• Nenhum resultado encontrado

Análise das relações entre prestadores de serviço e planos de saúde odontológicos: visão do cirurgião-dentista.

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "Análise das relações entre prestadores de serviço e planos de saúde odontológicos: visão do cirurgião-dentista."

Copied!
74
0
0

Texto

(1)

Trabalho de Conclusão de Curso

ANÁLISE DAS RELAÇÕES ENTRE PRESTADORES DE

SERVIÇO E OPERADORAS DE PLANOS ODONTOLÓGICOS: VISÃO

DO CIRURGIÃO-DENTISTA.

Fernanda Cristina Bertram de Moraes

Universidade Federal de Santa Catarina

Curso de Graduação em Odontologia

(2)

UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA DEPARTAMENTO DE SAÚDE PÚBLICA

Fernanda Cristina Bertram de Moraes

ANÁLISE DAS RELAÇÕES ENTRE PRESTADORES DE SERVIÇO E OPERADORAS DE PLANOS ODONTOLÓGICOS: VISÃO DO

CIRURGIÃO-DENTISTA.

Trabalho apresentado à Universidade Federal de Santa Catarina, como requisito para a conclusão do Curso de Graduação em Odontologia.

Orientadora: Profa. Dra. Mirelle Finkler

Co-orientadora: Dra. Daniela Garbin Neumann

Florianópolis 2014

(3)

Fernanda Cristina Bertram de Moraes

ANÁLISE DAS RELAÇÕES ENTRE PRESTADORES DE SERVIÇOS E OPERADORAS DE PLANOS ODONTOLÓGICOS: VISÃO DO

CIRURGIÃO-DENTISTA.

Este Trabalho de Conclusão de Curso foi julgado, adequado para obtenção do título de cirurgião-dentista e aprovado em sua forma final pelo Departamento de Odontologia da Universidade Federal de Santa Catarina.

Florianópolis, 13 de novembro de 2014.

Banca Examinadora:

________________________ Profa. Dra. Mirelle Finkler,

Orientadora

Universidade Federal de Santa Catarina ________________________ Prof. Dr. João Carlos Caetano, Universidade Federal de Santa Catarina

________________________ Dda. Denise Stuart Mussi Universidade Federal de Santa Catarina

(4)
(5)

AGRADECIMENTOS

Agradeço primeiramente a Deus por todas as bênçãos que Ele me confere diariamente, sendo a mais especial delas as pessoas com quem compartilho minha vida e que contribuíram não só para a realização deste trabalho, mas para a realização deste sonho que é estar me formando na Universidade Federal de Santa Catarina.

Agradeço imensamente a meus pais, Vivian Mariane Bertram de Moraes e Luiz

Álvaro de Moraes Jr., por todos os anos de amor e dedicação e por nunca terem duvidado da

minha capacidade de conquistar qualquer coisa que eu almejasse. À minha irmã, Isabela, pela paciência e amizade que me dedicou, de longe e de perto, ao longo desses 5 anos.

À professora Mirelle Finkler, por ter me proporcionado uma orientação maravilhosa, dedicando seu tempo em reuniões, correções de texto, mensagens e ligações, me ensinando a fazer tudo da melhor e mais correta forma. Obrigada por me apresentar o tema de Saúde Suplementar, o qual instigou minha curiosidade desde o primeiro contato e esse interesse tornou a execução desta pesquisa muito mais prazerosa do que eu mesma esperava. Obrigada por me mostrar novas perspectivas que me fizeram atingir reflexões imprescindíveis às quais eu não teria alcançado sozinha.

À Daniela Garbin Neumann, por ter sido uma co-orientadora muito atenciosa, sempre presente, pela participação de correções e reuniões do começo ao fim deste trabalho e especialmente pela excelente pesquisa realizada previamente e que constitui sua tese de Doutorado, a qual eu li, reli, e sempre consegui extrair dela alguma ideia nova e essencial.

Ainda, à Daniela Garbin Neumann e ao professor João Carlos Caetano pelo tempo e empenho dedicados à idealização e redação do projeto submetido ao CNPq, que aprovado no edital em questão, possibilitou o financiamento de nossas pesquisas.

Ao CNPq pelo auxílio financeiro para realização dessa pesquisa na forma de bolsa; ao Conselho Regional de Odontologia de Santa Catarina por ter possibilitado a execução da coleta de dados; aos alunos da ODOESC por participarem do teste-piloto conduzido

(6)

durante essa pesquisa; e aos Cirurgiões-Dentistas que se prontificaram a responder ao questionário.

A Denise Stuart Mussi e João Carlos Caetano por aceitarem o convite de fazer parte da minha Banca Examinadora e pela leitura e considerações prestadas a este trabalho.

E por último, mas não menos importante, aos meus amigos e namorado. Às amizades que construí ao longo desses anos no curso de Odontologia, em especial a meu amigo e dupla

Leonardo Mazzarolo, pelas incontáveis horas que passamos juntos, dentro e fora da UFSC,

pelo laço eterno que criamos desde os primeiros dias de faculdade, e pela habilidade no Excel carinhosamente emprestada aqui.

Virgínia Polli, por ser exatamente quem és! E Leticia Perin, por me amar exatamente

do seu jeito, e por serem minhas irmãs. Agradeço infinitamente a todos os meus amigos de

Joinville, os quais foram minha família em Florianópolis e que estiveram ao meu lado para

tudo, sempre, em especial Cristina Prachthauser Fusinato, Felipe Galvão Machado, Nicole

Girardi e também Taylor Doak, por me amarem incondicionalmente, e por darem sentido a

(7)

“Este modelo está falido. Por quê? Porque nós conseguimos todo um arcabouço legal e

democrático de reformar o Estado, mas o conteúdo dele continuou sendo o da medicalização da vida. Continuou sendo o conteúdo não da saúde, mas da doença. Continua sendo o conteúdo do hospital e não do atendimento básico na família.” (Sérgio Arouca)

(8)

RESUMO

A política de saúde no Brasil seguiu, a partir do final dos anos 80, uma trajetória baseada em uma concepção universalizante da saúde, enquanto direito de cidadania, que tem sido materializada pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Simultaneamente, ocorreu um considerável crescimento do setor de Saúde Suplementar (SS) no país, que cobre hoje cerca de um quarto da população. A Odontologia acompanhou esse crescimento, e hoje mais de 19 milhões de brasileiros estão cobertos por planos odontológicos. Através da análise das relações entre operadoras de planos odontológicos, seus prestadores, beneficiários e a Agência Nacional de Saúde Suplementar, pode-se conhecer melhor as peculiaridades da segmentação odontológica do setor. Investigar essas especificidades, especialmente no que diz respeito à relação entre os prestadores de serviço e as operadoras de planos odontológicos, foi o objetivo do presente estudo, a fim de contribuir com o desenvolvimento de propostas de mudanças para a qualificação da atenção à saúde bucal dos beneficiários. Trata-se de um estudo exploratório, com abordagem metodológica quantitativa, que teve como instrumento de pesquisa um questionário, enviado por correio eletrônico a todos os cirurgiões-dentistas do estado de Santa Catarina. A amostra foi composta por todos aqueles que aceitaram participar e que se declararam prestadores de serviços a pelo menos um convênio odontológico (157). Os resultados indicaram que o credenciamento interfere na autonomia profissional e que o baixo índice de satisfação está diretamente relacionado ao baixo retorno financeiro. Os profissionais relataram a diminuição da qualidade do atendimento prestado aos beneficiários no que diz respeito ao material utilizado e ao tempo dedicado à consulta. Observou-se também que lhes faltam conhecimentos sobre a SS e sua agência reguladora; e que a maioria pretende se descredenciar futuramente. Apesar de tudo isto, os profissionais reconhecem que o credenciamento tende a aumentar o fluxo de pacientes, compartilham a preocupação em desenvolver uma assistência ética, e consideram que o crescimento do setor é positivo para a população brasileira. Embora seja uma temática relevante para os trabalhadores da Odontologia, o baixo retorno de respostas a esta pesquisa remete a uma reflexão sobre a falta de engajamento e mobilização da categoria profissional nas questões que são de todos e de cada um.

(9)

SUMÁRIO

1 CONTEXTUALIZAÇÃO DO PROBLEMA DE PESQUISA ... 10

2 METODOLOGIA ... 17

2.1 Tipo de estudo ... 17

2.2 Participantes ... 17

2.3 Coleta de dados ... 18

2.4 Análise dos dados ... 19

2.5 Aspectos éticos ... 19

3 ARTIGO ... 21

REFERÊNCIAS ... 46

APÊNDICES ... 49

(10)

10

1 CONTEXTUALIZAÇÃO DO PROBLEMA DE PESQUISA

Diz a Constituição brasileira, no artigo 196 que “a saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.” Já no art. 198 estabeleceu-se que “as ações e serviços públicos de saúde integram uma rede regionalizada e hierarquizada e constituem um sistema único” (BRASIL, 1988, p. 33). Estava, assim, no ano de 1988, criado o Sistema Único de Saúde (SUS), inserido em uma proposta de seguridade social universalista (RONCALLI, 2003, p. 34).

Na prática, o SUS ainda não conseguiu consagrar o princípio da universalidade dos serviços públicos de saúde, fato este que manteve aberto o espaço para a compra e venda de serviços no âmbito privado. Segundo publicação do Conselho Nacional de Secretários de Saúde (BRASIL, 2007a), devido à grande dificuldade de se garantir o direito constitucional da universalidade, o SUS integra hoje um sistema segmentado o qual incorpora dois outros subsistemas relevantes: o Sistema de Saúde Suplementar e o Sistema de Desembolso Direto.

No que diz respeito à saúde bucal, de acordo com Manfredini (2010), há dois movimentos concomitantes e aparentemente contraditórios: a entrada da saúde bucal como prioridade nos serviços públicos, e um vigoroso crescimento das operadoras de planos odontológicos, ou seja, a expansão da odontologia dentro da Saúde Suplementar (SS).

Na década de 90 começaram a emergir propostas para uma reorientação do modelo de atenção à saúde no SUS, tendo como marco o surgimento do Programa de Saúde da Família (PSF) (RONCALLI, 2003). Em 2000, estabeleceu-se incentivo financeiro para a contratação de cirurgiões-dentistas nas equipes do PSF, diante da necessidade de ampliação do acesso da população brasileira às ações de promoção, prevenção e recuperação da saúde bucal. (BRASIL, 2000). A partir daí, a Odontologia foi assumindo papel cada vez mais importante e políticas relacionadas à higiene bucal, tabagismo e à aplicação de flúor foram tomando proporções maiores diante do aumento da demanda por esses serviços. (BRASIL, 2004).

A Odontologia passou a valorizar mais, dentro do sistema público, ações preventivas e de abordagem coletiva, além de procedimentos curativos. Outra ação importante do Ministério da Saúde foi a de promover, em 2004, a expansão da rede nacional de Centros de Especialidades Odontológicas (CEOs) (BRASIL, 2004), possibilitando procedimentos clínicos complementares aos realizados na atenção básica, de maior complexidade.

(11)

11 Concomitantemente, houve uma expansão da Odontologia no setor de SS, por meio dos planos odontológicos. O aumento no número de profissionais formados, aliado ao fato de que a população vem utilizando cada vez menos o desembolso direto como forma de pagamento, fomentou a necessidade de outras estratégias para se inserir e permanecer no mercado (VIEIRA, COSTA, 2008). A partir daí, os profissionais da área buscaram inserir-se no setor da SS.

A Odontologia tem crescido muito neste segmento da saúde. Segundo o caderno de informações da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), o número de beneficiários de planos privados de saúde cresceu de 31 milhões em dezembro de 2000 para mais de 49 milhões em setembro de 2013, em planos de assistência médica com ou sem cobertura odontológica. Nos planos exclusivamente odontológicos, o número foi de pouco mais de 2 milhões no ano 2000 para mais de 19 milhões de beneficiários no ano de 2013 (ANS, 2013).

As modalidades de operadoras odontológicas que possuem o maior número de beneficiários são a Odontologia de Grupo, em primeiro lugar, seguida da Cooperativa Odontológica. Juntas, detêm mais de 80% do número total de beneficiários (VIEIRA, COSTA, 2008). Sabe-se, ainda que mais de 80% dos vínculos são a planos coletivos, nos quais os beneficiários recebem a cobertura por intermédio de pessoas jurídicas (ANS, 2013).

A SS é composta pelos serviços financiados por planos e seguros de saúde e, portanto, possui um financiamento privado, porém com subsídios diretos ou indiretos do Estado. Isto ocorre por meio de deduções e/ou isenções fiscais, como por exemplo, beneficiários de planos de saúde que têm seus gastos com o plano deduzidos no pagamento do imposto de renda. Assim, uma parcela da população que tem condições de financiar sua própria assistência médica e odontológica acaba usufruindo de um indireto financiamento do Estado, o qual deixa de arrecadar impostos, diminuindo a receita (FINKLER et al., 2009). Além disso, as cooperativas de saúde recebem financiamento privado, porém estão isentas do pagamento de importantes impostos como PIS e COFINS e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (BRASIL, 1995), fazendo com que os cofres públicos sejam novamente prejudicados. O mix público-privado na SS ocorre ainda porque o SUS é o responsável pela regulação deste setor, financiando a ANS e suas ações (FINKLER et al., 2009).

O mercado de planos e seguros privados no Brasil atuou por quase 40 anos sem regulação (GARBIN et al, 2013). Durante a década de 1990, o setor de SS teve um crescimento desordenado e desregulado, até a criação da ANS, através da promulgação da Lei 9.961/2000. Conforme o art. 3º desta lei, a ANS tem “por finalidade institucional promover a

(12)

12 defesa do interesse público na assistência suplementar à saúde, regulando as operadoras setoriais, inclusive quanto às suas relações com prestadores e consumidores, contribuindo para o desenvolvimento das ações de saúde no país” (BRASIL, 2000, p. 749).

Malta et al. (2004) identificaram três enfoques nas ações da ANS: a primeira com relação à análise da capacidade das operadoras de se estabelecerem no mercado, honrando com seus compromissos na prestação de serviços de assistência à saúde; a segunda com enfoque nos direitos dos consumidores, no que diz respeito a contratos e a relação de consumo, sendo este o principal foco de fiscalização; e a terceira focaliza a questão dos produtos no que diz respeito a preços e composição de cobertura.

A regulação normativa e operacional da ANS é, sem dúvida, fundamental para a manutenção do funcionamento correto do setor de SS. No entanto, existe um campo de atuação em que a ANS pouco interfere, a regulação operativa, a qual engloba as relações entre as operadoras, os prestadores de serviço dos planos de saúde e seus beneficiários. “A regulação nesse nível deverá ser precedida por um processo de apreensão dessa dimensão, compreendendo como esses mecanismos assistenciais ocorrem no cotidiano” (MALTA et al; 2004, p. 436).

Para o melhor entendimento da dimensão do processo regulatório na SS, Cecílio et al.

(2005, p.64) criou um diagrama para compreensão do campo regulativo da ANS (Figura 1).

Figura 1 - A cartografia da regulação.

Na Figura 1, o campo A é composto por entes governamentais, em especial pela ANS, os quais regulam e determinam as leis que regulamentam esse sistema. É a representação da influência do Estado sobre o mercado, designada como Macrorregulação. Já o campo B, constitui o campo da Microrregulação, ou seja, “as formas de regulação que se estabelecem

(13)

13 entre operadoras, prestadores e compradores/beneficiários, em particular entre os primeiros, sem uma clara intermediação do Estado” (CECÍLIO et al., 2005 p. 64).

Faz-se necessário, portanto, investigar essas relações, a fim de entender os mecanismos utilizados pelas operadoras para ofertar seus serviços no mercado e como se dão as relações entre as três partes, para, a partir desses conhecimentos, garantir uma assistência à saúde de qualidade. Neste contexto, aponta-se a necessidade de se conhecer quais são os conflitos de interesses que se dão entre os atores desse sistema na saúde bucal e como eles influenciam no modo de produção da SS - objeto do presente trabalho - no âmbito das relações representadas na figura acima pelo número 1, ou seja, entre as operadoras de planos odontológicos e seus prestadores de serviço, os cirurgiões-dentistas.

O segmento de planos de saúde odontológicos no Brasil é reconhecido como uma categoria específica no universo de SS, e já na segunda metade dos anos 1990 foi considerada uma das mais promissoras fatias desse mercado em termos de crescimento de cobertura populacional (PINTO, 2008). A trajetória ascendente do segmento operador de planos odontológicos evidencia que a população está cada vez mais contratando esses serviços (PIETROBON et al., 2008).

O setor de planos odontológicos é altamente rentável e a permanência e o crescimento destas empresas no mercado podem ser favorecidos pela grande capacidade na geração de receitas desse setor (VIEIRA, COSTA, 2008). No entanto, ainda que esse setor seja responsável pelo atendimento odontológico de uma considerável parte da população, verificou-se em estudos como o de Mussi (2010) e de Neumann (2014) que a principal preocupação dessas empresas é sua saúde financeira. Para esta autora, as diferentes práticas de gestão de preços praticadas pelas operadoras evidenciam o processo de mercantilização da atenção à saúde, priorizando lucratividade e não a qualificação dos serviços (NEUMANN, 2014).

Esse mercado é objeto de várias projeções por parte do segmento empresarial, o qual estima que os planos odontológicos possam beneficiar mais de 40 milhões de usuários nos próximos anos (OLIVEIRA et al., 2009). O crescimento e a dinâmica desse mercado em ascensão podem ser explicados por algumas variáveis, das quais se destacam: a mudança no perfil profissional e da profissão odontológica, a dificuldade de acesso da população aos serviços de saúde bucal e o baixo gasto das famílias em desembolso direto para a assistência odontológica (VIEIRA, COSTA, 2008).

(14)

14 Além disso, os cirurgiões-dentistas têm buscado incluir-se no setor de SS como uma estratégia de permanecer no mercado de trabalho diante do aumento do número de profissionais atuantes e da queda do desembolso direto por parte dos pacientes. Esses fatores, aliados, acabam gerando uma crise no modelo liberal de atenção e contribuindo para o crescimento da SS. Assim, as operadoras aproveitam-se dessa crise do setor autônomo odontológico para estabelecer o pagamento dos procedimentos aos profissionais segundo tabelas de valores muitas vezes abaixo do custo destes procedimentos. Percebe-se então que há uma disputa de espaço entre operadoras e prestadores, a qual está a mercê das leis do mercado e acaba interferindo na qualidade dos serviços prestados aos beneficiários (GARBIN

et al., 2013).

Os profissionais vinculados a planos de saúde odontológicos têm se mostrado insatisfeitos quanto aos valores pagos pelos procedimentos cobertos e prazos de pagamento (D’AVILA, OLIVEIRA, SOUZA, 2007). Além disso, os cirurgiões-dentistas inseridos neste campo de atuação têm percebido uma queda no poder de exercício da profissão como atividade autônoma, sentindo-se muitas vezes limitados pelas operadoras de saúde (VILELA

et al., 2010). O credenciado, ex-profissional liberal, vem sendo transformado em assalariado e

prestador de serviço pelos convênios. (GARBIN et al., 2013). Neste mesmo sentido, Nunes, Leles e Gonçalves (2010) apontam que a Odontologia sofreu alteração de uma natureza liberal e privada para uma profissão vulnerável às oscilações da oferta de emprego e renda, o que tornou o profissional refém dos convênios e do credenciamento.

Essa insatisfação evidencia-se com a ocorrência de paralisações a nível nacional, organizadas por prestadores e beneficiários e que contam com o apoio de órgãos como o Conselho Federal de Odontologia (CFO) e a Associação Brasileira de Odontologia (ABO) e buscam principalmente a valorização do profissional cirurgião-dentista (CONSELHO REGIONAL DE ODONTOLOGIA-SC) (Anexo A). Outras demandas incluem o fim do excesso de exames radiográficos para uso administrativo e a criação de um meio de comunicação entre os cirurgiões-dentistas prestadores, beneficiários e operadoras. Os profissionais se mostram ainda insatisfeitos com as baixas tabelas de honorários, com o excesso de glosas (não pagamento de honorários) e com o desrespeito aos prazos de pagamento. Outra questão que gera insatisfação é o excesso de trâmites burocráticos na operacionalização dos planos (CIRURGIÕES-DENTISTAS, 2014).

Ciente desta disputa de interesses e diante das reivindicações que vem sendo feitas, a ANS instituiu, no ano de 2014, o Comitê de Incentivo às Boas Práticas entre Operadoras e

(15)

15 Prestadores (COBOP), visando estabelecer um canal de diálogo entre operadoras e prestadores de modo que ambos priorizem a qualificação dos serviços prestados aos consumidores (ANS, 2014a) De acordo com a resolução normativa que institui o COBOP, as finalidades deste órgão são: estabelecer diálogos entre os atores, desenvolver mecanismos que induzam esses agentes a priorizar a qualificação dos serviços e, ainda, promover indicadores relativos à adoção de boas práticas, defendendo o interesse público (ANS, 2014b).

Outra medida recente tomada pela ANS é a de exigir que as operadoras de pequeno e médio porte – sendo as de pequeno porte operadoras com ate 20.000 beneficiários e médio porte com um numero de beneficiários entre 20.000 a 100.000 - ofereçam serviços de ouvidoria, assim como já ocorre com as operadoras de grande porte (mais de 100.000 beneficiários). O objetivo dessa implementação é garantir que haja um canal de comunicação entre beneficiários e operadoras, de modo que os beneficiários possam dar sugestões, fazer reclamações e consultas recorrendo a ouvidoria cadastrada junto a ANS, obtendo assim subsídios para o aperfeiçoamento dos processos de trabalho da operadora (ANS, 2014b).

Ainda, a publicação de nova Lei Federal nº 13.003, neste mesmo ano de 2014, torna obrigatória a existência de contratos escritos entre as operadoras e seus prestadores de serviços. O artigo 17-A, acrescido na Lei nº 9.656, estabelece que:

“As condições de prestação de serviços de atenção à saúde no âmbito dos planos privados de assistência à saúde por pessoas físicas e jurídicas, independentemente de sua qualificação como contratadas, referenciadas ou credenciadas, serão reguladas por contato escrito, estipulado entre a operadora do plano e o prestador de serviço.” (BRASIL, 2014, p. 2)

Implica então, num compromisso das operadoras com os consumidores quanto à manutenção ao longo da vigência dos contratos. Poderá haver a substituição por outro prestador de serviços equivalente, mediante a comunicação aos consumidores com no mínimo 30 dias de antecedência. O contrato deve definir direitos, obrigações e responsabilidades das partes (BRASIL, 2014).

Por todo o exposto, evidencia-se a relevância do presente estudo, que visa a conhecer e analisar alguns aspectos da regulação operativa no campo odontológico, aprofundando-se na relação entre as operadoras e os prestadores de serviço no sistema de SS, seus limites, conflitos e interdependências. Neste sentido, conhecer a opinião dos prestadores sobre os planos de saúde é conhecer também a aceitabilidade e as vulnerabilidades destas relações.

(16)

16 Desta forma, o presente trabalho1 tem como objetivo geral analisar a relação entre os prestadores de serviço e as operadoras de planos odontológicos sob o ponto de vista dos cirurgiões-dentistas em atividade no estado de Santa Catarina. Seus objetivos específicos são: - identificar as razões que levam o profissional a prestar serviços no segmento odontológico da SS; conhecer, sob o ponto de vista dos cirurgiões-dentistas, as potencialidades e as limitações do credenciamento às operadoras de planos odontológicos no exercício da profissão; estimar o grau de satisfação dos cirurgiões-dentistas frente à realidade profissional e salarial em virtude de seu credenciamento às operadoras de planos odontológicos; e verificar as expectativas do cirurgião-dentista frente ao amplo crescimento da Odontologia no setor de SS.

1 Esta pesquisa foi concebida de forma complementar à realizada por Neumann (2014), quando se buscou analisar o modelo de atenção à saúde bucal desenvolvido na saúde suplementar a partir das operadoras de planos odontológicos. O projeto daquela pesquisa foi contemplado com recursos financeiros e bolsas na Chamada Nº 10/2012 MCTI/CNPq/MS - SCTIE - DECIT - Pesquisa em Saúde Bucal do CNPq. Este financiamento permitiu a ampliação do projeto de pesquisa de forma a contemplar também a análise do setor a partir dos beneficiários (pesquisa em andamento) e dos prestadores de serviço, aqui apresentada.

(17)

17

2 METODOLOGIA

2.1 Tipo de estudo

Segundo Minayo e Sanches (1993), um bom método é aquele que permite uma construção correta dos dados e ainda, ajude a refletir sobre a dinâmica da teoria, estando apropriado ao objeto e oferecendo elementos teóricos para análise. Ainda segundo esses autores, o conhecimento científico é a busca pela articulação entre uma teoria e a realidade empírica, e o método é quem possibilita essa articulação. Vê-se então, a importância que há em escolher a metodologia correta para um determinado objeto de estudo. No entanto, concordando com Turato (2003), sabe-se que não há uma escolha propriamente dita a ser feita, uma vez que o próprio objeto de pesquisa surge de pressupostos do pesquisador, e dependendo da pergunta feita por esse sujeito, pode-se utilizar-se de um ou outro método.

Este estudo pode ser classificado como exploratório, com abordagem metodológica quantitativa. A pesquisa quantitativa tem como objetivo encontrar dados, indicadores e tendências observáveis, e deve ser utilizada na presença de grandes aglomerados de dados, a fim de classificá-los e torná-los inteligíveis a partir da transformação dos mesmos em variáveis (MINAYO, SANCHES, 1993).

2.2 Participantes

Os sujeitos desta pesquisa foram os cirurgiões-dentistas inscritos no Conselho Regional de Odontologia de Santa Catarina (CRO-SC) que se declararam prestadores de serviços a pelo menos um convênio/plano de saúde com assistência odontológica, e que aceitaram participar.

Optou-se por incluir, nesta pesquisa, profissionais apenas do estado de Santa Catarina devido à maior facilidade de acesso graças ao apoio do CRO-SC, conforme solicitado (apêndice A) e autorizado (Anexo B). Atualmente existem 10.188 profissionais cadastrados em Santa Catarina (CROSC, 2014), contudo, não se pode precisar o quantitativo de profissionais que são prestadores de serviços a operadoras de planos odontológicos. Trata-se de um dado inexistente. Foram enviados, pelo CRO-SC, e-mail a 7.221 desses profissionais, visto que alguns não possuem endereço eletrônico cadastrado nesse órgão, e outros possuem dados desatualizados. Diante da impossibilidade de quantificar quantos deles foram de fato

(18)

18 recebidos e ainda, quantos foram para a caixa de spam, não se sabe o número exato de e-mails visualizados.

Frente à baixa taxa de resposta obtida inicialmente (96), buscaram-se novas estratégias de contato para aumentar a amostra. Foi publicado então, o convite à participação na pesquisa com o link da mesma na página do CRO-SC no Facebook, em dois momentos distintos. O convite foi enviado também como mensagem na mesma rede social a cirurgiões-dentistas cadastrados a convênios, uma vez que foi possível identifica-los a partir dos sites de empresas que disponibilizam sua relação de prestadores online. A coleta foi dada por finalizada, contabilizando-se um total de 157 participantes.

2.3 Coleta de dados

A fim de testar o funcionamento do instrumento de pesquisa a ser utilizado na coleta de dados, o questionário foi aplicado, no mês de maio de 2014 a uma amostra pré-selecionada. Cirurgiões-dentistas matriculados no Programa de Pós-Graduação em Odontologia da UFSC, na área de concentração Saúde Coletiva foram convidados a colaborar e receberam, via correio eletrônico, o link de acesso ao Termo de Consentimento Livre Esclarecido – TCL (Apêndice B) e ao instrumento de pesquisa (Apêndice C).

Os participantes tiveram 5 dias para realizar o preenchimento e envio do mesmo e de um total de 18 convidados, 6 responderam dentro do prazo requerido. Esse teste teve como objetivo avaliar alguns critérios importantes na hora de responder o questionário, como clareza das perguntas, tempo de duração para a resposta, avaliar o armazenamento das respostas em forma de planilha bem como verificar se ocorreu uma tabulação precisa dos dados. Pedimos, ainda, que os envolvidos enviassem sugestões de possíveis alterações via e-mail, as quais foram lidas e levadas em consideração. A execução desse teste teve grande importância, pois a partir dos feedbacks recebidos pode-se identificar quais eram as dúvidas comuns e promover alterações a fim de facilitar a interpretação de algumas das perguntas. Além disso, pode-se observar que o questionário teve um tempo de execução em torno de 3-5 minutos, ou seja, de rápido preenchimento.

Finalizado o teste piloto, os sujeitos da pesquisa foram inicialmente convidados a participar através de uma mensagem por correio eletrônico enviada diretamente pelo CRO-SC. Esta estratégia visou dispensar o acesso das pesquisadoras à lista de emails cadastrados naquela instituição, preservando o sigilo das informações cadastrais dos profissionais.

(19)

19 Nesta mensagem os profissionais foram informados sobre a temática do estudo, seus objetivos e relevância e esclarecidos de que poderiam participar como sujeitos de pesquisa somente se atuassem ou houvessem atuado como prestadores de serviço de operadoras de planos de saúde. Foram convidados, então, a acessar um link que os remeteu ao TCLE. Após leitura do TCLE, o profissional pôde: 1- indicar o interesse em receber os resultados da pesquisa (sendo ele sujeito de pesquisa ou não); 2 – solicitar a impressão do TCLE para ter a guarda deste documento; 3 – clicar em um link indicando que estava de acordo em participar da pesquisa, o qual o direcionaria automaticamente ao website contendo o instrumento de pesquisa, ou clicar em um link indicando que não estava de acordo em participar da pesquisa, o qual o direcionará a página de saída da pesquisa.

O questionário online, acessível através da plataforma Google Drive, foi composto por 32 perguntas fechadas e abertas, de simples escolha, contemplando os objetivos propostos neste estudo, além de coletar dados como idade, tempo de formação, grau de especialização e renda, com o intuito de melhor caracterizar os participantes. Optou-se por utilizar o Google

Drive como instrumento dessa pesquisa, pois ele tornou possível o processo de coleta e

análise de dados em um menor período de tempo. Além disso, permitiu o agrupamento dos resultados em planilhas organizadas, favorecendo a tabulação e interpretação dos dados obtidos.

2.4 Análise dos dados

As respostas das questões fechadas foram eletronicamente tabuladas, conforme as configurações especificadas no sistema do Google Drive e ilustradas por meio de figuras (Apêndice D). As respostas aberas foram agrupadas em um editor de texto de acordo com a similaridades dos seus conteúdos. Os dados obtidos foram então discutidos junto à literatura pertinente, proporcionando os resultados e conclusões deste estudo.

2.5 Aspectos éticos

A pesquisa foi submetida ao Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos da UFSC e somente após sua aprovação (Anexo C) os sujeitos de pesquisa foram contatados. A pesquisa não previu riscos aos sujeitos participantes a não ser o de constrangimento frente à possível perda do sigilo do informante, que, no entanto, foi garantido por parte dos pesquisadores. Os dados coletados exclusivamente por meio de questionário eletrônico foram

(20)

20 utilizados somente para os propósitos desta pesquisa. Ressalta-se que a mesma respeitou as determinações da Resolução 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde, garantindo totalmente o sigilo dos sujeitos de pesquisa tanto no decorrer da pesquisa, quanto na apresentação dos resultados, e em futuras publicações.

(21)

21

3 ARTIGO

Análise das relações entre prestadores de serviços e operadoras de planos

odontológicos: visão do Cirurgião-Dentista.

Analysis of the relationship between service providers and dental insurance companies: the dentist’s point of view.

Resumo

O setor de Saúde Suplementar (SS) no Brasil cobre hoje cerca de um quarto da população. No segmento odontológico a expansão da cobertura foi uma forte tendência durante vários anos, de modo que, atualmente, mais de 19 milhões de brasileiros são beneficiários de planos com serviços odontológicos. No entanto, as divergências entre operadoras de planos odontológicos e cirurgiões-dentistas (CDs) prestadores de serviços são frequentes. Este estudo - exploratório com abordagem quantitativa - buscou conhecer as potencialidades e limitações da SS sob a visão dos CDs que atuam neste segmento do mercado de trabalho, através de um questionário on-line. Os resultados indicaram que o credenciamento interfere na autonomia profissional; que a principal insatisfação está relacionada ao baixo retorno financeiro; que há diminuição da qualidade do atendimento em comparação ao privado; que faltam conhecimentos aos CDs sobre SS e sua agência reguladora; e que a maioria deles pretende se descredenciar das empresas em algum momento. Apesar de tudo isto, os profissionais reconhecem que o credenciamento tende a aumentar seu fluxo de pacientes, compartilham a preocupação em desenvolver uma assistência ética e consideram que o crescimento do setor é positivo para a população. Tais resultados permitem uma melhor compreensão dos conflitos vivenciados no âmbito da microrregulação da atenção à saúde bucal na SS, e apontam para a necessidade de uma intervenção mais direta por parte da ANS.

(22)

22 Palavras-chave: Saúde Suplementar; Planos Privados de Saúde; Odontologia; Mercado

de Trabalho; SUS.

Abstract

The Supplementary Health System (SS) in Brazil covers today about a quarter of the population. In the dental segment, there was a coverage expansion, and now, over 19 million Brazilians are covered by dentistry plans. However, disagreements between dental insurance companies and dentists (CDs) who work for them are frequent. This exploratory study with a quantitative approach has as a major goal to know the capabilities and limitations of the SS considering the vision of CDs, through an online questionnaire. The results indicated that the credentialing interferes with professional autonomy; the main dissatisfaction relates to the low financial return; there is a decrease in the quality of services offered to dental insurances patients and that there is a considerable lack of knowledge about SS and the regulatory agency. Despite all that, the dentists recognize that working for these companies tend to increase the patients flow, they share the concern to develop an ethical assistance and they consider that the sector's growth is good for the population. These results make it possible to have a better understanding when it comes to the conflicts between dentists and insurances companies, and they point to the need for a more direct intervention by the ANS.

(23)

23 Introdução

Diz a constituição brasileira¹ que “a saúde é direito de todos e dever do Estado” e que “as ações e serviços públicos de saúde integram uma rede regionalizada e hierarquizada e constituem um sistema único”. Estava, assim, no ano de 1988, criado o Sistema Único de Saúde (SUS), inserido em uma proposta de seguridade social universalista2.

Infelizmente, na prática, o SUS ainda não conseguiu consagrar o princípio da universalização dos serviços, fato este que mantém aberto o espaço para a compra e venda de serviços privados de saúde. No que diz respeito à saúde bucal, há dois movimentos concomitantes e aparentemente contraditórios neste contexto: a entrada da saúde bucal como prioridade nos serviços públicos e, simultaneamente, um vigoroso crescimento das operadoras de planos odontológicos, ou seja, uma expansão da odontologia dentro da Saúde Suplementar nos últimos anos (SS)3.

A SS é composta pelos serviços financiados por planos e seguros de saúde e, portanto, possui um financiamento privado, porém com subsídios diretos ou indiretos do Estado. Isto ocorre por meio de deduções e/ou isenções fiscais, quando, por exemplo, beneficiários de planos de saúde que têm seus gastos com o plano deduzidos no pagamento do imposto de renda. Ou seja, há um participação, direta ou indireta, do Estado no financiamento dos serviços privados de saúde no Brasil4.

Porém, o Estado não é tão somente corresponsável pelo aporte financeiro como é também o responsável pela regulação desse setor, através da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). Segundo Malta5, a ANS tem trabalhado em três principais perspectivas: a primeira com relação à análise da capacidade das operadoras de se estabelecerem no mercado, honrando com seus compromissos na prestação de serviços de assistência à saúde; a segunda com enfoque nos direitos dos consumidores (contratos e a relação de consumo),

(24)

24 sendo este o principal foco de fiscalização; e a terceira focaliza a questão dos produtos no que diz respeito a preços e composição de cobertura.

A agência representa, então, a intervenção do Estado nesse sistema, junto às leis que o regem, constituindo a macrorregulação. No entanto, existe um campo de atuação em que a ANS não interfere - o que engloba as relações entre as operadoras, os prestadores de serviço dos planos de saúde e seus beneficiários - relação esta conhecida como microrregulação5.

Segundo o caderno de informações da ANS6, nos últimos anos o número de beneficiários de planos privados de saúde vinculados a planos de assistência médica com ou sem cobertura odontológica cresceu amplamente, passando de 31 milhões em dezembro de 2000 para mais de 49 milhões em setembro de 2013. No segmento de planos exclusivamente odontológicos, este número que era de pouco mais de 2 milhões em 2000, chegou a 19 milhões de beneficiários em 2013.

Entretanto, apesar do potencial do mercado de trabalho em odontologia na saúde suplementar, nos dois últimos anos a agência reguladora vem sinalizando uma redução no crescimento do setor, acompanhando o desempenho da economia. Dados do último semestre de 2013 apontaram para um crescimento de apenas 0,5%, considerado o índice de crescimento mais baixo da história da odontologia na saúde suplementar7. Essa drástica queda estaria relacionada não só a estagnação da economia brasileira, mas também, segundo dados levantados pela ANS, ao enfrentamento dos prestadores e beneficiários frente aos abusos e ilegalidades cometidos pelas operadoras7.

Ainda assim, supõe-se que há espaço para o crescimento do setor. Algumas variáveis estruturais poderiam explicar essa dinâmica, dentre as quais se destacam a mudança no perfil profissional e da profissão odontológica, a dificuldade de acesso da população aos serviços públicos de saúde bucal e o baixo gasto das famílias com desembolso direto para a assistência odontológica8.

(25)

25 Estudos que exploraram o segmento odontológico na SS confirmam o que já se espera em termos de serviços privatizados: que apesar da responsabilidade sobre a saúde de uma parcela muito significativa da população, uma das principais preocupações das empresas do setor, se não a principal, é a sua própria “saúde financeira”9,10. As diferentes práticas de gestão de preços observadas evidenciam o processo de mercantilização da atenção à saúde, priorizando a lucratividade e não a qualificação dos serviços10.

Os profissionais vinculados a planos odontológicos têm se mostrado insatisfeitos em relação aos valores pagos pelos procedimentos cobertos e aos prazos de pagamento11, e relatam uma diminuição da autonomia no exercício da profissão, por conta das limitações determinadas pelas operadoras de planos de saúde12. Ao mesmo tempo, em termos de categoria profissional, os convênios estariam transformando o cirurgião-dentista – ex-profissional liberal - em prestador de serviço assalariado13, vulnerável às oscilações da oferta de emprego e renda14.

Essas insatisfações se materializam na forma de paralisações em nível nacional, organizadas por prestadores de serviços e beneficiários, contando com apoio de entidades profissionais (Conselho Federal de Odontologia e Associação Brasileira de Odontologia). Busca-se com estes movimentos principalmente a valorização do profissional, mas também a criação de um meio de comunicação entre CDs, beneficiários e operadoras15,16.

Diante deste contexto, o presente estudo buscou analisar alguns aspectos da regulação operativa no campo odontológico da SS, aprofundando-se na relação entre as operadoras e os prestadores de serviço, seus limites, conflitos e interdependências. Conhecer a opinião dos prestadores sobre os planos de saúde, sua aceitabilidade e vulnerabilidades é algo que se torna necessário para uma melhor compreensão da microrregulação do setor, permitindo repensá-lo e aperfeiçoá-lo.

(26)

26 Metodologia

Este estudo, exploratório com abordagem quantitativa, foi previamente aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos da Universidade Federal de Santa Catarina (n.717.483).

Foram convidados a participar os CDs que se declararam prestadores de serviços a pelo menos um convênio/plano de saúde no momento da pesquisa ou anteriormente. Atualmente existem 10.188 profissionais cadastrados no Conselho Regional de Odontologia no estado (CROSC)17. Não há dados agregados sobre quantos desses prestam ou prestaram serviços às operadoras de planos odontológicos, porém se poderia estimar cerca de metade deles, ao se tomar por base o estudo encomendado pelo Conselho Federal de Odontologia em 2003 que contabilizou 47,6% dos CDs da amostra trabalhando com convênios e credenciamentos18. O convite para participar da pesquisa foi encaminhado através do próprio CROSC para os 7.221 profissionais com e-mails cadastrados no órgão de classe. Contudo, apenas 157 profissionais participaram, mesmo após reiterado o convite via rede social. Atribuiu-se o baixo retorno a variáveis como: desatualização dos emails cadastrados, impossibilidade de evitar que emails fossem recebidos como spam e de mensurar até mesmo quantos não foram recebidos, bem como falta de interesse em participar e possíveis dificuldades no uso da ferramenta empregada (Google Drive) como instrumento de pesquisa.

A coleta de dados foi realizada através de questionário em meio eletrônico, pré-testado, composto por questões abertas e fechadas. As respostas das questões fechadas foram automaticamente tabuladas pela ferramenta eletrônica, enquanto que as respostas das perguntas abertas foram categorizadas de acordo com seus conteúdos. Os dados coletados foram então articulados aos estudos previamente publicados sobre a temática e analisados, sendo apresentados e discutidos a seguir.

(27)

27 Resultados e discussão

Caracterização dos participantes

A maioria dos participantes desta pesquisa foram homens (51,6%, 81), contrariando a realidade da odontologia brasileira exercida majoritariamente pelo sexo feminino. Diferentemente de países como Estados Unidos e outros do continente Europeu, no Brasil as mulheres são quase 60% dos profissionais em atuação19, mas nesta pesquisa, as mulheres compuseram 48,4% da amostra (76).

A maioria dos participantes (71,9%, 113) encontra-se na faixa etária de 30 a 40 anos (41,4%, 65) ou possuem entre 20 a 30 anos de idade (30,5%, 48), sendo que 53% (76) estão formados há menos de 10 anos. Segue a tendência, portanto, de que a maioria dos profissionais que atuam como prestadores de serviços junto a empresas de convênios e credenciamentos possuem menor tempo de formação, conforme anteriormente descrito12. No que diz respeito ao nível de formação, 62,4% (98) são especialistas, 7% (11) mestres e/ou doutores, 10% (15) ambos, e apenas 21% (33) são somente graduados. Tais dados parecem refletir o interesse dos profissionais em buscar aprimoramento no exercício da profissão, estando de acordo com o encontrado em outros estudos12,20,21.

Os participantes da presente pesquisa são todos atuantes ou já atuaram dentro desse mercado, sendo que 56% (88) são ou foram credenciados a planos odontológicos por mais de 5 anos, estando os demais (43,9%, 69) neste segmento do mercado de trabalho há menos de 5 anos. Segundo a ANS22, no Brasil, a modalidade que conta com o maior número de beneficiários desde o ano 2000 é a Odontologia de Grupo, seguida pela Cooperativa Odontológica. O mesmo acontece em Santa Catarina, onde a Odontologia de Grupo possui quase o dobro de beneficiários do que a Cooperativa Odontológica23. Distintamente, nesta pesquisa cerca de um terço da amostra (36,9%, 58) estão ou estavam credenciados na

(28)

28 modalidade Cooperativa Odontológica, outra terça parte (33,7%, 53) são ou foram credenciados a mais de um tipo de modalidade, e 12,7% (20) prestam ou prestavam serviços a Empresas de Odontologia de Grupo e a Operadoras Médicas que oferecem assistência odontológica. Os demais (16,5%, 26) não souberam informar, apesar da relevância deste conhecimento: cada tipo de operadora possui regulamentações específicas, podendo representar diferentes rotinas de trabalho aos prestadores e, portanto, gerar diferentes conflitos.

Quando questionados sobre a clientela, 57,9% (91) responderam atender majoritariamente pacientes particulares, 20,3% (32) afirmaram atender principalmente pacientes conveniados e 19,7% (31) mencionaram atender em proporções equivalentes. No que diz respeito à renda, 68% (108) afirmaram que os atendimentos efetuados através dos planos constituem no máximo 25% da renda total, enquanto 3,8% (6) afirmaram que o atendimento de pacientes conveniados é responsável por mais de 75% de sua renda. O que vem de encontro aos resultados obtidos na pesquisa encomendada pelo CFO, em 2003, na qual 57,9% da amostra relatou um percentual financeiro originado dos convênios de até 20%18.

Motivação para o credenciamento

Acerca da principal motivação para o credenciamento aos planos odontológicos, a maioria (76,4%, 120) respondeu visar aumento no fluxo de pacientes no consultório ou se tornar mais conhecidos pelos clientes, referendando o achado de Pietrobon24. De fato, os resultados desta pesquisa confirmam tal expectativa: após o credenciamento, a clientela particular de 51,5% (81) dos participantes não se alterou, mas 33,7% (53) relataram que a mesma aumentou. 7,6% (12) relataram diminuição da clientela e 7% (11) não sabiam informar. Resultado semelhante foi encontrado na pesquisa de D’Avila11, onde 43% dos

(29)

29 respondentes declararam não ter havido alteração na clientela particular e 35% declararam aumento.

Ainda sobre a principal motivação para o credenciamento, 12,7% (19) atribuíram à dificuldade de inserção no mercado de trabalho; 6,3% (10) objetivavam garantir um rendimento mensal ou pagar as despesas fixas do consultório; e 5% (8) indicaram outros motivos. A justificativa para credenciar-se aos planos odontológicos pela dificuldade de se inserir no mercado de trabalho também já havia sido observada em estudo24 no qual os entrevistados expuseram suas dificuldades diante da recente expansão do número de cursos de graduação em Odontologia, que levaram a uma multiplicação do número de profissionais se inserindo no mercado a cada ano. Aliado a isto, a queda no desembolso direto feito pelas famílias para o pagamento da assistência odontológica8 faz com que o cirurgião-dentista e especialmente o recém-formado veja os convênios como uma alternativa para a baixa rotatividade das clínicas, e como uma necessidade para sobrevivência no mercado de trabalho.

Influência na rotina profissional

Na busca por entender de que forma o credenciamento a planos odontológicos influencia a rotina de trabalho do cirurgião-dentista, elaborou-se uma questão aberta cujas informações foram categorizadas e são explicitadas na Tabela 1 (pelo fato de ilustrar uma questão aberta, a Tabela 1 contém valores na coluna “detalhamento” que representam o número de vezes em que um argumento foi mencionado por aqueles participantes que optaram por respondê-la).

(30)

30 Observa-se que o aumento do fluxo de pacientes, o principal motivo apontado para o credenciamento, acontece de fato, uma vez que os convênios trouxeram ao consultório dos prestadores um maior número de pacientes e foram responsáveis pela fidelização de outros, como se constatou através das seguintes respostas:

O fluxo e a procura são tão grandes que poderia ter outro colega comigo na sala trabalhando tranquilamente. (CD 125)

Em alguns casos, o paciente sai do convênio, mas se mantém fiel. (CD 106)

Como faço ortodontia, os planos normalmente não cobrem esse tipo de tratamento, então acabo ficando conhecida pelos pacientes conveniados e eles acabam tratando comigo quando necessitam de orto. (CD 127)

Dentre as inconveniências causadas pelos credenciamentos, a mais citada foi a perda de tempo com a burocracia, achado esse já observado também no estudo de Pietrobon24.

Os planos odontológicos requerem que o CD guarde um tempo diário ou semanal para preenchimento de burocracias decorrentes desses planos. (CD 119)

(31)

31

... preenchimento das guias dos convênios e consultas apenas para avaliações e ainda aguardar a aprovação das operadoras. (CD 53)

Demora do pagamento dos procedimentos, radiografias e/ou fotos para comprovar o procedimento. (CD 29)

As próprias operadoras reconhecem e admitem a existência desses trâmites burocráticos. Sabe-se que elas fazem inúmeras exigências aos prestadores a fim de supervisionar a qualidade de seus serviços, bem como verificar a legitimidade da necessidade dos procedimentos executados. Para isso, várias delas exigiam um número excessivo de radiografias, autorizações prévias para execução de tratamentos e preenchimento detalhado de fichas10. Contudo, a exigência de radiografias com finalidade exclusivamente administrativa foi vedada em 201025, sendo que as operadoras que persistem com essa práticas deveriam ser multadas.

A percepção de que os pacientes conveniados seriam mais difíceis e exigentes, mencionada 6 vezes nestes resultados, foi também relatada no estudo de Vilela12, mas de forma ainda mais expressiva: 57% dos profissionais relataram problemas relacionados a faltas, atrasos e reclamações quanto à cobertura dos procedimentos de assistência odontológica. No entanto, cabe um questionamento sobre essa interpretação, uma vez que de um modo em geral as pessoas estão mais conscientes dos seus direitos enquanto cidadãos, consumidores, pacientes, e portanto, exigindo mais dos profissionais. Há que se perguntar também se esse achado não seria indicativo da falta de conhecimento dos beneficiários quanto a cobertura dos planos contratados, uma vez que esses contratos nem sempre são suficientemente claros, e o consumidor buscaria obter diretamente com o profissional, tais informações.

(32)

32

Autonomia profissional

Acerca da autonomia profissional, estudos anteriores 10,11,12,24 já haviam verificado um grande controle imposto pelas empresas sobre o processo do trabalho odontológico, provocando mudanças substanciais que acabam por gerar certa frustração nos prestadores de serviços. Neste mesmo sentido, os resultados deste estudo mostram que, para grande parte da amostra, há perda de autonomia quanto ao planejamento e execução dos tratamentos, mesmo que parcialmente (Tabela 2). A maioria dos respondentes (60,9%) afirma que a operadora exige algum tipo de perícia, sendo que 29,2% (46) deles relatam a exigência de perícia inicial e final. Nesses casos, o profissional tem sua autonomia duplamente ferida, pois não há plena liberdade para elaborar o plano de tratamento, nem para executá-lo.

O grau de autonomia parece ser um pouco maior em relação à escolha de materiais para a realização dos procedimentos (66,2%) e medicamentos a serem receitados (92,3%), porém o credenciamento é usado como justificativa por alguns profissionais para a utilização de materiais de menor custo e qualidade, como será discutido mais adiante.

(33)

33 A autonomia deveria ser permitida ao profissional nos diversos momentos do atendimento, desde a seleção de procedimentos diagnósticos, terapêuticos, e ainda, no estabelecimento de honorários11. Infelizmente, estes resultados corroboram o encontrado por Neumann9, que também constatou que a maioria das operadoras faz uso de autorizações prévias e auditoria. Vale salientar que essas práticas podem interferir na tarefa cognitiva inerente ao exercício da sua profissão - a de diagnosticar, colocando em risco a autonomia no julgamento e na decisão do processo do trabalho10.

Satisfação na prestação dos serviços

Pode-se perceber que o grau de satisfação dos profissionais em ser credenciado aos planos odontológicos está diretamente relacionado à remuneração, em concordância com Pietrobon24. Dos participantes, 87,8% (138) afirmaram estar pouco satisfeitos ou insatisfeitos com o credenciamento, e a maioria (72,6%, 114) tem a baixa remuneração indicada como principal motivo de insatisfação. Um total de 73,8% (116) considera ainda, que os valores estabelecidos pelas operadoras para os procedimentos são excessivamente baixos (Tabela 3).

(34)

34 Ao se analisar o perfil dos que se declararam insatisfeitos ou pouco satisfeitos, pelo cruzamento dos dados, observou-se não haver predominância entre os sexos (50,7%, 70 - sexo masculino), mas sim de acordo com a idade, o tempo de formado e de credenciamento: 68,8% têm até 40 anos de idade, 79,5% estão formados a menos de 20 anos e 70,2% estão credenciados a menos de 10 anos.

Esse alto índice de insatisfação - principalmente entre os mais jovens no mercado, é preocupante, pois pode influenciar a qualidade do tratamento oferecido aos beneficiários. Tal realidade vem sendo denunciada na literatura 10,11,12,21,24, diante do que se pode afirmar ser um dos maiores conflitos no âmbito da microrregulação do segmento odontológico da SS.

Neumann10 constatou que as operadoras estão cientes da insatisfação financeira por parte dos prestadores, mas atribuem aos conflitos com a ANS (a macrorregulação) o não aumento nos valores das tabelas de procedimentos, afirmando que os custos relacionados à implementação das ações exigidas pela agência impossibilitariam o reajuste dos valores pagos. Contudo, sabe-se que o segmento odontológico da SS é um dos mais lucrativos e que o repasse dos valores arrecadados das mensalidades pagas pelos beneficiários para investimentos em assistência é menor que 50%8. Evidencia-se, então, o mercantilismo das operadoras, as quais mostram uma maior preocupação com sua própria saúde financeira do que com a qualidade dos serviços oferecidos aos beneficiários e as condições de trabalho e remuneração dos prestadores10.

Como os conflitos presentes nas relações entre CDs e operadoras se tratam majoritariamente de discussões de cunho financeiro, muitos sugerem a adoção da Classificação Brasileira Hierarquizada de Procedimentos Odontológicos (CBHPO) pelas operadoras como uma possível solução. Essa classificação foi criada em 2010 exatamente com intuito de servir como referência na reorientação de preços estabelecidos pelos

(35)

35 convênios10. No entanto, a adoção dessa classificação não parece condizer com a lógica econômica dessas empresas, que priorizam o lucro e a racionalização de custos.

Cabe comentar que se tornou explícita a necessidade dos participantes em reforçar suas insatisfações em todas as oportunidades possíveis no questionário (respostas abertas), mesmo daqueles que encontraram seu principal motivo de insatisfação elencado entre as alternativas oferecidas em resposta do tipo fechada. Por esta razão não há uma exata correspondência numérica entre os dados relacionados às variáveis da primeira questão mostrada na Tabela 3 e as duas questões subsequentes.

Coerentemente a isto, ao serem abordados sobre a intenção de se manterem credenciados, a maioria (76,4%) respondeu que pretende se descredenciar das empresas em algum momento, sendo que 52,2% (82) pretende fazê-lo em um futuro breve, e 24,2% (38) a médio ou longo prazo.

Dentre os 12% (19) dos respondentes que indicaram estar totalmente ou bastante satisfeitos, a maior parte justifica com o aumento do fluxo de pacientes, como discutido anteriormente. Entre os que assinalaram “outros” motivos para estarem satisfeitos, surgiram respostas como:

Não me trouxe custos adicionais, e ao mesmo tempo também não me atrapalham. Estou satisfeito com o meu relacionamento com a empresa de convênios. (CD 65)

Tenho a clientela atual em virtude do convênio. Hoje praticamente não atendo mais pacientes de convênio, mas a clientela que tenho surgiu em virtude do mesmo. (CD 4)

Qualidade do atendimento prestado

Recentemente, aconteceram paralisações dos cirurgiões-dentistas prestadores de serviços e dos beneficiários dos planos por eles convocados, em nível nacional, como parte de

(36)

36 uma estratégia de mobilização da categoria iniciada em 2011. Em suas reivindicações, pedem por uma maior valorização do trabalho do cirurgião-dentista e pela melhoria da qualidade dos serviços oferecidos aos pacientes15,16. Diante disso, os participantes foram questionados sobre a qualidade do atendimento ofertado aos beneficiários de planos (Tabela 4).

Quando questionados a esse respeito, a maioria (64,3%, 101), afirmou ser possível atender pacientes particulares e conveniados com a mesma qualidade, sem que sofram qualquer distinção por interferência da forma de pagamento pelos serviços prestados, em conformidade com os achados de Vilela12 e Pietrobon24.

No entanto, uma considerável parcela (35,6%, 56) relatou haver diferenças, sendo a mais comum delas a diferenciação de materiais ou técnica utilizada. Dentre aqueles que alegaram fazer essa diferenciação (22,2%, 35), alguns afirmaram utilizar resinas compostas de qualidade inferior ao atenderem pacientes de convênios, e outros, técnicas endodônticas simplificadas. Em segundo lugar, apareceu a diferenciação no tempo das consultas (19,1%, 30), com consultas mais curtas para os beneficiários de planos em comparação ao tempo dedicado em consultas de pacientes que pagam o atendimento via desembolso direto.

(37)

37 Independente da forma, esta diferenciação sempre apareceu justificada pela baixa remuneração oferecida pelas operadoras, como se pode ver nos seguintes relatos:

Para se ter rentabilidade com os planos de saúde, você é obrigado a aumentar a velocidade do atendimento, criar regras rígidas na execução dos procedimentos clínicos, atender mais pacientes por hora/dia/semana/mês o que te induz a uma diminuição no tempo de observação dos detalhes, aumentando o risco de insucesso nos tratamentos. (CD 72)

Qualidade no atendimento em si é igual para todos os pacientes, bem como técnicas utilizadas e a maioria dos materiais. A diferença é basicamente a qualidade de alguns materiais, como resinas, adesivos, anestésicos e alguns outros. (CD 119)

O tempo de atendimento não pode ser o mesmo. O número de consultas por mês também não. É humanamente impossível atender da mesma forma quem não valoriza o seu trabalho, apesar de o paciente não ter culpa disso. (CD 147)

Percebe-se, então, que a baixa remuneração do profissional tem, de fato, influência negativa no serviço recebido pelo beneficiário em alguns casos, ainda que a diferenciação do tratamento oferecido a pacientes conveniados e não conveniados consista inclusive em uma infração ética26. Porém, confirma-se nesse e em outros estudos11,12 que não só é possível, mas é mais frequente, oferecer aos pacientes conveniados e particulares o mesmo tratamento e atenção. Trata-se, portanto, de uma escolha muito particular, relacionada à ética de cada profissional.

Ainda neste âmbito, os participantes foram questionados sobre uma prática denominada pelas operadoras de “indução de demanda”. Trata-se de incluir no plano de tratamento ou no registro dos procedimentos realizados tratamentos desnecessários ou não realizados, a fim de se obter um maior retorno financeiro, uma vez que os prestadores são pagos por produtividade quantitativa27. Ao serem questionados sobre essa prática, a maioria dos participantes (78,3%,

(38)

38 123 relatou ja ter ouvido falar a respeito, e entre eles, 45,8% (72) acreditam ainda que seja algo frequente.

Diante disto, as operadoras criam mecanismos para evitar esse tipo de prática (como a exigência de perícias iniciais e finais) e investem em sistema de informações e auditorias presenciais27, o que muitas vezes acaba por interferir na autonomia profissional.

No que diz respeito à limitação de procedimentos, 53,5% (84) dos participantes afirmam que há limitações impostas pelas operadoras, enquanto 46,4% (73) negam a existência dessa prática. Dentre os procedimentos listados, os mais limitados são: procedimentos de prevenção (incluem raspagem, profilaxia, aplicação de flúor e instruções de higiene) - (25,4%, 40), procedimentos restauradores (14,6%, 23) e radiografias (6,3%, 10).

Conforme Neumann10 já afirmou, o modelo de atenção à saúde bucal ofertado pelos planos privilegia a assistência individual ao invés da coletiva, o tratamento e a reabilitação ao invés da prevenção. Esse fato foi corroborado nessa pesquisa, visto que entre os procedimentos mais frequentemente limitados pelos planos estão exatamente os que englobam alguma ação preventiva. Trata-se de um problema significativo, pois tal modelo não é efetivo em causar alterações no quadro epidemiológico das doenças bucais na população28. A agência reguladora promove incentivo à adoção de programas de promoção de saúde e prevenção de doenças no âmbito da SS, mas embora as operadoras as reconheçam como importantes, não se percebe ênfase na estruturação destes programas no segmento odontológico10.

Sabe-se que é intenção da ANS aproximar a SS das políticas públicas de saúde10, fazendo com que os modelos assistenciais preconizados pelo SUS sejam também norteadores das práticas no setor de planos privados. No entanto, as operadoras odontológicas não vislumbram no SUS um modelo que possa ser reproduzido na SS, nem tampouco entendem a importância da construção de um modelo de atenção em saúde bucal que priorize a qualidade

(39)

39 dos serviços ofertados aos beneficiários. Desta forma, as operadoras acabam por atribuir quase que exclusivamente aos prestadores de serviço a responsabilidade pela qualidade da atenção à saúde bucal dos beneficiários. Evidencia-se, então, a importância ANS induzir o modelo de atenção à saúde com vistas à integralidade, aperfeiçoando desta forma o setor de SS10.

Expectativas para a saúde bucal

As expectativas dos cirurgiões-dentistas diante do elevado crescimento do segmento odontológico da SS podem ser observadas na Tabela 5.

Os resultados evidenciaram uma contradição entre as projeções dos profissionais no que diz respeito às consequências do crescimento da saúde bucal na SS para o exercício da profissão e para os beneficiários dos planos: a maioria (70,7%, 111) afirma que para o cirurgião-dentista esse crescimento repercute negativamente, enquanto que para os beneficiários repercute de forma parcialmente ou totalmente positiva (64,3%, 101).

Quanto às perspectivas para os beneficiários, as respostas vão de encontro ao trabalho de Pietrobon24, no qual os sujeitos também consideram positivo o crescimento do setor para a população. Já com relação à projeção negativa vislumbrada para o exercício da profissão odontológica neste trabalho, supõe-se que seja resultante da dificuldade de relacionamento e

Referências

Documentos relacionados

As pontas de contato retas e retificadas em paralelo ajustam o micrômetro mais rápida e precisamente do que as pontas de contato esféricas encontradas em micrômetros disponíveis

- os termos contratuais do ativo financeiro dão origem, em datas específicas, aos fluxos de caixa que são apenas pagamentos de principal e de juros sobre o valor principal em

n Colocação em funcionamento com dispositivos de segurança e de proteção que não funcionem corretamente, tais como, por exemplo, o aparelho de alerta de gás, a luz intermitente,

a) Aplicação das provas objetivas. b) Divulgação dos gabaritos oficiais do Concurso Público. c) Listas de resultados do Concurso Público. Os recursos interpostos que não se

DATA: 17/out PERÍODO: MATUTINO ( ) VESPERTINO ( X ) NOTURNO ( ) LOCAL: Bloco XXIB - sala 11. Horário Nº Trabalho Título do trabalho

O pressuposto teórico à desconstrução da paisagem, no caso da cidade de Altinópolis, define que os exemplares para essa análise, quer sejam eles materiais e/ou imateriais,

Os roedores (Rattus norvergicus, Rattus rattus e Mus musculus) são os principais responsáveis pela contaminação do ambiente por leptospiras, pois são portadores

Este desafio nos exige uma nova postura frente às questões ambientais, significa tomar o meio ambiente como problema pedagógico, como práxis unificadora que favoreça