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Devido processo legal substancial e a função administrativa MESTRADO EM DIREITO

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC–SP

Guilherme Tadeu Pontes Birello

Devido processo legal substancial e a função administrativa

MESTRADO EM DIREITO

SÃO PAULO

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Guilherme Tadeu Pontes Birello

Devido processo legal substancial e a função administrativa

MESTRADO EM DIREITO

Dissertação apresentada à Banca Examinadora como exigência parcial para obtenção do título de MESTRE em Direito, área de concentração em Direito Administrativo, pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, sob a orientação do Prof. Doutor Márcio Cammarosano

São Paulo

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Banca Examinadora

_______________________________________

_______________________________________

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AGRADECIMENTOS

Em primeiro lugar agradeço a minha família. Em especial, as duas mulheres de minha vida: Julia e Leilane. Sem vocês, absolutamente nada disso faria sentido.

Agradeço também ao meu orientador, Márcio Cammarosano, pelos conselhos, pelos ensinamentos e pelo apoio. Ao professor Pedro Estavam Serrano, pelo estímulo contínuo, sem o qual jamais teria iniciado e aprofundado a vida acadêmica.

Aos colegas/amigos de trabalho Flávio Crocce Caetano, Mariana Naddeo Lopes da Cruz, Gabriella Fregni e Renan Beloto, pela compreensão, pelo apoio e pela paciência. Sem vocês, nada disso seria possível.

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RESUMO

O presente trabalho teve como escopo a delimitação do conceito jurídico da cláusula do Devido Processo Legal em seu sentido substancial e sua implicação no âmbito do exercício da função administrativa. Referida cláusula é um dos institutos mais antigos e afetos ao Estado de Direito. Em sua forma embrionária, a cláusula do Devido Processo Legal representou uma das primeiras maneiras de controle do poder despótico. A partir daí, foi o arcabouço para o surgimento de tantos outros institutos limitadores do Poder Estatal. Seja pelo aspecto processual formal - ferramentas procedimentais (ampla defesa e contraditório, dever de motivação das decisões estatais, entre outros), até chegar ao controle de mérito da decisão (embrionariamente tido como juízo de razoabilidade), este ultimo, conhecido como Devido Processo Legal Substancial. Ocorre que, esta gama de princípios e postulados tipicamente atribuídos à cláusula do Devido Processo Legal substancial (razoabilidade, proporcionalidade, motivação) possui previsão legal expressa e específica no texto normativo, relevando um esvaziamento de seu conteúdo no âmbito do ordenamento jurídico brasileiro. Ainda assim, é obrigação do cientista do direito atribuir sentido e unicidade ao sistema jurídico. A cláusula do Devido Processo Legal é axiologicamente ligada ao controle do mérito das decisões estatais. No âmbito do ordenamento jurídico pátrio, tal princípio revela-se como um comando ao aplicador da norma para que este busque a prolação da melhor decisão. Melhor decisão é aquela que, em primeiro lugar, observa o dever de promoção do interesse público (portanto, precedida de um juízo objetivo da “vontade” do comando normativo, e não um juízo arbitrário subjetivo) e, diante da realidade fática, tenha se mostrado como a mais eficaz. Enquanto proferida por uma autoridade competente, a decisão será considerada, aprioristicamente, como a melhor decisão, salvo comprovado que outra solução seja suficientemente mais vantajosa. Constatou-se que esta afirmação tem plena harmonia com a função administrativa e regime jurídico-administrativo. O exercício da função administrativa é, antes de mais nada, a promoção do bem comum, do interesse público. Isto implica em afirmar que o exercício das prerrogativas (Poder) conferidas à administração são instrumentais e, portanto, só podem ser exercidos para prossecução do interesse público estabelecido no próprio ordenamento jurídico (submissão plena ao princípio da legalidade). Neste sentido, não é conferido ao operador do direito qualquer margem de ação, na qualidade de agente público, em busca de outra finalidade que não o interesse público. Sendo assim, é função da administração a busca plena sempre da melhor solução para os casos concretos que lhe são apresentadas. Por meio de descrição de elementos de Teoria Geral do Direito, buscou-se apresentar formas e procedimentos capa de que se busque a melhor decisão (vale destacar, noções hermenêuticas de postulados que conferem uma compreensão unitária e sistêmica do ordenamento jurídico, relação de princípios e regras, juízo de ponderação e aplicação dos postulados da proporcionalidade e razoabilidade).

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ABSTRACT

The present study had as its scope, the delimitation of the legal concept of the Due Process of Law clause, in its substantial sense and its implication in the exercise of the administrative function. The mentioned clause is one of the oldest and intrinsic institutes of the Rule of Law. In its incipient form, the Due Process of Law clause represented one of the first methods to control the despotic power. Thenceforth, it was the skeleton for the rise of many others institutes that limits the State Power. From the formal procedural aspect – procedural instruments (full defense and the right to appeal, motivation of the State decisions duty, among others), up to reaching the merits of the decision control (originally accepted as reasonableness judgment), this last one known as Substantial Due Process of Law. Occurs that this range of principles typically assigned to the Substantial Due Process of Law clause (reasonableness, proportionality, motivation) has express and specific legal provision in the normative text, demonstrating an emptying of its content in the Brazilian legal order. Nevertheless, it‟s a duty for the legal scholar to apply sense and unity to the judicial system. Within the national legal system, the mentioned principle reveals itself as a command to the law enforcer to seek the best ruling. The best ruling is the one, firstly, that promotes the public

interest duty (therefore, preceded by a direct judgment of the “will” of the normative

command and not by an arbitrary subjective judgment) and, in front of the actual reality, has been shown as the most effective. As issued by a competent authority, the decision will be considered, a priori, as the best decision, except if proved that other decision is sufficiently more favorable. It was noted that this assertion has harmony with the administrative role and the legal administrative regime. The exercise of the administrative role is, before anything, the common good promotion, the public interest. This implies in the assertion that the exercise of the prerogatives (Power) given to the administration are instrumentals and, therefore, may only be exercised for the achievement of the public interest set forth in its own judicial order (full submission to the principle of legality). Thereby, it is not granted to the legal scholar any freedom of action, as a public agent, in seek for another purpose but the public interest. Thus, the administration role is to always seek for the best solution for the concrete cases that are presented. Throughout the General Theory of Law elements description, it was sought to present means and procedures in order to seek the best decision (worth mentioning, hermeneutical notions of principles that provide an unitary and systemic comprehension of the judicial order, ratio of principles and rules, weighing judgment and enforcement of the proportionality and reasonableness principles.

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INTRODUÇÃO ... 11

Capítulo I - NOÇÕES PROPEDÊUTICAS ... 14

1. Direito como fenômeno de linguagem ... 14

2. Normas jurídicas ... 18

3. Regras e Princípios... 20

4. Postulados normativos ... 24

4.1 Postulados normativos hermenêuticos ... 25

4.2 Postulados normativos aplicativos ... 25

4.2.1 Postulado da proporcionalidade ... 26

4.2.2 Adequação ... 26

4.2.3 Necessidade ... 26

4.2.4 Proporcionalidade em sentido estrito... 27

4.2.5 Postulado da Razoabilidade ... 28

5. Constituição e ordenamento jurídico ... 29

Capítulo II - A FUNÇÃO ADMINISTRATIVA. ... 32

1. O caráter instrumental do Estado de Direito ... 32

2. A tripartição de funções ... 33

3. A função administrativa ... 37

3.1 Regime jurídico administrativo ... 38

3.2 Interesse público ... 40

Capítulo III–ACLÁUSULADODEVIDOPROCESSOLEGALEMSEUSENTIDO SUBSTANCIAL ... 43

1. Evolução histórica da cláusula do Devido Processo Legal ... 44

1.1 De Law of The Land ao Due Process of Law ... 46

1.2 Das colônias americanas à Emenda Constitucional XIV ... 49

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2. A cláusula do Devido Processo Legal. ... 53

2.1 O conceito científico de processo ... 57

2.2 Devido Processo Legal em seu sentido formal ... 58

2.3 Devido processo legal substancial ... 59

2.3.1 Da disparidade doutrinária ... 59

2.3.2 Considerações sobre a posição doutrinária pátria ... 60

2.3.3 Da problemática conceitual em face do ordenamento pátrio ... 62

2.3.4 Um problema de segurança jurídica ... 65

2.3.5 Cláusula do Devido Processo Legal substancial enquanto controle de conteúdo decisório66 2.3.6 Cláusula do Devido Processo Legal em sentido substancial e a busca pela melhor decisão. 66 2.4 A “melhor” decisão ... 69

Capítulo IV – O DEVIDO PROCESSO LEGAL SUBSTANCIAL E A FUNÇÃO ADMINISTRATIVA ... 73

1. Ato Administrativo ... 73

1.1 Conceito ... 73

2. Procedimento de decisão administrativa ... 74

2.1 Análise das circunstâncias fáticas ... 75

2.2 Não subsunção das circunstâncias fáticas ao suporte fático de uma regra abstrata ... 76

2.3 Subsunção das circunstâncias fática ao suporte fático de uma regra abstrata ... 76

2.4 Postulado da proporcionalidade e da razoabilidade ... 77

2.4.1 Justiça ... 77

3. Discricionariedade e ato vinculado... 78

3.1 Conceitos ... 78

3.2 Discricionariedade e a questão da melhor decisão ... 79

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INTRODUÇÃO

Como é sabido, o artigo 5º, inciso LIV, da Constituição Federal da República de 1988, incorporou a cláusula do Devido Processo Legal (due process of law) como um princípio jurídico expresso no texto constitucional.

Princípio que a doutrina brasileira tem concebido como um pressuposto formal do processo, ao qual se sujeitam as esferas administrativas e judiciais. O presente trabalho, ao seu passo, possui como escopo a análise do princípio do Devido Processo Legal sob sua vertente substancial e seus reflexos no exercício da função administrativa, ou seja, a sujeição do mérito administrativo ao referido princípio constitucional.

Esta avaliação implica identificar as peculiaridades da referida cláusula e a maneira como se conforma quando inserida no ordenamento jurídico pátrio, assim como, as peculiaridade do exercício da função administrativa.

Sendo assim, no primeiro capítulo I, o presente trabalho preocupa-se em apontar elementos de Teoria Geral do Direito imprescindíveis a compreensão do tema. Aborda-se o direito enquanto fenômeno de linguagem, apresentando a diferenciação entre as duas abordagens do direito em seu plano lógico, distinção linguística entre a ciência do direito e o direito positivo, bem como o conceito de norma jurídica, esta imprescindível para o estudo que ora se propõe.

Com amparo nas lições de Ricardo Marcondes Martins, Celso Antônio Bandeira de Melo, Robert Alexy e Celso Ribeiro Bastos, será apresentada a distinção entre as diferentes espécies de normas jurídicas, tanto no que aduz às regras e os princípios jurídicos, quanto aos postulados normativos hermenêuticos e aplicativos, e principalmente formas de compreensão do sistema jurídico.

O segundo capítulo é destinado ao estudo da função administrativa, tal qual concebida pelo ordenamento jurídico pátrio. Inicia-se a análise do caráter instrumental do estado de direito e o impasse entre a tripartição de poderes em “Poder Executivo”, “Poder

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tripartição das funções “administrativa”, “legislativa” e “judicial”, demonstrando que os poderes estatais não se confundem com o exercício de suas funções.

Em seguida, passa-se propriamente ao estudo da função administrativa, enquanto meio de obtenção do interesse público através do estrito cumprimento do princípio da legalidade, e do regime jurídico administrativo.

Neste capítulo, chega-se a uma observação relevante ao estudo do direito administrativo no que aduz ao princípio do interesse público e a bipartição doutrinária em primário e secundário. A aqui forte ênfase a característica de que o interesse público não está à disposição de um juízo subjetivo e arbitrário do administrador público, mas sim á solução jurídica adequada a cada caso concreto, cuja resposta está incutida no próprio ordenamento jurídico.

No terceiro capítulo, com fundamento nas matérias já enfrentadas nos capítulos anteriores, o presente trabalho passa a estudar a evolução histórica do devido processo legal, com a transição do Law of the Land ao Due process os Law - cujo marco ocorreu com a promulgação da Carta Magna em 1215 – e as principais vicissitudes da ótica inglesa e a norte americana sobre o mesmo instituto.

Verifica-se que por reflexos da subordinação à Cora Inglesa, enquanto colônia, os Estados Unidos da América caminhou para a hegemonia do Poder Judiciário como órgão capaz de solucionar de forma justa as questões constitucionais, enquanto os ingleses conferiam tal poder ao parlamento.

Apresentado o contexto histórico, passa-se a enfrentar o devido processo legal no ordenamento pátrio, iniciando-se com a apreciação do próprio conteúdo previsto no texto constitucional, avaliando o significado de cada um dos signos que compõe a expressão “devido processo legal”, principalmente com vistas a aferir se os dignos “devido” e “legal” não constituem um pleonasmo.

(13)

comando normativo que determina a busca da melhor decisão traz considerações também à este sensível tema da ciência do direito.

(14)

Capítulo I - NOÇÕES PROPEDÊUTICAS

1. Direito como fenômeno de linguagem

Para compreender e interpretar o Direito é necessário ter em mente que este, antes de tudo, é um fenômeno de linguagem. E, enquanto fenômeno de linguagem, o Direito é uma das formas de construção do conhecimento e de comunicação do corpo social. Se o Direito é uma forma de comunicação e, portanto, uma forma de linguagem, alguns apontamentos a respeito desta temática são importantes a compreensão do sistema jurídico.

A linguagem está intimamente ligada ao processo de aprendizagem do homem. A forma de desenvolvimento do intelecto humano se dá única e exclusivamente por meio da linguagem. Daí a máxima de Ludwig Wittgenstein segundo a qual os limites da

minha linguagem significam o limite do meu mundo” 1.

A atividade cognoscitiva consiste no apontamento de premissas identificadas sensorialmente diante da realidade circundante, de modo que a constatação da veracidade dessas premissas possa ser aferível, servindo, assim, “de sustento para as

conclusões e permitam a extração lógica da verdade sistêmica”2. Portanto, o processo de

conhecimento do ser humano é a ordenação da realidade por meio de linguagem,

“constituindo aquilo que a filosofia chama de racionalidade”3

. O processo de racionalização do conhecimento humano é constituído em três estágios, a saber:

(i) primeiro os objetos são apreendidos na forma de ideias (representadas linguisticamente por termos – ex: „homem‟); (ii) com as associações das ideias surgem os juízos (representados pelas proposições – ex: „homem é mamífero‟); e (iii) da relação entre juízos são construídos os raciocínios (representados pelos argumentos ex: „homem é mamífero, mamífero é animal, então homem é animal‟).

1 WITTGENSTEIN, Ludwig. Tractatus logico-philosophicus. São Paulo: Edusp, 1994, p. 111.

2 SERRANO, Pedro Estevam Alves Pinto. Região metropolitana e seu regime constitucional. 1 ed. São Paulo:

Verbatim, 2009, p. 173.

3 CARVALHO, Aurora Tomazini de. Curso de teoria geral do direito: o constructivismo lógico-semântico. 3.

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Os raciocínios, por sua vez, são atos que advêm de inferências,4 são silogismos.5 Silogismo, como bem leciona o professor Pedro Estevam Alves Pinto Serrano

“se conforma por uma premissa maior, aplicada a uma menor, gerando uma conclusão”6

.

Nesse sentido, duas assertivas podem ser estabelecidas: (i) os processos de conhecimento precisam ser racionalizados para serem aceitos como válidos e úteis na explicação de nossas experiências; e (ii) o processo de conhecimento é obtido no campo das proposições.7“Isto nos autoriza dizer que todo conhecimento é proposicional.”8

Se, por um lado, o conhecimento é adquirido inicialmente pela troca de percepções e interações (experiências) do homem com o mundo que o cerca, por outro, é transmitido por meio de representação de um determinado significado, os símbolos,9 completando assim o ciclo de formação linguagem.

Para a Semiótica,10 a linguagem sempre poderá ser abordada em três dimensões: (i) a sintática

ou lógica, que estuda a relação entre os signos de maneira independente dos seus

4 Segundo Aurora Tomazini de Carvalho, existem dois tipos de inferência: a inferência imediata e a inferência mediata. Naquela, a conclusão é constituída por uma premissa e pode ocorrer de duas formas, por oposição

(ex.: “todos os homens são racionais, logo nenhum homem é não racional”); ou por conversão (ex.: “todos advogados são juristas, logo alguns juristas são advogados”). Já esta, a mediata, é a conclusão advinda de duas

premissas e se manifesta por 5 (cinco) formas, são elas: (i) a analogia -comparação entre juízos distintos apontando-lhes uma identidade comum; (ii) a indução - transmissão do caso particular para o geral, determinando-se o fenômeno que se aplicada a todos os casos da mesma espécie; (iii) a dedução - a construção de “uma proposição que é a construção lógica de duas ou mais premissas”; (iv) a dialética – na qual

“constrói-se uma conclusão (síntese) resultante da contraposição de juízos conflitantes denominados tese e antítese (ex: água é uma necessidade do organismo, mas causa afogamento, logo deve ser inserida com

moderação)” ; (v) a abdução - a adoção de hipóteses explicativas oriundas de duma proposição geral sobre a qual, posteriormente são descartadas ou confirmadas de acordo com a conclusão (CARVALHO, Aurora Tomazini de. Curso de teoria geral do direito: o constructivismo lógico-semântico. 3. ed. rev. e ampl. São Paulo : Noeses, 2013, p. 11-12).

5 Calçados nas lições de Charles Pierce, Pedro Serrano destaca que são três os tipos de argumento silogísticos: dedução, indução e abdução. (SERRANO, Pedro Estevam Alves Pinto. Região metropolitana e seu regime constitucional. 1 ed. São Paulo: Verbatim, 2009, p. 174)

6Idem, p. 173.

7 CARVALHO, Aurora Tomazini, op. cit. p.12. 8Ibidem.

9 GUIBOURG, Ricardo A.; GIGLIANI, ALEJANDRO M.; GUARINONI, RICARDO V. Introducción al

conocimiento científico. Buenos Aires: Eudeba, 2000. Símbolo é a classe específica do signo (signo se dá quando dois fenômenos se relacionam de forma natural, não deliberada – da relação de causa e efeito). São, portanto, “signos artificiales, intecionales y más o menos dependientes de alguna convención tácita entre miembros de un mismo grupo. De símbolos así están hechos los lenguajes” (p. 18). Por sua vez, significação

se refere a “la relacion entre el signo y el fenómeno cuya representación el signo trae a nuestra mente. En un sentido amplio todo acto humano es, o puede ser, vehículo transmissor de una significación[...] pero lo que caracteriza al lenguage es su intencionalidad; los signos que lo componen son más o menos deliberados (es decir, símbolos), y así el lenguagem tiene por objeto la comunicación a través del significado” (p. 18). Vale

destacar que os símbolos por si só não compõem a linguagem. Para formar linguagem, os signos devem estar preordenados, compostos por uma estrutura mais ou menos orgânica – atribuem uma função como partes da linguagem.

(16)

significados;11 (ii) a semântica, que estuda a relação dos signos e seu objeto (significação);12 e (iii) a pragmática, que estuda a relação entre os signos com os personagens e, entre os personagens e os seus destinatários.13

O Direito, enquanto fenômeno da cultura humana, pode ser abordado sob as mais diversas formas de linguagem.14 Para o presente estudo, a compreensão do Direito enseja

11 Aprofundando, a sintaxe dedica-se ao estudo da forma de combinação dos símbolos de determinada linguagem

e pode ser divida em três classes de elementos: a) conjunto de signos primitivos, que não precisam ser descritos por outras palavras da mesma linguagem; b) regra de formação, que é a combinação das expressões de acordo com a regra; e c) regras de derivação, em que se substitui a palavra por outras, mantendo-se o mesmo significado.Na linguagem formal (aritmética), por exemplo, é apenas possível a análise sintática, não subsistindo a interpretação (onde há atribuição de valor), ou seja, é vedada a semântica e a pragmática. Assim, a sintaxe pode destinar-se tanto à análise dos significados primitivos, quanto às regras de formação (nas linguagens naturais), “la sintaxis descriptiva o lingüística examina la estructura de los lenguajes, em forma especial (con referência a un idioma determinado) o geral. La sintaxis pura o lógica estudia, en cambio, la estructura de cualquier lenguaje (incluídos, e incluso côn preferência, los formales), y se halla más próxima a la lógica y a la filosofía que a la lingüística”. GUIBOURG, Ricardo A.; GIGLIANI, ALEJANDRO M.; GUARINONI, RICARDO V. Introducción al conocimiento científico. Buenos Aires: Eudeba, 2000, p. 30-33.

12 Conforme conceitua Guibourg, “a semántica es el estudio de los signos en relación con los objetos designados, o, por decirlo de un modo más claro, es el estudio del significado.” Algumas considerações que o Autor faz a respeito do tema são importantes ao presente trabalho. Quando aprendemos o nome de alguma coisa, não aprendemos propriamente algo sobre a coisa. Na verdade, o que se aprendeu é o costume linguístico de certo povo sobre o nome que corresponde à determinada coisa (não se pode confundir a realidade física com a linguística). E, por outro lado, também modificamos as nominações destas coisas – assim, não existem

normas verdadeiras sobre as coisas, e sim nomes comumente aceitáveis (“libertad de estipulación”). Esta liberdade de nomeação tem um risco (ou limite prático): dificultar nossos interlocutores em razão da dinâmica da regra do uso comum, pois, “cuanto menor se ala aceptación común de esse significado em el médio em que nos movemos, tanto mayor será la dificuldad de comunicación y tanto más necesaria alguna aclaración sobre

nuestro lenguaje personal”. Portanto, ainda que exista esta liberdade de nomeação, é de se reconhecer que

existe uma proximidade da linguagem, tendo em vista que “existe uma diferenciación natural entre los objetos

que sirven de base necesaria a cualquier linguaje”. É proveitosa a seguinte passagem “El lenguaje es la herramienta de la ciencia, y, em no pocos casos (linguística, literatura, derecho, informática) integra también, total o parcialmente, su objeto. Es provechoso, pues, que tomemos conciencia de las limitaciones del instrumento que usamos, de modo que sepamos manejarlo eficazmente y, sobre todo, que no nos dejemos

manejar por él”( GUIBOURG, Ricardo A.; GIGLIANI, ALEJANDRO M.; GUARINONI, RICARDO V. Introducción al conocimiento científico. Buenos Aires: Eudeba, 2000, p. 35-53).

13 A despeito da pragmática, as lições de Paulo de Barros Carvalho são pertinentes. Neste sentido, o doutrinador

bem destaca que o processo da decodificação da mensagem em grande parte está no plano pragmático,

transcrevendo Luiz Alberto Warat expõe: “analizar la problemática funcional del linguaje es en certo modo efectuar un planeamiento de nivel pragmático, para cuya elucidación debemos incursionar indefectiblemente

em torno a las condiciones subjetivas de su uso por parte de um sujeito determinado”. (WARAT, Luiz Alberto.

Semiótica y derecho. Buenos Aires: Eikón, 1972, p. 80)

14 A palavras (símbolo) “direito” tem inúmeros significados, o que, muitas vezes dificulta sua compreensão,

Tercio Sampaio Ferraz Jr., bem descreve esta problemática. Com efeito, o uso comum da palavra direito traz amplitude de significação nas três dimensões de linguagem: i) é sintaticamente “impreciso, pois pode ser

conectado com verbos (meus direitos não valem), com substantivos (o direito é uma ciência), com adjetivos (este direito é injusto), podendo ele próprio ser usado como substantivo (o direito brasileiro prevê...), como advérbio (fulano não agiu direito), como adjetivo (não se trata de um homem direito); ii) é, em termos

semânticos, “denotativamente vago”, pois possui muitos significados e “conotativamente ambíguo”, vez que “é

impossível enunciar uniformemente as propriedades que devem estar presentes em todos os casos em que a

palavra se usa” e; iii) pragmaticamente apresenta muita carga emotiva, dificultando seu emprego em uma medida neutra (FERRAZ JUNIOR, Tercio Sampaio. Introdução ao estudo do direito. 6. ed. 3. reimpr. São Paulo: Atlas, 2011, p. 15 -16).

(17)

abordagem no plano lógico sob duas formas de linguagem: a ciência do direito e o direito positivo. As lições trazidas por Aurora Tomazini de Carvalho bem destacam a distinção funcional entre direito positivo e ciência do direito:

(i) O direito positivo é um corpo de linguagem com função prescritiva, que se dirige ao campo das condutas intersubjetivas com a finalidade de alterá-las. Configura-se como linguagem objeto em ralação à linguagem social. É materializado numa linguagem do tipo técnica, que se assenta no discurso natural, mas utiliza-se de termos próprios do discurso científico. É operado pela Lógica Deôntica, o que significa dizer que as proposições estruturam-se sob fórmula „H → C‟, onde a consequência prescrita „C‟ aparece modalizada com os valores obrigatório (O), proibido (V) e permitido (P). Suas valências são validade e não validade, o que não impede a existência de contradições entre seus termos.15

(ii) A Ciência do Direito é um corpo de linguagem com função descritiva, que tem como objeto o direito positivo, caracterizando-se como metalinguagem em relação a ele. É objetivada num discurso científico, onde os termos são precisamente colocados. Sintaticamente é operada pela Lógica Alética, o que significa dizer que suas proposições manifestam-se sob a fórmula „S é P‟, onde predicado „P‟ aparece modalizado com valores necessário (N)e possível (M). Suas valências são verdade e falsidade e seu discurso não admite existência de contradições entre os termos.16

Carvalho: “eis que a pluralidade métodos científicos instrumentalizando a aproximação do exegeta ao próprio objeto cultural que é o sistema jurídico, decididamente, demonstra a complexidade da ontologia do direito. Entre a camada linguística do chamado direito positivo e a realidade social, tomada na proporção das condutas interpessoais, há uma multiplicidade de modos de aproximação, um número crescente de enfoques temáticos, representando cada qual uma forma de corte metodológico com que o ser cognoscente trava contato com o

objeto do conhecimento”. (CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário: linguagem e método. 4. ed. São Paulo: Noeses, 2011, p. 6).

André Franco Montoro bem discriminou 05 (cinco) significados distintos relevantes que podem ser conferidos ao direito, como sinônimo de ciência, como sinônimo de justo, como sinônimo de norma ou ordenamento jurídico, como sinônimo de direito subjetivo ou como sinônimo de fato social (MONTORO, André Franco.

Introdução à ciência do direito. 25. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p. 26).

15 Kelsen não admite a existência de contradição no Direito. Esta afirmação de Aurora advém da crítica de Lourival Vilanova a Kelsen. Segundo Vilanova, “Pondera Kelsen que não podemos descrever uma ordem

normativa afirmando: A deve-ser e A dever-não-ser como normas simultaneamente válidas. Veem-se, então,

dois sistemas, o sistema S‟, do Direito Positivo, e o Sistema S‟‟, da Ciência do Direito. Suponhamos que S‟,

contenha as normas N e não-N (contraditórias). Colocamos no nível S‟‟, podemos tomar o dado-de-fato, constitucionalmente contraditório, e descrevê-lo em proposições jurídicas, que não se contradizem por descrever a existência de normas contraditórias do sistema-objeto. S‟‟, em relação a S‟ sistema-objeto, é um sobre-sistema, o metassistema material de linguagem que tem por tema de conhecimento a linguagem em que se expressa o Direito positivo. Assim, é inexato Kelsen dizer que a lei de não contradição (e de terceiro excluído) é aplicável diretamente às proposições jurídicas, e indiretamente às normas jurídicas [...] as

proposições jurídicas não se contradizem por descreverem a existência de normas contraditórias”.

(VILANOVA, Lourival. As estruturas lógicas e o sistema do direito positivo. São Paulo: Noeses, 2005, p. 281-282).

16 CARVALHO, Aurora Tomazini de. Curso de teoria geral do direito: o constructivismo lógico-semântico. 3.

(18)

Não seria demais destacar a lição de Lourival Vilanova no sentido de que o Direito (como experiência e linguagem prescritiva) e a Ciência do Direito (como experiência dogmática) “são dois sistemas: um, cognoscitivo; outro, prescritivo. Porém, o sistema de Ciência-do-Direito é incorporado no próprio Direito, na medida que passa a ser sua fonte material, resultando em um metassistema.17

Portanto, Ciência do Direito e Direito Positivo são duas faces de uma mesma moeda, não obstante exerçam funções sintáticas distintas, ambas são imprescindíveis para a compreensão e aplicação dos sistemas jurídicos, na forma que se passará a demonstrar.

2. Normas jurídicas

Se precisar o signo da palavra “direito” é uma das tarefas mais árduas do exegético do direito, precisar o signo norma jurídica não é menos desafiador. Um objeto pode ser abordado sob distintos cortes epistemológicos, podendo todos os resultados serem válidos. Do mesmo modo, o objeto norma jurídica possui infindáveis enfrentamentos doutrinários/científicos com os mais diversos apontamentos. Não é o objeto deste estudo esgotar o tema. Porém, alguns pontos precisam ser delimitados.

Como visto no tópico supra, a linguagem normativa exerce uma função prescritiva, estabelece o comando de condutas (desejáveis ou indesejáveis) ao corpo social, em outras palavras, atribui um comando a um destinatário. Toda norma de comportamento responde ao esquema lógico “H → C”, em que H é o antecedente (descrição abstrata de um fenômeno) lidado por uma relação de imputação a C, o consequente (consequência pela ocorrência

de H)18 – “se ocorrer o antecedente, então deve se dar a consequência. A norma jurídica, na

qualidade de fenômeno linguístico comunicacional, possui o mesmo padrão, porém, detem outras características que a distinguem das demais normas, sendo função do cientista do direito identificar as características exclusivas que permitam a delimitação de seu conteúdo:

17 VILANOVA, Lourival. As estruturas lógicas e o sistema do direito positivo. São Paulo: Noeses, 2005, p. 159. 18 A afirmação de que toda norma de comportamento possui a fórmula lógica „H → C‟ é de MARTINS, Ricardo

(19)

A ciência jurídica procura apreender o seu objeto “juridicamente”, isto é, do ponto de vista do Direito. Apreender algo juridicamente não pode, porém, significar senão apreender algo como Direito, o que quer dizer: como norma jurídica ou conteúdo de norma jurídica, como determinado através de uma norma jurídica.19

De fato, nem toda linguagem normativa pode ser classificada como jurídica. Em primeiro lugar, normas jurídicas, diferentemente das demais normas, devem

necessariamente pertencer a uma “determinada ordem jurídica, e pertence a uma

determinada ordem jurídica quando a sua validade se funda na norma fundamental desta ordem”.20 Por pertencerem a um determinado sistema jurídico legitimado, as normas jurídicas autorizam o exercício do uso da força exclusiva do Estado para que, diante da ocorrência do antecedente da norma, se execute o seu consequente. É o que Goffredo Telles Jr. classifica

como “imperativo autorizante”.2122 Ou ainda, nas palavras de Noberto Bobbio são norma

jurídicas aquelas “cuja execução é garantida por uma sanção externa e institucionalizada”.23 Note-se que o consequente da norma jurídica não representa de imediato a aplicação de uma sanção, mas apenas a possibilidade do uso da força estatal sancionatória: trata-se do caráter coercitivo da norma jurídica, ou seja, o impacto no âmbito psicológico nos membros do corpo social que induzem ao cumprimento da norma, face a possibilidade de coação ou sanção. Portanto, para que uma norma seja jurídica, basta ser possível acionar o poder estatal a fim de que se execute o seu consequente diante da ocorrência do antecedente do mundo fenomênico.

19 KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. 8.ed. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2009, p. 79. 20 KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. 8.ed. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2009, p. 33. 21 TELLES Jr., Goffredo. Direito Quântico. 6ª ed. São Paulo, Max Limonad, 1985.

22 MARTINS, Ricardo Marcondes. Efeitos dos vícios do ato administrativo. São Paulo : Malheiros - Temas de

Direito Administrativo 19, p. 26, ao lecionar sobre a questão destaca que imperativo autorizante é a

característica que distingue a norma jurídica das normas morais ou religiosas, pois ela “autoriza a obtenção de

uma tutela jurisdicional”.

23 BOBBIO, Noberto. Teoria geral do direito; tradução Denise Agostinetti; revisão da tradução Silvana Cobucci

(20)

3. Regras e Princípios

Uma classificação importante de norma jurídica para compreensão do fenômeno Direito é a distinção entre regras e princípios jurídicos.24 Ultimamente a discussão sobre esta classificação tem ganhado força em virtude de novos conceitos apresentados por escolas pós-positivistas.25

Com a maestria que lhe é peculiar, Ricardo Marcondes Martins26 bem relata a evolução do referido tema. Para tanto, adota o critério histórico-científico de classificação entre as correntes que versaram sobre a questão dos princípios. O autor aponta a existência de três grandes fases que tratam sobre o conceito de princípio jurídico.27

24 Segundo Jean Rivero, um marco importante para o desenvolvimento da teoria dos princípios foi o Conselho de

Estado Francês (conforme Ricardo Marcondes Martins, o berço do Direito Administrativo). Este órgão jurisdicional possui competência para tratar das matérias vinculadas às questões de Estado, ou seja, das matérias atualmente e pelo direito administrativo. Ocorre que, diferentemente do direito civil (cujos registros datam desde o direito romano), o direito administrativo não tinha instituições jurídicas consolidadas, tampouco o direito posto tinha evoluído o suficiente para regular as questões ali tratadas. Nesse sentido, a jurisprudência do Conselho Francês foi calçada em valores que até então não vigoravam (ao menos expressamente) no ordenamento vigente, de modo que o Tribunal possuía um amplíssimo campo de liberdade para suas decisões. Esta vasta jurisprudência, inicialmente esparsa, foi a origem das normas hoje conhecidas como princípios. Evidentemente que no início não havia a concepção deste tipo de norma como há atualmente, nem mesmo e

terminologia “princípio” era adotada (isso foi ocorrer apenas em 1942, sendo o Tribunal criado em 1799 pela Constituição Francesa), mas, dali saíram os primeiros traços do instituto que, até hoje, é uma obra inacabada. (MARTINS, Ricardo Marcondes. Arbitragem e administração pública: contribuição para o sepultamento do tema. Interesse Público. Belo Horizonte, v. 64, p. 85-104, nov-dez, 2010). (RIVERO, Jean. Los princípios generales del derecho en el derecho administrativo francés contemporáneo. Revista de Administración Pública. Madri, v. 6, sept.-dic., 1951, p.289 a 299). Nesse sentido também são as lições de Celso Antoônio Bandeira de Mello (BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de direito administrativo. 31. ed. São Paulo: Malheiros, 2013, p. 38-42).

25 Esta nomenclatura (ou classificação) é de Luís Roberto Barroso. Segundo leciona o Autor, a proposta do

positivismo jurídico em separar radicalmente a norma jurídica de deveres éticos não teve condições de atender as expectativas na complexidade da sociedade moderna a partir da segunda metade do século XX. Sem que fosse excluído concepções estruturais introduzidas pelo positivismo jurídico, passou-se a buscar uma reaproximação entre ética e Direito, por meio da materialização de princípios constitucionais. (BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e aplicação da constituição: fundamentos de uma dogmática constitucional transformada. 7. ed. ver. – São Paulo: Saraiva, 2009). Vale destacar que esta classificação não é precisa, seja pela imprecisão da nomenclatura (pós-positivismo remete a uma suposta extinção do positivismo, o que não é verdade, como dito, muitos conceitos e institutos positivistas foram incorporados por esta nova corrente) e também uma imprecisão material, tendo em vista que são significativamente distintas as correntes que surgiram na metade do século XX que defenderam a aproximação entre direito e ética, tornando-se imprecisa a unificação das correntes em um só grupo. Porém, como esta nomenclatura tem sido a mais usual, foi mantida, até mesmo por que não se tem conhecimento de uma classificação mais precisa. Outras nomenclaturas também

poderiam ser destacadas, tais quais “neoconstitucionalista” ou mesmo “discursivistas”, porém, a despeito

destas nomenclaturas, as críticas conceituais permaneceriam as mesmas.

26 MARTINS, Ricardo Marcondes. Efeitos dos vícios do ato administrativo. São Paulo: Malheiros - Temas de

Direito Administrativo 19, p. 29-31.

27 Para embasar o quanto exposto, basta a esclarecedora lição de Virgílio Afonso da Silva: “Em geral,

classificações – desde que metodologicamente sólidas – dificilmente podem ser julgadas com base em um

(21)

A primeira fase é encabeçada por Oswaldo Aranha Bandeira de Mello e Ruy Cirne Lima,28 que conceituam os princípios como “fundamentos de uma dada disciplina

jurídica, seus aspectos mais importantes”. 29

Já a segunda fase, representada por Marcos Diniz de Santi e Celso Antônio Bandeira de Mello, os princípios integram o ordenamento jurídico (portanto são normas jurídicas) e possuem carga valorativa, de maneira que atuam como vetores informadores de todo o sistema, ainda que não possuam estrutura lógica prescritiva implicacional da norma jurídica.30 Vale reproduzir a definição de Celso Antônio Bandeira de Mello:31

Princípio é, pois, por definição, mandamento nuclear de um sistema, verdadeiro alicerce dele, disposição fundamental que se irradia sobre diferentes normas, compondo-lhes o espírito e servindo de critério para a exata compreensão e inteligência delas, exatamente porque define a lógica e a racionalidade do sistema normativo, conferindo-lhe a tônica que lhe dá sentido harmônico‟. Eis porque „violar um princípio é muito mais grave que transgredir uma norma. A desatenção ao princípio implica ofensa não apenas a um específico mandamento obrigatório, mas a todo o sistema de comandos. É a mais grave forma de ilegalidade ou inconstitucionalidade, conforme o escalão do princípio violado, por que representa insurgência contra todo o sistema, subversão de seus valores fundamentais, contumélia irremissível a seu arcabouço lógico e corrosão de sua estrutura mestra.32

acepção de princípio baseada nas formulações de Alexy e Dworkin (que de resto não são idênticas, mas têm grandes pontos de similitude). Ocorre que estes eminentes juristas não expropriaram (até mesmo por impossível) o direito ao uso de tal expressão, de molde a tornar admissível apenas a acepção que lhe emprestam. Então, é possível que algo seja qualificado como princípio, de acordo com uma dada acepção de princípio, descoincidente com a que lhe irrogaram estes mencionados autores.” (BANDEIRA DE MELLO,

Celso Antônio. Curso de direito administrativo. 31. ed. São Paulo: Malheiros, 2013, p. 54).

28 Este trecho da obra do referido autor conforma a proposição de Ricardo Marcondes Martins: “Forma-se

Direito Administrativo do acúmulo de regras de direito sôbre o princípio da utilidade pública. Logo, porém, é suplantado o princípio básico pelas normas jurídicas que já sôbre êle se amontoam, relativas ao Estado, em cuja atividade encontra a utilidade pública, por excelência, o veículo de sua realização. Deixa ver o modo de

formação do direito especial que a especialidade não lhe tira autonomia”. (CIRNE LIMA, Ruy. Princípios de direito administrativo brasileiro. 3.ed. São Paulo: José Bushatsky, 1954, p. 17.)

29 MARTINS, Ricardo Marcondes. Efeitos dos vícios do ato administrativo. São Paulo: Malheiros Editores

Temas de Direito Administrativo 19, p. 549. p.29-31. Referência bibliográfica sugerida pelo autor: BANDEIRA DE MELLO, Oswaldo Aranha. Princípios Gerais de Direito Administrativo, vol. I, 3ª Ed., 2007; Ruy Cirne Lima, Princípio de Direito Administrativo Brasileiro, 7ª Ed., 2007.

30 SANTI, Marcos Diniz. Lançamento tributário. 2ª Ed., 2ª tir., p. 94: “Os princípios jurídicos não são normas

jurídicas naquele estrito sentido apresentado: proposições prescritivas que apresentam a forma implicacional hipótese-tese. Princípios são fragmentos normativos, unidades de significação de enunciados prescritivos, que integram o arcabouço de normas jurídicas, alterando, constituindo (positiva e negativamente) e delineando a

estrutura dual da regra, seja pelo seu antecedente, seja pelo seu consequente normativo” (MARTINS, Ricardo

Marcondes. Efeitos dos vícios do ato administrativo. São Paulo: Malheiros - Temas de Direito Administrativo 19, p. 28).

31 BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de direito administrativo. 31. ed. São Paulo: Malheiros,

2013, p. 54.

32 MARTINS, Ricardo Marcondes. Efeitos dos vícios do ato administrativo. São Paulo: Malheiros - Temas de

(22)

A terceira fase tem como ponto de partida a teoria de Robert Alexy, a qual é estruturada na diferença entre regras e princípios.33 De acordo com o próprio Alexy, as regras são normas que não possuem qualquer grau de flexibilidade, ou seja, tratam do típico caso de

subsunção: ocorrido o fato, aplica-se a norma, não ocorrido o fato, não há consequente. Já princípios são normas cujo comando representa um mandamento de otimização, ou seja, são normas flexíveis, que determinam o cumprimento de um dever da melhor maneira possível, relevadas as condições fáticas.34

A escolha de uma solução jurídica quando não subsumida a uma regra, sempre ensejará a incidência de mais de um princípio, o que, por sua vez, exige a realização de um procedimento de ponderação.35 Ponderar significa identificar (e não escolher, escolher arbitrariamente) dentre quais dos valores/princípios colidentes sofrerá maior incidência ou maior restrição diante dos fatos concretos.

Tanto regra quanto princípio são normas jurídicas. E, enquanto normas obedecem a formalização “H→C”. Esta afirmação não sofre dificuldades com relação às

regras (cujo processo de imputação é tipicamente subsumido) porém, quanto à estrutura lógica dos princípios é necessário tecer algumas explicações.

Todo princípio está carregado de um valor axiológico positivado. Por ser positivado encontra estrutura deôntica, portanto, seu comando normativo segue a seguinte proposição: deve ser que um determinado princípio seja cumprido da melhor maneira possível

em razão das circunstâncias fáticas.36

33 Ricardo Marcondes Martins ressalta, conforme expressão de Paulo de Barros Carvalho (Direito Tributário

Fundamentos Jurídicos da Indiência, 2.ed. São Paulo: Saraiva, 1999, p. 17) que na concepção da terceira fase, tanto norma quanto princípios “são normas jurídicas, e, nesse sentido, passíveis de aplicação direta no mundo

fenomênico, consistindo ambos em manifestações irredutíveis do deôntico”. (MARTINS, Ricardo Marcondes. Efeitos dos vícios do ato administrativo. São Paulo: Malheiros - Temas de Direito Administrativo 19, p. 28).

34 ALEXY, Robert. Constitucionalismo discursivo. 2 ed. rev. Porto Alegre: Livraria do advogado, 288, p. 64-65. 35 O juízo de ponderação se dá pela aplicação da regra de colisão entre princípios. Virgilio Afonso da Silva

descreve referida regra da seguinte maneira: “„(P1 P P2) C‟. Isso significa, pura e simplesmente, que nos casos

de colisão entre dois princípios – P1 e P2 – o princípio P1 prevalece sobre o princípio P2 apenas nas condições daquele caso C. É possível – provável -, contudo, que em uma situação C‟ seja o princípio P2 que prevaleça sobre o princípio P1, ou seja: (P2 P P1) C‟. A despeito de se tratar, nos dois casos, dos mesmos princípios não é possível formular, em abstrato, uma relação de precedência entre eles. Essa relação é sempre

condicionada à situação concreta”. (SILVA, Virgilio Afonso da. Direitos fundamentais: conteúdo essencial, restrições e eficácia. São Paulo: Malheiros, 2009, p. 50.)

36 MARTINS, Ricardo Marcondes. Efeitos dos vícios do ato administrativo. São Paulo: Malheiros - Temas de

(23)

Ao contrário das regras, princípios não determinam o meio, mas sim a finalidade a ser atingida. Deste modo, princípios são normas de estrutura,37 ou seja, acarretam a prolação de outra regra jurídica. Isto ocorre de duas formas distintas: i) incidem sobre a edição de uma norma – em que o antecedente é a edição de uma regra e o consequente é o dever da regra estar em conformidade com o sopesamento dos princípios colidentes e; ii)

incidem diante de um fato não regulamentado – assim, a solução do caso concreto acarretará, diante do sopesamento de princípios, a edição de uma regra.38

Este caráter estrutural dos princípios são imprescindíveis à compreensão do ordenamento, pois, “se uma regra sempre é a concretização de um valor, um conflito entre regras é, sempre, um conflito entre princípios”.39 Pode ser que uma regra X, a priori, aplicável a determinados casos, seja afastada por um questão de princípios. Pode ser que, diante da peculiaridade do caso concreto o resultado do sopesamento entre os princípios colidentes acarretem a prolação de uma nova regra Y. Sendo assim, “nem sempre a regra exige um

cumprimento pleno”,40 podendo ser afastada diante das circunstância do fato concreto exige a

incidência maior de um princípio que tenha sido suprimido quando da edição da regra geral pré-existente.

Vale ressaltar que esta concepção a respeito do conceito de princípio (terceira fase) não substitui o quanto desenvolvido pelas escolas anteriores. Na verdade, o que se observa é a presença de abordagens distintas do objeto de estudo que ainda levam a mesma rotulagem (signo).41 Vale a máxima, não existe melhor ou pior classificação, basta que os critérios científicos distintivos sejam rigorosos e úteis. No caso todos conceitos

37 Normas de Estrutura advém da classificação de dicotômica de normas de comportamento que versam sobre

um conduta específica e normas de estrutura– que versam sobre a edição de novos normas.

38 MARTINS, Ricardo Marcondes. Efeitos dos vícios do ato administrativo. São Paulo: Malheiros - Temas de

Direito Administrativo 19, p. 31.

39 MARTINS, Ricardo Marcondes. Efeitos dos vícios do ato administrativo. São Paulo: Malheiros - Temas de

Direito Administrativo 19, p. 31

40 MARTINS, Ricardo Marcondes. Efeitos dos vícios do ato administrativo. São Paulo: Malheiros - Temas de

Direito Administrativo 19, p. 31

41 Esta preocupação foi bem alinhavada por Celso Antônio Bandeira de Mello: “é obvio, pois, que seria

gravíssimo erro pretender avaliar o objeto destarte identificado como princípio, para atribuir-lhe características distintas das que lhe foram irrogadas por que dele se serviu, valendo-se de critério que estivesse assentado em

outra acepção de princípio, qual a que lhe conferem Alexy e Dworkin. Isto implicaria falar de „A‟, supondo

-se referido a „B‟. Quem cometer tal erro em obra teórica – e isto tem ocorrido ultimamente – sobre estar

incurso em séria impropriedade, induzirá terceiros incautos a incidirem no mesmo deplorável equívoco”.

(24)

principiológicos apresentados permanecem revestidos de utilidade para a compreensão e aplicação do sistema jurídico, são complementares entre si e não se excluem.

4. Postulados normativos

Além da distinção normativa entre princípios e regras, para a compreensão do ordenamento jurídico é necessário fazer apontamento a um segundo tipo de norma conhecida como postulado normativo.

Postulados normativos não são normas jurídicas, na verdade, são condições essenciais que devem ser observadas para a interpretação e para a compreensão de um determinado objeto sob estudo.42 No âmbito jurídico, o primeiro apontamento sobre este tipo de norma foi de Celso Ribeiro Bastos,43 segundo o qual, postulado:

“é um comando, uma ordem mesma, dirigida a todo aquele que pretende exercer a atividade interpretativa. Os postulados precedem à própria interpretação, e se se quiser, à própria Constituição. Não se poderá interpretar devidamente, sem se atentar para estes elementos. Trata-se de condição para a interpretação”

Portanto, postulados são pressupostos hermenêuticos ao estudo de determinado objeto, são meta-regras,44 ou na classificação de Humberto Ávila,45 são normas de segundo grau (regra que versa sobre a constituição de uma outra regra). Sob o aspecto jurídico, os postulados normativos independem de previsão legal e não podem ser afastados por uma norma jurídica, pois são pressupostos à compreensão do próprio ordenamento jurídico.

42 ÁVILA, Humberto. Teoria dos princípios: da definição à aplicação dos princípios jurídicos. 15. ed. rev. atual.

e ampl. São Paulo: Malheiros. p. 164.

43 BASTOS, Celso Ribeiro. Hermenêutica e interpretação constitucional, São Paulo: Celso Bastos Editor, 1997,

p.95. Esta observação a despeito do pioneirismos do renomado jurista é de Ricardo Marcondes Martins, Efeitos dos vícios do ato administrativo. São Paulo: Malheiros - Temas de Direito Administrativo 19, p. 167.

44 Virgílio Afonso da Silva discorda da terminologia adotada por Humberto Ávila. Não obstante admita que os

postulados possuem estruturas diferentes da regras de condutas, posiciona-se no sentido de que ainda assim, postulados possuem estruturas de regras. (Direitos fundamentais: conteúdo essencial, restrições e eficácia, p. 169)

45 ÁVILA, Humberto. Teoria dos princípios: da definição à aplicação dos princípios jurídicos. 15. ed. rev. atual.

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4.1 Postulados normativos hermenêuticos

Os postulados normativos distinguem-se entre postulados hermenêuticos e

postulados normativos aplicativos. Ambos visam a adoção de instrumentos para interpretação e a aplicação do sistema jurídico. Postulados normativos aplicativos são destinados a soluções na aplicação imediata casuística do direito, ou seja, já durante a execução da norma; enquanto postulados hermenêuticos, via de regra, destinam-se a interpretação e a compreensão abstrata do ordenamento jurídico.46

No âmbito dos postulados hermenêuticos a doutrina é significativamente farta e abrangente. Para efeito deste estudo vale ressaltar que são sempre invocados postulados que conferem uma concepção sistêmica e orgânica ao ordenamento jurídico, tais quais, postulado da unidade do ordenamento jurídico,47 da supremacia da constituição e da

justiça.48

4.2 Postulados normativos aplicativos

No âmbito dos postulados normativos aplicativos, dois postulados são de significativa relevância para o presente estudo: os postulados da proporcionalidade e o da

razoabilidade.49

Os postulados da proporcionalidade e da razoabilidade têm como função auxiliar o aplicador do direito diante de uma solução de ponderação entre princípios, aferindo se a medida encontrada pelo operador do direito a solução de um determinado caso prático observou, da melhor maneira possível, os valores jurídicos (princípios) incidentes.

46 Esta classificação foi adotada de Humberto Ávila. Teoria dos princípios: da definição à aplicação dos

princípios jurídicos. 15. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Malheiros. p. 167.

47 Humberto Ávila. Teoria dos princípios: da definição à aplicação dos princípios jurídicos. 15. ed. rev. atual. e

ampl. São Paulo Malheiros.

48 Ricardo Marcondes Martins, Efeitos dos vícios do ato administrativo. São Paulo: Malheiros - Temas de

Direito Administrativo 19, p. 167.

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4.2.1 Postulado da proporcionalidade

O postulado da proporcionalidade consiste em um procedimento de três fases (na qual está compreendido o postulado da razoabilidade), são eles: adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito. Vale destacar que o procedimento consiste na verificação sequencial das fases, na ordem supra suscitada, passando-se a verificação da próxima fase tão somente se for satisfeita a fase sob exame.50

4.2.2 Adequação

Todo princípio jurídico objetiva o atingimento de uma finalidade. Sendo assim, o postulado da adequação consiste em avaliar se a medida selecionada é, em primeiro lugar, legitimamente constitucional e, em segundo lugar, fomente a realização do objetivo perseguido. Se o meio selecionado não for constitucionalmente legítimo ou não satisfazer a finalidade almejada, a medida é desproporcional. Do contrário, preenchido o requisito de adequação, passa-se análise do próximo subpostulado, qual seja, necessidade.51

4.2.3 Necessidade

O exame da necessidade é um “teste comparativo”.52 Ou seja, busca

comparar a medida selecionada com outras medidas igualmente adequadas, e a fim de constatar se a escolha do operador do direito é de fato a que possui maior eficácia. Sempre

50 Ricardo Marcondes Martins, Efeitos dos vícios do ato administrativo. São Paulo: Malheiros - Temas de

Direito Administrativo 19, p. 167

51 Há um questionamento na doutrina a respeito da necessidade do medida adotada cumpra totalmente

determinado objetivo (MENDES, Gilmar Ferreira, O princípio da proporcionalidade na jurisprudência do

Supremo Tribunal Federal: nova leituras‟. Repertório IOB de Jurisprudência: Tributário, Constitucional e

Administrativo 14 (2000), p. 371. Virgilio Afonso da Silva rebate este posicionamento alegando para tanto que isto seria contraproducente. (Direitos fundamentais: conteúdo essencial, restrições e eficácia, p. 170). Na verdade, nos parece que a discussão a respeito do cumprimento total de um determinado objetivo não é adstrito a exame da fase adequação e sim da fase da necessidade. O exame de necessidade consiste na aferição da existência de uma outra medida que satisfação igualmente determinado objetivo sem que acarrete tanto sacrifício dos demais princípios incidentes. Ora, se há outra medida mais eficaz a medida sob análise é desproporcional ou, se não há outra medida mais eficaz, não há como deixar de dar cumprimento ao princípio (que determina seu cumprimento da melhor maneira possível) ainda que parcialmente, por não existir outra medida melhor. Parece, portanto, que referida discussão é inócua no campo da adequação, satisfazendo no campo da necessidade.

(27)

que uma medida é selecionada, busca a promoção de uma finalidade. Esta finalidade é oriunda da prevalência de um princípio em detrimento dos demais princípios incidentes no caso concreto. É mais eficaz a medida que melhor atinja a finalidade com menor sacrifício dos demais princípios atingidos ou tenha a mesma eficácia a despeito do cumprimento de uma finalidade, mas, sacrifique menos os princípios incidentes. A necessidade visa, portanto, selecionar a medida que potencialize a finalidade almejada ou uma alternativa que seja menos gravosa em termos de sacrifício de princípios.

4.2.4 Proporcionalidade em sentido estrito

Por fim, superado a aferição da adequação e da necessidade da medida selecionada, passa-se ao exame de sua proporcionalidade em sentido estrito. Esta regra objetiva avaliar se os níveis de valorização de um princípio e sacrifício de outros justificam a medida apontada.

Este exame foi bem alinhavado por Robert Alexy em sua “Lei da

Ponderação”. Segundo esta Lei “quanto maior é o grau de não-satisfação ou de afetação de

um princípio, tanto maior tem que ser a importância e satisfação do outro”.53 Ora, o sacrifício de um princípio de ser justificado, ou proporcional, à medida da promoção de outro. Há de se ressaltar que a Lei de Ponderação ou o próprio subpostulado da proporcionalidade não afasta, por si só, a apreciação subjetiva a despeito do juízo da correlação de pertinência entre a supressão de um princípio e a satisfação de outro. É inclusive por esta razão que parte da doutrina entende que o postulado da proporcionalidade deva se restringir ao exame de adequação e de necessidade, os quais, em tese, teriam juízos objetivos e, portanto, passíveis de controle;54 duas objeções são críveis a este entendimento. A primeira delas é consubstancia-se no fato de que tanto o exame de adequação quanto o exame de necessidade comportam certo nível de subjetividade. Ainda que possam parecer objetivo na teoria, na prática comparar a adequação e necessidade de determinadas soluções jurídicas de densa complexidade pode representar um verdadeiro desafio. A segunda objeção

53 ALEXY, Robert. Constitucionalismo discursivo. 2 ed. rev. Porto Alegre: Livraria do advogado, 2008.

54 MARTINS, Leonardo. Proporcionalidade como critério do controle de constitucionalidade. Cadernos de

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concentra-se no sentido de que, ainda que a proporcionalidade em sentido estrito possa representar ainda um juízo de subjetividade, sua fórmula reduz satisfatoriamente o âmbito de alcance do juízo subjetivo, de modo que se ampliou a possibilidade de sua fiscalização e controle do mérito das decisões estatais – e isto é uma grande conquista do Direito que propõe como uma solução ao arbítrio.

Ademais, o juízo de proporcionalidade em sentido estrito não é um postulado satisfativo ao exame/controle das decisões estatais quando da aplicação da norma ao caso concreto. Existem tantos outros postulados que, na mesma maneira, instrumentalizam o controle objetivo das decisões estatais, entre eles, cite-se o postulado da razoabilidade.

4.2.5 Postulado da Razoabilidade

Superado o exame de proporcionalidade em sentido estrito e, portanto, constatada que a medida selecionada pelo operador do direito é legítima, adequada, necessária e proporcional, resta ainda aferir a sua razoabilidade. O postulado da razoabilidade tem caráter complementar ao postulado da proporcionalidade estrita. Sua finalidade é aferir se o juízo realizado pelo julgador não está eivado de densa subjetividade.

A doutrina sobre o tema também é infindável, o seu aprofundamento ensejaria dissertação própria, o que implica em extrapolar os termos da presente pesquisa. Todavia, os precisos ensinamentos de Humberto Ávila bem representam o tema. Segundo leciona, o postulado da razoabilidade possui três dimensões distintas, dever de equidade,

(29)

razoabilidade exige que uma relação de congruência entre “a medida adotada e o critério que

a dimensiona”, há aqui uma correspondência entre duas grandezas. 55

Não obstante seus apontamentos, Humberto Ávila não apresenta qualquer parâmetro para apuração do que é normal, equitativo ou equivalente. A despeito do que se compreende como princípio da razoabilidade, a adoção de tais parâmetros não compreendem a dimensão subjetiva do agente julgador e sim as concepções atinentes compor social em que está inserido, extraindo-se um conceito geral de bom senso.56 Em outras palavras, a abrangência de tais parâmetros não implicam em permissão à apreciação subjetiva/arbitrária do agente, cujo dever é a adoção de elementos críveis ao senso comum.

5. Constituição e ordenamento jurídico

Até o presente momento, este estudo compreendeu a abordagem separada de elementos que compõem o Direito (objeto de estudo), quais sejam, forma de linguagem, norma jurídica, princípios, regras e postulados. Estas representam parte do fenômeno Direito, mas não são suficientes ao entendimento de sua completude, como objeto singular do estudo científico. Para tanto, é preciso trazer à tona considerações a despeito do conceito de

ordenamento jurídico.

Como bem destaca Noberto Bobbio “o que costumamos chamar de direito é um caráter de certos ordenamentos normativos mais que certas normas”.57 Nesse sentido, normas jurídicas representam parte do ordenamento jurídico, mas não se pode afirmar que um ordenamento jurídico é o coletivo de normas jurídicas, afinal, “enquanto para a teoria tradicional um ordenamento jurídico se compõe de normas jurídicas, para a nova perspectiva normas jurídicas são aquelas que passam a integrar um ordenamento jurídico”.

O ordenamento jurídico é sistêmico e, enquanto sistema, deve ser considerado em sua totalidade. Desta feita, as normas jurídicas que compõem um sistema

55 Humberto Ávila. Teoria dos princípios: da definição à aplicação dos princípios jurídicos. 15. ed. rev. atual. e

ampl. São Paulo: Malheiros. p. 202-203.

56 Ricardo Marcondes Martins, Efeitos dos vícios do ato administrativo. São Paulo: Malheiros - Temas de

Direito Administrativo 19, p. 172.

57 BOBBIO, Noberto. Teoria geral do direito; tradução Denise Agostinetti; revisão da tradução Silvana Cobucci

(30)

jurídico devem ser interpretadas na forma dos postulados da coerência e unidade. Como anotou o Professor Geraldo Ataliba, sem esta compreensão sistêmica do ordenamento, as normas nada representam além de um amontoado caótico incompreensível, são providenciais suas lições:58

os preceitos normativos não podem ser corretamente entendidos isoladamente, mas, pelo contrário, haverão de ser considerados à luz das exigências globais do sistema, conspicuamente fixadas em seus princípios. Em suma, somente a compreensão sistemática poderá conduzir a resultados seguros. É principalmente a circunstância de muitos intérpretes desprezarem tais postulados metodológico que gera as disparidades constantemente registradas em matéria de propostas de interpretação.

O ordenamento jurídico em sua totalidade é coerente, de modo que não admite a incidência de duas normas incompatíveis em um caso concreto. Pelos postulados da coerência e da unidade compete ao operador do direito, observado o quanto exposto nos tópicos supra - a despeito da aplicação de regras e princípios, postulados hermenêuticos e de aplicação -, identificar a solução mais adequada em cada caso concreto. A possibilidade de duas normas incompatíveis não causa o colapso do sistema, como dito, um conflito de regras é sempre, em última instância um conflito de princípios, ou exclui-se uma regra em detrimento de outra a fim de que seja potencializado o princípio mais pesado no caso concreto, ou excluem-se ambas por meio de uma nova regra, caso as peculiaridades do caso concreto ensejem a incidência de um princípio antes minimizado pelas regras pré-existentes.

A concepção sistêmica do ordenamento jurídico – condição que dá primazia aos postulados unidade e da coerência – tem um ponto de partida: a Constituição. Na qualidade de norma fundante do Estado, é a Constituição que confere unidade ao sistema jurídico. Esta concepção foi bem desenvolvida por Kelsen, segundo a qual destacou que a

norma fundamental pressuposta é o fundamento de validade de todo o ordenamento jurídico. Tal concepção foi fundamental a concatenação dos sistemas constitucionais atuais. Vale transcrever os ensinamentos paradigmáticos do jusfilósofo:59

58 ATALIBA, Geraldo. República e constituição. 2. ed., 3 tir. atual. por Rosolea Miranda Folgosi. São Paulo:

Malheiros Editores, 2004, p. 179.

(31)

A norma fundamental é a fonte comum da validade de todas as normas pertencentes a uma mesma ordem normativa, o seu fundamento de validade comum. O fato de uma norma pertencer a uma determinada ordem normativa baseia-se em que o seu último fundamento de validade é a norma fundamental desta ordem. É a norma fundamental que constitui a unidade de uma pluridade de normas enquanto representa o fundamento da validade de todas as normas pertencentes a essa ordem normativa.

É na Constituição que estão estipuladas implícita e explicitamente as normas (tanto normas estruturais quanto de conduta) fundantes do Estado. Estas normas possuem relevância hierárquica sob os demais comandos normativos jurídicos. As normas infraconstitucionais são inferiores e devem obediência aos comandos normativos, tanto sob o aspecto formal (estrutural e de formação de normas) quanto o aspecto material.

Referências

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