo, expresso em termos de probabilidade e severidade, tomando como referência a pior condição possível” (ANAC, 2016).

Conhecer as causas da fadiga, associar com boas práticas e cuidados da saúde, exercer uma regulamentação trabalhista legítima ao desgaste físico e cognitivo do tripulante certamente resultará em melhor produtividade no competitivo mercado das empresas aéreas.

A implicância da fadiga desencadeia a possibilidade de ações incorretas, um nubelamento da consciência de risco em fases críticas do voo, uma canalização de ideias ou sensações, impossibilitando a tomada de decisões em caso de imprevistos, afinal todo pouso e decolagem são emergências em potencial. Um caso típico de desatenção originado pela fadiga aérea destes profissionais é a abertura inadvertida de portas da aeronave e a inflação das escorregadeiras de evacuação durante o taxiamento da aeronave pelos pátios do aeroporto. A Associação Internacional de Transporte Aéreo (IATA) lançou o Guia Preventivo de Inflação Inadvertida de Escorregadeiras (IATA, 2015, tradução nossa) como dispositivo orientador com procedimentos preventivos à desatenção nestes casos.

O presente trabalho surgiu por motivações do próprio pesquisador, comissário de voo ao longo de dezenove anos, nove deles na maior companhia aérea francesa na rota brasileira e demais anos em duas empresas nacionais. Ainda o faz questionar se a aviação em geral, por exemplo a brasileira, não necessitaria se alinhar em determinados parâmetros legislativos internacionais a fim de contribuir com uma melhor qualidade de vida a seus comissários, fortalecer o profissionalismo impactado por uma frenética concorrência empresarial do lucro, encobrindo fatores ameaçadores à segurança do voo.

Como dito anteriormente, o sorriso dos comissários esconde diversos cansaços, desmotivaçöes, insônias, irritações, depressões e absentismos. Acumulados e mal gerenciados causam danos a própria saúde, tão quanto põem em risco a eficiência na aplicação de procedimentos de segurança.

1.4 METODOLOGIA

1.4.1 Natureza da pesquisa e tipo de pesquisa

A estrutura do presente trabalho se apoiou como exploratória, por proporcionar maior familiaridade com o problema e explicitá-lo (GIL, 2002, p.41). Seguiu em procedimento bibliográfica e documental, o qual ainda em Gil (2002, p.46), “a pesquisa

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documental apresenta algumas vantagens por ser fonte rica e estável de dado: não implica altos custos, não exige contato com os sujeitos da pesquisa e possibilita uma leitura aprofundada das fontes”.

A abordagem da pesquisa foi qualitativa, a qual segundo o Instituto PHD (2015),

Está mais relacionada no levantamento de dados sobre as motivações de um grupo, em compreender e interpretar determinados comportamentos, a opinião e as expectativas dos indivíduos de uma população. É exploratória, portanto não tem o intuito de obter números como resultados, mas insights – muitas vezes imprevisíveis – que possam nos indicar o caminho para tomada de decisão correta sobre uma questão-problema.

1.4.2 Materiais e métodos

Os materiais utilizados foram baseados em forma:

Da Lei 7.183 de 5 de abril de 1984.

De documentos e artigos sobre segurança operacional. De documentos e artigos sobre fadiga aérea.

De documentos sobre saúde do tripulante.

1.4.3 Procedimentos de coleta de dados

A base de dados teve origem em revisões documentais e bibliográficas sobre gestão de fadiga em comissários.

1.4.4 Procedimento de análise dos dados

Os dados foram verificados por análise de conteúdo e interpretação que conforme André (1983) permite conhecer o caráter multidimensional dos fenômenos em sua manifestação natural, obter diferentes visualizações e análises, delineando um cenário ao objeto estudado.

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No intuito de melhor compreender o percurso da leitura, o trabalho foi estruturado da seguinte forma: no primeiro conteúdo encontra-se a introdução ao tema proposto, a problematização e o problema do estudo, os objetivos, a justificativa e a metodologia.

Na sequência do segundo conteúdo temos as fundamentações teóricas apresentando as causas da fadiga aérea nos comissários de voo, as possíveis situações de emergência a que estão submetidos, o efeito da fadiga nestes profissionais e as alternativas de profilaxia por meio da regulamentação de trabalho e o programa recomendado de gestão de risco de fadiga.

Em seguida, no terceiro conteúdo vemos a análise e discussão dos dados em cinco categorias de análise correlacionados ao referencial teórico , seguido das considerações finais. Por último temos as referências bibliográficas.

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2 REFERENCIAL TEÓRICO

2.1 A PROFISSÃO DE COMISSÁRIOS DE VOO

Personagem emblemático de qualquer companhia aérea, os comissários de voo tem um papel fundamental como um técnico em segurança de voo, atuação essencial como auxiliar do comandante e pilotos no controle da cabine de passageiros. Cabe a ele as verificações dos equipamentos de segurança como extintores de incêndio, cilindros de oxigênio terapêutico, procedimentos de evacuação, manipulação de portas, aplicação de primeiros-socorros, entre outros. Por definição na Lei 7.183 de 5 abril de 1984 (BRASIL, 1984, p.2), Comissário de voo:

É o auxiliar do Comandante, encarregado do cumprimento das normas relativas à segurança e atendimento dos passageiros a bordo e da guarda de bagagens, documentos, valores e malas postais que lhe tenham sido confiados pelo Comandante.

§ 1º – A guarda dos valores fica condicionada à existência de local apropriado e seguro na aeronave, sendo responsabilidade do empregador atestar a segurança do local.

§ 2º – A guarda de cargas e malas postais em terra somente será confiada ao comissário quando no local inexistir serviço próprio para essa finalidade.

Art. 7º – Consideram-se também tripulantes, para os efeitos desta Lei, os operadores de equipamentos especiais instalados em aeronaves homologadas para serviços aéreos especializados, devidamente autorizados pelo Ministério da Aeronáutica.

Os requisitos necessários são previstos no Regulamento Brasileiro de Homologação Aeronáutica (RBHA) 63-65 e contempla sua formação teórica e treinamento prático, exames, certificados, licenças (ANAC, 2016, p.20) e em conformidade à Publicação Recomendada de Aviação Civil (CAAP) 23 da ICAO (2005).

A aviação civil se enquadra em uma atividade altamente dinâmica, ininterrupta como prestação de serviço de risco onde as probabilidades e possibilidades de acidente e incidente coexistem diuturnamente. Os tripulantes precisam se adequar a este ritmo exigente comungando uma realização do sonho de voar e atraentes benefícios das empresas aos fatores agravantes da qualidade na saúde ocupacional, e necessariamente compensadas em forma de regulamentações trabalhistas específicas.

O paradoxo coexiste e é inevitável, porém gerenciável. A segurança de voo jamais pode ser negociada. No Brasil, o Sistema de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (SIPAER) preconiza a tríade Homem – Meio – Máquina como uma filosofia de

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atividade baseada no equilíbrio do Fator Humano nos aspectos fisiológicos e psicológicos e o Fator Material da aeronave e seu exercício. Sua função, além de investigativa de acidentes e incidentes, também contempla atividade educacionais, operacionais e regulamentares (CENIPA, 2016).

Em breve análise de seus tempos e movimentos, o comissário começa sua jornada de trabalho cerca de duas horas antes do início de sua jornada rumo ao aeroporto. Participa de uma reunião pré-voo (briefing) com membros da tripulação no Despacho Operacional (DO), onde serão passadas as informações técnicas e comerciais. Do DO partem rumo à aeronave para efetuar o cheque pré-voo, as verificações dos equipamentos e dispositivos de segurança. Na aeronave ainda em solo, os comissários estão constantemente alertas com vários tipos de emergência como a ocorrência de fogo no motor e evacuação dos passageiros por meio das escorregadeiras infláveis.

Durante o voo, as ameaças relacionadas à segurança são as mais variadas: turbulências previstas e as turbulências não previstas de céu claro (FAA, 2016), despressurização, princípio de fogo em lavatórios, bagageiros e sistemas elétricos, pânico entre os passageiros, situações médicas, entre outras.

Igualmente faz-se importante conhecer as tipologias de voos em duas esferas: voos nacionais e voos internacionais. O primeiro cenário se apresenta em rotas curtas em torno de 30 minutos a três horas de voo, em jornada dividida por trechos chamados “perna de voo”, por exemplo: São Paulo – Goiânia – Brasília – Rio Branco – Manaus. Voos internacionais em geral são diretos como São Paulo – Paris em 11 horas de voo.

A observância destes dois cenários traz desgastes diferentes e deve ser levado em conta elementos que dão origens à fadiga aérea, como a incidência de fusos horários, vibrações, alimentação irregular ou noites não dormidas, variantes e correlacionados entre si.

2.2 FADIGA AÉREA

Se em profissões rotineiras de segunda a sexta-feira das 8 às 17 h os indivíduos mantém seus ritmos em equilíbrio com oito horas de sono e refeições regulares, o comissário de voo se alimenta e dorme em horários inadequados. Os riscos para a saúde deste indivíduo podem confirmados com o desenvolvimento maior de patologias como diabetes, doenças cardiovasculares e distúrbios do sono.

A dessincronização externa causa dessincronização interna e deste o entrave maior na geração da fadiga quando surge o efeito inverso: a dessincronização interna se

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manifesta na externa. O estado de consciência, alerta, vigília, orientação e atuação sofrem alterações. Segundo Montandon (2007), a fadiga de voo é um estado que resulta na diminuição das habilidades no trabalho e prejuízo do estado de alerta em função, entre outros fatores, de atividades profissionais longas e cansativas, esgotamento físico e mental, sendo uma ameaça à segurança operacional, por degradar o desempenho dos tripulantes.

“Aeronaves a jato voam em grandes altitudes por diversas razões: em maiores níveis de voo há menor pressão atmosférica que resulta em maior velocidade por conta da menor resistência ao ar, menor consumo de combustível e menor tempo de voo” (CEAB, 2016, p. 11). Por esta razão, as aeronaves são pressurizadas por meio da absorção do ar externo pelos motores a fim de manter o nível de oxigênio suficiente para que seus ocupantes. A baixa qualidade de oxigênio e umidade do ar alteram o consumo de oxigênio dos comissários em movimento, superior dos passageiros sentados.

Neste sentido, entra a vital importância da confecção de escalas de tripulantes respeitando horários, folgas e repousos, permitindo assim o distanciamento dos elementos agravantes da fadiga e seu corpo reconciliar com o ritmo natural e normal do ser humano. Vale ressaltar que comissários de voo exercem uma atividade mais física que mental, como a dos pilotos, proporcionando um desgaste muscular maior.

A título de exemplo em um estudo comparativo de uma empresa aérea portuguesa, “é de salientar o facto de 58.9% da amostra total ter referido um nível moderado de estresse, enquanto 27.8% descreveu a sua atividade como sendo muito estressante.” (BAGANHA, 2013, p.12). A população neste caso estudada foi de 40 comissários de voo, sendo 21,7% da amostra.

Segundo Kanashiro (2005), a fadiga ainda pode ser classificadas em dois aspectos: Operacional resultante de aspectos ambientais, repartição de tarefas, ergonomia, duração, hora de voo e fusos e Individuais englobando aspectos fisiológicos, psicológicos e profissionais.

Em paralelo, é imprescindível ao comissário uma atenção especial no cuidado da sua saúde e evitar outros agravantes como fumo, álcool em excesso, sedentarismo, alimentação deficiente, ansiedade, etc e procurar manter uma ritmicidade do seu ciclo circadiano a qual afeta a estrutura do sistema sono/vigília e apetite, por exemplo.

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Desde o advento da mecanização, os processos de produção em massa e a revolução industrial, a sociedade passou da posição produtora para consumidora, a qual poucos produzem em detrimento dos tantos que consomem. Porém, justamente esta parcela que produz se submete a ritmos condições de trabalho muitas vezes desregradas ao que outrora foi perpetuado em seus genes desde o nascimento até sua adolescência, quando provavelmente começou a trabalhar. Aqui começa o problema das alterações dos ritmos ditos naturais e normais do ser humano. O ciclo circadiano pode ser definido como:

Os ciclos diários são conhecidos como ritmos circadianos, termo que tem origem na combinação das palavras latinas circa, aproximadamente, e diem, dia, ou seja, são ritmos que tem duração de um dia. Uma propriedade fundamental dos ritmos circardianos é que eles não são governados pelo ambiente, pois possuem uma natureza auto-sustentada. Eles continuam a se expressar mesmo que o organismo esteja vivendo em condições desprovidas de dicas a respeito das mudanças cíclicas do ambiente externo, como, por exemplo, sob a luz ou sob o escuro constante. Na ocasião que não estão sincronizados por uma mudança cíclica do ambiente físico eles são chamados de ritmos em livre curso e exibem um período (duração do ciclo) que na, maioria das vezes, é maior que 24 horas (LICATI et al, 2010, p.115)

A hostilidade do ambiente de trabalho do aeronauta é concomitante às suas reivindicações trabalhistas em termos de jornada de trabalho e repouso e andam descompassados com o ritmo de crescimento do setor aéreo. As fundamentações argumentativas não deixam dúvidas que o princípio dos acidentes/incidentes aéreos por mais que tenham causa material possuem origem no desempenho humano, condicionado a elementos impactantes que a fisiologia do voo proporciona no organismo resultando em fadiga aérea.

A invenção da luz elétrica fez a noite se tornar dia para várias atividades e mantê-las ininterruptas. O setor aéreo não ficaria atrás. As defasagens dos ciclos circadianos estão intimamente ligados à travessia de meridianos, a dessincronização interna e externa e alterações alimentares e sono comprometendo o ritmo natural do organismo e repercutindo na esfera do cognitivo.

A espécie humana é condicionada a um relógio biológico em função da luz solar e um posicionamento terrestre definido. O advento da mecanização e produção de bens romperam bruscamente essa estrutura e no setor aéreo adicionam-se os deslocamentos meridionais (fusos horários) de diversos territórios por seus tripulantes.

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Também conhecido como jetleg, tem sua causa na dessincronização entre o sono e o ciclo circadiano do indivíduo, sendo considerada uma queixa regular entre os comissários de voos internacionais. Os sintomas normalmente se apresentam no sono fora do horário ou a insônias no horário noturno local do pernoite.

Há profilaxias a serem indicadas, conforme orienta Martinez (2008) evitando cafeína, exercícios à noite, atividades de alta concentração, consumo de álcool e conforto do ambiente. Alguns adotam medicamentos à base de melatonina a fim de induzirem o sono para entrar no ritmo local, mas há diversos registros de dependência desses medicamentos, portanto, controversos e proibido no Brasil segundo nota no site da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA, 2016).

Algumas atitudes podem minimizar o impacto, como prescreve Martinez (2008, p. 178) que “em vôos para o leste, deve-se acordar cedo e evitar luz brilhante pela manhã, procurando, porém, se expor ao máximo de luz no final da tarde. Em vôos para o oeste, deve-se forçar a vigília durante o dia e de modo algum dormir antes que anoiteça”. Além dos sintomas relacionados ao sono e a baixa qualidade do descanso, segundo Mello (2002, p.122) alguns sintomas podem ser apontados como estudados em atletas brasileiros em viagem à Sidney, na Austrália:

O processo de sincronização ao fuso horário foi realizado de forma abrupta, na tentativa de romper com o ciclo claro-escuro que estava relacionado ao horário brasileiro. Os resultados demonstram que 34,4% dos atletas apresentavam uma insatisfação com o seu próprio sono, sendo que os distúrbios de sono mais relatados foram: apneia (14%), refluxo gástrico (15,6%), dor de cabeça (14,1%), ansiedade pós-pesadelo (39,1%), câimbras (20,3%), sonilóquio (26,6%), pânico noturno (9,4%), PLM (9,4%) e bruxismo (9,4%). Em relação a avaliação do cronótipo dos atletas, 73,43% se demonstraram indiferentes, 6,22% vespertinos moderados e 20,31% matutinos moderados.

Alguns exemplos de fusos horários em certos locais e períodos do ano: Paris – Los Angeles: - 9 h

Paris – Tóquio: + 7 h Paris – Montreal: - 6 h São Paulo – Frankfurt: +5 h São Paulo – Lisboa: +4 h

São Paulo – Cidade do México: -2 h

Muitos autores como Mello (2002), defendem a adaptação do organismo como sendo um dia para cada fuso cruzado. A lembrar que viagens para o leste são mais agressivas em adaptação do que viagens para o oeste.

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Longas horas de voo resulta em consequentes exposições às vibrações e ruídos da cabine, outro fator contribuinte para a fadiga aérea. Os sons são produzidos pelas turbinas em funcionamento e oscilam em vibrações maiores ou menores durante algumas fases do voo.

2.2.3 Vibração e ruído

Componente invisível, mas não menos tangível associada diretamente a fadiga e a indução do sono proporcionada pela vibração dos motores em toda fuselagem. Palma (2002, p.165) a apresenta de forma contundente os efeitos em aeronaves:

As vibrações são fatores físicos provenientes do deslocamento da aeronave e seu atrito com o ar, das turbulências e do funcionamento dos motores. Os grandes jatos parecem sofrer uma influência menor deste fator, mas segundo o Departamento Intersindical de Estudo e Pesquisa de Saúde e dos Ambientes de Trabalho – DIESAT (1995) podem favorecer o aparecimento de tonturas, mal estar e vômitos ou, até provocar alterações visuais, nos sistemas neuromuscular ou nos sistemas vasculares. Problemas na coluna vertebral, também, foram sugeridos como influenciados pelas vibrações.

Se o repouso a bordo é previsto em voos de longo percurso como designa a Lei 7.183 (BRASIL, 1984) no artigo 13 e parágrafo único, o mesmo é feito sob o forte ruído dos motores constantemente. Como aponta Lopes (2009, p. 53), “quanto maior o tempo de exposição, maior o comprometimento dos limiares auditivos obtidos em trabalhadores expostos ao ruído ocupacional”. Não de se surpreender a queda da qualidade auditiva nos exames anuais de medicina do trabalho nas companhias aéreas. A magnitude do ruído da aeronave varia de 80 a 140 dB, em comparação a 65 dB em uma conversa em tom normal e a exposição prolongada tem sido registro de ansiedade, tensão muscular, fadiga, hipertensão arterial, impotência sexual, etc como aponta De Melo (2012). A vibração contribui ainda com alterações de batimentos cardíacos, respiração e pressão sanguínea.

Os diversos elementos originários da fadiga se interagem e não menos a qualidade, a quantidade e os horários na pausa das refeições submetidas em meio a ruídos e vibrações de forma desconfortável em sua ingestão. O tempo para a alimentação é irregular, sendo feita muitas vezes com pressa e desatentamente.

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Outro fator fisiológico da fadiga aérea é a dessincronização das refeições nos horários padrões. Os comissários normalmente fazem suas refeições de forma rápida pelo pouco tempo restante se for um voo curto ou nos voos intercontinentais em horários adversos em virtude da decolagem tardia, muitas vezes jantando às duas horas da manhã ou almoçando às quatro horas da tarde. A dessincronização do ritmo circadiano, como apresenta Palmeira (2016), registra maior probabilidade de alteração no apetite, na saciedade e resulta em consumo de alimentos mais calóricos e gerando consequentemente sobrepeso.

Vale ressaltar a facilidade às guloseimas, refrigerantes e sucos dos serviços de bordo, produtos fartos em açúcar e sal. A necessidade metabólica de um tripulante não difere daquele de ritmo normal, mas resulta na busca de alimentos fáceis, de má qualidade, industrializados, congelados e baixo valor nutritivo percebem-se provocados pela alteração do ciclo circadiano que influenciam no apetite, a saciedade, ocorrendo uma desordem e compulsão alimentar, conforme Bernardi (2009).

A ingestão alimentar desregulada pode induzir a um atraso na organização metabólica e nos ritmos de sono/vigília dependendo do tipo de alimento consumido pelo comissário e comprometer a qualidade do seu repouso previsto a bordo, com alimentos calóricos e de metabolismo demorado.

2.2.5 Sono

O sono representa um terço de nossa vida e é uma necessidade vital. Sua estrutura cíclica é dividida em cinco ciclos de 90 a 120 minutos dependendo de cada indivíduo: adormecimento, sono lento leve, sono lento profundo, onde nesse estágio há recuperação da fadiga muscular, e o movimento rápido dos olhos (REM). A média de horas necessárias varia em média oito por noite.

Martinez (2001, p.16) aponta que “a teoria mais razoável da função do sono é a de que sirva para restaurar processos químicos e físicos deteriorados durante a vigília”. Componente recuperador do desgaste físico, a regulação do sono é feita pelo sistema homeostático pela liberação de melatonina no organismo ao qual induz ao sono em ambientes escuros. Ainda por Licati et al (2010, p.116),

Os ritmos circardianos ocorrem numa variedade de medidas fisiológicas e psicológicas que incluem o sono, a secreção hormonal, a temperatura corporal, a excreção urinária, o alerta subjetivo, o humor e o desempenho, exibindo valores máximos e mínimos aproximadamente no mesmo horário ao longo do dia de vinte e quatro horas.

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A privação do sono e sua qualidade pode trazer consequências severas ao organismo no desempenho cognitivo do indivíduo, causando fadiga mental, alterando o estado de alerta, tempo de reação e desempenho, como aponta Soares e Almondes (2012). Voos nacionais que decolam muito cedo obrigam seus tripulantes a uma brusca interrupção do sono, muitas vezes acordando as duas e meia ou três horas da madrugada e perfazendo uma sequência de voos até o meio da tarde.

Nos voos intercontinentais praticamente são privados do sono a viagem toda, sendo permitido um período de descanso a bordo por cerca de duas horas e realizar o ciclos de sonos de 90 minutos. O sono REM caracteriza-se pelo movimento rápido dos olhos, diminuição do tônus muscular, uma respiração mais profunda e projeção de sonhos. Por esse complexo sistema resumido por Dement, Aserinsky e Kleitman como apresenta Fernandes (2006), muitas empresas aéreas justificam um ou dois períodos de 90 minutos como tempo necessário para descanso de seus tripulantes a bordo.

Segundo Mello (2012), os horários mais críticos de sonolência são divididos em dois momentos: a noturna de 03 a 05 h e a diurna de 13 a 15 h, também conhecido como “efeito feijoada”. Nesses dois períodos, o estado de alerta se compromete na execução de atividades. A privação de sono pode ser igualmente comparada ao efeito do álcool no organismo – três copos de vinho para cerca de 19 horas sem dormir ou seis copos para 24 horas.

Outros elementos influenciam a perturbação do sono como luz natural ou azul (computadores, tablets, celulares), atividades esportivas excessivas e temperatura corporal. Para tanto, a não recomendação de uso daqueles aparelhos antes de dormir e levam a um descanso insuficiente.

Os efeitos mais frequentes da privação de sono se manifestam com bocejos, micro-sonos (as chamadas “pescadinhas”), coceiras nos olhos e fraqueza induzindo a uma queda considerável de atenção, comunicação e consequente impacto na consciência situacional e de risco a que estão submetidos constantemente.

2.3 CONSCIÊNCIA SITUACIONAL E CONSCIÊNCIA DE RISCO

O conceito de consciência situacional (CS) é aplicado diretamente nos treinamentos de pilotos e em diversas áreas de complexidade estrutural. Igualmente aos comissários de voo pode ser entendida como a percepção das interfaces do ambiente em que

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se encontram, os indivíduos envolvidos no tempo e o espaço, a aeronave e seus procedimentos em uma sinergia de eficiência em situações criticas. Henriqson, Éder et al. (2009, p. 435) define os elementos cognitivos para a CS:

Diversos autores, dentre eles Leplat (1987), Rasmussen (1982), Wickens e Hollands (2000), Endsley (1995, 1999) e Foltz (2008), têm buscado compreender o funcionamento dos elementos da cognição humana (percepção, atenção, memória, tomada de decisão, resposta motora, entre outros) em termos de estrutura, conteúdo e funcionalidade, através da proposição de modelos de controle cognitivo.

Ainda em Henriqson, Éder et al (2009, p.436) aponta modelos teóricos de tomada de decisão:

O modelo de consciência situacional de Endsley (1995; 1999) serviu de base para a investigação dos fatores determinantes do modo de controle cognitivo e da tomada de decisão. O modelo de consciência situacional compreende três níveis de representação e gestão de recursos cognitivos por parte dos operadores: detecção e percepção de sinais (nível 1), compreensão (nível 2) e projeção futura (nível 3). Entende-se que os três níveis precedem a tomada de decisão, a qual será influenciada pelo modo de controle cognitivo dos operadores para uma dada situação. O modelo não exclui a interferência de fatores como atenção, memória, conhecimento, experiências (tratados como gestão de recursos cognitivos) e o feedback de sinais/informações já processadas.

O agravante da fadiga aérea em comissários de voo é a esfera em que ocorre o impacto a ponto de comprometer a consciência de risco e a consciência situacional. Alguns responsáveis cognitivos podem ser detectados de imediato: uma reluta constante contra o sono, a diminuição dos reflexos, o bloqueio de percepções, a monotonia e o tédio na madrugada em cabines escuras, a canalização de uma ideia ou visão, esquecimentos repetitivos.

Nos treinamentos de comissários em empresas aéreas, determinadas perguntas podem ajudar a esta retomada de consciência: que tipo de aeronave estou voando? como se abre esta porta? onde estão os equipamentos de segurança? por onde estamos voando (mar, gelo, deserto)? E servem como ferramentas perceptivas dos ambientes internos e externos a fim de manter os parâmetros de segurança sempre ativos.

Em conjunto à consciência situacional, o conceito de consciência de risco (CR) vem a ser a possibilidade da incidência de determinado evento resulte em perdas ou diminuição de performance, uma resultante da combinação da probabilidade de ocorrência de uma situação ou seu impacto potencial. No dicionário Priberam (2016), risco é a

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probabilidade de estar exposto ao perigo. Ao voar, as condições nas operações carregam inevitavelmente possibilidades e probabilidades a risco de acidentes e incidentes.

A degradação das duas consciências relacionam-se na diretamente com redução de percepção, “desatenção, baixa motivação, falta de cuidado, negligência e imprudência, e assim as medidas preventivas estão dirigidas no sentido de se restringir a variabilidade indesejável do comportamento humano”, conforme apresenta Reason (2000 apud CORREA e CARDOSO JUNIOR, 2007, p.190) na Teoria do Queijo Suíço. O alinhamento das falhas e erros levam as perdas e fatalidades.

O risco faz parte do trabalho aéreo, sendo considerado insalubre e perigoso, um ambiente inóspito. Tomar consciência dos riscos é se alinhar à antecipação dos fatos, muitos deles já conhecidos ao longo de décadas de aviação, na aplicação dos procedimentos preditivos e preventivos. Não há risco zero na aviação. Mas por serem vivenciados e previsíveis, as causas latentes podem ser reduzidas ao máximo.

Na consciência de risco, as ações preventivas são precedidas por ações preditivas por meio de treinamentos e condicionamentos teóricos e práticos. Para tal, simuladores de voo apresentam cenários dos possíveis riscos que acompanha a jornada do comissário. Ambas as consciências, situacional e de risco, permitem uma ação adequada, eficiente e eficaz em situações de acidente e incidente.

De forma abreviada, a Skybrary (2016, tradução nossa) disponibiliza a definição da ICAO para acidente como sendo toda ocorrência relacionada com a operação de uma aeronave, havida entre o período em que uma pessoa nela embarca com a intenção de realizar um vôo até o momento em que todas as pessoas tenham dela desembarcado e, durante o qual, pelo menos uma das situações, sofrer lesão, danos à estrutura da aeronave ou desaparecida. E para incidente como uma ocorrência, que não acidente, associada a operação de uma aeronave cujo efeito venha a afetar a sua operação.

As consciências situacional e de risco permitem gerenciar os diversos tipos de emergências a bordo em um monitoramento constante da cabine nas diversas fases do voo, controlando falhas por meio de um conjunto de procedimentos previstos e evitar o que pode ser uma armadilha pronta pelo efeito da fadiga aérea.

2.4 SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIAS A BORDO

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A Lei nº 9.294, de 15 de julho de 1996 (BRASIL, 1996) estabelece a proibição do fumo a bordo de aeronaves civis brasileiras. No passado, muitos eram os indícios de focos de incêndio em lixeiras de lavatórios ou poltronas e atualmente esse agravante diminuiu a forma inexistente.

Porém, o aumento do número de equipamentos eletrônicos com baterias de íon lítio tem acarretado a incidência de focos de calor e princípio de incêndio relatado pelas companhias aéreas. Se o transporte dessas baterias são proibidas como cargas em aeronaves pela ANAC, o alerta na cabine de passageiros redobra visto o montante de aparelhos a bordo, a exemplo dos recentes casos ocorridos com o celular Samsung Note 7 (ANAC, 2016).

A ameaça do fogo a bordo pode comprometer as ações dos comissários em caso de despressurização da cabine, pois qualquer incidente não anula a possibilidade de outro novo incidente.

2.4.2 Despressurização

As aeronaves voam a cerca de 35 mil pés de altitudes (10.668 m) e portanto são pressurizadas, visto o baixo índice de concentração de oxigênio externo. As ocorrências de despressurização têm origem em perfuração de fuselagem, rompimento janelas e portas ou falha no próprio sistema de pressurização da cabine (CEAB, 2016).

Como consequência há queda brusca de oxigênio em toda aeronave, declínio da temperatura, sensação de ofuscação e confusão mental, névoa por condensação do ar o tempo de lucidez nos indivíduos se reduzem a poucos segundo, em média 20 a 45 segundos (CEAB, 2016).

Todos seus ocupantes devem usar imediatamente as máscaras de oxigênio liberadas quando houver uma despressurização até a aeronave atingir um nível de voo de segurança, onde o ar externo se equipara com o ar interno tornando-se respirável.

Esta situação leva inevitavelmente a aeronave a um pouso de emergência em aeroporto mais próximo, por evidente falha na operação.

2.4.3 Pousos de emergência

Todo pouso e decolagem são consideradas emergências em potencial. São as chamadas fases críticas dos voos. O maior índice de acidentes/ incidentes ocorrem nestas fases, segundo relatório do Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos

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(CENIPA) aponta para 33,54% o número de ocorrências no período de 2004 a 2013 em território nacional.

Esses pousos podem ocorrer em infraestrutura aeroportuária, mar, selva, deserto ou geleiras e em sua grande maioria nos aeroportos (CENIPA, 2015). Pousos de emergência ocorrem por mais variados motivos: falha nos motores, no sistema hidráulico e operacional, fogo e fumaça a bordo, falta de combustível, sequestro e sabotagem, entre outros.

Em pousos de emergência, há uma grande probabilidade de evacuação dos ocupantes da aeronave por meio das portas e equipamentos infláveis pelos comissários de voo.

2.4.4 Abertura inadvertida de portas e inflação de escorregadeiras

Escorregadeiras são equipamentos de evacuação em forma de tobogãs infláveis encontrados nas portas das aeronaves e de uso exclusivo em caso de emergência. Segundo a IATA (2016), em 2004 foi o erro mais frequente dos comissários e diversas empresas aéreas reportaram à instituição americana como sendo 60% por fatores humanos. Apesar do volume decrescente nas ocorrências, as ameaças ainda são presentes causando sérios danos físicos e mesmo fatais.

Uma porta aberta e sua escorregadeira inflada inadvertidamente pode causar o cancelamento do voo obrigando a companhia acomodar os passageiros em hotéis, pagar indenizações, resultando em grandes prejuízos.

Estas ocorrências surgem em detrimento da fadiga aérea, desatenção e cansaço e pode ser reduzido consideravelmente por meio da regulamentação aérea especifica vigente prevendo descanso a bordo, repousos, folgas, limites de pousos e horas de jornadas.

2.5 REGULAMENTAÇÃO AÉREA BRASILEIRA

2.5.1 Lei do Aeronauta

A regulamentação trabalhista dos aeronautas é prevista pela Lei 7.183 de 5 de abril de 1984 (BRASIL, 1984). Sua função orienta as empresas com relação as jornadas de trabalho, limites de voo e pousos, tempos de repouso, folgas, escalas de serviço, reservas e sobreavisos. Os extratos a seguir são pertinentes para análise posterior da fadiga nos comissários de voo.

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A função dos tempos de voo e escalas permitem ao comissário uma organização do seu trabalho regulamentar baseada na medicina da aviação em prevenção à fadiga aérea.

2.5.2 Tempo de voo e escalas de trabalho

A presente versão da lei prevê a seguinte composição do tempo à disposição do empregador:

Art. 20 – Jornada é a duração do trabalho do aeronauta, contada entre a hora da apresentação no local de trabalho e a hora em que o mesmo é encerrado.

§ 1º – A jornada na base domiciliar será contada a partir da hora de apresentação do aeronauta no local de trabalho.

§ 2º – Fora da base domiciliar, a jornada será contada a partir da hora de apresentação do aeronauta no local estabelecido pelo empregador.

§ 3º – Nas hipóteses previstas nos parágrafos anteriores, a apresentação no aeroporto não deverá ser inferior a 30 (trinta) minutos da hora prevista para o início do vôo. § 4º – A jornada será considerada encerrada 30 (trinta) minutos após a parada final dos motores.

Art. 21 – A duração da jornada de trabalho do aeronauta será de: a) 11 (onze) horas, se integrante de uma tripulação mínima ou simples; b) 14 (quatorze) horas, se integrante de uma tripulação composta; e

c) 20 (vinte) horas, se integrante de uma tripulação de revezamento ( ANAC, 2016, p.3)

Os tempos de voo e pouso ficam assim definidos:

Art. 29 – Os limites de vôo e pousos permitidos para uma jornada serão os seguintes:

a) 9 (nove) horas e 30 (trinta) minutos de vôo e 5 (cinco) pousos, na hipótese de integrante de tripulação mínima ou simples;

b) 12 (doze) horas de vôo e 6 (seis) pousos, na hipótese de integrante de tripulação composta;

c) 15 (quinze) horas de vôo e 4 (quatro) pousos, na hipótese de integrante de tripulação de revezamento (ANAC, 2016, p.5)

Os limites de tempo de voo ficam assim definidos:

Art. 30 – Os limites de tempo de vôo do tripulante não poderão exceder em cada mês, trimestre ou ano, respectivamente:

a) em aviões convencionais: 100 – 270 – 1.000 horas; b) em aviões turboélices: 100 – 255 – 935 horas;

c) em aviões a jato: 85 – 230 – 850 horas (ANAC, 2016, p.6)

Regulamentado o período de jornadas, dá-se o regulamento dos tempos de folga e repouso nas escalas dos tripulantes.

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2.5.3 Tempo de repouso e folgas

As folgas e períodos de repouso como sendo:

Art. 34 – O repouso terá a duração diretamente relacionada ao tempo da jornada anterior, observando-se os seguintes limites:

a) 12 (doze) horas de repouso, após jornada de até 12 (doze) horas;

b) 16 (dezesseis) horas de repouso, após jornada de mais de 12 (doze) horas e até 15 (quinze) horas; e

c) 24 (vinte e quatro) horas de repouso, após jornada de mais de 15 (quinze) horas. Art. 35 – Quando ocorrer o cruzamento de 3 (três) ou mais fusos horários em um dos sentidos da viagem, o tripulante terá, na sua base domiciliar, o repouso acrescido de 2 (duas) horas por fuso cruzado; (ANAC, 2016, p.7)

De igual importância na confecção das escalas, o descanso a bordo para os comissários se torna um elemento qualitativo e vital a fim de minimizar a fadiga aérea durante o voo.

2.5.4 Descanso dos comissários e fases do voo

A Lei 7.183 (BRASIL, 1984, p.2) ainda regulamenta o descanso dos comissários a bordo das aeronaves em assentos reclináveis, contudo, mas não prevê descanso na horizontal igual aos pilotos. Essa medida desobriga as empresas aéreas a adotarem uma oferta de descanso com qualidade, podendo ser em poltronas de classe econômica junto aos passageiros. Descansar na horizontal proporciona uma diferença considerável para o sistema circulatório, o relaxamento físico, realização dos ciclos de sono, se desconectar do clima comercial e descompressar dos picos de estresse ocorridos desde o início da sua jornada.

Nos voos intercontinentais em aviões para 200 ou 300 passageiros a duração do voo é dividida em fases de serviço e plantão. As fases de serviços de bordo ocorrem após a decolagem e antes do pouso e a fase de plantão se realizam entre elas. O período de plantão noturno se descreve em cabine apagada proporcionando descanso aos passageiros. Metade da equipe de comissários repousa e outra metade permanece de plantão, em seguida há troca de turno. Por exemplo, em um voo de onze horas, três horas seriam dedicadas a seu descanso outras três para o plantão.

Atualmente, o Projeto de Lei (PL) 8255/14 (SNA, 2016) aprovado pela Câmara dos Deputados retifica uma legislação que se faz obsoleta para os dias atuais e não mais de 30

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anos, ampliando inclusive para tripulantes de outros segmentos como taxi aéreo e serviços privados. Amplia, por exemplo, o número de folgas de 8 para 10, reduz as horas mensais de 85 para 80 e o número de pousos de 5 para 4 em tripulações simples.

Em função de diversos agravantes já conhecidos pela fadiga aérea, o Sistema de Gerenciamento de Risco de Fadiga é uma ferramenta contribuinte redutora como recurso tanto bordo como na organização das escalas.

2.6 SISTEMA DE GESTÃO DE RISCO DE FADIGA (FRMS)

Após estudos preliminares sobre as causas de diversos acidentes/ incidentes, em 2011, a OACI e IATA reconhecem a fadiga aérea como um elemento agravante nos casos ocorridos. As regulamentações trabalhistas já não são mais condizentes com as tecnologias avançadas, os ritmos de jornadas em função da ampliação das frotas, linhas, demandas e ofertas no mercado do setor aéreo. A ICAO define o FRMS:

Para mitigar este risco, a ICAO recomenda que os operadores estabeleçam Sistemas de Gerenciamento de Risco da Fadiga, em inglês, Fatigue Risk Management System [FRMS], a fim de monitorar e gerenciar continuamente riscos à segurança operacional relacionados à fadiga, com base em princípios e conhecimento científicos, bem como em experiência operacional, que tenham o objetivo de garantir que o pessoal envolvido desempenhe suas atividades com nível adequado de vigilância (LICATI et al, 2015, p.8).

Em uma atividade dinâmica como a aviação, onde tanto a vida dos funcionários como dos consumidores podem estar em risco, o FRMS é uma ferramenta sistêmica diante das ameaças e situações.

O FRMS propõe um olhar científico sobre a fadiga e seus causas em uma melhor metodologia que avalia o desempenho humano relacionado às alterações do ciclo circadiano, sono e vigília e passa a operar de forma preditiva, proativa e reativamente. Estimula a gestão de risco de fadiga humana mensurando o cansaço dos tripulantes, investigando e avaliando os riscos por meio de relatórios, monitoramento clínico e confeccionamento de escalas mais equilibradas às suas missões.

Adequação de uma nova perspectiva visa minimizar o impacto no organismo dos tripulantes e é essencial para o bom andamento das operações aéreas. Empresas e tripulantes trabalham em respeito mútuo, um bom relacionamento e responsabilidade conjunta, proporcionando um ambiente organizacional onde as cargas de trabalho não excedam o limite humano, maximizando a utilização dos tripulantes com segurança.

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Por um lado a empresa se compromete em preparar programações dentro do FRMS, a bordo as tripulações gerenciam a fadiga e disponibilizam relatórios igualmente importantes à empresa.

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3 APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

3.1 OS FATORES DA FADIGA AÉREA EM COMISSÁRIOS DE VOO.

A somatória dos elementos fuso horário, privação de sono, alimentação desregrada, vibrações e ruídos comprometem a integridade do ciclo circadiano e levam a uma diminuição da percepção situacional, capacidade de reação, prejuízo do estado de alerta, um esgotamento físico e mental por degradação de desempenho como aponta Montandon (2007).

Este comprometimento pode ser dividido ainda em dois aspectos conforme Kanashiro (2005), Operacional e Individual. Assim, a congruência entre as duas esferas é oriunda das tarefas, ergonomia do trabalho, saúde física e mental do tripulante entre outros.

A causa maior da fadiga se dá pela privação de sono e sua indução ocorre pela falta luminosidade em período noturno estimulado pela produção de melatonina conhecido como “hormônio do sono”. Em voos noturnos o cenário nas cabines apresenta-se com luzes apagadas e os comissários travam uma luta contra o sono para manter seu estado de alerta.

As alterações do sono ainda se agravam quando os comissários atravessam diversos meridianos em voos internacionais, sobretudo voos para leste (MARTINEZ, 2008) desregulando os horários habituais de descanso noturno. A hora de dormir local não acompanha o sono habitual e muitos comissários adotam medicamentos à base de melatonina para induzi-lo, assunto controverso e proibido no Brasil (ANVISA, 2016).

Contudo, algumas medidas profiláticas do sono para pacientes com transtornos do sono relacionado ao ritmo circadiano, segundo constatadas por Martinez (2008, p. 177)

Manter horários regulares de deitar e levantar, fazendo uso de despertador. Evitar oscilações de mais de 2 h nos horários de levantar no fim de semana. Evitar permanecer mais que 7,5 h na cama, incluindo a sesta neste total. Fazer exercícios, com intervalo mínimo de 6 h, até deitar.

Evitar atividades excitantes ou emocionalmente perturbadoras próximo da hora de deitar.

Evitar atividades que exijam alto nível de concentração imediatamente antes de deitar.

Evitar atividades mentais como pensar, planejar, relembrar na cama. Cuidado com drogas, hábitos e ambiente.

Evitar produtos contendo álcool, tabaco, cafeína ou qualquer substância com ação no sistema nervoso central, antes de deitar.

A cama deve ser confortável, colchão e lençóis de boa qualidade, cobertas adequadas à temperatura.

O quarto de dormir deve ser escuro e silencioso, com temperatura de 24 °C (limites entre 17 e 27 °C).

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Sendo um dos elementos mais agravante, a privação do sono ou acumulo de cansaço por noite mal dormida ou interrompida gera consequências em diversas esferas do cognitivo humano, tais como desempenho, atenção, memória, concentração, entre outros, como aponta a ilustração de Mello (2012).

Imagem 1 – Consequências do débito de sono.

Fonte: Melo, 2012.

Na mesma conceituação acima, a privação de sono é associada ao consumo de álcool em uma relação semelhante a 19 horas sem dormir para seis copos de cerveja ou três de vinho e o dobro de quantidades em caso de 24 horas.

Com o fator fuso horário a alimentação também é alterada. Em voo internacional noturno quando o organismo está acostumado a dormir, há ingestão alimentar constante de produtos calóricos ocasionado pela alteração do ciclo circadiano que influenciam no apetite e a saciedade, ocorrendo uma desordem e compulsão alimentar (BERNARDI, 2009).

Em voos curtos, a refeição se torna uma corrida contra o tempo, ao paladar e à digestão. Em seus pernoites, o descompasso ocorrido pelo fuso horário não confere aos das refeições locais ou aqueles conhecidos em seu organismo.

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Outro elemento contribuinte é o nível de ruído ocupacional variante de 80 a 140 dB (LOPES, 2009), sendo o teor de uma conversa em 60 dB. As vibrações são definidas como “fatores físicos provenientes do deslocamento da aeronave e seu atrito com o ar, das turbulências e do funcionamento dos motores” (PALMA, 2012, p.165). Ambos, ruído e vibrações, lembram um efeito semelhante ao viajar no banco de trás do carro, um som linear que embala a um estado de sonolência.

Ao mesmo tempo, a vibração contribui com a alteração de batimentos cardíacos e pressão arterial segundo alerta Mello (2012) e potencializa um estado de irritação pela ausência de momentos de silêncio e pausa auditiva a que o corpo está acostumado, gerando picos ou acumulo de estresse.

Todos estes componentes afetam a saúde ocupacional, ocasionando riscos físicos e cognitivos juntos às atividades operacionais.

3.2 O RISCO DA FADIGA NA SAÚDE OCUPACIONAL.

A organização do trabalho em seus tempos e movimentos gera impactos na saúde dos funcionários desde a Revolução Industrial. Entre 12 a 16 horas de jornada de trabalho nas fábricas, a medicina do trabalho surge constatando um esgotamento físico e mental ao desumano e submisso ritmo das produções.

Fadiga aérea é um estresse ocupacional ocasionado pelo ambiente de trabalho (aeronave) durante a execução das tarefas do colaborador (comissário) e que excedem a capacidade de enfrentamento do indivíduo ou nas respostas fisiológicas, psicológicas e comportamentais dos indivíduos aos estressores (LIPP, 2009).

Os estudos alertam sobre os efeitos da fadiga no organismo dos tripulantes. A começar pela privação do sono, Martinez (2001, p.16) expõe que “a teoria mais razoável da função do sono é a de que sirva para restaurar processos químicos e físicos deteriorados durante a vigília”. Portanto, toda atividade que interrompe esse processo, desencadeia uma alteração físico-químico no organismo e no ritmo circadiano.

Horários irregulares, isolamento e distanciamento social e familiar, ritmo intenso das escalas, pressão no cumprimento dos horários dos voos, adversidade das condições do tempo e complexidade das operações são exemplos somadas às variantes da fadiga e tendem acentuar o stress e a tensão na saúde ocupacional do comissário.

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Dentre os elementos que compõem a fadiga, o cansaço físico transfere-se no esgotamento mental, repercute em queixas somáticas diversas conforme apresenta Baganha (2013, p.7):

Denota-se, portanto, que a perpetuação de elevados níveis de stress constitui uma ameaça de ruptura à continuidade do papel ocupacional e social do trabalhador, podendo o seu efeito incapacitante resultar em burnout, uma síndrome de natureza tridimensional, caracterizada por sentimentos de exaustão emocional (desgaste de recursos emocionai), cinismo/despersonalização (descomprometimento como trabalho) e perda da realização pessoal (diminuição de sentimentos de competência e eficácia profissional).

Por um lado, o risco da fadiga afeta a integridade técnica no voo em diversas fases. Por outro, leva a constantes afastamentos médicos, absentismos e desmotivações dentro da corporação. Alguns sintomas da fadiga são facilmente reconhecidos, como vemos em Mello (2012, 2002) e Henriqson, Éder et al (2009), tais como:

 Pálpebras pesadas  Dores na nuca  Bocejamento

 Períodos de microsono (“pescadinhas”)  Irritabilidade

 Dificuldade de comunicação  Sensibilidade acirrada  Atenção reduzida

 Tomada de decisões afetada  Memória diminuída

A saúde ocupacional é intrinsicamente impactada pelas condições laborais que se apresenta, seja qual área for, mas também comporta a percepção pessoal do indivíduo. Se o jargão “deixe seus problemas fora da empresa” era visto como politicamente correto, hoje muitas empresas não negligenciam o lado emocional.

Neste sentido, a Lei 7.183 de 5 de abril de 1984 (BRASIL, 1984) prevê as folgas e repousos como parâmetro mínimo para que comissário se recomponha física e psicologicamente das adversidades a que é exposto.

Na atual regulamentação é previsto de 12 a 24 horas de repouso, dependendo do tipo de tripulação, e 8 folgas mensais sendo um sábado ou um domingo (ANAC, 2016, p.7). Contudo, tal legislação não tem embasamento científico e já se faz obsoleto em relação a outros países que aplicam novos conceitos para reduzir a fadiga aérea baseados no FRMS.

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Algumas alterações surgem em propostas como na lei do aeronauta pelo PL 8255/14 (SNA, 2014), conforme aponta o site do Sindicato Nacional dos Aeronautas (SNA):

Busca trazer para o Brasil as melhores práticas em gerenciamento do risco de fadiga e, consequentemente, em segurança de voo. Hoje, existe apenas um item ainda sem consenso: o número de folgas mensais dos tripulantes, que passaria para um mínimo de dez. Cabe dizer que nos países com as melhores práticas de aviação do mundo, como EUA, Austrália e União Europeia, o número mínimo de folgas dos aeronautas fica entre 10 a 15 folgas mensais. (SNA, 2016)

De maneira informal, os comissários encontram paliativos para reduzir a fadiga como bebidas à base de cafeína, se ocupar, caminhadas pela cabine, folhear revistas e mesmo fazer uma pausa de dez minutos, além do descanso a bordo.

A saúde ocupacional afetada pela fadiga aérea conforme exposto compromete dois elementos fundamentais para a efetividade das operações dos comissários de voo em suas funções na segurança de voo: a consciência situacional e consciência de risco.

3.3 A CONSCIÊNCIA SITUACIONAL E DE RISCO EM SITUAÇÕES COTIDIANAS.

A consciência situacional emprega o exercício da percepção de tempo e espaço e projeção de situações futuras (DECEA, 2012). Um modelo deste exercício pode ser obtido através de perguntas iniciadas com onde, quando, quem e como e servem como reforçadores estruturais cognitivos. Devem ser feitas constantemente pelo comissário em atuação como um estado de alerta.

Estes conceitos são usados amplamente em companhias como Air France nos treinamentos de tripulantes. Alguns exemplos de perguntas de consciência situacional:

– Como opero a porta desta aeronave? (é um B737, A320?) – Por onde voaremos? (deserto, mar, floresta)

– Como se usa este extintor de incêndio? (BCF, CO2)

– Quais situações de emergencia podemos vivenciar? (pouso na água ou fora da pista) – Quais as fraseologias em caso de evacuação? (soltem os cintos e saiam, corram, pulem)

Desde a entrada até sua saída da aeronave existe um comprometimento constante por estes questionamentos pelos comissários a fim de assegurar a correta aplicabilidade dos procedimentos de segurança. A consciência situacional reforça a capacidade de atuação de forma preditiva e preventiva.

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A fase preditiva começa pelo check list quando o comissário assume seu posto a bordo verificando dos equipamentos de segurança como extintores de incêndio, cilindros de oxigênio terapêutico, coletes salva-vidas, portas, escorregadeiras e outros itens (CEAB, 2016). O objetivo desta ação é tanto verificar a validade e operacionalidade e reforçar assim seu contato com o equipamento.

A fase preventiva advém do constante estado de alerta durante o voo na correta manipulação dos equipamentos e procedimentos de emergência no momento em que se fizer necessário. Isto é obtido nos centros de treinamento em solo e em simuladores de voo em diversas situações.

Imagem 2 – Cadeia de ações

Fonte: exposição do autor, 2016

Entretanto, os comissários voam em aeronaves diferentes como A320, B737, B777, entre outras. Desenvolver a consciência situacional do ambiente fisico e a disposição dos equipamentos em cada avião desenvolve uma dimensão interativa no indivíduo.

Para Henriqson, Éder et al (2009, p.436), o modelo de consciência situacional compreende três níveis de representação e gestão de recursos cognitivos:

Nível 1 – Detecção e percepção de sinais, Nível 2 – Compreensão e

Nível 3 – Projeção futura.

O modelo não exclui a interferência de fatores como atenção, memória, conhecimento, experiências (tratados como gestão de recursos cognitivos) e o feedback de sinais/informações já processadas. A consciência situacional busca o entendimento do cenário do voo: onde estamos voando, qual o tempo de voo, quais as condições do tempo, etc.

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