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Academic year: 2021

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Neurociência para Professores do Ensino Fundamental e Médio I Curso de Neuroeducação

INVESTIGANDO O SISTEMA SENSORIAL Oficina 1. Somatorrecepção

A todo o momento estamos sendo “bombardeados” por vários estímulos que são percebidos pelos nossos olhos, pele, ouvido, boca, nariz, entre outros órgãos. Estes estímulos são captados por células especializadas (receptores sensoriais), capazes de transformar cada um deles em pequenas unidades de informação que poderão ser “lidas” pelo nosso cérebro e utilizadas por nós, a fim de que possamos perceber e interagir com o ambiente.

Na pele, estes estímulos são detectados por diferentes receptores sensoriais que geram alterações elétrofisiológicas em neurônios sensoriais; seus corpos celulares situam-se em gânglios (agrupamentos de corpos celulares) situados próximos à medula e seus prolongamentos ramificam-se, um direcionando-se para a periferia do organismo (para os receptores propriamente ditos) e o outro entra na medula para realizar contatos sinápticos com outros neurônios e transmitir a informação para o cérebro. Quanto maior o número de neurônios que interagem diretamente com o receptor sensorial, mais detalhada é a representação da superfície que estes receptores recobrem. Esta área, chamada de campo receptivo, possui uma região de correspondência no cérebro, onde possuímos um mapa de toda a superfície do corpo, em que o número de neurônios que processa informações provenientes de uma dada região é proporcional à sua importância e não ao seu tamanho (Figura 1). Se representarmos o número de neurônios corticais dedicados ao processamento de informações de uma dada região do corpo sob a forma de área de cada uma das partes do corpo, o resultado final será um “homúnculo”, i.e., uma figura humana totalmente fora de proporção (Figura 2).

Há duas propriedades importantes que caracterizam a sensação táctil: seu imenso poder de discriminação e seu papel na exploração ativa do ambiente. A habilidade para detectar detalhes varia imensamente na pele de diferentes regiões do corpo, sendo mais desenvolvida na pele das pontas dos dedos e nos lábios, o que está associado à grande inervação dessas regiões e reflete a quantidade de tecido neural dedicado ao processamento de informações dessas partes do corpo, particularmente de córtex cerebral. A capacidade para desenvolver leitura Braille, presente em todos os seres humanos, ilustra o grau de refinamento que pode haver na detecção de detalhes refinados da estimulação táctil. Outro aspecto importante é a diferença no processamento de informações derivadas de estimulação táctil promovida pela exploração ativa (a pessoa “busca” a informação) ou de estimulação passiva (algo ou alguém a estimula). Essa diferença pode ser percebida tomando-se um objeto qualquer e passando-o, por exemplo, sobre o dedo indicador, e depois passando o dedo indicador sobre ele. A exploração ativa proporciona muito mais informação, sendo essencial para o reconhecimento de objetos.

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Exercícios

O presente experimento deve ser realizado em grupos de pelo menos 3 alunos. É bastante importante que os alunos possam participar do experimento ativamente, experimentando com o colega do lado, por exemplo. Os resultados deverão ser anotados para discussão. Explanações e/ou hipóteses sobre os resultados devem ser elaboradas e serão, posteriormente, discutidas em classe.

Experimento: Discriminação táctil entre dois pontos

Este experimento permite evidenciar a distância mínima necessária de estimulação entre dois pontos da superfície de diferentes regiões do corpo para que essas estimulações sejam percebidas efetivamente como dois estímulos. No presente experimento avaliaremos se os

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limiares espaciais de diferentes regiões de um dos lados do corpo diferem dos do outro lado, levando em consideração a preferência na utilização de uma das mãos (manualidade). Essa abordagem é interessante, pois um mesmo voluntário é controle de si próprio, já que serão comparados seus lados direito e esquerdo. Na medida do possível, cada grupo deverá testar uma pessoa preferencialmente destra e outra preferencialmente canhota. Com as duas pontas de um clipe de papel, pesquisar a distância mínima em que ser percebem claramente dois pontos estimulados em diferentes partes do corpo (ponta do dedo indicador, falange proximal -mais próxima à mão - do dedo indicador, palma da mão, antebraço, braço e tronco). O voluntário deve estar vendado. O experimentador pega o clipe e escolhe uma distância entre as pontas. Então, o estímulo é aplicado encostando as duas pontas na região da pele testada, por 2 a 3 segundos, causando, em ambos os pontos, um leve abaulamento. O voluntário deve relatar se sentiu “um” ou “dois” pontos. Enquanto a resposta for “um”, o experimentador deverá aumentar a distância entre as pontas e proceder a uma nova estimulação. Esse aumento deve ser gradual e conhecido (digamos 0,5 mm a cada estimulação - série ascendente). Quando a resposta mudar para “dois”, na série ascendente, a distância deverá ser anotada. Alternativamente, a distância inicial entre as pontas do clipe deverá ser grande e, a cada estimulação, ser diminuída até que o voluntário relate a sensação de apenas “um” ponto (série descendente). O procedimento mais indicado é intercalar uma série ascendente com uma série descendente. Utilize a tabela abaixo para anotar e discutir os

resultados.

Utilizando o modelo de botões

Campo receptivo é um conceito bastante importante para compreendermos como percebemos uma estimulação numa determinada área da pele. Utilizando o modelo de botões (Figura 3), discuta:

1) como podemos discriminar a estimulação de dois pontos na superfície da pele? 2) por que às vezes isso não é possível?

3) quais as regiões de maior sensibilidade tátil do nosso corpo?

4) utilizando o cérebro de acrílico e a figura do homúnculo sensorial, relacione o mapa da superfície do corpo no córtex e os dois modelos de campo receptivo.

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Oficina 2. Comparando a visão central com a visão periférica Introdução

Embora normalmente não sejamos capazes de perceber, existe uma grande diferença entre nossa visão central (o ponto para onde estamos fixando o olhar) e nossa visão periférica (que compreende desde os locais ao redor desse ponto, até os limites do campo visual). Enquanto nossa visão central é capaz de perceber os detalhes e as cores dos objetos, a visão periférica é muito “pobre” na percepção dessas duas características visuais. Ou seja, possuímos uma boa acuidade apenas na visão central. Isso se deve à constituição de nosso sistema visual. Tanto o olho quanto o cérebro são diferentes no que tange a visão central e periférica. Podemos comparar o olho humano a uma “câmara escura”, como nas máquinas fotográficas antigas (antes da era das câmeras digitais). A entrada de luz ocorre por um orifício, a pupila, que corresponderia ao obturador da câmera fotográfica. A imagem é formada na parte de trás do olho, a retina, que corresponderia ao filme fotográfico (Figura 4). É na retina que estão os receptores visuais, chamados fotorreceptores, que são células capazes de detectar a luz. Acontece que, ao contrário do filme fotográfico, a distribuição de fotorreceptores na retina não é uniforme. Quando olhamos para um objeto, a imagem desse objeto é projetada na região central da retina, chamada fóvea. A imagem dos demais objetos da cena visual é projetada ao longo do resto da retina, que é denominada retina periférica. Possuímos dois tipos de fotorreceptores: os cones e os bastonetes. A fóvea possui receptores do tipo cone, que estão envolvidos na percepção de cor. A retina periférica possui receptores do tipo bastonete, que não estão envolvidos na percepção de cor. Por isso, embora isso pareça contra-intuitivo, não somos capazes de perceber cor na visão periférica.

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Além dessa distinção no tipo de receptores presentes na retina central e periférica, existe outra importante diferença. Na retina central (fóvea), cada cone possui “seu próprio” neurônio para levar a informação visual para o cérebro. Às vezes, alguns poucos cones utilizam um mesmo neurônio para isso. No entanto, na retina periférica muitos bastonetes utilizam o mesmo neurônio para levar a informação até o cérebro. Isso faz com que as informações captadas por dois bastonetes diferentes sejam sinalizadas por meio desse neurônio, de forma que o cérebro não consegue diferenciar qual dos bastonetes gerou a sinalização (Figura 5). Muitos neurônios, portanto, sinalizam informações da retina central (um para cada cone), e poucos sinalizam informações da retina periférica (um para muitos bastonetes). Esse é um dos motivos do cérebro possuir uma área cortical devotada a processar imagens vindas da fóvea muito maior do que a área que processa imagens vindas da periferia. Entre outros fatores, é por isso que apenas a visão central possui boa acuidade visual, sendo capaz de perceber os detalhes dos objetos.

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O fato de possuirmos movimentos oculares faz com que normalmente não percebamos o quão “ruim” é nossa visão periférica, pois sempre acabamos desviando o olhar para os objetos que nos interessam, fazendo com que eles sejam processados na retina central. Quando lemos um texto, por exemplo, nossos olhos vão saltando de palavra em palavra, de modo que cada uma delas passe sobre a fóvea. A atividade a seguir visa demonstrar a diferença entre a visão central e periférica no que diz respeito à percepção de cor, forma, detalhes e movimento dos objetos visuais.

Materiais

Objetos pequenos e de cores diferentes (canetas, chaveiros, borrachas, etc). Numa versão mais sofisticada, esses objetos podem ser obtidos recortando-se formas geométricas (quadrados, círculos e triângulos) em cartolinas de cores diferentes e colando-as na ponta de varetas de madeira.

O professor deve pedir a um aluno que se sente em uma cadeira e mantenha seu olhar fixo em algum ponto da sala, situado à sua frente. O professor deve ficar em pé atrás do aluno, escolher um objeto e mostrá-lo para a classe, mas não para o voluntário (Figura 6). Então, vagarosamente o professor deve apresentar o objeto ao longo de um círculo imaginário ao redor da cabeça do voluntário, partindo da região posterior do campo visual do aluno, para

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posições mais centrais de seu campo visual. O ponto de partida tem que ser uma posição na qual o voluntário ainda não possa ver o objeto. O professor deve pedir que o aluno diga para a turma o momento em que ele perceber a presença do objeto no campo visual. Quando o aluno detectar a presença do objeto em seu campo visual, o professor deve parar o movimento e perguntar para o voluntário se ele é capaz de perceber a forma, a cor e os detalhes do objeto. O professor pode também mover verticalmente o objeto de vez em quando, para ver se o aluno é capaz de perceber movimento. Uma vez que os bastonetes são bons detectores de movimento, o voluntário provavelmente será capaz de identificar essa característica. O professor deve então continuar lentamente o movimento ao longo do círculo imaginário em direção ao ponto em que o aluno está fixando o olhar, parando de quando em quando, e pedindo que o aluno tente identificar as outras características do objeto. É de suma importância que, durante a manipulação, o voluntário não mova o olhar na direção do objeto, mesmo que ele seja tentado a fazê-lo.

A manipulação termina quando o voluntário conseguir reconhecer todas as características do objeto e, portanto, identificar o objeto. Isso deve ocorrer quando o objeto estiver posicionado muito próximo à direção do olhar do aluno. Isto é, quando a imagem do objeto estiver projetada na retina central. O professor deve repetir o experimento algumas vezes, com objetos diferentes, e anotar os resultados para posterior discussão.

Questões orientadoras

Ao longo da discussão, o professor deve incentivar a turma a formular hipóteses que ajudem a explicar os resultados obtidos durante o experimento. Essas hipóteses devem ser confrontadas com as observações obtidas, podendo ser mantidas (caso estejam de acordo com as observações) ou descartadas (caso não estejam de acordo). As hipóteses formuladas pela

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turma podem e devem ser testadas com a realização de outras observações e experimentos. A seguir, a sugestão de algumas perguntas para a discussão:

1. Em sua opinião, qual a diferença entre os processos de detecção e identificação?

2. Por que o voluntário é inicialmente capaz de detectar a presença do objeto, embora tenha dificuldade em identificá-lo?

3. Que características (movimento, cor, forma, etc.) foram primeiro percebidas pelo voluntário? Por quê?

4. A percepção de uma característica leva, necessariamente, a percepção das outras? Por quê? 5. Quais as possíveis explicações para as diferenças observadas entre visão central e

periférica?

Oficina 3. Ponto cego

O ponto cego corresponde a uma região do nosso olho em que não somos capazes de detectar estímulos luminosos. Mais surpreendente, se um estímulo visual é apresentado neste ponto concomitantemente à estimulação de partes da retina, nosso cérebro interpreta que há estimulação oriunda daquele ponto e que essa estimulação é congruente com a que está efetivamente ocorrendo na retina. Em outras palavras, na falta de informação luminosa oriunda do ponto cego, nosso sistema nervoso realiza o completamento perceptual.

No olho dos vertebrados, os axônios das células que conduzem a informação oriunda dos fotorreceptores se projetam para fora do olho em direção ao sistema nervoso central, se reúnem num ponto da retina. Também por esta região entram vasos sanguíneos no olho. Assim, há axônios de células nervosas e vasos sanguíneos nessa região; por outro lado, essa região não contém fotorreceptores (Figura 7). Alguém poderia questionar porque este arranjo das células se apresenta assim, ou seja, porque os axônios que se direcionam para o sistema nervoso não estão posicionadas em outra região do olho que não interferisse na detecção dos estímulos. Essa resposta envolve entender a história evolutiva que levou ao surgimento do olho dos vertebrados, o que não é nossa missão aqui, apesar do tópico ser interessante.

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Apesar de haver um ponto cego em cada olho não o notamos normalmente. Mas podemos demonstrar sua existência a partir de um experimente muito simples, usando a Figura

8. Com o olho direito fechado, segure essa figura a cerca de 50 cm de distância à frente do olho esquerdo. Fixe o olhar na cruz. Lentamente, mova a figura para trás e depois para frente. Sempre mantendo o olhar na cruz repare que há um momento em que o círculo desaparece. Isto ocorre pois, neste momento a imagem proveniente do círculo se projetou sobre o ponto cego em sua retina.

É importante que o olho direito esteja fechado quando a cruz estiver à direita do círculo. Isso porque no ser humano o ponto cego, ou seja, o ponto em que os axônios formadores do nervo óptico atravessam a retina, se localiza na região mais próxima do nariz em sua retina (região nasal). Caso você queira revelar o ponto cego do olho direito feche o olho esquerdo e coloque apostila de cabeça para baixo. A Figura 9 representa esquematicamente os olhos esquerdo e direito e como a luz da cruz e do círculo são projetos na retina do olho esquerdo.

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Várias perguntas interessantes surgem quando da realização deste experimento. Por exemplo, se temos um ponto cego em cada olho, porque não temos a impressão de que existe falta de informação desses pontos? Em outras palavras, como seria possível ignorar a existência de dois pontos cegos, um em cada olho ? Acredita-se atualmente há mecanismos cerebrais que “completam probabilisticamente” a imagem visual, mesmo não dispondo de informações sobre esses pontos. É possível revelar isso experimentalmente. Note que no experimento anterior o campo visual que rodeia a região do ponto cego corresponde ao papel branco e que a sensação oriunda do ponto cego foi a de que o campo era branco.

Usando agora a Figura 10, fixe a cruz com o olho esquerdo, mantendo o olho direito fechado e repita o procedimento anterior. Você perceberá que em determinado momento você não mais verá a barra cortada em um ponto, mas sim uma barra contínua, sem qualquer interrupção. O que nosso cérebro fez foi preencher a área sobre a qual não temos informações, i.e., o ponto cego, com o padrão mais provável em função da estimulação das regiões circunvizinhas da retina.

Tendo entendido como o efeito funciona, tente repetir esse procedimento colocando no entorno do ponto cego padrões diferentes de cores e formas. Repare o que ocorre. Tente colocar padrões de xadrez, barras com cores diferentes em cada lado e assim por diante. Você verá que o seu sistema visual completa a informação faltante.

Uma discussão interessante sobre esse fenômeno visual é que muitas vezes percebemos o mundo de uma determinada forma, mas que isso pode não corresponder à realidade. Em

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outras palavras, podemos viver uma vida inteira sem notar que algumas vezes nossos sentidos nos enganam.

Oficina 4. Sentido de proveniência dos estímulos acústicos Introdução

Sons são ondas mecânicas longitudinais, isto é, são causados pela compressão e rarefação das moléculas do meio por onde se propagam, longitudinalmente. A velocidade de propagação dos sons no ar é de cerca de 340 m/s. Em meios mais densos, como a água ou mesmo sólidos, a velocidade é maior: aproximadamente 5.100 m/s no ferro, 1.500 m/s na água do mar. As principais características de um som são sua freqüência, intensidade (volume) e timbre (complexidade).

A freqüência de um som corresponde ao número de comprimentos de onda ocorridos em um segundo, sendo expressa em Hertz (Hz). Biologicamente este conceito tem importância fundamental, pois diferentes espécies detectam sons de freqüências distintas. Por exemplo, o ouvido humano ouve freqüências entre 20 Hz (sons graves) e 20.000 Hz (sons agudos) devido a características intrínsecas de uma região do sistema auditivo chamado cóclea. Há uma membrana na cóclea, chamada membrana basilar (Figura 11), que é capaz de vibrar quando exposta a sons acima de 20 Hz ou abaixo de 20.000 Hz. É na Membrana Basilar que se encontram células receptoras específicas que transformam a energia mecânica da vibração em alterações elétrofisiológicas. Estas células são capazes de gerar alterações na atividade nervosa dos neurônios que conduzem a informação para o cérebro.

Experimento

Um voluntário deve permanecer sentado com os olhos fechados, e sem mover a cabeça. Colegas sentados ao redor, gerarão estalidos de dedos que servirão como estímulo acústico. O Professor deve indicar o momento em que cada aluno fará um estalido, pois deve-se

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apresentar apenas um por vez. Logo após cada estalido, o voluntário, ainda com os olhos fechados, deverá apontar para a origem do som. Colegas diferentes, sentados em posições e distâncias que variam aleatoriamente em relação ao plano sagital do voluntário, gerarão esses estalidos, individualmente; a cada estalido o voluntário apontará para a origem do som. Anotar os resultados graficamente (registrando a posição dos estalidos em relação à cabeça do voluntário, particularmente em relação ao plano sagital) e se o voluntário foi capaz de identificar com precisão a proveniência do estímulo sonoro.

Questões orientadoras

1. Existem condições em que o voluntário demonstra dificuldades em identificar a proveniência do estímulo acústico?

2. Quais as possíveis fontes de informação nessa condição experimental são utilizadas para identificar a fonte do som?

3. O que ocorre se o voluntário inserir algodão em um dos ouvidos?

Oficina 5. Detecção de aceleração angular

Tarefas tão simples quando andar, correr e pular geram acelerações e rotações do corpo no espaço. É comum que essas atividades sejam desempenhadas concomitantemente a manutenção de uma cena visual estável. A manutenção do equilíbrio e da cena visual durante o desempenho desse tipo de tarefa dependem de mecanismos que permitem detectar as acelerações a que o corpo é submetido e corrigir o movimento dos braços, pernas e olhos, em função das acelerações a que o corpo é submetido. Existe um aparelho vestibular em cada lado da cabeça, dentro do osso craniano situado logo atrás da orelha (Figura 11 - mostra o aparelho vestibular direito; Figura 12). Em seres humanos, cada aparelho vestibular possui 3 canais semi-circulares arranjados de forma aproximadamente ortogonal em relação aos outros canais, um em cada plano da cabeça. Esse tipo de arranjo permite detectar acelerações e rotações nas três dimensões do espaço.

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Os canais semi-circulares são constituídos de canais membranosos que, de certa forma, “flutuam” dentro de espaços intra-ósseos (Figura 11). Esses canais são preenchidos por um líquido denominado endolinfa. Quando ocorrem rotações do corpo e da cabeça, as paredes ósseas acompanham esse movimento prontamente. A endolinfa, porém, tende a manter sua inércia anterior. Assim, ocorre um movimento relativo das paredes ósseas do canal em relação à endolinfa. Esse movimento relativo estimula receptores, células ciliadas, situadas no aparelho vestibular, permitindo a detecção da estimulação e também a correção da posição dos membros (pernas e braços), da cabeça e dos olhos com vistas à manutenção do equilíbrio. É possível realizar diversos experimentos que permitem revelar o funcionamento dos canais semi-circulares e também as correções de membros e olhos decorrentes dessa estimulação, utilizando uma cadeira giratória bem lubrificada (deve-se cuidar para que a cadeira fique bem fixa no chão, que o voluntário cruze as pernas para evitar que as mesmas toquem o chão e que o voluntário não seja pessoa que enjoa facilmente quando viaja de carro em serra).

O experimento consiste em girar um voluntário para sua direita, com os olhos abertos e o queixo posicionado cerca de 30 graus abaixo do plano horizontal, uma volta por segundo. Deve-se observar o movimento dos olhos durante a manobra. Note que existe um movimento ocular lento para a esquerda, alternado com um movimento ocular rápido para a direita (para facilitar a visualização e análise desse movimento, pode-se filma-lo com uma câmera de vídeo ou mesmo uma câmera digital direcionada pelo voluntário para seus próprios olhos. Isso porém, não é absolutamente necessário para se observar o fenômeno. No caso de utilização da câmera para filmagem, o voluntário não deverá focalizar o olhar na câmera, mas sim “num ponto qualquer no infinito

Pedir para os alunos descreverem o deslocamento dos olhos e para levantarem hipóteses sobre sua origem. A resposta mais comum dos alunos é que o voluntário está tentando manter a imagem visual estável e por isso realiza os movimentos oculares. Ou seja, que se trata de um tipo de reflexo visual. Depois que os alunos apresentarem essa e/ou outras hipóteses, pedir

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que eles idealizem experimentos para testá-las. Durante essa tentativa dos alunos, o Professor pode ressaltar que de acordo com a hipótese a manutenção da imagem visual estável seria o fator crítico e que de acordo com a hipótese sua origem seria ocular. No contexto dessa discussão, não raro os alunos acabam propondo que se gire o voluntário na cadeira com os olhos fechados (felizmente, dá para observar o movimento ocular lento no sentido oposto ao da rotação mesmo que o voluntário esteja com os olhos fechados).

Quando se chega a este ponto, pode-se fazer raciocínios do tipo “se... então...”. Por exemplo, “se de fato é a manutenção da imagem visual estável que determina a fase lenta do movimento ocular sendo que essa resposta tem origem na própria estimulação visual, então não deve haver esse tipo de movimento ocular quando os olhos estão fechados”. Portanto, “se os olhos não se moverem, então poderemos concluir que pode se tratar de um reflexo cuja origem é visual”. Porém, “se ocorrer esse movimento ocular mesmo com os olhos fechados, i.e., na ausência de visão, então poderemos concluir que não é a manutenção da imagem visual o fator crítico determinante dessa resposta”. Depois que os alunos entenderam a lógica desses raciocínios, fazer o experimento, girando o voluntário na cadeira com a cabeça posicionada da mesma forma que antes, porém com os olhos fechados. Deverá haver movimento ocular, como antes.

Outra idéia de experimento comumente proposta é que se gire o voluntário para a direita até que sua endolinfa adquira a inércia de movimento nesse sentido e, então, pará-lo abruptamente, pedindo-se que ele voluntário abra os olhos logo a seguir. Observa-se o movimento ocular mesmo depois que a rotação foi interrompida. Porém, as fases lenta e rápida desse movimento terão sentido oposto ao descrito acima, isto é, a fase lenta será para o lado direito e a fase rápida para o lado esquerdo. Note que esse movimento é congruente com idéia de que é o movimento relativo da endolinfa em relação ao labirinto ósseo que determina a resposta. Note ainda que essa resposta é idêntica à observada quando se parte da posição de repouso, com rotação do voluntário para a esquerda.

Esses resultados permitem avaliar as hipóteses apresentadas acima e mostrar que a origem da resposta não é visual. Neste momento, pode-se ressaltar que trata-se de uma resposta que corrige a posição do globo ocular e que essa correção contribui para a manutenção da imagem na retina.

Seria essa correção efetivada apenas em relação ao globo ocular ou também em relação à posição dos membros no espaço ? Pedir para os alunos idealizarem experimentos para avaliar esta possibilidade.

Uma proposta comum é que se gire o voluntário repetidas vezes, com os olhos vendados e, depois, se pare a cadeira abruptamente. Então, pedir para que ele aponte para um objeto imaginário fixo, situado à sua frente, com movimentos do dedo para frente e para trás. Ficará claro que o voluntário corrige a posição dos membros em função da estimulação vestibular. Um experimento adicional, talvez o mais impressionante, é girar o voluntário com os olhos fechados até que se atinja a velocidade de rotação constante. Depois disso, desacelerar a cadeira lentamente até a posição parada. Desde o início, o voluntário deverá informar, a cada instante (i.e., “segundo a segundo”), o que está sentindo. Por exemplo, ao perceber o início do

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seu movimento giratório para a direita, o voluntário deverá informar “direita.. direita... direita...” e prosseguir dizendo “direita” enquanto for essa sua sensação. Quando sentir que o movimento giratório foi interrompido, o voluntário deverá informar “parado... parado... parado...”.

Similarmente, quando sentir que está girando para sua esquerda, deverá informar “esquerda... esquerda... esquerda...”. E depois, quando sentir que está parado, deverá informar ““parado... parado... parado...”. Assim, saberemos, a cada segundo, o que o voluntário está sentindo. Esse experimento mostrará que se não houver movimento relativo da endolinfa em relação aos canais, já que ambos adquiriram a inércia de movimento, o voluntário sentirá que está parado, mesmo estando em rotação (é importante que a velocidade de rotação seja constante para que o fenômeno apareça). Mais interessante, quando o voluntário é desacelerado, ainda rodando para a direita, terá a sensação de estar rodando para a esquerda. Pode-se iniciar esta atividade com este experimento pois ele é o mais impressionante de todos.

LEITURAS ADICIONAIS

BEAR MF, CONNORS BW e PARADISO MA, 2008. Neurociências. Desvendando o sistema nervosa, 3a. Ed., Artmed, Porto Aletre, 896p.

GAZZANIGA, M.S., Ivry R.B. e Mangun G.R., 2006. Neurociência Cognitiva. A Biologia da Mente. Artmed, Porto Alegre, 768p.

KOLB, B & WHISHAW, I.Q. 2002. Neurociência do Comportamento. Editora Manole Ltda. LENT, R. 2001. Cem bilhões de neurônios: conceitos fundamentais de neurociência. Editora Atheneu, São Paulo, 698p.

Referências

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