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Paradigmas de saúde e a relação com a atuação do profissional de Educação Física na perspectiva de mulheres do município de Bozano/RS

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UNIJUÍ – UNIVERSIDADE REGIONAL DO NOROESTE DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

DHE – DEPARTAMENTO DE HUMANIDADES E EDUCAÇÃO CURSO DE EDUCAÇÃO FÍSICA

PARADIGMAS DE SAÚDE E A RELAÇÃO COM A ATUAÇÃO DO

PROFISSIONAL DE EDUCAÇÃO FÍSICA NA PERSPECTIVA DE

MULHERES DO MUNICÍPIO DE BOZANO/RS

RENAN FELIPE RASIA

Ijuí/RS Dezembro/2017

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RENAN FELIPE RASIA

PARADIGMAS DE SAÚDE E A RELAÇÃO COM A ATUAÇÃO DO

PROFISSIONAL DE EDUCAÇÃO FÍSICA NA PERSPECTIVA DE

MULHERES DO MUNICÍPIO DE BOZANO/RS

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Educação Física, Departamento de Humanidades e Educação da Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul, como requisito parcial para a obtenção do título de bacharel em Educação Física Orientador: Prof. Ms. Mauro Bertollo

Ijuí/RS Dezembro/2017

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A Banca Examinadora abaixo assinada aprova o Trabalho de Conclusão de Curso:

PARADIGMAS DE SAÚDE E A RELAÇÃO COM A ATUAÇÃO DO

PROFISSIONAL DE EDUCAÇÃO FÍSICA NA PERSPECTIVA DE

MULHERES DO MUNICÍPIO DE BOZANO/RS

Elaborado por RENAN FELIPE RASIA

Como requisito parcial para obtenção do título de Bacharel em Educação Física. Ijuí (RS), 14 de dezembro de 2017.

Banca Examinadora:

_______________________________________________________ Professor Me. Mauro Bertollo (Orientador)

_______________________________________________________ Professor Dr. Paulo Carlan (Examinador Titular)

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RESUMO

Ao longo dos anos as maneiras de enxergar a saúde foram se modificando através de seus paradigmas. Desta forma, este estudo busca através de uma pesquisa qualitativa identificar a relação da Educação Física com os paradigmas de saúde. Também, procura entender melhor qual o papel do profissional de Educação Física frente aos modelos biomédico e biopsicossocial, como forma de atuação e na busca de credibilidade com a população pesquisada. Os resultados permitem fazer uma reflexão sobre o modo de atuação dos profissionais de Educação Física, e ainda, percebe-se indícios do porque a participação da Educação Física na saúde possui pouca credibilidade e é restrita na maioria das vezes apenas à exercícios físicos, enquanto o tema que norteia a Educação Física é o movimento humano e a cultura corporal de movimento. Ainda, apresenta sugestões de formas mais globais de atuação, com práticas corporais pensadas para a saúde coletiva, pois existe demanda para a área da Educação Física na saúde da população como um todo e muitas vezes nos boicotamos pensando apenas em academia onde é apenas uma parcela da população que frequenta. Dessa forma, muitas vezes associa-se a Educação Física com a musculação, e esquecemos que a ela é muito mais ampla, e que a musculação é apenas uma parcela da cultura corporal de movimento. Palavras-Chave: Biopsicossocial; Educação Física; Saúde.

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SUMÁRIO

1INTRODUÇÃO...6

2 A EDUCAÇÃO FÍSICA E A RELAÇÃO COM A SAÚDE E SEUS PARADIGMAS...8

2.1 Os paradigmas de saúde: uma revisão do conceito de saúde ao longo dos anos...8

2.2 Como promover saúde se o foco ainda é curar doença?...11

2.3 A Educação Física e a relação com a saúde coletiva: pensando a graduação e a atuação...17

3 PROCESSO METODOLÓGICO...20

4 ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DOS RESULTADOS...21

4.1 Conceituando a saúde e percebendo-se como uma pessoa saudável...21

4.2 Promover, evitar, curar: verbos que o profissional precisa decifrar para atuar...23

4.3 Como olhar a saúde de forma biopsicossocial se ainda usamos as lentes biomédicas...26

4.4 Educação Física: área de conhecimento reduzida a academias e jogar bola...28

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS...33

REFERÊNCIAS...34

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1 INTRODUÇÃO

Ao longo dos anos os paradigmas de saúde vêm se modificando. Farinatti e Ferreira (2006) fazem uma retrospectiva desde o tempo onde acreditava-se que a doença era um castigo divino para os pecadores, então a cura se dava através de orações, até o paradigma biomédico, onde acredita-se que a saúde é a ausência de doença.

Esse último paradigma tratado pelos autores é o que está mais fortemente na cultura das pessoas, principalmente em pessoas de municípios pequenos e de interior onde as informações tendem a ter uma certa dificuldade de chegar. Em 1986 surgiu a Carta de Otawwa, que foi uma conferência internacional sobre Promoção da Saúde, e desde então, criou-se um novo paradigma, tentando sai um pouco da ausência de doenças e vendo a saúde como algo muito mais amplo.

Segundo a carta de Otawwa (1986) a promoção da saúde tem 5 pontos de ação. O primeiro seria a implementação de políticas públicas saudáveis, o segundo ponto seria a criação de ambientes saudáveis, o terceiro ponto seria a capacitação da comunidade, o quarto seria o desenvolvimento de habilidades individuais e coletivas e o último ponto de ação em relação a promover saúde seria reorientação dos serviços de saúde. A partir dessa carta e suas recomendações, buscou-se um novo modo de ver, agir, pensar e educar com relação a saúde, tanto que a OMS define ser saudável como: [...] “um estado de completo bem-estar físico, mental e social, e não consiste apenas na ausência de doença ou de enfermidade (WHO, 1947, p. 1).”[...]

Com esse novo paradigma e forma de pensar a saúde, o trabalho aborda os paradigmas e papel do educador físico na área da saúde. A pesquisa tem o intuito de identificar em uma determinada população o seu conhecimento sobre o tema de saúde. Fazendo uma relação a partir daí com a atuação do profissional da Educação Física nessa nova perspectiva, promoção de saúde, tendo em vista que esta área é reconhecida como participante do grupo de profissionais que atuam na saúde da população.

Essa pesquisa busca discutir e compreender o papel do educador físico e a sua importância nos aspectos do que é ser saudável atuando junto a população com medidas e educação em saúde. Procura entender melhor quais ferramentas de intervenção o profissional da Educação Física pode utilizar na hora de promover saúde, levando em conta o conhecimento da população sobre o assunto e as sugestões da carta de Otawwa.

A pesquisa tem como objetivo investigar a população do município de Bozano, situado na região noroeste do estado do Rio Grande do Sul, para tentar identificar aspectos relacionados

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com a atuação do profissional de Educação Física e relacionar com os paradigmas de saúde. A pesquisa busca ainda entender melhor como a população do município visualiza a saúde e a importância do educador físico na área da saúde pública.

A justificativa do tema se dá pela atuação do educador físico na saúde pública ser frágil ainda. Nesse sentido Fraga (2007) pensa que a necessidade do educador físico na área da saúde, tanto no campo de prevenção de doenças crônicas e agudas, como na recuperação terapêutica, ou na promoção da saúde, cada vez mais aumenta, porém este crescimento não é sinônimo de incorporação de profissionais a demanda no Sistema Único de Saúde (SUS).

O mesmo autor ainda deixa claro que o profissional da Educação Física, principalmente o bacharel que é voltado para atuar na saúde, pode ser um membro da equipe tal como é o médico, o enfermeiro, o fisioterapeuta, o nutricionista etc. (ibidem). O paradigma biopsicossocial mostra muito isso, de que a saúde pública é dever também do educador físico. A escolha desse tema foi para mostrar que a Educação Física é muito maior que apenas series e repetições, hipertrofia, emagrecimento. Isso, tendo em vista que o educador físico possui uma importância na saúde das pessoas como tem o enfermeiro, fisioterapeuta, nutricionista e demais profissionais da saúde.

Porém, os leigos fazem relação de que o bacharel de educação física é um profissional para atuar apenas em academias, prescrevendo exercícios, números de repetições e séries.

Esta pesquisa traz a discussão sobre a atuação dos profissionais de Educação Física. Através da fala de autores que tratam desse tema e de pessoas que convivem diretamente através de práticas com profissionais de Educação Física e pessoas que não convivem ou que não tem interferência de um profissional da área, foi feito uma relação sobre a importância do educador físico na saúde da população.

Foi realizada uma entrevista semiestruturada com o intuito de tirar o máximo de informações dos participantes acerca do tema. Apenas mulheres participaram da pesquisa e foram escolhidas de forma aleatória.

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2 A EDUCAÇÃO FÍSICA E A RELAÇÃO COM A SAÚDE E SEUS PARADIGMAS

Ao longo dos anos o conceito de saúde foi se modificando. Com isso a atuação e a forma de olhar o tema seguiu essa mesma lógica. No entanto, o campo da Educação Física poderia ter maior número de trabalhos científicos quando se fala em promoção de saúde. Deste modo, este estudo traz em seu referencial teórico a relação da área com a saúde, passando desde uma revisão dos conceitos sobre o tema ao longo dos anos. No segundo tópico aborda sobre alternativas trazidas por alguns autores de como atuar no paradigma biopsicossocial. No último tópico mostra uma análise da relação da Educação Física com a saúde coletiva, pensando e discutindo desde a graduação até a atuação do profissional.

2.1 Os paradigmas de saúde: uma revisão do conceito de saúde ao longo dos anos

No (SUS) existe um trabalho multidisciplinar dos profissionais que lá atuam em prol da saúde da população e visando recuperar e promover saúde. O educador físico possui espaço no SUS? Qual seria a função do educador físico na saúde da população? Qual educação em saúde o educador físico pode proporcionar?

Algumas unidades básicas de saúde possuem um profissional de Educação Física atuando junto à população. Ao atuar na área da saúde o educador físico pode seguir algumas linhas de trabalho. A população é muito diversificada, tanto no aspecto socioeconômico, quanto de gênero e idade, pois o SUS- Sistema Único de Saúde é uma política pública, então qualquer cidadão pode e deve utiliza-lo, o que pode dificultar ao educador físico querer seguir apenas uma linha de trabalho.

Para falar dessas linhas de trabalho que o educador físico pode atuar, é preciso entender os paradigmas de saúde que aparecem ao longo do tempo. Segundo Farinatti, Ferreira (2006), na época de Descartes surge o primeiro paradigma de saúde, cada povo detinha um pensamento acerca da mesma. Sagan (1987) apud Farinatti, Ferreira (2006) relata e define que as teorias da saúde desses povos devem ser agrupadas em duas categorias: as que têm a centralidade nos fatores comportamentais e as que têm enfoque nos fatores do ambiente.

Os povos mais antigos tinham a superstição como a forma de explicar tudo que acontecia com eles. Eles atribuíam fenômenos naturais tais como terremotos, tempestades, trovões e outros aspectos de origem natural como (GARRISSON, 1966 apud FARRINATI, FERREIRA, 2006) relata que os ventos, as nuvens, os terremotos, as tempestades, os espetáculos e os sons da natureza eram sinais exteriores e visíveis de deuses malignos

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demônios, espíritos e outros agentes sobrenaturais. Essa teoria era usada para explicar os aspectos relacionados à saúde, ou melhor, dizendo, a falta dela.

Garrison (apud FARINATTI, FERREIRA, 2006) fala que em uma associação de ideias, o homem primitivo começou a considerar a doença como uma punição imposta pelos deuses dotados de poderes sobrenaturais. Para curar os doentes, Meira (1976) apud Farinatti, Ferreira (2006) diz que rezavam e faziam sacrifícios aos Deuses para obtenção de saúde.

Com o passar dos tempos, com novas sociedades se constituindo o paradigma de saúde foi se modificando. As sociedades pré-cristãs, como egípcios, hebreus e gregos, por exemplo, pensavam já em termos físicos relacionados a saúde. Para eles a condição física era o que determinava os níveis de saúde, ou seja, quanto mais bem condicionado fisicamente mais saúde se possuía. Apesar do elemento religioso ser muito importante ainda, acreditava-se que as enfermidades da época teriam alguma relação com os hábitos e com a higiene pessoal (FARINATTI, FERREIRA, 2006).

Farinatti e Ferreira (2006) relatam que por volta do ano de 400 a.C. Hipócrates começa a relatar os impactos do meio ambiente na saúde das pessoas. Ele reconhece que as influencias geográficas encontram-se na origem da propagação da doença (FARINATTI, FERREIRA, 2006). A condição de saneamento básico das cidades era analisada a partir da sua localização, descrevendo as doenças e epidemias características de cada região e clima (BABINI, 1985 apud FARINATTI, FERREIRA, 2006).

Para marcar o avanço da medicina criou-se o método quantitativo, que era basicamente estudos epidemiológicos estatísticos. Este método combinava informações e cálculos matemáticos para explicar os fenômenos relacionados à saúde. Petty uniu sob a noção de quantificação, o que se estuda hoje em economia, epidemiologia e ciências da política, ele e outros estudiosos como Willian Heberden (1710-1801), Thomas Short (1960-1772), Lambert Quetelet (1796-1874) e Louis Villermé (1782-1863) mostraram em seus estudos o quanto o meio ambiente interfere sobre a saúde e a longevidade da população (FARINATTI, FERREIRA, 2006). Os métodos usados por esses estudiosos combinavam a observação direta, as estatísticas e a preposição de mudanças tendo como base os resultados obtidos. Esse método ainda é utilizado atualmente para explicar epidemias e doenças de determinadas regiões. (FARINATTI, FERREIRA 2006)

A visão sanitarista por sua vez, vem para orientar as medidas em saúde até o final do século XIX (FARINATTI, FERREIRA, 2006). Percebia-se que as condições de saneamento básico eram altamente ligadas às enfermidades. Duas teorias sustentavam essa ligação: a teoria do miasma e a teoria do contágio. Definia-se miasma como uma condição atmosférica que vinha

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muito provavelmente das matérias em decomposição e putrefação e que estaria por trás das infecções (WILCOKS, 1965 apud FARINATTI e FERREIRA, 2006). Após a visão sanitarista surge o paradigma biomédico, que ainda associava as doenças com as baixas condições sanitárias, mas sua maior característica é tratar da saúde como apenas a ausência de doença. Quando se fala em saúde de uma visão biomédica veremos que uma pessoa saudável será aquela livre de enfermidades, ou seja, a centralidade do conceito de saúde é o próprio individuo, posteriormente o ambiente e as condições de saúde (FARINATTI e FERREIRA, 2006).

Após o paradigma biomédico de centralidade apenas no individuo surge o paradigma biopsicossocial. White (1991 apud FARINATTI e FERREIRA, 2006, p. 36), explica de forma brilhante o anseio por uma nova perspectiva de saúde:

[...] a própria noção de medicina tendia a distanciar-se da de saúde pública. Uma espécie de cisma instituía-se paulatinamente; as faculdades de medicina e seus estudantes interessavam-se cada vez menos por uma saúde construída em uma perspectiva coletiva. Os médicos eram formados para estudar e curar doenças com base em diagnósticos estabelecidos em laboratório.

Como no paradigma biomédico, o indivíduo era apenas o centro das atenções, surge o biopsicossocial para pensar em cuidar de todos, ou seja, pensar a saúde como algo muito além de apenas não ter doença, olhar a saúde com uma visão preventiva e de promover saúde do que apenas ser curativa. Franklin P. Mall apud Farinatti, Ferreira (2006) diz que é preciso que as pesquisas médicas evoluam do estudo das doenças para o estudo da saúde. Já Ryle (1948) apud Farinatti, Ferreira (2006) ressalta que ainda que houve um avanço na medicina, ela perdeu a sintonia com algumas necessidades humanas fundamentais, algumas mais profundas, tanto do indivíduo, quanto da comunidade.

Farinatti e Ferreira (2006) relatam que pensar a saúde como um todo e não somente como ausência de doenças foi desafio de alguns estudiosos. Max vonPettenkorfer (1818-1901) foi um dos promissores a evidenciar que o desenvolvimento de uma doença era oriundo de 4 fatores: um microrganismo especifico; as condições ambientais; as condições climáticas e por último, mas não menos importante, as condições individuais propicias (FARINATTI e FERREIRA, 2006).

Farinatti e Ferreira (2006) diz que após este estudo de vonPettenkorfer, abriu-se os olhos para uma nova perspectiva em saúde. Começou a dar-se valor para outras condições que antes eram despercebidas pelo paradigma biomédico, como por exemplo, os fatores ambientais e as condições do clima.

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À medida que passou a olhar a saúde com os óculos do paradigma biopsicossocial começou a enxergar-se que era necessário promover saúde para a população, e não somente pensar em curar as doenças. Nesse sentido foram criados documentos muito importantes que marcaram essa passagem das políticas públicas de saúde a ser voltada para a promoção. A canadianLalondeReport foi o primeiro documento de política pública que tinha objetivos de promoção da saúde para a população canadense.

[...] o governo do Canada propõe-se a dar à biologia humana, à ecologia e aos modos de vida a mesma atenção que [...] à organização do sistema de serviços de saúde, de forma que as quatro vias de promoção da saúde sejam contempladas com o mesmo vigor” (WHITE, 1991, p.145 apud FARINATTI e FERREIRA, 2006).

No Brasil, a carta brasileira de saúde, confeccionada no ano de 1987, durante a VIII Conferência Nacional de Saúde, assumiu que a saúde era dependente de fatores múltiplos, como renda, educação, alimentação, lazer, condições de trabalho e acesso aos serviços públicos e privados de saúde (BRASIL, 1987 apud FARINATTI e FERREIRA, 2006).

2.2 Como promover saúde se o foco ainda é curar doença?

Os profissionais que atuam na área da saúde têm papel fundamental na promoção da saúde da população. O direito à saúde é dever do Estado, garantindo um conjunto de políticas sociais, econômicas, que vai desde a criação do Sistema Único de Saúde (SUS), que é universal, público, participativo e integral (GOMES, FRAGA, CARVALHO, 2015). O SUS é a maior ferramenta criada pelo poder público para a melhoria da saúde, porém existem algumas deficiências dentro do SUS e uma delas é citada no artigo: Políticas Públicas de Saúde no Brasil: SUS pactos de saúde; Denizi Oliveira Reis, Eliane Cardoso de Araújo e Luiz Carlos de Oliveira Cecilio.

Os autores relatam que existe uma deficiência muito grande na formação dos profissionais da saúde, ainda se encontra muito centrada na cura e práticas hospitalares, o que gera uma dificuldade de desenvolver práticas mais integrais e que visem o cuidado, incluindo a capacidade de trabalhar em equipe, criando e pondo em prática atividades de promoção e prevenção com relação à saúde, tendo também uma postura mais ética e que pense mais nos usuários do SUS. (REIS, ARAÚJO, CECILIO, 2006)

Como é apontado esse fato, a formação profissional dos profissionais da área da saúde ainda é muito biomédica, tendo o pensamento apenas em curar as doenças e preveni-las de

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forma individual. Quando se fala em profissionais da área da saúde inclui-se o educador físico, que atua na área da saúde com atividades físicas visando evitar doenças crônicas não transmissíveis.

Carvalho (2016) ressalta que o exercício físico não pode ser as única alternativa na atenção básica de saúde quando o objetivo é prevenir doenças crônicas não transmissíveis, claro, sem desconsiderar que ele possui importância, mas que evitar as DCNTs não são objetivos que resumem as práticas corporais e atividade física, ou seja, elas podem e devem ter outras funções dentro da atenção básica de saúde. Essa visão do autor está relacionada ao modo biopsicossocial de enxergar saúde, mas ainda os profissionais da área, principalmente educadores físicos estão apenas com o modelo biomédico em suas prescrições.

Carvalho (2016) comenta que é necessário criar um debate sobre práticas corporais e exercício físico para que possamos pensar além da prevenção das doenças não transmissíveis, pois em sua maioria, apenas os efeitos biológicos benéficos são propagados, o que faz o exercício físico como protagonista numa visão mais restrita relacionadas aos benefícios.

“Uma definição pode não restringir ou impedir que existam diversos sentidos para um conceito, isso é relevante ao tratar os termos/conceitos práticas corporais e atividade física, já que há, na literatura, em especial na que aproxima a Educação Física das Ciências Sociais e da Saúde Coletiva, um importante embate de forças” (CARVALHO, 2016, p. 649).

Muitas vezes os profissionais, principalmente da Educação Física se prendem ao conceito de exercício físico e esquecem que fazem parte de um âmbito maior, que engloba questões sociais, além de biológicas. Bouchard et al. (1990) apud Farinatti, Ferreira (2006) relata que cada vez mais cresce os indícios de que aspectos socioculturais, econômicos e ecológicos têm uma significativa importância para a saúde como o biológico, e que a doença é consequência de um estilo de vida numa totalidade. Reforça-se a importância de o educador físico ter uma visão ampliada sobre os conceitos de saúde, e também de não fixar seu enfoque apenas em exercício físico para melhorar a saúde da população.

Reforçando a ideia, a OMS diz que saúde é bem-estar físico, mental, social e não somente a ausência de doenças. Como se percebe na definição de saúde, é preciso pensar além do biológico, as Diretrizes do ACSM (2014) para os testes de esforço e sua prescrição conceitua que o exercício é um tipo de atividade física que consiste em movimentos corporais planejados, estruturados e repetitivos e com o intuito de melhorar ou então manter um ou mais componentes da aptidão física. Se pensarmos a saúde através do exercício físico estaremos apenas pensando

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no biológico, ou seja, teremos como objetivo apenas o gasto energético e movimentos determinados para que a taxa metabólica basal seja elevada e com isso evita-se algumas doenças. As práticas corporais são “[...] expressões individuais ou coletivas do movimento corporal, advindo do conhecimento e da experiência em torno do jogo, da dança, do esporte, da luta, da ginástica [...]” (BRASIL, GTPS, 2012a, p. 28 apud CARVALHO, 2016).

Nesse sentido, relacionando práticas corporais com a definição de saúde, pode-se perceber que encaixa mais que exercício físico, pois nas práticas corporais o sujeito é submetido a experiências prazerosas para ele, pois o indivíduo irá optar por uma prática que lhe é familiar e que traz prazer em praticar, esquece a ideia de simplesmente fazer algo para ter um gasto energético e faz algo que lhe proporciona gasto energético e sensação de bem estar, o que aproxima bastante sobre a definição de saúde.

As práticas corporais também podem ser entendidas como: “um conjunto de práticas sociais com envolvimento essencialmente motor, realizadas fora das obrigações laborais (profissional ou voluntária), domésticas, higiênicas, religiosas, realizadas com propósitos específicos, não instrumentais” (GONZÁLEZ, 2015, p. 137 apud GOMES, FRAGA, CARVALHO, 2015). O autor ainda destaca três pontos fundamentais para uma prática corporal: a primeira fala que o movimento corporal é essencial para ser uma, a segunda relata que é necessário ter uma organização interna assegurada por uma lógica específica e a terceira é que tem que ser atividades culturais ligadas ao lazer, entretenimento, com fim de cuidar do corpo ou não (ibidem).

Um exemplo é o indivíduo que não gosta de forma alguma de musculação, mas pratica, pois, se tem a cultura que a academia é sinônima de saúde, e ele gosta de dançar, mas não dança porque não tem benefício a saúde quanto à musculação numa visão cultural. A dança iria lhe trazer muito mais benefícios que a musculação, pois está atrelada a sensação de bem-estar, de convívio social e também gasto energético, o que fará muito bem para a saúde daquele individuo, mas por uma questão cultural ele prefere a musculação mesmo odiando ir à academia e o ambiente dela.

Carvalho (2016) destaca que as práticas corporais trazem grandes benefícios comprovados em literaturas, tais como: maior inserção e interação social, trazendo relações socioafetivas, gerando também uma maior autoestima e um menor nível de depressão e ansiedade; prevenção de doenças não transmissíveis, tais como osteoporose, diminuição ou até mesmo a cessação de dores crônicas, ou seja, atua melhorando o biológico do indivíduo; e também melhorando a memória, atuando diretamente no cognitivo. Como o autor destaca, as práticas corporais atuam em vários fatores do indivíduo, contempla ele como um todo, e não

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somente como um ser biológico, melhorando o cognitivo do indivíduo, o biológico e principalmente os aspectos socioafetivos, que muitas vezes são desconsiderados pelos profissionais que atuam junto as unidades básicas de saúde e que é um dos fatores determinantes na saúde do indivíduo.

Pode-se pensar então que as práticas corporais são a solução para tudo, porém é errado pensar desta forma. As práticas corporais são excelentes aliadas do profissional de Educação Física para a promoção da saúde da população, assim como o exercício físico. O que está entrelaçado às práticas corporais é a forma biopsicossocial de ver a saúde. “[...] a saúde integra relações complexas, cuja compreensão exige mais do que podem oferecer as ciências biológicas” (FARINATTI e FERREIRA, 2006, p. 68). Os autores nos mostram que devemos pensar o indivíduo além do biológico, precisamos entender e compreender os sujeitos que estamos trabalhando e ter relações sociais com eles para promovermos a melhor saúde para ele.

Segre e Ferraz (1997) apud Pereira et al. (2009) acredita que o conceito de autonomia, entende-se na qualidade de vida como algo individual, algo intrínseco, sendo possível de ser avaliado somente pelo próprio sujeito, o que torna difícil afirmar claramente se é boa ou má qualidade pois a realidade de vida é de cada um. Então é muito individual a sensação de bem-estar, por isso é possível optar pelas práticas corporais para contemplar os indivíduos e proporcioná-los saúde.

“Seria um erro entendermos que para promover a saúde das pessoas, estaríamos necessariamente tentando prevenir suas doenças ou que a presença destas denotaria a falha de nossas tentativas de promover a saúde” (DA ROS, VIEIRA, CUTULO, 2005, p. 113). Essa citação reforça a ideia de que pensar apenas no biológico na tentativa de promover saúde é errada, com isso tomando por base aulas de grupos, é necessário desenvolver práticas que irão trazer sensação de bem-estar, ou seja, utilizar de ferramentas que irão muito além do biológico, como por exemplo, a maneira de dar aula, motivando e alegrando os alunos.

Ter uma vida saudável é bem mais que ter um corpo saudável. Limitar vida saudável ao sinônimo de corpo saudável é acreditar que saúde é a ausência da doença (DA ROS, VIEIRA, CUTULO, 2005), e que no âmbito da promoção da saúde pode-se considerar errado pensar dessa forma, pois o foco do profissional não deve ser apenas o biológico, mas sim tudo que constitui aquele indivíduo, desde seu corpo, passando pela sua mente, seus aspectos sociais, e tudo que constitui esse ser, ou seja, é necessário olhar para os marcadores sociais que constituem esse indivíduo tais como idade, sexo, ocupação, raça, renda familiar, escolaridade, estado civil, religiosidade, personalidade, por exemplo, que são altamente importantes e que

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irão influenciar de forma muito significativa na hora de promover saúde, tendo como base um modelo biopsicossocial de encarar saúde.

Fazendo um questionamento sobre os aspectos que nos levam a saúde, tendo um olhar profissional, como educadores físicos, podem pensar que somos propriamente educadores e não somente profissionais preventivos. Nessa linha é necessário pensar além do corpo e como ele funciona, mas traçar estratégias para atuarmos diretamente na educação da saúde da população, principalmente os que frequentam a saúde básica, dessa forma é necessário refletir, por exemplo: “Será que a saúde, o bem-estar ou a felicidade está no fato de nos tornarmos ativos e exercitados, ou no contexto em que isto se dá?” (DA ROS, 2005, p. 114).

O foco da saúde e do bem-estar proporcionado pela atividade física, pelo exercício ou pela prática corporal não precisa estar necessariamente no quanto de condicionamento o indivíduo irá ganhar se correr 30 minutos a 60 por cento dos seus batimentos cardíacos máximos, mas sim, no contexto dessa corrida, ou seja, com qual prazer ele fará esta prática, qual local, com quem, com música ou sem, enfim, vários aspectos que certamente irão influenciar no bem-estar desse indivíduo que irá correr.

Ao meu ver, um indivíduo que joga futebol duas vezes na semana, está fazendo sua atividade física e se pensarmos de uma forma preventiva ele estará fazendo certo. Porém este mesmo individuo sai do jogo e come um churrasco com bastante sal e bebe cerveja com os amigos. Ao analisarmos essa situação hipotética, porém muito verídica, podemos pensar que o exercício não fará diferença nenhuma, pois o consumo excessivo de sal segundo a Organização Mundial da Saúde causa hipertensão e o consumo de bebida alcoólica pode causar problemas ao corpo biológico, desde reumatismo até cirrose. Ao analisarmos dessa forma, logo vamos mandar que este individuo pare com o consumo da bebida alcoólica pós jogo e que não coma muita carne vermelha com sal. Estaremos agindo de forma biomédica.

Seguindo essa situação hipotética, podemos analisar ela totalmente diferente, e mais correta, de ver todo contexto e entender o porquê esse indivíduo consome bebida alcoólica após o jogo e come carne vermelha com bastante sódio. Se olharmos essa situação com os olhos biopsicossociais veremos que a cerveja e o churrasco pós jogo é tão ou mais importante para o indivíduo quanto o exercício (no caso o futebol), pois a cerveja e o churrasco compartilhado com os amigos trarão a este individuo certamente bem estar, e logo a saúde, isto para este individuo é altamente saudável.

Porém, este individuo estará sim fazendo mal ao seu corpo biológico, então ele pode ser orientado e educado a tentar melhorar isso. Cabe ao profissional traçar uma forma de melhorar isso, seja orientando, seja conversando, mas jamais proibindo esse indivíduo de jogar

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seu futebol, beber sua cerveja e comer o churrasco com seus amigos, pois para ele isto é saúde sim, o saudável não está no biológico, mas sim no contexto todo que cerca o indivíduo e cada um possui um modelo de vida saudável, cabe aos profissionais orientar e promover a saúde dentro da subjetividade de cada indivíduo.

Quando pararmos de pensar apenas nos aspectos biológicos dos indivíduos e no que está na superfície do que se entende por saúde, quando finalmente mergulharmos de cabeça até o fundo para entender o real sentido de saúde, focarmos nos aspectos totais do indivíduo como saúde física, convívio social, questões econômicas, saúde mental, relações interpessoais e tudo mais que compõem um indivíduo, somente assim vamos estar mais pertos do que realmente queremos, que é contribuir ao bem estar das pessoas e promover saúde para elas (DA ROS, 2005).

No campo de trabalho vamos ser constantemente expostos a situações sociais que irão muito além do biológico, e precisamos saber lidar com isso, principalmente para profissionais que atuam no SUS em cidades carentes de investimento público. Na formação do profissional da área da saúde é ensinado em sua maioria o biológico do indivíduo, e deixando em segundo plano o lado humanista. Kant por exemplo, acredita que as pessoas possuem um valor intrínseco, ou seja, elas possuem dignidade, fazendo assim delas valiosas acima de tudo (BARBOSA, 2011).

Com base nisso, devemos pensar que muitas vezes o biológico do praticante está menos mal que o seu psicológico, ou seja, ao procurar uma prática corporal o indivíduo não está querendo repetições e zonas alvos de treinamento para um melhor condicionamento físico, mas sim, um momento de lazer que irá lhe trazer bem-estar e que naquele instante lhe proporcionará dignidade de ser pessoa.

Muitas vezes o educador físico não precisa passar uma atividade com zona de treinamento. Basta estar atento ao indivíduo, aos seus gostos, suas condições sociais, e proporcionar a ele informações para que ele seja educado em relação a sua saúde e com isso possa escolher o que fazer em relação a ela. Buscando assim ser educador, ou seja, ensinar esse indivíduo sobre saúde e buscar caminhos para que na subjetividade desse indivíduo ele seja cada vez mais saudável, e que seja membro ativo da sociedade, contribuindo para que ela trabalhe da melhor maneira possível para todos.

É também de grande importância reconhecer que por trás daquele aluno, por trás daquele ser biológico, existe uma pessoa com seu valor intrínseco, com subjetividades, gostos, condições e pensamentos muito individuais e que precisa ser respeitado.

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2.3 A Educação Física e a relação com a saúde coletiva: pensando a graduação e a atuação

Fraga (2007) ressalta que as atividades corporais voltadas para a saúde, mais que uma tendência voltada para a forma física, ditada pela mídia, acaba por ser um fato social complexo, e que está presente na vida cultural contemporânea, e precisa de interpretações da parte das ciências sociais e humanas. Nessa mesma perspectiva, Carvalho (2001) afirma que temos que lembrar que a saúde como conceito também estaria fundamentada nas ciências humanas e sociais.

A autora ainda reforça que isso faz com que seja necessário mudar a ideia da saúde centrada no organismo, no físico, no biológico e comece a pensar a saúde como processo e resultado das opções na vida. Opções essas relativas ao trabalho, à moradia, ao lazer, mas especialmente nos valores e princípios de vida que se quer, que se acredita ser a melhor (ibidem).

Porém, Bagrichevsky (2001 apud FRAGA e WACHS, 2007) faz a ressalva de que a Educação Física brasileira atingiu o final do século passado relativamente consolidada como profissão, mas com um sério problema de legitimidade. Isso segundo o autor se dá pelo o impasse em função das profundas marcas, mas que ainda estão presentes na Educação Física por uma herança conservadora histórica, na qual tinha como papel a defesa de um nacionalismo que atendia interesses do militarismo e de uma população economicamente privilegiada.

Nessa lógica, Bagrichevsky (2001 apud FRAGA e WACHS, 2007) reforça a ideia de que ainda hoje é possível detectar, no currículo de parte das escolas de Educação Física, preocupações centradas na melhoria da aptidão física e com a aprendizagem de gestos e técnicas motoras pré-definidas, e deixam a par o estímulo à reflexão dos futuros profissionais. Isso mostra, que a formação acadêmica do profissional da área, tem muito a ver com a sua atuação. Quando se fala em área da saúde, sobretudo relacionada à Educação Física escolar, podemos citar Go Tani (1992) para exemplificar e reforçar a ideia de se ir muito além de repassar formulas e series. O autor afirma que:

“Ao nosso ver, a preparação profissional em Educação Física está enfatizando demasiadamente a transmissão de procedimentos didático-pedagógicos pré-estabelecidos [sic] em forma de seqüências pedagógicas presas ao passado, rígidas e muitas vezes inadequadas. Em outras palavras, as famosas “receitas” ou “fórmulas mágicas” de ensino estão sendo transmitidas sem uma análise profunda e séria dos princípios ou conhecimentos em que elas se fundamentam. (GO TANI, 1992, p. 63)”

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O pensamento do autor vem reforçar a ideia de que ser profissional de Educação Física é mais complexo e profundo que pensar em series, repetições e zonas alvos. Carvalho (2007) traz que a questão não reside em saber por que as pessoas não praticam atividade física, isso é um falso problema. A questão está justamente no reducionismo, na pobreza, na distância e na indiferença da área com o próprio sujeito que é o motivo maior, e a razão que se destina a existência da categoria profissional.

Pensando em saúde coletiva Carvalho (2001) mostra que é necessário pensar em toda população e não apenas nos privilegiados economicamente:

“A produção do conhecimento na área vem afirmando a necessidade da prática física dirigida a toda a população, mas na dimensão do discurso, do teórico. No plano da concretização de programas, de propostas, da realização de atividades, da implementação do sistematizado, a prática específica tem privilegiado, ao longo da história da Educação Física brasileira, a minoria, a quem pode pagar pelo serviço. E trata-se de um paradoxo, porque de um lado temos centenas de profissionais desempregados ou sendo explorados e, de outro, milhares de pessoas querendo, necessitando da informação e do conhecimento específico, sem acesso, sem orientação. Ou seja, o critério para selecionar os grupos é o dinheiro.” (CARVALHO, 2001, pg 13).

Levando em conta o que Carvalho (2001) pensa, podemos fazer uma auto critica enquanto profissionais e/ou acadêmicos de Educação Física e pensar como a área e seu trabalho contribui com a sociedade. Desse modo, refletir sobre como a sua intervenção profissional e/ou acadêmica vai interferir na vida daqueles que não tem condições econômicas de frequentar uma academia ou ter contato com algum profissional de Educação Física. Ou seja, pensar sua intervenção para além daqueles que são privilegiados economicamente pois como o próprio autor argumenta, existe muitas pessoas necessitando da informação e do conhecimento mas não tem acesso e nem orientação. (CARVALHO, 2001).

Para Bagrichevsky (2001 apud FRAGA e WACHS, 2007) o fato da Educação Física, figurar timidamente nas esferas de formulação de políticas públicas de saúde e educação no Brasil parece ser resultado do descompasso epistemológico histórico, ou seja, da falta de reflexão e pensamentos mais alargados acerca do sujeito. Para Carvalho (2001) as enfermidades eram expressão de desequilíbrio entre o homem e o ambiente. Agora é necessário ampliar esse quadro e refletir que a doença é também sinal de desequilíbrio entre o homem e o homem, e suas relações sociais.

Refletir sobre aspectos maiores que o exercício físico seja talvez a grande função da Educação Física para lhe dar legitimidade, mas que acaba sendo negligenciada. Quando falamos em saúde pública e coletiva esse fato fica mais explícito. Não somos vendedores de saúde, mas podemos ser promotores. Nesse sentido, Carvalho (2001) escreve que:

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“A saúde não é um objeto, um presente. Portanto, ninguém pode dar saúde: o médico não dá saúde, o profissional de Educação Física não dá saúde, a atividade física não dá saúde. A saúde resulta de possibilidades, que abrangem as condições de vida, de modo geral, e, em particular, ter acesso a trabalho, serviços de saúde, moradia, alimentação, lazer conquistados – por direito ou por interesse – ao longo da vida. Tem saúde quem tem condições de optar na vida. A saúde está diretamente relacionada com as escolhas que não se restringem tão-somente a poder escolher este ou aquele trabalho, realizar-se pessoal e profissionalmente com ele, morar dignamente, comer, relaxar e poder proporcionar condições de vida para os mais próximos, mas também conseguir viver dignamente com base em valores que não predominam em uma sociedade como a brasileira – excludente, individualista, competitiva, consumista. Todos esses são elementos que determinam a nossa saúde que não é só física, mental ou emocional. É tudo junto, ao mesmo tempo! Pensar na saúde do Homem é considerá-lo como ser político – cidadão – e ético – profissional. (CARVALHO, 2001, p. 14).

Nesse sentido, pensar a saúde e pensar a atuação do profissional de Educação Física se faz necessário. É papel desde a universidade, formar profissionais capazes de refletir aspectos importantes e que legitimam a área. Para Fraga e Wachs (2007) pensar a Educação Física apenas como sinônimo de exercícios físico leva à compreensão deficitária sobre saúde pública que persiste na área. Para ele isso faz com que raramente a Educação Física seja reconhecida como um campo de saberes e práticas sociais que expressam necessidades de caráter coletivo.

Tal ideia pode ser exemplificada pela contínua defesa exclusivista que alguns setores da Educação Física fazem. Tomam os exercícios físicos como elemento que dá identidade à área, para distingui-la e valorizá-la perante outras profissões do campo das ciências da saúde (BAGRICHEVSKY, 2001 apud FRAGA, WACHS 2007)

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3 PROCESSO METODOLÓGICO

Trata-se de um estudo qualitativo. Essa abordagem qualitativa, envolve a utilização de estudos e coleção de uma variedade de materiais práticos, tais como experiência pessoal, introspecção, entrevista, observação, dentre outros. De posse desses materiais empíricos, o pesquisador qualitativo irá descrever de acordo com a perspectiva dos entrevistados e não da sua visão pessoal (TURATO, 2005).

A população pesquisada foram mulheres do município de Bozano cadastradas no SUS da cidade. A seleção ocorreu pela idade, participaram da pesquisa mulheres de idades entre 30 a 50 anos, sendo 2 mulheres que participam de políticas públicas de saúde do município (hidroginástica, academia, grupo de caminhada) pelo menos 3 vezes por semana e 2 mulheres da mesma faixa etária que não frequentam esses espaços oferecidos pelo município. A escolha dos participantes foi feita de forma aleatória, levando em conta os critério definidos pela pesquisa, onde foi feito por convite e aceitação das mesmas.

A coleta dos dados foi feita através de entrevista semiestruturada, elaborada pelo autor. As entrevistas foram feitas individualmente, pré agendadas com as participantes com local e data combinados entre o pesquisador e a participante. A análise dos dados foi feita de forma universal, e comparando as participantes ativas com as não ativas, relacionando assim a diferença ou não da atuação do educador físico, e por fim discutindo com os autores que falam sobre essa perspectiva de saúde e assuntos relacionados com educação em saúde e promoção da saúde.

A pesquisa é de caráter descritiva, qualitativa. “Pesquisas descritivas têm como objetivo descrever as características de determinada população ou fenômeno (GIL, 1946, p. 42)”. A pesquisa foi feita primeiramente com a escolha dos indivíduos, posteriormente decorreu um agendamento individual para a aplicação do instrumento de pesquisa, que no caso foi uma entrevista semi estruturada, após a coleta de dados de todos os indivíduos participantes da pesquisa transcorreu a análise e discussão de dados. Realizou-se cuidados éticos, sendo usados nomes fictícios na hora de expor as entrevistas, evitando qualquer tipo de exposição das participantes.

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4 ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DOS RESULTADOS

Após as entrevistas, foram feitas as transcrições, e posteriormente, análises e interpretações dos resultados, onde discuto a fala das participantes, dialogando com os autores da área que falam sobre promoção da saúde, qualidade de vida, educação em saúde, Educação Física e temáticas relacionadas.

Faço uma apresentação do conceito de saúde das entrevistadas, partindo de suas respostas na entrevista e relacionando esse conceito individual com o que a OMS define como saúde. Posteriormente, discuto aspectos de promoção e prevenção de saúde, e faço uma relação das respostas das participantes com conceitos e ações que o profissional da área da saúde, e mais especificamente o profissional de Educação Física possa fazer e intervir.

Abordo também, a questão da identidade da Educação Física e sua importância na área da saúde. Como está a questão da intervenção profissional do educador físico e como este profissional e esta área de conhecimento podem participar da melhoria da saúde e qualidade de vida das pessoas que não podem ou não tem condições de pagar uma academia ou frequentar aulas de exercícios físicos. Nesse sentido, discuto os aspectos de práticas corporais e atividades físicas como algo mais leve do que o exercício físico em si, ou seja, uma prática que além dos benefícios físicos tragam também benefícios do bem-estar e do prazer em praticar, além do convívio social.

Ainda neste capitulo apresento sugestões de como pode-se atuar o profissional de Educação Física que trabalha na área da saúde. Faço uma reflexão quanto aos paradigmas de saúde, e questões culturais relatadas pelas entrevistadas, como por exemplo a grande influência da figura médica na saúde delas, e até algumas sugestões vindas das mesmas, no sentido de facilitar as informações sobre o tema da saúde. Reitero sobre pensar ações que englobem o todo, e não somente uma pequena parte da população que frequenta as academias e espaço de hidroginástica.

4.1 Conceituando a saúde e percebendo-se como uma pessoa saudável

Quando fala-se em saúde, a OMS conceitua a saúde em “um estado de completo bem-estar físico, mental e social, e não consiste apenas na ausência de doença ou de enfermidade (WHO, 1947, p. 1).”[...]. Levando em consideração o órgão máximo de saúde a nível mundial, entendemos que a saúde é mais complexa e tem um âmbito maior do que a ausência de doenças.

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Porém, muitas pessoas ainda pensam que a saúde é somente não ter doença, caso da Mathilde, que relata que: “para ter saúde não pode ter doença”. A mesma ainda se considera saudável, pois “a única coisa que eu sinto é dor nas costas, e não tenho nenhuma doença.”.

Nesse mesmo sentido, a entrevistada Amélia, ao ser questionada sobre o que é saúde, afirma que é: “uma pessoa que não esteja doente, que seja totalmente saudável, de corpo, de cabeça, que não esteja doente”. Ainda, a entrevistada relata que esse conceito de saúde que ela possui se deve: “provavelmente da cultura que a gente tem assim, uma noção de o que é estar com saúde, não estar doente, é quando você está bem, quando você não toma medicamento.” Ela ainda reforça que: “quando uma pessoa não precise de medicamento ela tem saúde” (AMÉLIA).

Analisando as respostas da Mathilde e da Amélia, percebe-se o quanto o conceito de saúde que elas possuem está atrelado ao paradigma biomédico. Farinatti e Ferreira (2006) dizem que olhar a saúde através do ponto de vista biomédico, veremos uma pessoa saudável quando ela estiver livre de enfermidades. Ou seja, o conceito de saúde será ela ter alguma doença ou não, aspectos como convívio social, condições básicas de qualidade de vida, relação sujeito e ambiente, questões financeiras e emocionais, lazer, conhecimento, serão desconsideradas, apenas seu ser biológico, se ele está com algum problema que afeta o seu funcionamento biológico normal ou não, esse será o parâmetro para definir saúde do ponto de vista biomédico. Por outro lado, Cristina diz que ter saúde é: “bem-estar físico, mental, viver bem, fisicamente, mentalmente, socialmente, tudo isso faz parte da saúde”. Esse conceito dado pela entrevistada já remete e assemelha-se ao conceito da OMS sobre o que é saúde.

Na mesma perspectiva, Regina define saúde como: “qualidade de vida. Nessa qualidade de vida é ter animo para trabalhar, disposição para viver, para ter uma atividade física, uma nutrição que faça teu corpo aguentar a rotina.”

Farinatti e Ferreira (2006) citam a Carta Brasileira de Saúde de 1987, onde assumiu-se que saúde era algo que dependia de fatores múltiplos, como renda, educação, alimentação, lazer, condições de trabalho e acesso aos serviços públicos e privados de saúde. Analisando as respostas dadas por Regina e Cristina veremos que se encaixa melhor no paradigma biopsicossocial, tendo em vista que elas levam em consideração mais fatores para conceituar saúde do que somente a ausência de doenças.

Quando perguntadas se consideravam-se saudáveis, todas responderam que sim. Porém, cada uma justificou dentro do que considera saúde o porquê de ser saudável. A qualidade de vida é algo individual de cada um, a avaliação pode ser feita pelo individuo,

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dificultando afirmar se é uma boa ou má qualidade de vida, pois a realidade vivida por cada sujeito é única e individual (SEGRE e FERRAZ, 1997 apud PEREIRA et al. 2009).

Regina diz: “eu tento ter uma alimentação saudável, que eu digo, comer saladas, legumes, sem gordura, atividade física semanal, leitura, palavras cruzadas, e uma boa noite de sono.” Esses fatores, segundo ela, tornam-na uma pessoa saudável. Vemos que existe uma preocupação maior que apenas evitar doença, mas pode-se perceber a sensação de bem-estar, do lazer, principalmente quando ela cita a leitura e as palavras cruzadas, como atividades que a tornam saudável e questões biológicas também, como por exemplo qualidade do sono.

Cristina, apesar de não praticar nenhum exercício físico depõem: “não sou sedentária, não tendo doenças, estando bem, fisicamente, mentalmente, tudo isso é saúde, participar das coisas na comunidade, ter amizades com as pessoas, isso tudo faz parte de tu ser saudável”. Percebe-se que existe uma singularidade no conceito dela em ser saudável, por exemplo as amizades, participar na comunidade, para ela isso traz saúde através do bem-estar.

Mathilde se considera saudável porque: “única coisa que eu tenho e que sinto, mas isso não quer dizer, que é que eu sinto dor nas costas, mas isso é problema de coluna.” Percebe-se que ela se considera saudável porque o conceito de saúde dela é não ter doença nenhuma, e a dor nas costas que ela sente não é motivo dela não se considerar saudável.

Amélia se considera saudável, explicando: “eu não tomo nenhum medicamento, mas assim, eu gostaria de fazer mais exercício físico, assim sabe, sinto um pouco de necessidade, de caminhar ou de correr, mas, acredito que sim.” Aqui percebe-se que o fato de não tomar medicamento a torna saudável, reconhece que precisa fazer exercícios mas ainda assim, o maior problema para ela seria ter doença, já que não tem, está saudável.

Analisando todas as respostas, vemos a singularidade de cada pessoa, sobre os conceitos e logo a forma de agir com relação a saúde. Quem entende saúde como ausência de doenças tem usado de recursos que irão evitar a aparição de alguma enfermidade. Quem entende a saúde como algo mais complexo, está usando de ferramentas que proporcionem qualidade de vida e principalmente a sensação do bem-estar.

4.2 Promover, evitar, curar: verbos que o profissional precisa decifrar para atuar

Pensando a atuação do profissional da saúde, focando um pouco mais no profissional de Educação Física, veremos que atuar na saúde da população é algo complexo. Na visão biomédica, o profissional que mais tem influência sobre a saúde é o médico. E muitas vezes,

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quando se fala de atividade física ou exercício físico, a população respeita mais a opinião do médico do que do profissional de Educação Física.

Isso fica explicito na resposta da Mathilde: “eu sei que teria que fazer 40 minutos de caminhada por dia, além de fazer academia e coisa, teria que fazer essa caminhada [...] pra ser o certo teria que fazer caminhada, e fazer 40 minutos, não parar conversar com vizinho, com ninguém [...] o médico que falou, eu disse que caminhava bastante quando ia na lavoura e coisa, e ele disse que essas caminhadas não fazem efeito nenhum, que tem que ser caminhada de 40 minutos e sem estar de papo com os vizinhos.”

Fica nítido o quanto a influência do médico influi na vida dela, o quanto essa forma biomédica de ver a saúde e as atitudes com relação a saúde está atrelada a figura médica. Ela ainda relata que: “eu sou uma das pessoas que se o que o médico falar eu respeito, sigo à risca”. E justifica que isso se deve porque: “ele estudou para resolver os problemas de saúde”. E ainda completa: “o doutor tinha indicado que era para fazer exercício”.

Cristina reforça ainda mais que a questão cultural do paradigma biomédico está muito forte nessa população, ela diz que: “[...] é cultura. Até eu como agente de saúde, daí a gente fala nas casas, tu vê que não, parece que não dão muita importância sabe, é mais se o médico disser.” Ainda exemplifica: “a gente pergunta, e daí, como está a diabete? Tem caminhado? Está tomando o remédio certo? Fazendo uma atividade física? Aí a pessoa responde eu não tô fazendo atividade física. Dali um tempo eu volto lá, dai, me dizem: ah o doutor mandou fazer atividade física, mandou fazer dieta, daí eu digo as vezes, ah, mas eu não tinha falado, não tinha pedido para você, dito que era importante?!”.

Esse relato mostra o quanto a figura médica tem influência. Isso porque as pessoas escutam mais o que o médico fala, ou seja, ainda se pensa a saúde muito medico-centrada, dá-se muita importância para a figura médica apenas, tendo em vista que é o símbolo de profissional que mais estudou, e mais conhece sobre saúde na cultura popular. Isso é reforçado pela explicação de Mathilde, ao ser questionada de qual profissional seria mais importante em sua saúde, ela diz que: “seria o médico”. E justifica isso dizendo: “porque ele estudou, para resolver os casos, os problemas de saúde né”. Isso demonstra o quanto ainda o paradigma biomédico está presente na vida dessas pessoas.

Seguindo a mesma linha, só mudando o profissional, a Amélia ao ser questionada sobre quais profissionais têm maior interferência no seu comportamento em relação a saúde diz: “a nutricionista”. Ela justifica a escolha da seguinte forma: “[...] a gente escuta muito, assim, não sei também se é pelo fato de que ela, mas dão bastante entrevista até no rádio, assim né, pessoal comenta muito, como eu trabalho com as mulheres, falam muito assim, de

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nutricionista, e eu acho bem importante assim, bem interessante o trabalho delas.” Ao ser questionada se alguma vez ela já consultou com alguma nutricionista ela respondeu: “nunca”. Analisando isto, vemos que mesmo essa pessoa não tendo contato direto com a nutricionista, ainda assim, as ações que a nutricionista faz, mediante programas de rádios, palestras, influencia positivamente de tal forma a vida da entrevistada que ela acaba considerando-a o profissional que mais interfere nas suas ações com relação a saúde.

Diante desse quadro, podemos pensar e a Educação Física? Porque essa importância para o médico e a nutricionista e essa ausência da Educação Física na saúde dessas pessoas? Talvez a culpa seja dos próprios profissionais da área.

“Ao nosso ver, a preparação profissional em educação física está enfatizando demasiadamente a transmissão de procedimentos didático-pedagógicos pré-estabelecidos [sic] em forma de seqüências pedagógicas presas ao passado, rígidas e muitas vezes inadequadas. Em outras palavras, as famosas “receitas” ou “fórmulas mágicas” de ensino estão sendo transmitidas sem uma análise profunda e séria dos princípios ou conhecimentos em que elas se fundamentam. (GO TANI, 1992, p. 63)”

Essa afirmação, questiona a atuação do profissional de Educação Física. Onde está a identidade da classe, e mais, como atuar diante a população, se nós mesmos muitas vezes nos limitamos a academia? Esquecemos que a Educação Física é muito mais ampla que musculação e treinamento funcional.

Para Fraga (2006) pensar a Educação Física apenas como sinônimo de exercícios físico leva à compreensão deficitária sobre saúde pública que persiste na área. Para ele, isso faz com que raramente a Educação Física seja reconhecida como um campo de saberes e práticas sociais que expressam necessidades de caráter coletivo. Assumir ser um profissional dessa esfera, não é ser apenas um ótimo treinador de musculação. É necessário reflexão, necessário pensar aspectos maiores, principalmente quando o tema é promoção de saúde, tais como condições sociais dos indivíduos, relação sujeito/ambiente, ações que contemplem o todo e não apenas uma pequena parcela da população. Nessa linha, a Política Nacional de Promoção da saúde (2002) diz que:

“Promover saúde é educar para a autonomia como construído por Paulo Freire , é tocar nas diferentes dimensões humanas, é considerar a afetividade, a amorosidade e a capacidade criadora e a busca da felicidade como igualmente relevantes e como indissociáveis das demais dimensões. Por isso, a promoção da saúde é vivencial e é colada ao sentido de viver e aos saberes acumulados tanto pela ciência quanto pelas tradições culturais locais e universais”. (POLÍTICA NACIONAL DE PROMOÇÃO DA SAÚDE, 2002, p.13)

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Desse modo, limitar a Educação Física na promoção da saúde das pessoas apenas como uma área que planeja, executa e transmite movimentos pré-definidos, sem reflexão parece ser errado. Fazer isto só reforça mais o pensamento popular de que o profissional desse âmbito serve apenas para dizer se a execução do exercício está correta ou não. Mathilde ao ser questionada sobre a contribuição do profissional de Educação Física em sua saúde diz que: “ele contribuiu dizendo os exercícios que fazem bem para a gente, o que pode, o que não pode fazer.” Ainda exemplifica, contando uma situação que ocorreu com ela: “que nem eu esses dias, fui fazer aquele do joelho lá (extensor), que estava me incomodando, daí ele (profissional de Educação Física) disse que era para diminuir o peso.”

Analisando o relato de Mathilde, percebe-se o quanto está impregnado a limitação do profissional a apenas corrigir movimentos de exercícios físicos. Olhando os conceitos de saúde, qualidade de vida, promoção de saúde, fica nítido o quanto à Educação Física precisa evoluir para não ficar de fora do enquadramento desses aspectos. Pensar saúde, principalmente saúde pública, é fazer reflexão de vários fatores e tentar buscar uma identidade maior para a área ser reconhecida como merece.

4.3 Como olhar a saúde de forma biopsicossocial se ainda usamos as lentes biomédicas?

Pensando em benefícios, ainda o exercício físico é o mocinho perante a cultura popular. Relacionando os benefícios, em uma visão mais restrita, o exercício físico possui mais protagonismo que as práticas corporais e que a atividade física. Nesse sentido, é necessário criar uma discussão sobre estes termos para que possamos aumentar o nosso pensamento além da prevenção de doenças não transmissíveis, pois ainda é propagado apenas os efeitos biológicos e biomédicos, esquecendo os benefícios sociais, afetivos e psicológicos que o movimento humano pode trazer (CARVALHO, 2016).

Indo ao encontro a esse pensamento, Cristina relata que quando era jovem: “[...] se reuniam ali no salão, daí faziam, jogavam pingue pongue, faziam reunião dançante, é.. quase todo final de semana a gente vinha pro salão ali e daí ali a gente se reunia, [...] esse relacionamento era muito bom, hoje os jovens pensam mais em, as vezes uns vão se divertir assim, mas outros ficam só no celular[...] mas não é aquele convívio assim, de antes.”

Analisando a fala de Cristina nota-se a riqueza das práticas corporais e atividades físicas. No relato da entrevistada fica claro o quanto essas reuniões de finais de semana que traziam algo bom para a vida dela. As atividades se analisarmos do ponto de vista biomédico, poucos benefícios trariam, tendo em vista que pingue pongue e dança, que são relatadas pela

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Cristina como atividades que fazia, não possuem muito gasto calórico e tem uma intensidade de moderada a baixa. Porém, como González (2015) ressalta, as práticas corporais são algo essencialmente motor, mas que tenha envolvimento social, que é realizada fora das obrigações laborais, que são ligadas ao lazer, podendo serem usadas para cuidar do corpo ou não.

Dessa forma, entender que apesar de não ser um exercício físico recomendado pelos paradigmas biomédicos, o pingue pongue e a dança, faziam grande diferença na vida de Cristina, pois para ela era benéfico a pratica corporal. Porém, ainda é analisado apenas o exercício como o salvador de tudo, esquecendo-se do quanto o movimento corporal, e mais ainda com interação social pode beneficiar o sujeito. Ainda se estima apenas o biológico do indivíduo, dessa forma quando falamos em Educação Física, principalmente o pensamento popular assimila que é sinônimo de exercício físico, academia de musculação ou caminhada. Ao ser questionada sobre o que a levaria a ter uma boa saúde e o que poderia fazer para conseguir isso, Mathilde diz: “Tem que fazer caminhada, fazer exercícios físicos, academia, se exercitar para não ficar muito parada”.

Nesse relato, é nítido o quanto a cultura de que somente o exercício físico é benéfico a saúde. Com certeza o exercício físico traz benefícios e vários estudos comprovam, porém, temos que pensar que a saúde e muito menos a Educação Física não é limitada a exercício e prevenção de doenças. Dessa forma, pensar atividades de lazer, convívio social, práticas corporais devem sim ser dever do profissional da Educação Física e são ótimas alternativas para promover saúde.

Porém, Carvalho (2001) cita que a formação profissional está muito atrelada ainda para a prática privada, como academias, clubes que reproduzem a política de consumo, bem como para a indústria de equipamentos e até de produtos cosméticos. Nesse sentido, os profissionais são formados numa visão biomédica, pois é mais lucrativa que tentar ver a saúde através do biopsicossocial.

Ainda falando em lucros, Carvalho (2001) cita que a condição financeira tem sido o passe para o acesso, e para o direito ao serviço do profissional de Educação Física. Ou seja, quem tem condições de pagar um personal trainer, ou frequentar uma academia privada é quem usufrui da educação física. Entretanto, é um critério extremamente excludente, e que restringe de forma injusta o acesso a orientação e o serviço do profissional. (ibidem). Nesse sentido é necessário refletir, como contribuir para a saúde através da Educação Física para que as pessoas, não somente aquelas que podem pagar pelo serviço do profissional possam ter qualidade de vida.

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4.4 Educação Física: área de conhecimento reduzida a academias e jogar bola.

Um estudo realizado em Jequié-BA, mostra que 57% dos profissionais de Educação Física daquela cidade atuam em academias e clinicas privadas. Isso vai de antemão a outros profissionais da área da saúde como médicos, enfermeiros, fisioterapeutas, que atuam mais na saúde pública (OLIVEIRA et al., 2004 apud COQUEIRO, NERY, CRUZ, 2006). Isso talvez seja o maior erro da área da Educação Física, se limitar a academias e clubes privados, e esquecer de quem não pode pagar pelo acesso ao profissional, isso talvez possa explicar o fato da tamanha importância dos demais profissionais da área da saúde e uma certa desvalorização do profissional dessa área como papel importante na saúde da população, visto que este, está limitado apenas a uma pequena parte da população que frequenta academias e clinicas privadas.

Dessa forma, podemos pensar a atuação do profissional de Educação Física, questionando e refletindo, quais contribuições essa área de saber traz para a sociedade como um todo? Qual a contribuição da Educação Física para as pessoas que não tem acesso a academias, a espaços de exercício físico, que não possuem informações sobre atividades físicas, ou então que não possuem condições financeiras de pagar pelos serviços de um profissional?

Podemos pensar em medidas e ações de educação em saúde. Amélia relata que a nutricionista influencia muito em sua saúde e explica que isso ocorre: “não sei se é pelo fato de que elas dão bastante entrevistas até no rádio assim né [...] elas conseguem influenciar as pessoas, são formadoras de opinião.” Nesse sentido, é possível ver o quanto a informação vinda do rádio, principalmente para uma população de interior, habituada a estar sempre com o rádio ligado, acaba influenciando e mudando até hábitos. Dessa forma, o profissional de Educação Física poderia utilizar mais dessa medida, e ir falar de assuntos relacionados a área, fazendo assim com que mais pessoas tenham acesso ao conhecimento produzido pela Educação Física, e não limitando apenas aqueles que podem pagar pelo serviço.

Outra questão que pode ser pensada na atuação do profissional, é levar informação até o público jovem, que ainda está formando sua opinião sobre saúde. Cristina ao ser questionada quais ações ela achava interessante da parte da Educação Física para tentar melhorar a saúde da população, e tentar quebrar um pouco o paradigma de que atividade física só serve para curar e prevenir doença diz:

“[...] assim os educadores físicos também tentar fazer, tentar conversar com as pessoas e coisa, sei lá, se partindo das escolas porque a gente sempre, criança, jovem, a gente pega mais depois que eles tiverem uma mentalidade feita, não trata mais, essas pessoas mais de idade se falar em atividade física, eles dizem, se vê uma pessoa caminhando na rua, vão dizer aquele lá não tem o que fazer, ta lá caminhando, né, eu acho que

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assim, tentar assim fazer mais palestras, sei lá, se as vezes começando assim, nas escolas com mais crianças, com adolescentes pra mentalidade, [...] tentar mudar essa geração que vem vindo ai, que saúde é a coisa mais importante né, não só de tratar a doença.” (CRISTINA, 08/10/17).

Nesse relato, percebe-se mais uma oportunidade de o profissional de Educação Física influenciar de modo positivo na saúde de mais pessoas. Utilizar a escola, tanto bacharéis como licenciados para educar os jovens sobre saúde. Apresentar palestras, informações, enfim, meio que possibilitam que futuramente esse indivíduo possa ter uma cultura mais adepta da atividade física, dos bons hábitos, que entende que a saúde passa longe de ser apenas a ausência de doenças, mas que tem relação com o meio onde vive, com as condições em que vive, que esse possa ser reflexivo também sobre sua saúde e possa decidir sobre o que faz bem a ele ou não.

Nesse sentido, não basta apenas praticar exercícios físicos pura e simplesmente para a aderência à hábitos saudáveis. É de grande importância que os pontos teóricos sejam trabalhados juntamente com a prática, buscando, a partir disso, uma formação que tenha como escopo a totalidade do ser humano enquanto praticante de exercícios físicos (CARDOSO, PEREIRA, 2011).

Percebemos então, a tamanha importância que a Educação Física possui na aderência de hábitos saudáveis futuros na vida dos jovens. Se a licenciatura não consegue dar conta, bacharéis podem e devem criar projetos que levem até as crianças e jovens, formas de produzirem hábitos saudáveis, como palestras sobre saúde, gincanas relacionadas ao tema, desenvolver trabalhos extracurriculares com os alunos, no intuito de tentar estimular o pensamento e a cultura sobre saúde.

Mathilde relata sua Educação Física escolar: “a gente jogava vôlei, jogava handebol, essas coisas assim.” Infelizmente, ainda em sua maioria a Educação Física escolar se resume apenas no ensino dos esportes coletivos, como descreve Pereira e Silva (2004) e Guedes (1997) (apud CARDOSO, PEREIRA, 2011) que entre os problemas ligados as ações docentes na Educação Física Escolar, podem ser citados a maciça presença de esportes em detrimento a outros conteúdos de ensino.

Isso faz com que aconteçam casos como de Mathilde, que fica com uma visão de que a contribuição da Educação Física na sua saúde, mais precisamente do profissional é: “O que eles explicam para a gente é o suficiente, não tem outra coisa pra, a ação deles lá, é o suficiente, só quando a gente tiver fazendo algum exercício errado vem me corrigir.” Dessa forma, temos a tendência de entender que a desvalorização do profissional e da Educação Física inicia na escola, e que se a cultura de que Educação Física é só jogar bola não for mudada pelos

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profissionais, acadêmicos, desde bacharéis até licenciados, o espaço da Educação Física na saúde da população será apenas corrigir movimentos que estiverem errados.

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