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O CONCEITO DE IDENTIDADES SOCIAIS E SUA RELAÇÃO COM A DEFICIÊNCIA VISUAL

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O CONCEITO DE IDENTIDADES SOCIAIS E SUA RELAÇÃO COM A DEFICIÊNCIA VISUAL

Prof. Dr. Saulo César Paulino e Silva

A ideia de identidade vem sendo discutida por diversos estudiosos da teoria social dentre outras outras áreas do conhecimento. Diz-se que existe uma “crise de identidade”, porque a visão tradicional que concebia a identidade como fixa, compondo um sujeito unificado, está passando por um processo de mudança e transformação que “está deslocando as estruturas e processos centrais das sociedades modernas e abalando os quadros de referência que davam aos indivíduos uma ancoragem estável no mundo social” (HALL, 2003, p. 07)

Partindo da concepção de “identidade abrangente”, pressupõe-se que os estudos a esse respeito ainda são recentes e revelam complexidade. As mudanças estruturais iniciaram uma transformação nas sociedades modernas a partir do final do século XX. Como resultado desse fenômeno social de mudança, começou ocorrer a fragmentação dos conceitos culturais de gênero, sexualidade, etnia, raça e nacionalidade. Consequentemente, isso está proporcionando uma transformação em nossas identidades sociais (HALL, 2003. P. 09).

Essas transformações da sociedade estão mudando também as identidades individuais e questionando o conceito que temos de nós mesmos como sujeitos integrados.

Nas sociedades ocidentais contemporâneas, de acordo com Mcllvenny (1996), cultura e identidade não são mais vistas como conceitos vazios, pois hoje não se pode falar de identidade sem mencionar a cultura. Segundo esse pesquisador, em nosso mundo pós-moderno tornou-se impossível conceber a cultura como algo finito e autossuficiente de conteúdo, costumes e tradições.

De um ponto de vista sociológico, o sujeito está se posicionando

constantemente em uma sociedade por instituições e estruturas sociais. As

identidades social e cultural de uma pessoa, por exemplo, podem ser a de um

professor, um policial, um doutor, um aluno, uma mãe, um paciente e assim por

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diante.

A esse respeito Moita Lopes (2002) afirma que a natureza fragmentada das identidades sociais está relacionada ao fato de as pessoas não possuírem homogeneamente uma identidade social explicada somente por sua raça ou gênero, pois as identidades sociais são complexas.

Quando analisadas de um prisma mais cuidadoso, observa-se que várias identidades coexistem em uma mesma pessoa ou como afirma Bruner (1997) somos um conjunto de possíveis si-mesmos.

Esse fenômeno cultural é tão importante nos dias de hoje que se faz refletir em diversos estudos sobre identidade que procuram entender e interpretar essa nova paisagem social e os seus participantes. Como exemplo poder-se-á citar as pesquisas desenvolvidas por Hall (1995, 2003), Harré e Van Langenhove (1999), Kimmel (1998), Linde (1993), Moita Lopes (2000, 2002, 2003) entre outros.

Procura-se um novo sentido de ser, pois essas transformações afetam e mudam as nossas identidades pessoais e nos fazem refletir a respeito de nós mesmos como sujeitos integrados.

Essa mudança social é tão ampla que leva-se a questionar a respeito da transformação da própria modernidade. Para que se entenda esse fenômeno, são traçadas três concepções que representariam diferentes estágios na “evolução” do conceito de identidade, definidos da seguinte maneira: sujeito do Iluminismo, sujeito sociológico e sujeito pós-moderno.

O sujeito do Iluminismo baseava-se na conceituação da pessoa centrada, unificada, dotada de capacidades de razão, de consciência e de ação em que o “centro consistia num núcleo interior, que emergia pela primeira vez quando o sujeito nascia e com ele se desenvolvia, ainda que permanecendo essencialmente o mesmo (...) ao longo da existência do indivíduo” (HALL, 2003, p. 10/11).

O conceito de sujeito sociológico relacionava-se à complexidade do

mundo moderno e à consciência de que este centro interior do sujeito não era

autônomo e autossuficiente, ou seja, de acordo com essa visão, que se

caracterizou como concepção clássica da questão, a identidade é formada na

interação entre o eu e a sociedade. Nessa perspectiva, o sujeito ainda tem um

núcleo que se denomina um “eu real” que poderá ser modificado num diálogo

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com os mundos culturais exteriores e as identidades oferecidas por esses mundos.

O sujeito denominado “pós-moderno” surge a partir do momento em que essa unificação e estabilização do “eu” é questionada, tornando-se fragmentada. O sujeito torna-se “composto não de uma única, mas de várias identidades, algumas vezes contraditórias ou não resolvidas”. Em outras palavras, a identidade torna-se instável e provisória, pois os sujeitos assumem uma identidade não-fixa que é formada e transformada continuamente em relação às formas pelas quais somos representados ou interpelados nos sistemas culturais que nos rodeiam (HALL, 1987, 2002, p. 12, 13).

A respeito ainda dessa fragmentação das identidades, afirma-se que as identidades sociais têm uma natureza fragmentada, como já afirmado anteriormente, porque “gênero, raça, classe social, idade, etc. coexistem na mesma pessoa” (MOITA LOPES, p.62). O sujeito fragmentado se constituí de identidades construídas por um sistema cultural em um mundo social. Afirma, ainda, que a escolha das nossas múltiplas identidades não depende de nossa vontade, mas é determinada por meio das práticas discursivas, impregnada pelo poder, nas quais agimos embora possamos resistir a essas práticas.

Portanto as identidades não são fixas, mas diferenciadas e constantemente reconstruídas, ressaltando-se a importância do significado que os participantes constroem quando interaougem uns com os outros. (FAIRCLOGH, 1992 e SARUP, 1996 apud MOITA LOPES, 2002)

Quando nos referimos à identidade, devemos pensá-la na sua

pluralidade que emerge das práticas sociais ocorridas no discurso. Deve-se

pensar que a sua emersão ocorre porque o discurso é concebido como um

processo de construção social que parte de duas premissas básicas: a primeira

que trabalha com o conceito de construto negociado pelos participantes,

remetendo-se à ideia de que este construto não é próprio da linguagem, mas

está inserido em um determinado contexto sócio-histórico. A segunda que

procura estabelecer relação entre o significado e as circunstâncias sócio-

históricas particulares, ou seja, o significado construído socialmente está

localizado em circunstâncias sócio-históricas particulares e é mediado por

práticas discursivas específicas, nas quais os participantes estão posicionados

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em relações de poder (FOCAULT 1971; FAIRCLOUGH, 1989, 1992 entre outros).

O discurso proporciona uma percepção do engajamento dos sujeitos como forma de construir não só a realidade social que os cerca, mas também de construírem a si mesmos. Essa construção se concretizaria a partir da maneira como os sujeitos atuam nas práticas sociais, ou seja, os sujeitos empregam a linguagem dialogicamente no discurso, onde a relação entre o eu e o outro permeia o modo particular desses sujeitos conceberem o mundo, o outro e a si próprios.

Moore (1988, P. 170), afirma que “as identidades são construídas no discurso, sendo, portanto fragmentadas, contraditórias e ambíguas” . Passa a idéia de que não é fácil falar do indivíduo como um ser autônomo, pois a vida do homem é como se fosse constituída de uma massa de fragmentos contraditórios.

Na verdade, as identidades são descrições complexas quando não são concebidas como homogêneas. As pessoas não podem ser definidas, por exemplo, somente pela sua sexualidade, pela sua etnia ou pela sua profissão.

A identidade de uma pessoa, por exemplo, não se limita a ser somente mulher, mas faz parte das suas identidades também ser brasileira, negra, professora entre outras, Dessa forma “adquirem o seu sentido de identidade de uma variedade de modos de ser que estão disponíveis” (MOITA LOPES, 2002, P.

138).

Backhurt e Sypnowich (1995), ao se referirem ao pensamento de Vygotsky, afirmam que somos seres sociais não por sermos determinados pelas circunstâncias sociais de nossas vidas, mas porque nossas capacidades de pensar e agir são em si mesmas socialmente constituídas. Essa perspectiva proporciona refletir a respeito da ideia de que a construção das identidades socialmente multifacetadas é construída por meio da mediação discursiva.

Referindo-se especificamente ao deficiente visual, observa-se que a

construção das suas identidades não deverá partir de uma concepção que tem

na deficiência referência única para posicioná-lo por meio do discurso na

sociedade. Deve-se partir do princípio de que as identidades do deficiente

visual, como as de qualquer outra pessoa, não estão limitadas apenas a um

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modo de ser, mas constroem-se a partir de diferentes papeis, como já foi discutido anteriormente.

Portanto a referência a uma pessoa com deficiência visual não deverá

se restringir a sua limitação sensorial, construindo-se uma identidade pronta e

acabada. Ao contrário disso, dever-se-á considerar o conjunto de si mesmos

que são representados por diferentes atuações sociais como o papel de pai,

mãe, homem, mulher, professor, professora entre tantos outros que

caracterizam o ser social.

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BIBLIOGRAFIA

BACKHURT, D. e SYPNIVICH, C. Introduction: problems of the social self. In:

BACKHURST, D. e SYPNOWICH, C. (Eds). The social self: London: Sage, 1995.

BRUNNER, J. Atos de significação. Porto Alegre:Artes Médicas, 1997.

FAIRCLOUGH, N. Language and power. Londres:Longman, 1992.

FOUCAULT, M. L’Ordre du discours. Paris:Gallimard, 1971.

HALL,S. A identidade cultural na pós-modernidade. Rio de Janeiro: DP e A., 2003.

HARRÉ, R. e VAN LANGENHOVE, L. Introducing positioning theory. In:

HARRÉ, R. e VAN LANGENHOVE. Positioning theory: moral contexts of intentional action. Oxford: Blackwell, 1991.

KIMMEL, M.S. A produção simultânea de masculinidade hegemônicas e subalternas. Horizontes Antropológicos: Corpo, Doença e Saúde, 1998.

LINDE, C. Life stories. The creation of coherence. Nova York: Oxford University Press, 1993.

MCLLEVENNY, Paul. Popular Public Discourse at Speakers' Corner:

Negotiating Cultural Identities in Interac, 1996.

MOORE, S. Geeting a bit of the other: pimps of postmodernism. In: CHAPMAN, R e RUTHER FORD, J. (Eds). Male Order. Londres: Lawrence e Wishart, 1988.

MOITA LOPES, L. P. da. e BASTOS, L. C. Identidades: recortes multi e interdisciplinares. São Paulo: Mercado de Letras/CNPQ, 2003.

MOITA LOPES, L. P. da (2003) Discursos de identidades. São Paulo: Mercado de Letras, 2003.

_________. Identidades fragmentadas. Campinas: Mercado de Letras, 2002.

SARUP, M. Identy, culture and postmodern world. USA: The University of

Geórgia Press, 1996

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