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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC – SP Renato Gugliano Herani

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC – SP

Renato Gugliano Herani

A prova da inconstitucionalidade das leis

na Justiça Constitucional brasileira

DOUTORADO EM DIREITO

(2)

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC – SP

Renato Gugliano Herani

A prova da inconstitucionalidade das leis

na Justiça Constitucional brasileira

DOUTORADO EM DIREITO

Tese apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de Doutor em Direito do Estado, subárea Direito Constitucional, sob orientação do Professor Doutor André Ramos Tavares.

(3)

Banca Examinadora

_______________________________

_______________________________

_______________________________

_______________________________

(4)
(5)

Agradeço à Pontifícia Universidade Católica – PUC/SP, instituição que me acolheu na pesquisa; eu a acolho no coração.

Agradeço ao Prof. Dr. André Ramos Tavares; não bastassem todos os ensinamentos, estímulo e confiança, ainda me despertou para o tema desenvolvido neste trabalho; e à CAPES pelo investimento nesta pesquisa.

(6)
(7)

A PROVA DA INCONSTITUCIONALIDADE DAS LEIS

NA JUSTIÇA CONSTITUCIONAL BRASILEIRA

Renato Gugliano Herani

Resumo: A presente tese propõe reduzir as observações ao sistema constitucional brasileiro a um modelo de explicação dogmática da inter-relação entre dois tradicionais institutos do Direito, aparentemente, antagônicos: a prova e a inconstitucionalidade. O resultado investigativo é a sistematização da prova-da-inconstitucionalidade no direito constitucional processual brasileiro. O estudo parte da admissão de um déficit investigativo no Brasil sobre a prática da racionalidade probatória no juízo decisório da (in)constitucionalidade das leis. Fato que justifica perguntar sobre as concepções e as tendências referentes à postura metódica diante da prova como um elemento a mais na práxis do processo de decisão da inconstitucionalidade na Justiça Constitucional brasileira. A tese pretende uma análise crítica, metodologicamente, referida a essa práxis. A atenção investigativa está centrada nas questões fáticas e nos problemas probatórios em âmbito de Supremo Tribunal Federal no exercício do controle de constitucionalidade das leis. Lidar com tal problema é colocar no epicentro a significação da inconstitucionalidade e também o instituto da prova, que é problematizado do ponto de vista próprio da argumentação constitucional. O deslocamento do direito à prova do estrito direito processual comum para o terreno constitucional é uma questão deficitária na doutrina, que, neste trabalho, se pretende desafiar.

(8)

A PROVA DA INCONSTITUCIONALIDADE DAS LEIS

NA JUSTIÇA CONSTITUCIONAL BRASILEIRA

Renato Gugliano Herani

Abstract: This thesis proposes to reduce the observations to the brazilian constitutional system in a model of dogmatic explanation of the interrelationship between two traditional institutions of law, apparently, antagonistic: the proof and the unconstitutional. The result is the systematic of proof in the Brazilian right constitutional process. The study admits to have the investigative deficit in Brazil on the practice of evidential reasoning in making judgments of (un)constitutionality of laws. Which justifies asking about the ideas and trends related to a methodical approach to talk about the proof as one more element in the praxis of the decision about unconstitutionality of law in the context of Brazilian Constitutional Justice. The thesis intends to review a methodologically referred to this praxis. The investigative attention focuses on the factual issues and evidentiary issues in the context of Supreme Court, while exercising control of the constitutionality of laws. Addressing this problem is to place the significance at the epicenter of unconstitutionality and also the institute of proof, which are discussed in terms of their own legal and constitutional arguments. The displacement studies of the right to the proof in the strict procedural law to the constitutional land is a deficit constitutional issue in the doctrine, that, in this work, expected to challenge.

(9)

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ABNT - Associação Brasileira de Normas Técnicas ACO - Ação civil originária

ADC - Ação direta de constitucionalidade

ADCT - Atos de disposição constitucional transitórios AImp - Arguição de impedimento

ADIn - Ação direta de inconstitucionalidade

ADO - Ação direta de inconstitucionalidade por omissão ADPF - Argüição de descumprimento de preceito fundamental

AgR - Agravo regimental AI - Agravo de Instrumento AImp - Arguição de impedimento

Ap - Apelação Art. - Artigo

AR - Ação rescisória CC - Código Civil CF - Constituição Federal

Cf - Conforme CP - Código Penal

CPC - Código de Processo Civil Dec - Decreto

Des - Desembargador

DIEESE - Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos DJe - Diário da Justiça eletrônico

DO - Diário Oficial

DOU - Diário Oficial da União Dr. - Doutor

DVS - Destaque para votação em separado EC - Emenda Constitucional

ED - Embargos de declaração ER - Emenda regimental

FPM - Fundo de Participação dos Municípios

FUNDEF - Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental HC - Habeas Corpus

(10)

IBOPE - Instituto Brasileiro de Opinião Pública e Estatística INMETRO - Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia

Inq - Inquérito i. e. - isto é

j. - Julgado Kw - Quilowatt

LC - Lei Complementar MC - Medida Cautelar

MI - Mandado de injunção Min. - Ministro

MP - Medida Provisória MS - Mandado de Segurança NBR - Norma Brasileira p. ex. - por exemplo

p. - Página

PGR - Procuradoria-Geral da República PL - Projeto de lei

QO - Questão de ordem Rcl - Reclamação

RE - Recurso Extraordinário REsp - Recurso Especial

Rel. - Relator

RHC - Recurso em habeas corpus

RG - Repercussão Geral

RISTF - Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal Rp - Representação

STA - Suspensão de tutela antecipada SL - Suspensão de liminar

SS - Suspensão de segurança STF - Supremo Tribunal Federal

STJ - Superior Tribunal de Justiça TC - Tribunal Constitucional

(11)

A PROVA DA INCONSTITUCIONALIDADE DAS LEIS

NA JUSTIÇA CONSTITUCIONAL BRASILEIRA

SUMÁRIO

NOTAS INTRODUTÓRIAS

. . . . . . 17

A motivação . . . . . 17

A indagação . . . . . 19

Objetivos da tese . . . . . 21

Das conquistas ao passo pretendido . . . . . . 23

Panorama do trabalho . . . . . 24

Notas de normalização do texto . . . . 26

Primeira Parte

PRESSUPOSTOS TEÓRICOS:

DA PROVA E DA INCONSTITUCIONALIDADE

Introdução . . . . . 28

1

EPISTEMOLOGIA BÁSICA DA PROVA

. . . . . . . 30

1.1 O uso jurídico-processual do termo “prova” . . . 31

1.2 Finalidade da prova judicial . . . 36

1.3 Status jurídico da prova . . . 43

1.4 Epistemologia ontológica dos fatos: o problema da quaestio facti e quaestio iuris . . . . 47

1.4.1 Suporte em John R. Searle: um ponto de partida . . . . 48

1.4.2 Fato bruto vs. Fato institucional . . . . 49

1.4.2.1 Fatos brutos . . . . . 51

(12)

1.4.3 Fato como enunciado linguístico . . . . . . . 56

1.4.4 Critério de classificação dos fatos institucionais: fato-tipo e fato-caso . . . 60

1.4.5 Espécies de fatos jurígenos: legislativo, jurídico e consequencialista . . . . 63

1.4.6 Verificação dos fatos sociais . . . . . . . 75

1.4.7 Quaestio facti vs. Quaestio iuris: distinção impossível . . . 76

1.5 O problema do critério da verdade e a prova judicial . . . 78

1.5.1 Apontamentos sobre a verdade pelas correntes filosóficas . . . 81

1.5.2 O problema da verdade processual-constitucional . . . 85

2

CONTROLE

HÍBRIDO

DE

CONSTITUCIONALIDADE

BRASILEIRO

. . . 88

2.1 Nesse exato momento, algum brasileiro, em algum lugar do país: cumpre uma lei inconstitucional . . . . . . . 89

2.2 Universalização dos modelos clássicos de Justiça Constitucional: doutrina da exportação, circulação, recepção e hibridação . . . . 90

2.2.1 Justiça Constitucional, controle de constitucionalidade e jurisdição constitucional: notas distintivas . . . . 94

2.2.2 Modelos clássicos de controle jurisdicional de constitucionalidade . . . 103

2.2.3 Hibridação dos modelos clássicos: sistemas derivados . . . . . . . . . . 110

2.3 Justiça Constitucional brasileira: Supremo Tribunal Federal – sui generis Tribunal Constitucional . . . . . . . . 113

2.4 Fenômeno da “concretização” do controle abstrato de constitucionalidade . . . . . 115

2.4.1 Uma nota sobre o processo constitucional objetivo . . . . 116

2.4.2 Dogma da não-remissão fática na Justiça Constitucional brasileira . . . . 118

2.4.3 Superação do dogma da não-remissão fática: juízo de inconstitucionalidade aberto à faticidade . . . 129

3

DIMENSÃO

FÁTICA

NO

CONTROLE

DE

(IN)CONSTITUCIONALIDADE DAS LEIS

.. . . 142 3.1 O uso da expressão “inconstitucionalidade das leis” . . . 144

3.2 Princípio da constitucionalidade . . . . . . . 147

3.3 Conhecimento a priori e a posteriori da inconstitucionalidade . . . 154

(13)

3.4.1 Caso próprio do controle concentrado . . . . . . . . 162

3.4.2 Caso próprio do controle difuso . . . . 166

3.4.3 Caso jurídico-concreto de (in)constitucionalidade . . . 168

Segunda Parte

PROPOSTA DE UM MODELO

DE PROVA DA INCONSTITUCIONALIDADE

Introdução . . . . . 173

4

OBJETO DA PROVA NO CASO DE INCONSTITUCIONALIDADE

LEGISLATIVA

. . . 177

4.1 Fato a provar e o exame de relevância . . . 177

4.2 Critério do fato da lei produzida . . . . . . . 184

4.2.1 Existência do objeto de controle e parâmetro de controle . . . 184

4.2.2 A lei como fato social-institucional . . . . 188

4.2.2.1 Problema da controvérsia do fato da lei produzida . . . 194

4.2.2.2 Prova do fato da lei produzida . . . . 196

4.2.2.3 Prova do direito no controle concentrado de constitucionalidade . . . . 198

4.2.2.4 Prova do direito no controle difuso de constitucionalidade . . . 200

4.3 Faticidade no caso de inconstitucionalidade formal: critério do fato da produção irregular da lei . . . 202

4.4 Faticidade no caso de inconstitucionalidade por omissão: critério do fato da omissão legislativa . . . . . . . 211

4.4.1 Omissão legislativa absoluta ou total . . . 214

4.4.2 Omissão legislativa relativa ou parcial . . . . 219

4.5 Faticidade no caso de inconstitucionalidade material: critério do fato do abuso do poder de legislar . . . . . . 220

4.5.1 Locus do fato a provar no caso de inconstitucionalidade material: parâmetro de regras e princípios constitucionais . . . . 223

4.5.1.1 Enunciados constitucionais de subsunção genérica . . . 225

4.5.1.2 Distinção entre regras e princípios: ponto de apoio . . . 231

4.5.1.3 Justificativa exigida por regras paramétricas: baixa faticidade . . . 232

(14)

4.5.1.5 Parametricidade pelo princípio da igualdade . . . . . . . . 239

4.5.2 Pressupostos constitucionais fáticos condicionantes da validade da lei . . . . . . 250

4.6 Fato a provar na aplicação das técnicas de decisões de declaração de (in)constitucionalidade, na modulação dos efeitos, na determinação da repercussão geral e na concessão de medidas cautelares . . . 252 4.6.1 Modulação dos efeitos e as técnicas de decisão . . . . 252

4.6.2 Repercussão Geral . . . . 257

4.6.3 Concessão de medidas cautelares no processo objetivo . . . . 262

5

MEIOS DE PROVA DA INCONSTITUCIONALIDADE

. . . 266

5.1 Peculiaridades dos meios de prova no controle de constitucionalidade . . . . . . . 267

5.2 Meios típicos . . . 272

5.2.1 Prova documental . . . 273

5.2.1.1 Autores intelectual e material dos documentos . . . 276

5.2.1.2 Documento público e privado . . . . 277

5.2.1.3 Prova documental por requisição de informações adicionais . . . . . 282

5.2.2 Prova pericial . . . . 285

5.2.2.1 Pressupostos de admissibilidade e momento de proposição da prova pericial no controle concentrado . . . . 291

5.2.2.2 Prova pericial no controle difuso . . . 295

5.2.3 Prova oral . . . 296

5.2.3.1 Testemunho técnico . . . . 297

5.2.3.1.1 Testemunho do amicus curiae . . . 298

5.2.3.1.2 De pessoas com experiência e autoridade na matéria . . . . 312

5.2.3.1.3 Do perito judicial . . . . 315

5.2.3.2 Testemunho comum . . . . . . . 316

5.3 Meios atípicos . . . . . . . . 320

6

PRODUÇÃO DA PROVA DA INCONSTITUCIONALIDADE DAS

LEIS NA JUSTIÇA CONSTITUCIONAL BRASILEIRA

. . . . 322

6.1 Sincronia da prova-da-inconstitucionalidade . . . 324

6.1.1 Perspectiva interna . . . . . . 325

(15)

6.1.2.1 O problema da inferência probatória mínima . . . . 329

6.1.2.2 A inferência probatória na inconstitucionalidade formal . . . 334

6.1.2.3 A inferência probatória na inconstitucionalidade material . . . 337

6.1.2.3.1Proporcionalidade . . . . . 340

6.1.2.3.2Razoabilidade . . . . . 343

6.1.2.3.3Igualdade . . . . 345

6.1.2.3.4Inferência probatória e a metódica estruturante . . . . . 347

6.2 Diacronia da prova-da-inconstitucionalidade . . . . . . 354

6.2.1 Procedimento probatório da inconstitucionalidade em dinamicidade interna . . 355 6.2.1.1 Tempo da prova . . . . . . . . 357

6.2.1.1.1Tempo da prova no controle difuso . . . . . . 360

6.2.1.1.2Tempo da prova no controle concentrado . . . . . . . . 360

6.2.1.2 Lugar da prova . . . . . 362

6.2.1.2.1Audiência pública na Justiça Constitucional . . . . . 365

6.2.1.3 Sujeitos da prova . . . . . . . . 370

6.3 Superação da Súmula 279 do STF: proposta de revisão . . . . 380

7

VALORAÇÃO DAS PROVAS DA INCONSTITUCIONALIDADE

DAS LEIS PELO JUIZ CONSTITUCIONAL

. . . . 383

7.1 Fonte das normas de valoração das provas da inconstitucionalidade . . . . 384

7.2 Sistema da prova legal . . . . . . . 387

7.3 Sistema do livre convencimento . . . . . . 392

7.4 Sistema da persuasão racional . . . . . . . 395

7.4.1 Persuasão racional determinada pela intensidade do poder de controle . . . . 398

8

FILTROS

PRINCIPIOLÓGICOS

DO

PROCEDIMENTO

PROBATÓRIO DA INCONSTITUCIONALIDADE

.. . . 412

8.1 Princípio da autorregulação constitucional em matéria de prova . . . 414

8.2 Princípio da inferência probatória mínima . . . . . 417

8.3 Princípio da instrução oficial . . . 419

8.4 Princípio do ônus da prova da inconstitucionalidade . . . 421

8.4.1 Carga do ônus argumentativo da inconstitucionalidade legislativa . . . . 423

(16)

8.4.1.2 Sobre a inexistência da lei impugnada . . . . 425

8.4.1.3 Sobre a inconstitucionalidade material e formal da lei impugnada . . . . 426

8.5 Princípio da presunção fática . . . . 427

8.6 Princípio da instrumentalidade do poder instrutório . . . 428

8.7 Princípio da intercomunicação do poder instrutório . . . . 433

CONCLUSÕES

. . . . . . 436

REFERÊNCIAS

. . . . 442

ANEXO A CASOS E DECISÕES CITADAS

. . . 459

(17)

NOTAS

INTRODUTÓRIAS

A motivação:

A ideia medrada neste estudo ganhou força a partir de inquietações despertadas por ocasião da publicação de ensaio sobre as mutações morfológicas da inconstitucionalidade frente à recente hermenêutica constitucional e ao seu impacto metodológico na estrutura argumentativa das decisões no processo constitucional objetivo (HERANI, 2010, p. 209-228). Atentamos para a carência investigativa de certas categorias normativas dessa tipologia processual na Justiça Constitucional brasileira, “não trabalhadas no modelo clássico de controle concentrado-abstrato de constitucionalidade, e que lidam com a linguagem das provas, o controle dos fatos (comissivos e omissivos) e prognoses legislativos” (HERANI, 2010, p. 209-228).

A pergunta pela prova no contexto específico do controle de constitucionalidade não é novidade no atual estágio do constitucionalismo brasileiro. O Supremo Tribunal Federal já fala em “procedimento de instrução da ação direta de inconstitucionalidade”1, porque pratica

em larga escala a atividade probatória para “a colheita de dados fáticos”2. Tal afirmação muito

diz sobre a “avaliação performática do controle judicial” (DIMOULIS; LUNARDI, 2011, p. 332), quanto à qualidade argumentativa das decisões no que se refere às provas e o seu papel. Essa questão por si só provoca uma reflexão sobre as funções da Justiça Constitucional brasileira e a sua legitimidade. Há muito a doutrina nacional se inclina ao debate sobre o ativismo do Supremo na aferição da legitimidade constitucional das leis; porém, pouco avançou sobre o exame e a valoração de fatos e prognoses legislativos nos procedimentos processuais e na estrutura de decisão a partir da práxis, vale dizer, da prática cotidiana ou do modus operandi dos operadores do direito no exercício da jurisdição constitucional brasileira (MARTINS, MENDES, 2009, p. 325; MENDES, 2001, p. 1-24).

1 Expressão extraída da decisão monocrática de indeferimento de participação de especialista em audiência pública da Min. Cármen Lúcia, na ADPF 101/DF.

(18)

O direito constitucional brasileiro marchou, significativamente, para a superação da ideia clássica da inconstitucionalidade conceitualmente preconcebida no ânimo de cognição por operações meramente formal-dedutivas de premissas normativas. Premissas fixadas, com base na análise do texto legal e na doutrina pertinente, abstratamente, a partir da confrontação intertextual, e são operadas segundo o esquema silogístico de subsunção, que prioriza argumentos logicamente válidos, sem se ocupar da correção material valorativa das premissas.

Estudos doutrinários recentes descrevem a interpretação praticada pelo Supremo Tribunal Federal oposta ao “método hermenêutico clássico, de que se poderia separar, em departamentos estanques, os elementos fáticos e normativos envolvidos” (MENDES, 2001, p. 1-24). Podemos dizer que já é uma conquista da hermenêutica jurídica a intercomunicação entre elementos normativos e fáticos na realização do direito. Mas, reiteramos, ainda há um déficit metódico e sistemático sobre a racionalidade probatória aplicada na decisão da inconstitucionalidade das leis: eis a motivação maior deste trabalho. As investigações aqui realizadas partem desse problema, para focar o poder instrutório ou probatório, fitando, insistentemente, um sentido da prova nos casos de (in)constitucionalidade das leis.

Alguns países avançaram as pesquisas sobre o poder probatório do órgão máximo da Justiça Constitucional. Desde o final do século passado há paulatino amadurecimento, por exemplo, da doutrina italiana em relação ao papel central dos fatti nas decisões da Corte Costituzionale. Hoje já fala, em grau de especificidade considerável, em “fatos científicos na jurisprudência constitucional”3 (VACCARI, 2008), em relação aos quais a interpretação jurídica

não se compatibiliza se apoiada apenas nos cânones interpretativos savignyianos. Demanda um método especial para lidar com o “significado do conjunto de fatos a ser regulado pela norma e pela decisão” (MÜLLER, 2009, p. 48); método como técnica formal do proceder praticamente a resolução de casos jurídicos (MÜLLER, 2009, p. 292; NEVES, C, 1993, p. 17).

Mas a doutrina nacional ainda carece de investigação de fôlego tendente a sistematizar o poder instrutório do Supremo Tribunal Federal no controle de constitucionalidade, mormente no atual estágio de reconhecimento – legislativo e pretoriano – da indissociabilidade das referências fáticas na argumentação da constitucionalidade. Justifica refletir sobre as concepções e as tendências à postura metódica4 pronta para falar da prova como um elemento a mais na justificação da inconstitucionalidade. Portanto, a tese propõe uma análise crítica, metodologicamente referida, da práxis, ou seja, do modus operandi da Justiça Constitucional brasileira, com a atenção voltada às questões fático-probatórias.

3 “fatti scientifici nella giurisprudenza costituzionale”.

(19)

A indagação:

Indagar sobre a inconstitucionalidade em relação com a prova encobre, no fundo, o infenso ao clássico conceito de vício intrínseco à norma infraconstitucional, ou preexistente nos caracteres do próprio texto legal, pronto para ser descortinado ou desvendado pela racionalização lógica da relação intertextual com a Constituição, por mera operação formal-dedutiva de premissas normativas. Operação em que o discurso jurídico, próprio do positivismo legalista, desafia apenas quaestio iuris, para a qual se abstrai o texto e o torna indiferente à racionalidade empírica, vale dizer, a qualquer referência aos “factores ou a elementos normativos extratextuais e transpositivos” (NEVES, C., 1993, p. 30), como “relações intersubjetivas humanas” inseridas na “historicidade e faticidade” (STRECK, 2009, p. 322), os valores e a “natureza das coisas” (MÜLLER, 2008, p. 118), em pretensa reconstrução do que fora intencionado, consciente ou não, pelo produtor da norma ou do sentido objetivamente vinculado ao texto; e assim o faz, porquanto

[...] identifica a ciência numa atitude reducionista, que pensa a linguagem como uma estrutura textual auto-suficiente, encontrando a significação no interior do próprio sistema criado e esquecendo as outras cenas significativas, como a produção social dos sentidos que, na verdade, é anterior ao próprio significado textual (WARAT, 1995, p. 15).

Esse olhar de soslaio é uma pré-compreensão teórica não descurada nesta pesquisa. É, a bem da verdade, o fundamento para perguntar se a prova não seria um elemento determinante, e em que medida, na justificação da inconstitucionalidade. Em última instância, é a razão de perguntarmos: a inconstitucionalidade não se prova?

(20)

Torna-se evidente, pois, que, em sede de ação direta, a inconstitucionalidade deve transparecer, diretamente, do texto da norma estatal questionada, não podendo, a prolação desse juízo de desvalor, depender, para efeito do controle normativo abstrato, nem de prévia indagação probatória concernente a matéria de fato nem mesmo da análise de outras espécies jurídicas infraconstitucionais, para, somente a partir desse exame e num desdobramento exegético ulterior, efetivar-se, então, o reconhecimento da ilegitimidade constitucional do ato questionado.

Esse trecho encobre uma regra inerente à argumentação da inconstitucionalidade, a anuncia como um conceito meramente de direito (um sentido jurídico abstratamente apreendido5), vigorante por muito tempo no direito brasileiro, e que instiga a metódica da

Justiça Constitucional refletida nesta pesquisa. Ao vertê-la em proposição lógico-jurídica, desvela-se a fórmula: em qualquer caso, dado o fato de a norma estatal ser questionada em sua legitimidade constitucional em controle abstrato, então deve-ser a inconstitucionalidade transparecida diretamente da norma estatal em confronto com a Constituição. Não depende, pois, de prévia indagação fático-probatória.

É regra, há muito, propalada na Justiça Constitucional brasileira e sintetiza o dogma da não-remissão à realidade (HERANI, 2010, p. 240; TAVARES, 2007a, p. 13-31). Trata-se de uma limitação argumentativa ao justificar a (in)constitucionalidade legislativa, que dispensa as referências a quaestio facti e, logo, a atividade probatória: em qualquer caso, dado o fato de a norma estatal ser questionada em sua legitimidade constitucional em controle abstrato, então (não-)deve-ser a inconstitucionalidade dependente de prévia atividade probatória para ser reconhecida; em última dedução: em qualquer caso, dada a inconstitucionalidade, então (não-)deve-ser, argumentativamente, dependente de prova. Isso, levado ao extremo, equivale a negar o papel dos fatos e, logo, a inibir o poder argumentativo, pelo viés probatório, do Supremo Tribunal Federal ao decidir: aqui há uma inconstitucionalidade.

Daí a indagação inicial, cuja resposta está em constante tensão nesta pesquisa. Não por outra razão, senão pela argumentação revelada em decisões que se inclina a contrariar o credo metodológico da não-remissão fático-probatória no reconhecimento da inconstitucionalidade. Credo que há muito a doutrina estrangeira dá como superado, e a nacional sinaliza a superação. A Justiça Constitucional brasileira não dispensa os “conhecimentos específicos a

(21)

extravasarem aos limites do próprio Direito”6, como as “sensíveis dúvidas, controvérsias do

ponto de vista científico, ético e religioso”7, a “análise dos fatos legislativos”8, ao justificar a

(in)constitucionalidade. O Min. Marco Aurélio salientou ao abrir os trabalhos na audiência pública designada na ADPF 54/DF:

Costumo dizer que, sem fato, não há julgamento e aquele que personifica o Estado-Juiz há de defrontar-se com conjunto de elementos objetivando formar o respectivo convencimento sobre a controvérsia. Visamos, com esta Audiência Pública, que se desdobrará de início em três dias, colher esses dados de convicção.

Por detrás da carência de “dados de convicção” está a pré-compreensão de que a inconstitucionalidade não é um problema social porque é um conflito internormativo solúvel, autonomamente, pelo Direito, mas se constrói por referências que vão além das jurídicas, alcança as fáticas e valorativas. Trazer a faticidade para a ação de decidir a (in)constitucionalidade, inevitavelmente chama à operação outro elemento a integrar o discurso jurídico9: a racionalidade probatória. Com isso, abre-se a fenda para investigar e

desvendar a estrutura e a função do poder probatório da Justiça Constitucional.

Objetivo da tese:

A proposta é reduzir as observações ao sistema brasileiro a uma explicação sobre dois institutos tradicionais do Direito e, em certa medida, antagônicos, ao menos aparentemente: a prova e a inconstitucionalidade. Pretendemos, a depender do resultado, contribuir para a dogmática do direito constitucional à prova-da-inconstitucionalidade10.

6Razão justificativa do deferimento da audiência pública realizada na ADPF 54/DF. 7Expressão extraída da ata de audiência pública realizada na ADPF 54/DF.

8Anunciado no julgamento do RE 463.629/RS.

9 “O discurso é uma mediação estruturada do pensamento ou uma articulação intencionalmente unitária entre sucessivos elementos do pensamento” (NEVES, C., 1993, p. 30); é jurídico, pois a operação discursiva visa à realização do direito.

10Ao longo do trabalho, o termo prova-da-inconstitucionalidade assim grafado, ou seja, com hífen, alude a uma

(22)

O foco da investigação é o problema já anunciado entre os teóricos da Constituição: na medida em que preconizam uma “instrução probatória mínima” (BERNARDES, 2004, p. 445; BUENO, 2006, p. 135; MENDES; MARTINS, 2009, p. 252; TAVARES, 2005, p. 397; DIMOULIS; LUNARDI, 2011, p. 234) no processo constitucional objetivo, alertam para o “deficit quanto ao direito à prova” (CANOTILHO, 2008, p. 169) no direito constitucional pela “insuficiência metódica” (CANOTILHO, 2008, p. 169), e para a importância de afinar os contornos teóricos e práticos da análise probatória (GALINDO, 2007, p. 345-348). Com vistas a abrandar o deficit, o trabalho tem por objeto de investigação a prova no jogo jurisdicional (CAPELLA, 2008, p. 126) brasileiro; em outras palavras, a racionalidade probatória que nos é revelada nos processos em que o Supremo Tribunal Federal é instado a decidir a inconstitucionalidade legislativa.

Pretendemos com um modelo de explicação fornecer subsídios teóricos com os quais é possível exercitar a “avaliação de qualidade argumentativa” (DIMOULIS; LUNARDI, 2011, p. 332) no controle da constitucionalidade dos atos legislativos. A “qualidade da prova” (DIMOULIS; LUNARDI, 2011, p. 332) é um critério de avaliação qualitativa da motivação, não exclusivo, é certo, mas cada vez mais presente na jurisdição constitucional; com isso, não deixa de ser um critério de controle da discricionariedade judicial, que acaba por refletir as finalidades e legitimidade do Supremo enquanto órgão central da Justiça Constitucional.

Não se pretende, aqui, observar a prova constitucional de forma ampla e completa. Demandaria enfrentá-la, por exemplo, no exercício individual do direito fundamental por ação constitucional ou no instrução perante as Cortes internacionais de direitos humanos. Não por irrelevância científica, mas porque a preocupação é constante e única com a atividade instrutória enquanto um problema argumentativo no controle (orgânico) de constitucionalidade inerente à função estruturante da Justiça Constitucional (TAVARES, 2005, p. 253; 2008, p. 825-846). Mas fica a percepção, não é sem tempo, sob uma inspiração antipositivista, acurar a prova no direito processual constitucional.

Se de um lado o âmbito de análise é circunscrito, de outro tem extensão a considerar. Desde que presente a inconstitucionalidade, a atividade probatória é investigada com o propósito de descrevê-la por seus elementos colhidos da prática da jurisdição constitucional. A prova é vista em correlação com o controle de constitucionalidade desde um ponto de vista conceitual, tendendo elucidar o seu sentido num contexto aparentemente inóspito.

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o revestimento estrutural do texto normativo que lhe confere caráter legal, ou seja, do procedimento institucionalizado de criação solene e oficial de texto legislativo; portanto, neste estudo, lei é a forma de que se reveste o texto normativo ou o conjunto dele num ordenamento jurídico (FERRAZ Jr, 2003, p. 233), em últimos dizeres, “é aquilo que é feito pelo Poder Legislativo segundo um procedimento determinado” (SILVA, J. 2007, p. 25).

Por fim, a pesquisa trata da prova jurídica praticada no sistema jurídico brasileiro, mais precisamente, no processo judicial, operado no contexto da Justiça Constitucional, o que equivale dizer, no âmbito restrito do Supremo Tribunal Federal.

Das conquistas e o passo pretendido:

Ocupar-se da prova-da-inconstitucionalidade é complexo, porque a prova é problematizada do ponto de vista da argumentação constitucional. É inegável, “ao contrário dos juspublicistas, a doutrina jusprocessualista há muito vem falando do direito à prova” (CANOTILHO, 2008, p. 170), e os resultados são indispensáveis. Mas se a proposta é a prova da inconstitucionalidade, há outro desafio a enfrentar, ínsito à teoria constitucional, que é “deslocar o direito à prova do estrito campo jusprocessualístico para o localizar no terreno constitucional” (CANOTILHO, 2008, p. 170). O trabalho reconhece, como ponto de partida, a anomia11 na teoria constitucional quando se fala na metódica da prova. O esforço de superá-la

coloca em tensão o status da inconstitucionalidade como um conceito reduzidamente jurídico, e pergunta por um sentido da prova no direito constitucional.

11 Anomia é um conceito do pensamento sociológico. De origem grega, vem de anomos (a representa ausência, inexistência, privação de; e nomos, é lei, norma). É uma referência obrigatória, dentre outras, Emile Durkheim, pesquisador francês considerado um dos precursores da sociologia moderna do final do século XIX. Esse termo adquiriu múltiplas facetas em Durkheim, com distinções semânticas desde a primeira aparição nas reflexões sociológicas e ao longo do século XX. Durkheim o associa à ausência de regras procedimentais adequadas para regular as relações complementares entre os participantes na vida industrial e comercial; em outro momento, à

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A anomia só se percebe pois, desde meados do século passado, a argumentação constitucional conjuga aportes metodológicos para além da racionalidade lógico-sintática à margem do caso concreto, o que conduz a doutrina ao alerta para a instrução e o controle material na fiscalização da constitucionalidade, em especial no processo objetivo (BERNARDES, 2004, p. 448; CANOTILHO, 1993, p. 1.030; TAVARES, 2005, p. 422; 2007a, p. 13-31). Não são raras as orientações opostas à “inviabilidade do regresso aos fatos no curso do processo objetivo” (TAVARES, 2005, p. 395), para admitir o concreto mesmo no controle concentrado (BERNARDES, 2004, p. 450; HERANI, 2010, p. 241; MARTINS; MENDES, 2009, p. 306; SANCHÍS, 2000, p. 161-195; DIMOULIS; LUNARDI, 2011, p. 234). Em consequência, a superação da “tese da inadmissibilidade do ingresso dos fatos no processo objetivo aflora no campo da produção de provas” (TAVARES, 2005, p. 398). É lugar comum, pois, admitir inseparáveis os fatos da argumentação constitucional: “os legislativ facts devem ser tomados em consideração no juízo de inconstitucionalidade, pelo menos na medida em que a fixação desses fatos se torne necessária para a decisão de constitucionalidade ou inconstitucionalidade” (CANOTILHO, 1993, p. 1.037).

Se os fatos condicionam a (in)constitucionalidade, e tal assertiva se engaja aos novos paradigmas metodológicos da interpretação constitucional, que não mais relegam a comunicação fato/norma, então, é inevitável falar da prova como uma nova categoria (ou elemento operacional) do controle de constitucionalidade (HERANI, 2010, p. 241; TAVARES, 2005, p. 394). Atrelar a justificação da inconstitucionalidade à inserção da relação intertextual na historicidade “como modo de existência humana inconclusa” (MÜLLER, 2009, p. 94) e na faticidade social como complexo de “conteúdos materiais da vida” (STRECK, 2009, p. 296) no e para o Direito e, com isso, trazer o princípio da instrução não são novidades na doutrina. Todavia, é preocupante, ainda se ressente, mormente se a Justiça Constitucional observada é a brasileira, de uma análise crítica do poder instrutório do Supremo Tribunal Federal.

Panorama do trabalho:

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prova-da-inconstitucionalidade, objetivamente possível no sistema jurídico brasileiro. Para atingi-lo, outros são alvejados, os específicos, que têm “função intermediária e instrumental, permitindo, de um lado, atingir o objetivo geral e, de outro, aplicar este a situações particulares” (LAKATOS, MARCONI, 1983, p. 102). Esses objetivos são distribuídos nas duas partes do trabalho, dispostos de modo que se cumpra um método dogmático pluridimensional, congrega atividades argumentativas em dimensões: “analítico-lógico”, “empírico-descritivo” e “prático-normativo” (ALEXY, 2008, p. 244).

A primeira parte – Pressupostos teóricos: da prova e da inconstitucionalidade – objetiva elucidar o quê se pretende explicar (explicadum); isso é feito pela análise dos dois institutos centrais da pesquisa: a prova e a inconstitucionalidade. O primeiro capítulo, chamado Epistemológia básica da prova, fornece notas epistemológicas sobre os pressupostos teóricos da prova, a envolver não só a significação base, como os elementos constitutivos e contíguos (fato e verdade). Já o segundo, Controle híbrido de constitucionalidade brasileiro, o terceiro, Dimensão fática no controle de (in)constitucionalidade das leis, dedicam-se à análise de pressupostos teóricos da inconstitucionalidade em perspectivas distintas. Naquele, voltamos à sua evolução a partir da circulação, recepção e hibridação dos modelos clássicos de Justiça Constitucional, com o propósito de trabalhar a prova-da-inconstitucionalidade como um problema no momento de concretização do controle abstrato de constitucionalidade. Já o terceiro capítulo dedica-se à morfologia da inconstitucionalidade olhando a faticidade condicionante, ou seja, o fato na sua composição estrutural-argumentativa.

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Notas de normalização do texto:

A estrutura formal da tese obedece às vigentes normas da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) de padronização da normalização aceitável internacionalmente, tornando-a assim melhor compreensível. As principais normas utilizadas são as NBR´s 10520:2002, 6023:2002, 14724:2005; 6027:2003.

É opção do autor, facultada pelas normas técnicas, a adoção do sistema de chamadas “autor-data” ao invés da “numérica”. Não é uma mera opção arbitrária, mas por convicção de que, por tal modelo, oferece-se maior fluência na leitura, pois a menção da informação extraída de outra fonte aparece no texto. Apenas em certas situações aplicamos o sistema numérico, autorizado pela NBR 10520:2002, n. 7, como para notas explicativas, curtos comentários, esclarecimentos ou explanações paralelas à fluência lógica do texto. Ademais, conforme determina o sistema de chamadas “autor-data”, as obras citadas, direta ou indiretamente, ao longo do trabalho constam da lista de referências ao final do trabalho.

As citações diretas em língua estrangeira são acompanhadas de tradução, para permitir a confrontação. Para manter a coerência de priorizar a fluência da leitura, no corpo do texto está a citação traduzida para o português e, em rodapé, é repetida em língua original da obra referida, mesmo quando a citação é em língua espanhola. Isso só não ocorre se a citação envolver palavras de fácil tradução, as quais já serão transcritas em português. Obras traduzidas foram usadas, preferencialmente, para os casos em que a língua original é inacessível ao pesquisador ou diante da impossibilidade de acesso ao texto original. Por fim, o trabalho se limita à citação de obras e artigos científicos de valor reconhecido e pertinência temática.

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P

RIMEIRA

P

ARTE

PRESSUPOSTOS

TEÓRICOS:

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Introdução

Adotamos a estratégia de não propor, desde logo, a definição do que pretendemos por prova-da-inconstitucionalidade. Outra não poderia ser a postura, pois o escopo da pesquisa é, justamente, a construção de um modelo de explicação (explicatum) do objeto apreendido, cujo ponto de chegada é a definição. Por ora, fiquemos só com o impulso da afirmação: a inconstitucionalidade das leis se prova. É autorizado por pressupostos teóricos, convicções sobre percepções atuais de institutos antagônicos e inconciliáveis, ao menos aparentemente, – a prova e a inconstitucionalidade –, os quais, juntos, encerram uma unidade semântica a ser desvendada.

Esta primeira parte do trabalho propõe elucidar o quê se pretende explicar (explicadum); assim é feito com a análise desses dois institutos: a base de uma específica ou atípica atividade probatória; por isso, os estudaremos como pressupostos teóricos do explicatum (BRUGGER, 1969, p. 331). Por serem epistemológicos, lidam com a possibilidade de conhecimento, a descrição e a explicação das propriedades desses institutos.

Tratamos de uma síntese da teoria geral da prova com agudo enfoque na análise sintática. Sendo o propósito nuclear da pesquisa a especificação do significado da prova-da-inconstitucionalidade das leis no sistema jurídico brasileiro e a sua dissecção, não se logra tal intento sem antes discernir e pôr em relevo os elementos constitutivos da prova, como condição prévia e pressuposta. Sem isso não é possível sequer cogitar o objeto estudado. A confirmação da hipótese – inconstitucionalidade se prova – passa, antes, pelo compromisso da “decomposição de um todo em suas partes” (GARCIA, 1978, p. 317), para identificar os componentes da prova e a relação que os unem (estrutura).

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haja dúvida na tentativa de referenciar à prova com todas as suas peculiaridades, ou seja, não só com os elementos de constituição, como também com a estrutura procedimental pela qual se constitui.

Se a prova é da inconstitucionalidade, a partir do significado desse vício, tem-se a delimitação do objeto probatório. Mas só é identificado como tal, se antes não há dúvida do que seja e como se estrutura. Afirmar que se está diante da prova depende, antes, em nível lógico-teórico, de um “critério de decidibilidade”, com o qual se pode ou não afirmar a referência a ela e, posteriormente, à prova-da-inconstitucionalidade. Tal perspectiva permite decidir e delimitar, com base em certas propriedades significativas, a definição da região temática de descrição e ordenação da prova. Assim, com a intenção de preparar a segunda parte, antes formulamos o critério de decidibilidade dos enunciados que podem ou não integrar o direito positivo da prova, para não haver dúvida quando se está diante dela; para isso, o estudo volta-se para a análise de suas propriedades semânticas. Todos os conceitos trabalhados neste capítulo e no próximo serão utilizados, já na segunda parte, na composição da proposta de sistematização da prova-da-inconstitucionalidade.

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1 EPISTEMOLÓGIA

BÁSICA

DA

PROVA

O estudo da morfologia da prova é um caminho de identificação do referido critério de decidibilidade. No campo jurídico, a Morfologia situa-se no específico conhecimento das formas apresentadas pelo objeto. Consolidou-se, ao tempo do século XIX, um ramo da Linguística. Não se ignora, contudo, que outras ciências (como a biologia, a geografia, a medicina) também a utilizam para o estudo das formas dos objetos (ALMELA, 2002, p. 5-29).

Considerando que “o direito sempre se manifesta em linguagem” (OTERO, 1998, p. 33), e assim adquire “a sua forma natural de ser” (ROBLES, 2005, p. 2), é eficaz a predisposição científica de estudar o Direito a partir da perspectiva morfológica, para trabalhar a forma ou a estrutura das normas, as instituições e as decisões jurídicas. Há correntes teóricas que exercitam a consistência estrutural do Direito com apoio no discurso morfológico; é o caso, por exemplo, da análise epistemológica “estática” em Hans Kelsen (1984, p. 163), ao elaborar a teoria pura do direito, ou ainda da teoria tridimensional em Miguel Reale (2001, p. 163) ao captar a “experiência jurídica sob o ponto de vista estrutural”, sem esquecer a “teoria estruturante do direito” em Friedrich Müller (2008) ao propor uma nova estrutura da norma jurídica. São teorias que prestigiam aspectos estruturalistas do que se entende por Direito. A despeito disso, ainda ressente-se de estudos específicos sobre a metamorfologia jurídica, isso torna a tarefa de descrição morfológica da prova ainda mais árdua.

A morfologia linguística consolidou-se, no século XX, “uma disciplina essencialmente sincrônica, ou seja, uma disciplina centrada no estudo da estrutura das palavras em um determinado estágio da linguagem”12(ALMELA, 2002, p. 5-29). O estudo da morfologia da prova

assume tal feição no isolamento de seus elementos em si, que se inter-relacionam na dinâmica da atividade probatória, diferenciando-a. Compreende “os elementos de linguagem necessários à produção probatória” (TOMÉ, 2008, p. 154), não só de sua composição em si, como da sua estrutura lógica.

O que interessa, neste passo, é a fixação do pressuposto de identificação da prova. A partir e com base nele, buscamos a sua explicação tal como manifestada no momento em que a atividade processual volta-se para a verificação da (in)constitucionalidade legislativa.

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Extrapola aos limites de tal pretensão a digressão criticamente profunda sobre a prova; isso conduziria a pesquisa a propósitos outros, mais ousados, pois enveredaria para a tensão dos elementos e da estrutura da prova, em vista de um sentido intencional de releitura.

Nem por isso descuramos do debate atual sobre a teoria geral da prova, com vistas a alcançar um sentido do termo “prova” que, em alguma medida, reflita o consenso na comunidade jurídica. A partir dele, estendemos ao estudo: (a) das peculiaridades significativas desse termo analisadas no contexto do uso jurídico-processual, a partir de exemplos práticos extraídos da práxis decisória brasileira que exaltarão os elementos morfológicos da prova13; (b) da finalidade e (c) do status jurídico da prova; além dos

elementos contíguos a ela inter-relacionados: (d) o fato e (e) a verdade.

1.1 O uso jurídico-processual do termo “prova”

A explicitação do uso jurídico-processual do termo “prova” é o primeiro problema a enfrentar no estudo do seu papel na argumentação da (in)constitucionalidade das leis. Explicar o quê se pretende com a prova-da-inconstitucionalidade demanda antes analisar as significações desse termo tal como aplicado e a partir da teoria geral do direito.

No campo jurídico, “prova” não é um conceito de referência a um objeto que exista em si, com representação cognitiva concreta no mundo real, vale dizer, pertencente à região ôntica husserliana dos objetos naturais. Pertence à região ôntica dos objetos culturais; como tal, tem existência espaço-temporal susceptível à experiência, além de ser valioso, positiva ou negativamente, como qualquer objeto cultural (CARVALHO, 2008, p. 17). O sentido da prova se apreende observando-a nas relações jurídico-sociais, no âmbito de extensão desta pesquisa, nas relações processual-constitucionais.

O uso do termo “prova” na comunicação jurídico-processual aponta ou designa sentidos diversos distinguíveis apenas pelo contexto. Reconhecidamente é polissêmico ou plurivalente. A pluralidade indeterminada do sentido da prova é consenso doutrinário

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(DELLEPIANE, 1942, p. 6; DENTI, 1972, p. 3-22; TOMÉ, 2008, p. 63; SANTO, M., 1983, p. 1). Isso é aceito aqui, como um pressuposto de pesquisa, uma vez que o objetivo não é a tensão reflexiva da prova judicial como objeto em si; é só o parâmetro e ponto de partida da construção de uma categoria dela derivada, cuja investigação é a preocupação central neste trabalho. Poderíamos partir para uma postura de defesa de um significado em determinado dos demais existentes. Mas, igualmente seria ineficiente, pois conduziria à explicação apenas parcial e reducionista da realidade jurídica da prova, e isso acaba por não subjugar relações comumente distinguidas como tal no uso jurídico-processual. Então o mais adequado é aceitar a polissemia, é fazê-la um aliado na busca do sentido da prova-da-inconstitucionalidade.

Seguindo por essa linha, o uso do termo “prova” no contexto processual permite apreendê-lo sob um valor conotativo plurissignificativo, pois aponta variados significados. Para testar tal variação, trabalhamos exemplos práticos no direito processual ordinário, extraídos de ações selecionadas indiscriminadamente. Vejamos:

(a) “Ausência de prova do alegado excesso de velocidade por parte do autor”14;

(b) “O Réu entende ser indispensável a produção de prova testemunhal"15;

(c) “Ao demandado cabia a prova do alegado fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor”16;

(d) “Prova suficiente a amparar o decreto condenatório, diante do relato da vítima, confirmado pela prova testemunhal e amparado pela prova técnica”17;

(e) “Conforme o artigo 334, inc. I e IV, independem de prova os fatos notórios e aqueles em razão dos quais militam presunções legais ou de veracidade”18.

No exemplo (a), o termo “prova” é empregado com o sentido intencional de fato que se pretende ou deva construir ou determinar significativamente a partir da reconstrução de um evento ou acontecimento de ordem física ou natural e social, condicionante da pretensão jurisdicional deduzida no processo. Fato juridicamente qualificável, como tal, “todo e

14 TJ/RS, 11ª. Câmara Cível, Ap. 70042870816, Des. rel. Kátia Elenise Oliveira da Silva, j. 6/7/2011, em ação de indenização por acidente de trânsito (grifo nosso).

15 TJ/SP, Câmara Reservada ao Meio Ambiente, AI 990.10.225777-0, Des. rel. Renato Nalini, j. 10/6/2010, em ação civil pública (grifo nosso).

16 TJ/RS, 15ª. Câmara Cível, Ap. 70039048624, Des. rel. Vicente Barroco de Vasconcellos, j. 24/11/2010, em ação de reintegração de posse (grifo nosso).

17 TJ/RS, Turma Recursal Criminal, Ap. 71003202942, Des. rel. Luiz Antônio Alves Capra, j. 29/08/2011, em ação criminal (grifo nosso).

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qualquer fato que, na vida social, venha a corresponder ao modelo de comportamento ou de organização configurado por uma ou mais normas de direito” (REALE, 1987, p. 199). É apreendido, em síntese, como fato a provar (ponto de partida) e o fato provado (resultado), ou seja, objeto da prova.

No exemplo (b), o mesmo termo aparece com o sentido de instrumento pelo qual há ou não a comprovação do fato a provar; isto é, significa “os diferentes elementos de juízo produzidos pelas partes ou recolhidos pelo juiz, a fim de estabelecer no processo a existência de certos fatos (prova testemunhal, prova indiciária)”(DELLEPIANE, 1942, p. 6), dentre outros. Ou seja, é usado no sentido de meio de prova.

O termo no exemplo (c) se distancia dos demais para significar a atividade probatória em si, a “ação de fazer a prova” (DELLEPIANE, 1942, p. 6). Implica a parte “fornecer os elementos de juízo ou produzir os meios indispensáveis para determinar-se a exatidão dos fatos que alega como fundamento de sua ação, e sem cuja demonstração perderá o seu pleito” (DELLEPIANE, 1942, p. 6). Nem fato nem meio, é a ação de provar. Não é objeto ou instrumento, é a atividade ou procedere, consistente na ação de fazer a prova dos fatos constitutivos de um direito, por uma sequencialidade de atos até o resultado probatório. Conota, pois, o procedimento prático probatório.

No exemplo seguinte, ao termo “prova” atribui-se o sentido de convicção, em alusão ao “fenômeno psicológico, o estado de espírito produzido no Juiz por aqueles elementos de juízo, ou seja a convicção, a certeza acerca da existência de certos fatos sobre os quais recairá o seu pronunciamento” (DELLEPIANE, 1942, p. 6). Esse sentido é comum, por exemplo, nas decisões penais em que a condenação não ocorre por insuficiência probatória, vale dizer, por falta de consciência de certeza do magistrado do resultado positivo do processo probatório; só é perceptível ao realizar a inferência racional das premissas probatórias construídas a partir da aplicação dos meios de prova, como última etapa do procedimento probatório. Se dessa inferência resultar a convicção acerca da verdade dos fatos, depois de cumprido o procedimento prático probatório, então a inferência não é outra senão a de suficiência da prova. Com efeito, é um sentido que enfatiza o aspecto valorativamente subjetivo do resultado probatório (TOMÉ, 2008, p. 80). Com isso, no exemplo (d), prova significa o resultado inferencial do procedimento probatório do fato. O procedere se desdobra na sequencialidade de atos que culminam no resultado da valoração das premissas probatórias em confronto com as premissas fáticas. Aqui, portanto, tem um sentido de valoração probatória.

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Designa uma prescrição inerente à atividade probatória. Daí a ideia de “procedimento organizacional da prova”, “composto pelo conjunto de regras que regulam a admissão, produção e valoração dos elementos levados aos autos, determinando o transcurso probatório” (TOMÉ, 2008, p. 68), que disciplinam e dão forma jurídica ao modo de produção probatória. São as regras do jogo, as normas do processo legal da prova, tal como as que definem a sua ilicitude, o ônus, os meios, o momento e o lugar da produção, enfim, são “o conjunto de normas jurídicas que governam a atividade probatória”19 (CAPELLA, 2008, p. 135), que conota o

denominado filtro da prova (CAPELLA, 2008, p. 135).

Nos exemplos acima, o traço semântico da prova está condicionado ao contexto pragmático no qual se insere. A variação designativa é determinada pelo uso no processo civil, penal, trabalhista, tributário ou constitucional. Oferece uma particular significação aos destinatários envolvidos segundo a extensão dada ao termo em seu contexto. A depender da ocasião ou de quem o emprega, tem um sentido vinculado à interpretação subjetivamente condicionada à percepção de quem o utiliza e de acordo com a experiência momentânea do processo, o que propicia a pluralidade de sentidos. Essa é a percepção provocada pelos exemplos acima. Por isso, é um termo com “defeito congênito de linguagem” (ATIENZA, 2007a, p. 55): a ambiguidade terminológica. É “um caso particular de incerteza designativa” (WARAT, 1995, p. 78), pois expressa “um conjunto de propriedades designativas, isto é, um mesmo rótulo ou significante veicula propriedades designativas aplicáveis a âmbitos denotativos claramente diferenciáveis” (WARAT, 1995, p. 78).

Mas as propriedades designativas da prova, juntas, têm um sentido lógico, denotam processo ou sequencialidade culminante num resultado. O mesmo rótulo ou significante veicula propriedades designativas que, se observadas em conjunto, exprimem dinamicidade, encadeamento de momentos que se desenrolam no processo judicial. É o que se pode perceber nos exemplos trabalhados. São hipóteses plenamente possíveis num único processo, ocorrendo-as, desencadeiam uma sequência: a parte ajuíza a ação na qual afirma um acidente (fato) e, por isso, deve fazer a prova do afirmado (fato a provar), para isso, requer a prova testemunhal (meio), com a qual faz a prova dos fatos constitutivos do seu direito (procedimento); o réu contesta a licitude da prova constante dos autos invocando regras jurídicas (filtro); o juiz entende ser prova suficiente do acidente a afirmação testemunhal (valoração); ao final, decide que o autor produziu a prova (fato provado-resultado); logo, desencadeou o dever de indenizar.

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Com efeito, prova tem significados variados observados na pragmática dos momentos do processo, os quais são estaticamente isolados, de modo que lhe empresta o sentido de “prova como resultado, meio e atividade”20 (MIDÓN, 2007, p. 28). Essa específica

indeterminação significativa é, na Filosofia da Linguagem Ordinária, um tipo de ambiguidade: processo-produto (WARAT, 1995, p. 78). Ocorre “quando se aplica o mesmo significante para referir-se tanto a uma atividade como ao resultado da mesma” (WARAT, 1995, p. 78), é o caso, por exemplo, da palavra “contrato”: “aplicada à atividade de contratar e ao documento resultante desta atividade” (WARAT, 1995, p. 78). Daí a correta conclusão:

[...] a prova padece de ambigüidade processo/produto, podendo significar tanto a enunciação como o enunciado resultante (dilema) [...] Essa polissemia decorre, principalmente, das diferenças quanto ao alcance do termo, aos diversos momentos em que a prova é considerada, à estrutura aberta da linguagem e aos aspectos relativos à sua pertinência. Por esse motivo, sempre que falamos em prova devemos estabelecer a fase de sua dinâmica a que nos estamos referindo (TOMÉ, 2008, p. 67).

O termo “prova” é altamente jurídico-abstrato, porque distante de uma entidade física, o que obsta um referente concreto, e com isso torna muito difícil precisar, e assim uniformizar, um sentido referencial. Não obstante, há traços significativos mínimos a integrar o significado processual da prova, ainda que, conotativamente, haja a variação segundo a forma e quem o usa. Todas as propriedades designativas denotam, de forma invariável, algo (fato a provar, meio e procedimento probatórios) funcionalmente destinado ao convencimento no contexto do processo judicial de uma autoridade (juiz, júri ou Tribunal), para chegar a conclusões sobre fatos. Em última instância, indica processo de convencimento sobre fatos para alcançar determinado fim. Reforça tal percepção o sentido etimológico do termo: deriva do latim proba, de probare, ou seja, ato de demonstrar, reconhecer, formar juízo de (SILVA, De P., 2002, p. 656), deriva ainda de probatio, ensaio, verificação, inspeção exame, aprovação, confirmação (TOMÉ, 2008, p. 63).

Essa digressão sobre o uso da prova é crucial neste estudo, aproximá-lo à inconstitucionalidade induz um valor de distinção da prova, até então pouco explorado pela doutrina constitucional. Essa simbiose sinaliza a pluralidade significativa da prova num contexto ainda mais especializado, a perguntar por um especial poder probatório do Supremo Tribunal Federal, menos propenso a exercê-lo se considerarmos que a maior intensidade probatória está nas instâncias ordinárias. É um poder que expressa formas jurídicas de fato a

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provar, meio e procedimento probatórios alusivas à prova-da-inconstitucionalidade das leis. A reflexão sobre esse especial poder é o cerne da pesquisa.

1.2 Finalidade da prova judicial

Para quê se prova? O ato de provar persegue o quê? São perguntas sobre a finalidade da prova judicial. Para desvendá-las, recorremos à análise de Hernando Devis Echandia (1976, p. 238) a respeito, do ponto de vista intraprocessual e extraprocessual.

Como já analisado, do ponto de vista interno do processo, a prova significa processo-produto de convencimento do juiz sobre fatos relevantes na construção da decisão judicial. Tem uma finalidade subjetivista, pois “prova é meio de convencimento do destinatário” (TOMÉ, 2008, p. 81), de “criar no juiz a convicção da existência de determinados factos” (ENGISCH, 2004, p. 87). Buscar o convencimento de quem é o responsável por solucionar um caso concreto não vai além de provocar a convicção da verdade confiada sobre a (in)existência de fatos afirmados, controversamente, no processo judicial. A prova vincula-se, finalisticamente, ao estado mental do julgador de crer na ocorrência do fato. A motivação das decisões judiciais se cumpriria, nesse contexto, com a expressão da crença do juiz e das causas que o levaram a crer que os fatos ocorreram. Contudo, “expresar as causas de uma crença, no caso em que se possa fazer, é algo muito distinto de justificar uma decisão”21 (BELTRÁN, 2003, p. 27-34), vários podem ser os fatores de convencimento, sobre os quais não se teria qualquer controle racional.

A finalidade meramente subjetivista da prova, bem pondera, Jordi Ferrer Beltrán (2003, p. 27-34), “não é capaz de dar conta do funcionamento do mecanismo da prova no direito”22 e,

pior, acarretaria efeitos incontroláveis se praticada no processo constitucional. Assumi-la irrestritamente implicaria decidir questões que lidam com a constitucionalidade com base num realismo jurídico radical e irracional, com incalculáveis prejuízos à sociedade. Se a afirmação da verdade sobre as questões fáticas se subsumisse à simples crença do juiz constitucional e às

21 “[…] expresar las causas de una creencia, en el caso de que pueda hacerse, es algo muy distinto de justificar una decisón”.

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causas subjetivamente por ele eleitas, então seria impossível admitir que pudesse equivocar-se. “Assim, dizer que um fato está provado é igual a dizer que um determinado sujeito dotado de autoridade crê que esse fato ocorreu”23(BELTRÁN, 2003, p. 27-34). Logo, não haveria critério

que permitisse afirmar que o juiz constitucional estaria equivocado se, por exemplo, cresse na inverdade do fato da “desigualdade étnico-racial ou social dos candidatos à universidade pública”, porque, quando graduando, em sua sala existiam três negros; ou do fato da “morte cerebral de fetos anencéfalos”, porque comunga de crença religiosa que prega o fim da vida com a parada cardíaca. Questões como essas não podem ser decididas sob o pressuposto de que é o próprio juiz constitucional quem deve constituir, para não dizer inventar, os fatos relevantes para a solução das controvérsias constitucionais.

Por isso, a finalidade da prova só se completa se a perspectiva subjetivista conjuga-se com a objetivista. O convencimento do juiz sobre os fatos é a destinação da prova; mas não se constrói sem critérios objetivos com os quais se tem a justificação normativo-racional das decisões sobre os fatos. A prova é estruturada para aportar ao processo enunciado fático relevante ao conflito judicial para compor os argumentos da decisão, e assim o faz segundo critérios objetivamente controlados pela racionalidade normativa e epistêmica. A função da prova se define, pois, a partir da distinção entre a justificação normativa e a racional-empírica (BELTRÁN, 2003, p. 27-34). O convencimento acerca dos fatos condiciona-se às normas que regulam a plurivocidade semântica da prova; e assim se dirá que a decisão do juiz está justificada se cumpre com o prescrito por essas regras (BELTRÁN, 2003, p. 27-34).

Mas ainda não é suficiente para dar conta de como funciona a prova no direito, “é imprescindível compreender que a justificação dos enunciados declarativos de fatos provados é relativa ao conjunto de elementos de juízo (ou meios de prova) apartados do processo”24 (BELTRÁN, 2003, p. 27-34). Mesmo num sistema de livre convencimento, “a liberdade do juiz para determinar os fatos provados do caso está delimitada por regras gerais de racionalidade e lógica”25 (BELTRÁN, 2003, p. 27-34), sem o que não se escapa das arbitrariedades e não se tem o

“convencimento racional” (SANTOS, M., 1983, p. 5).

Com efeito, objetivamente, provar é atuar para “a constatação demonstrada de um fato ocorrido” (FERRAZ Jr., 2003, p. 319), é “demonstrar a efetiva ocorrência de um fato concreto”

23 “Así, decir que un hecho está probado es igual a decir que un determinado sujeto dotado de autoridad cree que ese hecho ha ocurrido”.

24 “[...] es imprescindible comprender que la justificación de los enunciados declarativos de hechos probados es relativa al conjunto de elementos de juicio (o medios de prueba) aportados al proceso”.

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(BURGARELLI, 2000, p. 99). Desvendar a verdade da afirmação fática, se a favor de uma ou de outra parte, é tarefa do juiz, para a qual conta com a prova como meio eficaz para sustentar os relatos propagadores de efeito jurídico; logo, “mecanismo fundamental para o reconhecimento dos fatos da vida social juridicizados pelo direito, bem como um dado imprescindível ao funcionamento do sistema de normas” (CARVALHO, 2008, p. 825). Proporciona a linguagem competente para constituir o fato jurídico, isto é, a “linguagem das provas” (CARVALHO, 2008, p. 824) exercitada na justificação da decisão judicial.

Nessa linha, prova é essencialmente instrumento de conhecimento, pois propicia informações relativas a fatos que devem ser provados no processo (TARUFFO, 2002, p. 99-124), para a constatação da sua verdade ou falsidade (MACCORMICK, 2006, p. 33). Logo, supre lacunas cognitivas fáticas.

Em todo caso, se pode dizer que a prova é um instrumento que proporciona informações sobre o conteúdo de um enunciado e dá para conhecer a circunstância de que se ocupa o enunciado, com a consequência de que o enunciado mesmo poderá ser considerado verdadeiro ou falso sobre a base da prova ou das provas que se referem a ele26 (TARUFFO, 2002, p. 99-124).

Essa percepção amplamente conhecida da finalidade da prova pressupõe a sua realização diante de casos nos quais as deliberações e decisões dizem respeito, por óbvio, a questões não meramente de direito, mas daqueles que são decididos “com base nos fatos” (MACCORMICK, 2006, p. 110), para os quais se busca a constatação da verdade e a sua subsunção ao direito. O atendimento a tal finalidade propicia, na prática processual, a solução de conflitos de questões de fato como etapa prévia e indispensável para a aplicação de normas jurídicas no caso concreto. A finalidade das provas se realiza, pois, no âmbito da lógica da aplicação das normas, que é revelada pela fórmula:

Se p então q p ... q

Lembra Neil MacCormick (2006, p. 111), “a aplicação é possível apenas desde que consideremos possível, sempre em princípio e às vezes na prática, a prova se p é verdadeiro

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