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Guardiola Confidencial - Marti Perarnau

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Academic year: 2021

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Sum ário Prefácio Capítulo 1 Mom ento 1 Mom ento 2 Mom ento 3 Mom ento 4 Mom ento 5 Mom ento 6 Mom ento 7 Mom ento 8 Mom ento 9 Mom ento 10 Mom ento 11 Mom ento 13 Mom ento 14 Capítulo 2 Mom ento 12 Mom ento 15 Mom ento 16 Mom ento 17 Mom ento 18 Mom ento 19 Mom ento 20 Mom ento 21 Mom ento 22 Mom ento 23 Mom ento 24 Mom ento 25 Mom ento 26 CAPÍTULO 3 Mom ento 27 Mom ento 28 Mom ento 29 Mom ento 30 Mom ento 31 Mom ento 32 Mom ento 33 Mom ento 34 Mom ento 35

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Mom ento 36 Mom ento 37 Mom ento 38 Mom ento 39 Mom ento 40 Mom ento 41 CAPÍTULO 4 Mom ento 42 Mom ento 43 Mom ento 44 Mom ento 45 Mom ento 46 Mom ento 47 Mom ento 48 Mom ento 49 Mom ento 50 Mom ento 51 Mom ento 52 Mom ento 53 CAPÍTULO 5 Mom ento 54 Mom ento 55 Mom ento 56 Mom ento 57 Mom ento 58 Mom ento 59 Mom ento 60 Mom ento 61 Mom ento 62 Mom ento 63 Mom ento 64 Mom ento 65 Mom ento 66 Mom ento 67 Epílogo Sum ário

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PREFÁCIO

Há um a passagem neste livro que vai arrepiar os pelos do seu corpo. Não pretendo arruinar a experiência, apenas direi que tem a ver com Lionel Messi e um dos m om entos que, para Pep Guardiola, j ustificam a profissão de técnico de futebol. São poucas linhas que você vai ler e reler, im aginando com o a cena se deu e tentando com preender com o um instante, na solidão de um a sala ilum inada pela tela de um com putador, pode ter tanto significado.

Esta leitura lhe proporcionará outros m om entos m arcantes, com o a conversa entre Guardiola e o lendário enxadrista Garry Kasparov, um encontro de cérebros privilegiados traduzido em palavras. Ou a descrição m inuciosa das sessões de treinam ento do Bay ern de Munique, m aterial valioso para os interessados no m étodo de trabalho em cam po de um técnico revolucionário. Ler e reler será um hábito que o acom panhará até o últim o ponto, quando a estranha sensação de chegar ao final de um livro a contragosto se instalará. E você será convidado a com eçar de novo.

Pep Guardiola é um m istério. Com o profissional e com o pessoa, m antém o acesso a seu m undo restrito a poucos. Não perm ite invasões e não gosta de vazam entos. Antes deste trabalho de Martí Perarnau, o que foi publicado a respeito do técnico catalão se assem elhou a um olhar afastado, baseado em conversas com quem pôde ver m ais de perto. O autor entrou na bolha, foi convidado a sentar-se à m esa e nos trouxe um relato sem precedentes. Um dos grandes m éritos deste livro é ser capaz de surpreender não o leitor que quer conhecer Guardiola, m as o leitor que j ulga conhecê-lo.

Um a das surpresas é a desm istificação de um treinador identificado por m uitos com o um guardião da estética. O obj etivo principal dos tim es dirigidos por Guardiola não é praticar um futebol belo — essa é apenas a im pressão que eles provocam . Seus únicos dogm as são a coragem e a bola. E seu presente para o j ogo é desfazer o falso conflito entre “j ogar bem ” e “vencer”, um a falácia criada por preguiçosos que encanta os enam orados pelo futebol feio, algo ainda m ais deplorável do que não gostar de futebol. O Barcelona de Guardiola foi im piedoso com todos eles ao confiscar seus argum entos, com o disse definitivam ente César Luis Menotti em entrevista à revista argentina El Gráfico: “Guardiola foi um furacão devastador, arrasou com toda a farsa e a m entira, as destruiu, as aniquilou de tal m aneira, que agora até os italianos querem ter a bola e j ogar”.

A m onum ental obra do Barcelona dos “pequenos”, dos m eios--cam pistas frágeis e geniais, reform ou um a época em que a faixa central do cam po parecia

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território exclusivo para gladiadores m usculosos especializados na negação do j ogo. O sistem a aperfeiçoado por Guardiola criou um tim e histórico, que reprogram ou os obj etivos de clubes e seleções em relação à m aneira de atuar. Quando os executivos do Bay ern im aginaram com o deveria ser o futuro do tim e em term os de estilo, Guardiola representava a visão m ais com pleta e inovadora. Este livro é um diário da im plantação de um j eito de j ogar futebol que contraria as características do que sem pre se praticou na Alem anha. Mais um a dem onstração do caráter transform ador de Pep, pois não se trata de criar um Barça que fale alem ão, m as sim um Bay ern que fale “guardiolês”.

Lam ento pelos seus afazeres diários. Mesm o os obrigatórios serão influenciados por estas páginas — as próxim as, que fique claro — m agistralm ente escritas por Martí Perarnau, enfim traduzidas para o português. Elas são um a linha direta com o Steve Jobs do futebol.

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CAPÍTULO 1

TEMPO, PACIÊNCIA, PAIXÃO

“Precisam os de paciência.” KARL-HEINZ RUMMENIGGE *** “Precisam os de paixão.” MATTHIAS SAMMER ***

“Preciso de tem po.” PEP GUARDIOLA

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Mom ento 1

O enigm a de Kasparov Nova York, outubro de 2012

Garry Kasparov balançou a cabeça enquanto term inava o prato de salada. Usou as m esm as palavras pela terceira vez: “É im possível”. Já falava com um tom de irritação na voz. Pep Guardiola insistia em lhe perguntar as razões pelas quais considerava ser im possível com petir com o j ovem m estre Magnus Carlsen, o m ais prom issor enxadrista do m om ento.

O j antar transcorria em clim a am igável. Guardiola e Kasparov haviam se conhecido sem anas antes, e desde o início o técnico catalão dem onstrou abertam ente seu fascínio pelo grande cam peão. Kasparov encarna qualidades que Pep adm ira profundam ente: rebeldia, esforço, inteligência, dedicação, persistência, força interior… Daí o entusiasm o ao conhecê-lo pessoalm ente e encontrá-lo para dois j antares, em que conversaram sobre com petitividade, econom ia, tecnologia e, é claro, esporte. Guardiola se afastara da elite do futebol poucos m eses antes e com eçava a gozar de um ano de tranquilidade em Nova York. Deixara para trás, no FC Barcelona, um período triunfal — o m ais brilhante, bem -sucedido e apaixonante da história do clube catalão, talvez inigualável: seis títulos em sua prim eira tem porada, além de catorze troféus dos dezenove possíveis em quatro anos. Os resultados de Guardiola eram excepcionais. Mas, para alcançá-los, ele havia se esgotado. Exausto e descontente, disse adeus ao Barça antes que os danos provocados fossem irreversíveis.

Em Nova York, ele queria com eçar de novo e viver um ano de paz, esquecim ento e tranquilidade. Precisava preencher um reservatório de energia que tinha se esvaziado e passar m ais tem po com a fam ília, que pouco via pelos com prom issos de trabalho. Sua intenção era conhecer novas ideias e dedicar-se aos am igos. Um deles era Xavier Sala i Martín, professor de econom ia da Universidade Colum bia e tesoureiro do Barça em 2009 e 2010, a últim a etapa de Joan Laporta com o presidente do clube. Sala i Martín é econom ista de prestígio internacional e um bom am igo dos Guardiola. Morando em Nova York há m uito tem po, ele foi essencial para que a fam ília de Pep vencesse algum as reservas em relação à cidade norte-am ericana: os filhos não dom inavam o inglês e Cristina, a esposa, ocupava-se dem ais com o negócio da fam ília na Catalunha. Assim , não entendiam bem o que Guardiola propunha. Sala i Martín encoraj ou a fam ília a curtir a experiência de viver em Nova York, que acabou sendo m uito m elhor do que esperavam .

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Guardiola convidou o econom ista para visitar sua casa em Nova York. “Sinto m uito, m as esta noite tenho um com prom isso: m arquei de j antar com o casal Kasparov”, desculpou-se, antes de sugerir a Pep que o acom panhasse. Guardiola ficou encantado com a ideia, assim com o o próprio Kasparov e sua esposa, Daria. Foi um encontro fascinante. Não falaram de xadrez nem de futebol, m as de invenções e tecnologia, da coragem de rom per paradigm as, das virtudes de não se acovardar diante da incerteza e da paixão. Falaram m uito da paixão. Kasparov expôs de form a clara suas ideias pessim istas sobre os avanços tecnológicos. Segundo ele, o m undo está estacionado econom icam ente porque o potencial tecnológico serve basicam ente para j ogos e novos inventos não possuem a relevância dos antigos. Na opinião de Kasparov, a invenção da internet não pode ser com parada à da eletricidade — que provocou um a autêntica transform ação econôm ica, perm itindo o acesso da m ulher ao m ercado de trabalho e m ultiplicando por dois o volum e da econom ia m undial. O ex-cam peão m undial de xadrez explicou que a verdadeira influência da internet na econom ia produtiva, não na financeira, é m uito inferior à que teve a eletricidade. Deu com o exem plo o iPhone, cuj a capacidade processadora é m uito superior à dos com putadores da Apollo 11, os agc (Apollo Guidance Com puter), que possuíam cem vezes m enos m em ória ram que um sm artphone atual. Segundo Kasparov, os agc serviram para levar o hom em à Lua, m as agora usam os a potencialidade de um telefone celular para m atar passarinhos (referindo-se ao gam e popular Angry Birds). Sala i Martín, um hom em de raciocínio prodigioso, assistiu m aravilhado à conversa entre Kasparov e Guardiola: “Foi fascinante ver dois hom ens tão inteligentes im provisando um diálogo sobre tecnologia, invenções, paixão e com plexidade”, disse.

O encantam ento m útuo foi tam anho que, poucas sem anas m ais tarde, eles se encontraram para um segundo j antar — ao qual Sala i Martín não pôde com parecer porque estava na Am érica do Sul, m as que teve a presença de Cristina Serra, esposa de Pep. Naquela segunda noite, sim , se falou de xadrez. Guardiola ficou surpreso com a intensidade de Kasparov ao falar sobre o norueguês Magnus Carlsen, visto por ele com o o indiscutível futuro cam peão m undial — o que de fato aconteceu um ano depois, em novem bro de 2013, com a vitória sobre Viswanathan Anand por 6,5 a 3,5. Kasparov rasgou elogios ao j ovem m estre (de 22 anos na época), a quem chegou a treinar secretam ente em 2009, e tam bém detalhou algum as fraquezas que deveria corrigir se quisesse dom inar por com pleto o m undo do tabuleiro. Foi então que Guardiola perguntou se Kasparov se sentia capaz de vencer o em ergente cam peão norueguês. A resposta o surpreendeu: “Tenho capacidade para derrotá-lo, m as é im possível”. Guardiola im aginou se tratar de um a frase politicam ente correta que continha toda a diplom acia que um hom em im petuoso com o Kasparov era capaz de dem onstrar. E por isso insistiu: “Mas, Garry, se você tem capacidade, por que não

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conseguiria vencê-lo?”. A segunda tentativa obteve a m esm a resposta: “É im possível”. Guardiola é teim oso, m uito teim oso, e não largou o osso que Kasparov lhe atirara. Insistiu um a terceira vez, enquanto o enxadrista ia se encerrando cada vez m ais em sua concha protetora, os olhos fixos no prato, com o naqueles tem pos em que precisava defender um a posição frágil no tabuleiro. “É im possível”, voltou a dizer com certo ar de lam úria. Guardiola m udou de tática, afastou o prato de salada, que m al havia tocado, e decidiu esperar outra oportunidade para sondar as razões pelas quais Kasparov se sentia incapaz de vencer o j ovem Carlsen. Não só por curiosidade, m as porque tinha consciência de que a resposta podia guardar um dos segredos do esporte de alto nível.

Fazia só quatro m eses que Pep abandonara o com ando do Barça, depois de construir um cartel de vitórias único e inim aginável. Tinha deixado o clube porque se sentia vazio, desgastado, esgotado, incapaz de levar m ais glórias a um a equipe que havia se fartado de tantas conquistas. Foi o prim eiro e único na história do futebol a conseguir os seis títulos possíveis em um a m esm a tem porada. Mas Guardiola renunciou ao Barça por esgotam ento e agora, j á renovado e recuperado, ciente de que a energia voltava ao seu corpo — e, sobretudo, à sua m ente —, via-se diante de um dos grandes m itos do esporte, o qual lhe repetia sem hesitar que ainda possuía as capacidades para vencer, m as que era im possível fazê-lo. Sentiu curiosidade, é lógico. O enigm a de Kasparov continha m uito m ais que um a anedota para contar aos netos; nele se encontrava a resposta para o que Guardiola desej ava saber há m uito tem po: por que se desgastara tanto no Barça? E, principalm ente, com o evitar tanto desgaste no futuro?

Se eu tivesse que definir Pep Guardiola, diria que ele é um hom em que duvida de tudo. A origem dessas dúvidas não é a insegurança nem o m edo do desconhecido: é a busca da perfeição. Ele sabe que alcançá-la é im possível, m as a persegue do m esm o m odo. Por isso, m uitas vezes tem a sensação de que seu trabalho está inacabado. Guardiola é obcecado pelas dúvidas. Acredita que só pode encontrar a m elhor solução depois de exam inar todas as opções. Lem bra, nesse aspecto, o m estre enxadrista que analisa todas as j ogadas possíveis antes de realizar o m ovim ento seguinte. A obsessão por esclarecer as dúvidas é um traço da essência de Pep, capaz de dar voltas e m ais voltas em torno de qualquer assunto que envolva o j ogo antes de tom ar um a decisão.

Quando estuda com o encarar um a partida, ele não duvida da vocação do seu tim e: todos ao ataque, com a bola e para ganhar. Mas esses são conceitos m uito am plos, e Guardiola desenha com traços finos. Suas grandes ideias são im utáveis, contudo se com põem de m uitas pequenas ideias, que ele vai destrinchando na sem ana que antecede a partida. Pensa e repensa sobre a escalação, a entrada de

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um j ogador em vez de outro, os m ovim entos que cada atleta fará em função do adversário, a sintonia de algum j ogador com um com panheiro, com o trabalhar as linhas da equipe diante do ataque inim igo…

A m ente de Guardiola se parece com a do enxadrista que calcula e analisa todos os m ovim entos, próprios e do adversário, para antecipar m entalm ente o desenvolvim ento da partida. Jogue contra quem j ogar, a preparação será idêntica: não haverá um segundo de descanso até que ele estude e avalie todas as opções. E quando term inar, voltará de novo a todas elas. É o que Manel Estiarte, seu braço direito no Barça e no Bay ern, cham a de “lei dos 32 m inutos”, em alusão à dificuldade de fazer Pep se desconectar do futebol. Estiarte em prega todos os recursos ao seu alcance para de vez em quando conter a obsessão do treinador e obrigá-lo a se distrair, m as sabe por experiência própria que a distração não dura m ais de m eia hora: “Você o leva para com er em um restaurante para que se esqueça do futebol, m as depois de 32 m inutos j á vê que ele com eça a divagar. Os olhos m iram o teto, ele faz que sim com a cabeça, diz que está escutando, m as não olha pra você, j á está pensando outra vez no lateral esquerdo do tim e adversário, nas coberturas do volante, nos apoios ao ponta… Passou m eia hora e ele volta a suas digressões internas”, explica Estiarte.

Se os j ogadores estiverem fechados com ele, se o Bay ern o apoiar, Guardiola não se desgastará tanto com a tensão causada pela análise constante das variáveis. Às vezes, Estiarte o m anda em bora de Säbener Straβe, a cidade esportiva do Bay ern, para que ele se desconecte. Nesses dias, Guardiola volta para casa e passa um tem po com os filhos, brinca com eles, m as m eia hora depois vai até um canto que preparou no final de um corredor, que não chega sequer a ser um quarto pequeno, e recom eça suas divagações. Passaram -se 32 m inutos e é preciso repassar novam ente todas as dúvidas, apesar de ser a quarta vez no dia em que as exam ina.

Por tudo isso, a resposta de Garry Kasparov era tão im portante. Daí vinha sua insistência em resolver o enigm a. Por que um m estre lendário com o Kasparov, cuj as capacidades são excepcionais, considerava im possível derrotar um rival? Foram Cristina e Daria, as esposas, as rainhas daquele tabuleiro nova-iorquino, que desvendaram o enigm a. Levaram a conversa novam ente para o rum o da paixão, desse ponto passaram à exigência e ao desgaste em ocional e, por fim , desem bocaram na concentração m ental. “Talvez sej a um problem a de concentração”, sugeriu Cristina. Daria deu a resposta: “Se fosse só um a partida e durasse apenas duas horas, Garry poderia vencer Carlsen. Mas não é assim : a partida se prolongaria por cinco ou seis horas, e ele não quer viver outra vez o sofrim ento de passar tantas horas seguidas com o cérebro funcionando a todo vapor, calculando possibilidades sem descanso. Carlsen é j ovem e não tem consciência do desgaste que isso provoca. Garry tem , e não gostaria de voltar a

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passar por isso durante dias a fio. Um conseguiria se m anter concentrado por duas horas; o outro, por cinco. Por isso seria im possível ganhar”.

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Mom ento 2

Chuva e expectativa em Munique Munique, 24 de junho de 2013

É festa de São João, o prim eiro dia de Guardiola no Bay ern, e está chovendo. Ele parece não se im portar. Está radiante, precisa até conter em alguns m om entos o sentim ento de plenitude que o invade. Mais do que m edo, o que Guardiola sente é felicidade, e ele não quer esconder isso. Felicidade, basicam ente, porque está de volta ao futebol. E regres-sa, além de tudo, no lom bo de um cavalo im petuoso e veloz com o o Bay ern, um clube que tam bém está em êxtase e transborda em oção, com o se a contratação de Pep fosse m ais um título na tem porada da tríplice coroa, ou a prim eira conquista do novo percurso.

É 24 de j unho de 2013, e o Bay ern vive um dia histórico. Mas realiza-se apenas um a entrevista coletiva. Foram credenciados 247 j ornalistas, o m aior núm ero j á registrado no clube para um evento dessa natureza. O am biente na Allianz Arena é extraordinário, com o se a chegada de Guardiola fosse, m ais que um a apresentação, um acontecim ento. O entusiasm o invade o estádio de Munique, há tensão no ar e um a m ultidão se am ontoa na sala de im prensa. O técnico está exultante com a retom ada das atividades. Ele rej uvenesceu, não é o hom em extenuado que abandonou o Barça: o brilho voltou aos seus olhos. Deve ser a proxim idade da bola. É a paixão. “Eu gosto de futebol, j á gostava antes de ser j ogador. Gosto de j ogar, gosto de ver, gosto de falar de futebol. Vou m e confinar em Säbener Straβe para aprender rápido tudo o que preciso saber sobre o clube, sobre os j ovens da base e, principalm ente, sobre os rivais na Bundesliga”, ele diz.

Karl-Heinz Rum m enigge, presidente do com itê executivo do Bay ern, logo estabelece os obj etivos: “Para nós, o título m ais im portante é o da Bundesliga, um cam peonato de 34 rodadas, ainda que o m ais atraente sej a o da Cham pions — nela não dá para garantir nada, e não adianta j ogar de form a m ecânica. Tenho m uita vontade de saber o que Pep m udará na equipe”. O técnico faz com as m ãos um gesto que indica que m udará m uito pouco, em bora m e dê a sensação de estar sendo diplom ático. Perto se encontram seus principais colaboradores, que parecem concordar com ele. Manel Estiarte, sem pre à som bra, será seu braço direito, pronto a lhe dizer o que for necessário para aj udá-lo a m anter o rum o. Dom ènec Torrent ocupará o posto de treinador assistente, a ser dividido com Herm ann Gerland, um profissional da casa que acom panhou o crescim ento de Thom as Müller, David Alaba e Philipp Lahm . Gerland cairá com o um a luva na equipe de Guardiola.

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físico que largou tudo para seguir Guardiola até o Barça, de onde tam bém partiu j unto com o técnico. Buenaventura, peça-chave entre os colaboradores, acom panhou Pep até Munique. A seu lado está Carles Planchart, que dirigirá a equipe de scouting, encarregada da indispensável tarefa de analisar os rivais e, principalm ente, os m ovim entos do próprio tim e.

Cristina, a esposa de Guardiola, e Maria, a filha m ais velha, sentam --se na sexta fileira do auditório. Ali tam bém está Pere Guardiola, irm ão do técnico, assim com o Evarist Murtra, o diretor que propiciou a chegada de Pep ao banco do Barça, e Jaum e Roures, em presário que explora os direitos audiovisuais do futebol espanhol. O representante do treinador, Josep Maria Orobitg , fecha o pequeno grupo de fam iliares e am igos.

O Bay ern recebe Guardiola com a sensação de ter adquirido a últim a peça para concluir a escalada até o topo do esporte. Rum m enigge expressa a ideia assim : “Conseguim os dim inuir em dez pontos a diferença para o Barcelona no ranking m undial, m as ainda som os os segundos. Ainda não som os os prim eiros, apesar dos grandes êxitos obtidos na tem porada. Estou contente por ter conseguido contratar alguém com o Guardiola. É um privilégio para o Bay ern”. Pep tenta conter o entusiasm o crescente: “Seria m uita presunção afirm ar que o Bay ern pode m arcar um a era. Tem os que ir passo a passo. As expectativas são m uito altas e não é fácil. Estou um pouco nervoso”. Para a surpresa de todos, ele se expressa em um alem ão correto, provocando certo alvoroço, j á que ninguém esperava esse nível de conhecim ento da língua. Chega a usar expressões gram aticalm ente com plexas: em prega com acerto o pronom e dem onstrativo “diese” e usa reiteradam ente o difícil vocábulo “Herausforderung” quando fala do desafio que terá, algo que os m eios de com unicação alem ães destacaram em profusão. Com o passar dos m eses, esse dom ínio do idiom a lhes parecerá norm al, ainda que m uitas vezes Pep volte a pedir calm a a algum j ornalista de fala m ais apressada.

Todos querem saber o que m udará, se haverá um a revolução parecida com a que ele fez ao chegar ao Barça em 2008, quando dispensou Ronaldinho e Deco. Guardiola rej eita a ideia: “São poucas as coisas para m udar na equipe. Cada treinador tem suas ideias, m as, na m inha opinião, não é preciso m udar m uito num a equipe que ganhou quatro títulos” (ele inclui a Supercopa de 2012). “O Bay ern está m uito bem , é um tim e excelente. Espero m antê-lo no nível alcançado com Hey nckes, que é um grande técnico, a quem adm iro não som ente pelas últim as façanhas, m as por toda a carreira. Espero logo m e encontrar com ele, porque sua opinião m e interessa m uito. É um a grande honra ser seu sucessor. Ele m erece todo o m eu respeito.”

Com o se nunca tivessem ganhado nada, clube e técnico deixam para trás os respectivos históricos e parecem querer com eçar j untos um a nova vida — ainda

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que em quatro anos Guardiola tenha conquistado catorze títulos e o clube de Munique, de história gloriosa, sete. É por isso que Uli Hoeneβ, presidente do clube, não está m entindo ao j urar que se beliscava quando Guardiola aceitou sua proposta: “No princípio, quando Pep disse que podia se im aginar algum dia treinando aqui, não podíam os acreditar”.

Eles iniciam essa cam inhada conj unta com paixão j uvenil, grandes esperanças e altas expectativas, m as tam bém com o peso de saber que tudo ainda está por ser feito. No futebol, sem pre se com eça do zero e só existe o presente: “Quando um clube com o o Bay ern cham a, você atende na hora. Estou disposto, estou pronto. Para m im é um desafio. Meu período no Barcelona foi fantástico, m as eu precisava de novas m etas e o Bay ern m e ofereceu essa possibilidade. Estou preparado e, ainda que sinta a pressão, tenho que ser capaz de viver com ela. Com o treinador do Bay ern, você precisa fazer o tim e j ogar bem e ganhar. Mesm o que, repito, não ache que um tim e tão vencedor precise de grandes m udanças”. É um discurso bastante diferente do articulado em 2008, quando ele assum iu o Barça e prom eteu correr e lutar até o últim o arrem esso lateral do últim o m inuto do últim o j ogo. Aqui, o esforço é dado com o certo, e a pressão que Guardiola exercerá sobre si m esm o e os atletas será com o a chuva ou a cervej a em Munique: fará parte da paisagem .

Nesse 24 de j unho, seu ideal futebolístico se resum e a poucas palavras: “Minha ideia de futebol é sim ples. Gosto de atacar, atacar e atacar”. Todos descem para o cam po para que Guardiola experim ente pela prim eira vez o banco da Allianz Arena. Recordando Kaváfis e o célebre poem a sobre Ítaca, de que o técnico tanto gosta, um dos catalães presentes na fresca m anhã de segunda-feira em Munique lhe desej a “que o cam inho sej a longo”. Guardiola se volta e com pleta: “Que sej a bom !”.

A verdade é um a só: Guardiola não aguentava m ais ficar sem futebol. Quase provocou um ataque de nervos em Manel Estiarte quando lhe pediu que organizasse seu escritório em Säbener Straβe a partir de 10 de j unho. “O que você vai fazer lá? Não haverá ninguém ! Aproveite as férias, porque serão suas últim as em m uito tem po…”, ele respondeu.

Pep volta para onde quer estar. Com sua paixão, o futebol. Mas e o Bay ern, do que precisava? Por que a m udança? Por que o cavalo ganhador, três vezes ganhador, m uda de cavaleiro? Por quê? Warum?

Com preender a razão pela qual o Bay ern decidiu m udar de técnico na tem porada de m aior sucesso da sua história exige um esforço intelectual difícil nos tem pos de hoj e. Obriga a refletir sobre a vida dos clubes, a com plexidade do futebol e o papel dos dirigentes de um a em presa que m escla o tangível e o intangível, gols e gritos em partes iguais. O que houve na Baviera foi que um grupo de grandes ex-j ogadores decidiu proj etar um novo cam inho para um clube

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cuj o estilo de j ogo sofria de certo déficit de identidade. O Bay ern tinha história, poder, dinheiro, autoestim a, sustentação social e um a traj etória gloriosa. Seus inúm eros êxitos se som avam às m elhores virtudes germ ânicas: a persistência, a fé indestrutível e a fortaleza de espírito. Mas era difícil definir com exatidão sua filosofia de j ogo. Hoeneβ e Rum m enigge decidiram adquirir o que faltava. Não se lim itaram a ir atrás de m ais títulos, procuraram tam bém um selo de identidade que caracterizasse sua hegem onia, um a assinatura duradoura. O obj etivo era que, depois de algum tem po, a m arca Bay ern deixasse de ser vista apenas com o reflexo de esforço, coragem , potência e vitórias. E nessa busca, o eleito foi Guardiola.

Talvez a m aior dem onstração de inteligência bávara tenha sido se renovar enquanto o Bay ern estava no auge. Se a escolha fosse pela continuidade, ninguém reprovaria o clube — especialm ente à vista do tríplice sucesso de Hey nckes e seu plantel. Com Guardiola o que se quis foi dar um passo além , ser um pouco m elhor e, sobretudo, ser m elhor com m ais frequência e de form a perceptível. Não era um proj eto fácil, porque Hey nckes chegara m uito longe. Nesse 24 de j unho, no gram ado da Allianz Arena, Guardiola revela os prim eiros sinais de cum plicidade com Matthias Sam m er, o diretor técnico do Bay ern que lhe dará m uito suporte nos m eses seguintes. Os olhos de Pep parecem transm itir o paradoxo que o Bay ern vive: após chegar ao topo, decidiu voar ainda m ais alto. Em Munique chove cerca de 134 dias no ano, e Guardiola tam bém terá que se acostum ar com isso.

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Mom ento 3

É o Bay ern

“Prepare-se, Manel. Escolhi o Bay ern.” Nova York, outubro de 2012

Em Pescara, noroeste da Itália, Manel Estiarte sorri ao pensar em Guardiola: rápido na escolha de um novo ciclo, lento no adeus a um capítulo j á encerrado. No fim , o destino não será a Inglaterra, m as a Alem anha.

A conversa acontece em outubro de 2012, cinco m eses depois da saída do Barcelona. Durante esse período, Guardiola recebeu ofertas de vários clubes: Chelsea, Manchester City, Milan — e, logicam ente, do Bay ern. Na realidade, não eram prom essas financeiras, m as cartas de am or, propostas que pretendiam arrebatar o coração do técnico que levou o Barça ao topo.

A despedida em Barcelona foi longa e difícil. Guardiola expôs os m otivos do adeus ao am igo Estiarte antes de fazer o m esm o com o clube ou com o próprio Tito Vilanova (falecido em abril de 2014, vítim a de câncer na garganta), seu assistente técnico e sucessor. Explicou tudo com detalhes, m as a realidade poderia ser narrada de form a resum ida: desgaste. Depois de quatro anos de intensidade m áxim a, Guardiola havia se esgotado m ental e fisicam ente. Estava exausto. Tinha dado tudo o que podia e se sentia incapaz de continuar.

Não era o único m otivo, claro. Durante quatro anos, Pep se desdobrou no papel de técnico, líder, porta-voz, presidente virtual e até m esm o organizador de viagens. Prim eiro, trabalhou sob a presidência de Joan Laporta, de personalidade vulcânica, capaz de fazer o bem e o m al ao m esm o tem po, elétrico, ousado. Em seguida, atuou com Sandro Rosell, um hom em que esconde a frieza do tecnocrata sob um a m áscara de doçura. Nesse período, Guardiola usou sua calm a e sobriedade para com pensar o com portam ento histriônico de Laporta, e respondeu ao espírito hesitante de Rosell com um a superdose de energia. O convívio com os dois presidentes esteve longe de ser tranquilo.

Mas em relação a Laporta, ele sentia gratidão. Ainda que não fossem grandes am igos, Pep lhe agradecia pela dupla oportunidade oferecida: a prim eira, dirigir a equipe filial, o Barcelona b, que Guardiola fez subir da difícil terceira divisão, um título sem pre destacado por ele em seu currículo; e a segunda, treinar o tim e principal um ano m ais tarde. Seu reconhecim ento era sincero e profundo, e se estendia ao diretor esportivo, seu antigo com panheiro de equipe no Dream Team de Cruy ff, o habilidoso ponta Txiki Begiristain.

Os anos sob o com ando de Laporta não foram calm os, apesar do sucesso incontestável. Tim e e clube seguiam por cam inhos diferentes: em vez de ter a

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sensação de conduzir um barco veloz, Guardiola se sentia no lem e de um im enso transatlântico. Nenhum a decisão era sim ples, fosse a de transferir os treinam entos para a nova cidade esportiva, estender o contrato de patrocínio aos m em bros da com issão técnica, coordenar as film agens publicitárias ou definir a política do clube diante de qualquer conflito. O Barcelona era um a engrenagem com plexa que m archava em direção e ritm o diferentes daqueles que Guardiola im prim ia à equipe. Mas, m esm o com todas essas dificuldades, a sintonia esportiva com Laporta era com pleta. E o tim e ganhava tudo.

Entretanto, no início de 2010, Guardiola percebeu que o futuro em Barcelona não seria fácil. Sandro Rosell era o principal aspirante ao cargo de presidente nas eleições do verão daquele m esm o ano. Favorito indiscutível, Rosell havia sido vice-presidente esportivo do clube de 2003 a 2005, quando se dem itiu por desentendim entos com Laporta. Voltaria para suceder o desafeto, um feito alcançado por im pressionante m aioria dos votos.

Com Laporta, o técnico conquistara os seis títulos possíveis na tem porada: Liga, Copa do Rei, Cham pions League, Supercopas da Espanha e da Europa e Mundial de Clubes. Mas a chegada de Rosell à presidência acrescentou um novo elem ento à j á com plexa gestão do clube: a anim osidade, o rancor. Em particular, o novo presidente cham ava Pep de “dalai-lam a”. Não parecia confiar nele, via-o com o alguém totalm ente alinhado com Laporta e se rem oía pelos seis títulos que seu antecessor havia conseguido “antes da hora”. A distância entre presidente e técnico aum entou depois da prim eira grande decisão de Rosell, quando conseguiu que a assem bleia de sócios votasse a favor de m over um a ação j udicial contra Laporta. Rosell habilm ente se absteve. Para Guardiola, aquilo m arcou o início de um longo adeus.

Durante quatro anos, Pep exigiu o rendim ento m áxim o de seus atletas, o que provocou atritos inevitáveis. É claro que alguns seguiam treinando sem se abalar, m as outros j á se dedicavam m enos, porque se consideravam os m elhores do m undo, com o atestava a im ensa lista de títulos conquistados. Mais de um m em bro do elenco j á se m otivava apenas nos grandes j ogos e procurava desculpas para evitar as partidas duras e frias de j aneiro e fevereiro em cam pos hostis. Além disso, um j ogador recém -contratado não fazia por m erecer a confiança que recebera.

Apesar de o conj unto seguir funcionando, Guardiola disse um dia: “Quando notar que os olhos dos m eus j ogadores não brilham m ais, será hora de ir em bora”. No início de 2012, alguns olhares estavam apagados.

Guardiola se foi porque se sentia desgastado. Ainda que se diga em Barcelona que pesou em sua decisão o fato de Rosell ter se negado a apoiá-lo na suposta rem odelação do plantel, que incluiria a dispensa de j ogadores com o Piqué, Fàbregas e Daniel Alves, o técnico respondeu de m aneira contundente quando

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lhe perguntei sobre isso: “Não é verdade. Não faria sentido nenhum . Fui em bora do Barcelona porque havia m e esgotado por com pleto. Anunciei a decisão ao presidente em outubro de 2011 e não houve nenhum a m udança posterior de opinião. Não pedi para reform ular o elenco: não seria lógico, porque eu j á tinha decidido ir em bora. A única verdade é que naquele ano ganham os quatro títulos e j ogam os m elhor do que nunca, com o 3-4-3 contra o Real Madrid ou o 3-7-0 que usam os no Mundial de Clubes. Jogam os m aravilhosam ente, m as eu estava no lim ite do desgaste e j á não sabia que variações táticas ainda poderia oferecer à equipe. Por isso fui em bora. Não houve nada m ais”.

Ele foi para Nova York em busca de sossego — tarefa nada fácil, considerando os seguidos ataques que chegavam de Barcelona.

O ano sabático foi repleto de propostas de clubes que sonhavam em contratá-lo. O Manchester City de seu colega Txiki Begiristain insistiu m uito. Pep se reuniu em Paris com Rom an Abram ovich, que estava disposto a tudo e j á tinha até com eçado a renovar o elenco do Chelsea com j ogadores bem ao gosto de Guardiola, com o Hazard, Oscar e Mata. Um a delegação do Bay ern assistiu, no dia 25 de m aio de 2012, à últim a partida de Pep no Barça, a final da Copa do Rei contra o Athletic de Bilbao, em Madri. Foi a derradeira vitória com o Barcelona (3 a 0), o últim o título conquistado.

Naquela ocasião, os dirigentes do Bay ern não se reuniram com Guardiola, m as com seu representante. Fazia seis dias que o tim e de Munique sofrera um a dolorosa derrota contra o Chelsea na final da Cham pions League, em plena Allianz Arena. Foi a fatídica noite dos pênaltis perdidos, um golpe duríssim o que encerrava um a tem porada am arga. Um a sem ana antes, em 12 de m aio, na final da Copa da Alem anha disputada em Berlim , o Borussia Dortm und vencera os bávaros por 5 a 2. E o Borussia era a m esm a equipe que havia conquistado de form a brilhante o segundo título consecutivo na Bundesliga, abrindo oito pontos de frente em relação ao Bay ern. Em poucas sem anas, três títulos tinham sido perdidos: a Liga, a Copa e a Cham pions. Depois da derrota na cruel final europeia, Hey nckes prom eteu à esposa que só continuaria “m ais um ano”. Os diretores do Bay ern pensavam da m esm a m aneira: tinham que procurar um substituto. Queriam Guardiola e, seis dias m ais tarde, viaj aram a Madri para deixar claro esse desej o.

Guardiola tam bém se interessava pelo Bay ern. Um ano antes, no final de j ulho de 2011 — pouco depois de ter conquistado de m odo brilhante (por 3 a 1) a Cham pions League diante do Manchester United em Wem bley —, o Barcelona disputou a Copa Audi em Munique. Pep gostou da cidade esportiva de Säbener Straβe, m enor e com m enos instalações que a do Barça. Reservadam ente, com entou com Manel Estiarte: “Gosto disto. Um dia eu poderia treinar aqui”.

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escutara a m esm a frase em relação a outro grande clube. Foi um dia depois de terem elim inado o Real Madrid nas sem ifinais da Cham pions: Guardiola e Estiarte tinham viaj ado a Manchester para ver ao vivo o rival da final em Wem bley. Em 4 de m aio de 2011, sentados na tribuna de Old Trafford, assistiram ao Manchester United × Schalke 04 que levaria a equipe de sir Alex Ferguson a m ais um a final. Encantado com a atm osfera da partida (o tim e da casa venceu por 4 a 1), Pep disse ao am igo: “Gosto deste am biente. Um dia eu poderia treinar aqui”.

Guardiola sente autêntica veneração pelos grandes nom es do futebol europeu e pelas equipes lendárias. Por isso, Estiarte não estranhou o encantam ento do am igo. Desta vez, pelo Bay ern. Tam pouco foi surpresa para ele o sentim ento de adm iração em relação a Uli Hoeneβ e Karl- -Heinz Rum m enigge quando os quatro tom aram café j untos. Trocaram palavras am áveis e de consideração m útua. O Bay ern tinha acabado de contratar Jupp Hey nckes para liderar a segunda fase do plano bávaro (a prim eira foi executada por Van Gaal), e Guardiola vinha da conquista de outra Cham pions e seguia com prom etido com o Barça, de m odo que nenhum deles cogitava um a aproxim ação definitiva.

Ao contrário do que se disse, Pep não lhes deu seu núm ero de telefone. Era o m ês de j ulho de 2011 e abandonar o Barça ainda não fazia parte dos planos, m uito m enos deixar seu contato. Para o técnico que conquistara tudo o que se podia im aginar com um estilo de j ogo que apaixonou o m undo inteiro não seria preciso anotar dados pessoais em um bilhetinho. “Não foi exatam ente com o se relatou na im prensa: tínham os j ogado um a partida am istosa contra o Bay ern e nos encontram os com Kalle [Rum m enigge] e Uli [Hoeneβ] para conversar um pouco. Expressei a eles m inha adm iração pela equipe que com andavam e elogiei o Bay ern com o grande clube que sem pre foi, nada além disso. Nunca tinha im aginado treinar o Bay ern. Nem naquele m om ento pensei nisso, não ofereci m eus serviços. Alguns anos depois aconteceu, m as porque o futebol tem dessas coisas, não porque eu provoquei ou planej ei esse desfecho”, explicou Guardiola.

Na prim avera de 2012 a situação j á havia m udado substancialm ente, com o ocorre tantas vezes no futebol. Esgotado e exausto, apesar da conquista de m ais quatro títulos — as Supercopas da Espanha e da Europa, o Mundial de Clubes e a Copa do Rei —, Guardiola se despedia de Barcelona. Cheios de energia apesar de terem perdido todos os títulos, Hoeneβ e Rum m enigge sabiam que Hey nckes só teria m ais um ano à frente da equipe e com eçavam a pensar em um substituto. Foram atrás de Guardiola na final da Copa do Rei em Madri para fazê-lo saber desse interesse. Reuniram -se com o representante de Pep e puseram as cartas na m esa: Hey nckes j á tinha avisado que iria em bora, e eles queriam Guardiola para o ano seguinte.

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ocasionalm ente, Guardiola disse a Estiarte: “Prepare-se, Manel. Escolhi o Bay ern”. Os dois foram esportistas de nível internacional e cam peões olím picos. Mas são m uito diferentes, e talvez por isso se com plem entem tão bem . Guardiola foi um j ogador excepcional, que gostava de passar despercebido em cam po. Jogava m uito longe do gol adversário e sabia conduzir a equipe com o ninguém . Antes de realizar um a j ogada, j á tinha pensado na seguinte. Todos os seus m ovim entos tinham o obj etivo de pôr o com panheiro na m elhor posição possível, facilitar suas ações. Para Guardiola, o sucesso consistia em organizar o tim e.

Já Estiarte foi “o Maradona da água”, um atleta de polo aquático único, com incrível talento para decidir j ogos. Por sete anos consecutivos, entre 1986 e 1992, foi eleito o m elhor j ogador do m undo dessa m odalidade. Ganhou todos os títulos possíveis, conquistou todas as m edalhas existentes e recebeu os m aiores prêm ios. Era um goleador insaciável, um “assassino” da área. Jogou 578 vezes pela seleção espanhola, e com ela m arcou 1561 gols, além de participar de seis Jogos Olím picos. Resolvia sozinho as partidas e por isso tam bém era cham ado de “o Michael Jordan da água”. Tinha sido o artilheiro m áxim o em quatro Olim píadas consecutivas e em todas as outras com petições, m as não conseguia ganhar o ouro com a Espanha. Até que, um dia, resolveu m udar.

Em um a de suas reflexões, quando j á havia iniciado um a am izade m uito boa com Guardiola, com preendeu que se continuasse j ogando de m aneira individualista, buscando o gol sem pensar na equipe, talvez seguisse sendo um hom em de recordes, m as nunca alcançaria o ouro olím pico. Assim , após ser vice-cam peão nas Olim píadas de Barcelona, m odificou sua form a de j ogar.

Fez um a dura autocrítica, renegou o egoísm o típico do artilheiro e se pôs à disposição do coletivo. Passou a defender ainda m ais que os outros, deu preferência à troca de passes com os com panheiros e

re-nunciou às j ogadas individuais. Estiarte deixou de ser o artilheiro dos torneios, m as a sorte da equipe m udou: a seleção espanhola ganhou o ouro olím pico e o cam peonato m undial. Seu sacrifício pessoal significou o sucesso de todos.

Com o fizera no Barcelona, Estiarte se m antém à som bra tam bém no Bay ern, enquanto Guardiola com anda a equipe. Ele sabe m elhor do que ninguém o que sente um artilheiro e com o é se debater entre as aspirações pessoais e as necessidades do coletivo. Anos depois de ter sido com o Maradona ou Michael Jordan, sua principal característica é a discrição. Sonda o am biente, intui o que pode acontecer, antecipa-se ao m ovim ento seguinte e oferece à equipe sua experiência. Acim a de tudo, protege e aj uda Pep em tudo o que é possível, com o o m eio--cam pista que dá passes de gol ao atacante.

Por tudo isso, é um a pessoa m uito im portante para o técnico. Perguntei a Guardiola sobre essa im portância: “Olha, os técnicos são sem pre m uito sós, e o que nós querem os ter ao nosso lado é fidelidade. Nos m om entos de solidão,

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naqueles m om entos em que as coisas não vão bem , que sem pre existem e sem pre existirão, o técnico quer ter por perto pessoas em quem pode acreditar e confiar. Manel sem pre foi isso: fidelidade. Além da grande aj uda que m e dá, do trabalho concreto que realiza, da quantidade de coisas que ele faz por m im , além de tudo isso, em Manel tenho alguém em quem m e apoiar nos m om entos ruins ou de dúvida. E tam bém nos bons m om entos. É incrível poder dividir todos esses m om entos com ele. Manel foi o m elhor no seu esporte e tem um a intuição especial; ainda que se trate de outra m odalidade, o atleta em si é m uito parecido em um a ou outra especialidade. Ele tem intuição para saber se estam os indo bem ou não, se perdem os o pulso, se o vestiário é nosso ou não, se há inform ações vazando, coisas desse tipo… Isso só é possível saber com um a intuição especial, de quem sabe ler olhares e gestos. E Manel tem isso. Além de ter sido o m elhor do m undo no seu esporte, tem tam bém essa intuição. Os outros atletas fazem as coisas de form a m ecânica; os realm ente bons possuem um dom especial para se destacar. Bem , Manel tem esse dom ”.

Guardiola não hesita em recorrer a ele. “Às vezes digo: ‘Manel, senta, m e diz quais são as suas im pressões’. Ele é m uito sincero e inteligente. No início não m e dizia tudo, m as cinco anos depois m e conhece m elhor e consegue transm itir m uito m ais essas sensações. Sabe quando deve m e dizer as coisas e quando não deve. Por tudo isso, preciso dele ao m eu lado. Som os am igos tam bém , claro. Sua fidelidade é absoluta e, m esm o depois de ter sido o Maradona da água, ele é o prim eiro a arregaçar as m angas, sej a qual for o trabalho a ser feito.”

Em outubro de 2012, em Nova York, Maria, Màrius e Valentina, os três filhos de Guardiola, ainda sofriam um pouco para aprender o inglês e se adaptar à escola. O telefone do técnico catalão toca com frequência com propostas para dirigir tim es de futebol. O City de Txiki Begiristain é insistente. Abram ovich lançou m ão de todos os seus encantos: quer Pep e vai construir um Chelsea sob m edida para ele. Vai dar o que Guardiola pedir. Os alem ães são m uito sérios: não fazem grandes prom essas e dizem apenas o que precisa ser dito.

“Prepare-se, Manel. Escolhi o Bay ern.”

Escolher o Bay ern não im plica assinar o contrato im ediatam ente. Significa abrir um processo de negociações para chegar a um acordo financeiro e trocar algum as ideias sobre filosofia de j ogo. Mas Hoeneβ não vacila: “Não se preocupe, encontrarem os o dinheiro”.

O Bay ern decidiu não ter dívidas bancárias. Prim eiram ente, estabelece o investim ento necessário; em seguida, com unica o plano aos sócios, que fazem o aporte dos fundos. E é assim nesse caso: Guardiola é o investim ento, e os sócios logo terão o dinheiro para realizá-lo.

Pep, Uli e Kalle falam de futebol, sobre com o j ogar e quais j ogadores utilizar. Já é o suficiente. Os três logo se entendem quando a conversa inclui um a bola.

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Debatem sobre Mario Góm ez, Luiz Gustavo e Ty m oshchuck, e Guardiola diz que não quer que o Bay ern libere Toni Kroos. Em dezem bro os contratos são assinados em Nova York, durante a visita do presidente Hoeneβ à casa de Guardiola, e j á em j aneiro o acordo vem a público. O Bay ern não tem a delicadeza de avisar Hey nckes, que se ressente dos am igos Hoeneβ e Rum m enigge. Na verdade, os dois dirigentes executaram a m issão de buscar um substituto para o técnico, que com unicou que deixaria o Bay ern na prim avera de 2013. De qualquer m odo, faltou inform á-lo com antecedência sobre quem seria seu substituto.

Pep avisou o Manchester City, o Chelsea e o Milan a respeito de sua escolha, m as a rede de televisão Sky Itália é que acaba revelando que Guardiola será o novo treinador do Bay ern, e o clube de Munique precisa antecipar o anúncio oficial do acordo, divulgado em 16 de j aneiro de 2013. Em Barcelona, as m ás línguas aproveitam para dizer que Guardiola escolheu um destino m uito confortável. Nesse m om ento, no entanto, poucos podem im aginar com o Hey nckes elevará o nível das exigências ao conquistar a tríplice coroa, consagrando-se com o um a lenda entre os técnicos do Bay ern.

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Mom ento 4

Na vanguarda do futebol europeu Munique, 25 de junho de 2013

“Estam os na terceira fase da renovação do futebol do Bay ern de Munique.” A frase é de Paul Breitner, lenda do Bay ern e do Real Madrid. Ele explica as diferentes etapas dessa renovação e volta ao final dos anos setenta: “Durante décadas, o Bay ern j ogou com o m esm o sistem a. Com o técnico Pál Csernai, Kalle e eu com eçam os a j ogar da form a com o o Bay ern j ogou até 2008: podem os cham á-la de um 4-1-4-1, 4-2-4 ou 4-4-2, m as na verdade é sem pre a m esm a proposta tática com alguns m ovim entos diferentes. Este sistem a j á caducou. No século xxi, faz parte do passado”.

No Bay ern havia a certeza de que era preciso m udar, m as não se sabia exatam ente com o. Até que chegou o holandês Louis van Gaal. “Sabíam os que hoj e em dia só se pode ganhar títulos com o futebol que o Barcelona pôs em prática”, Breitner diz. “O Barça com eçou a j ogar com o um tim e de basquete: com m ovim entação intensa e m udanças de ritm o, alternando posições, com posse de bola… Chegava a até cinco horas de posse de bola em 90 noventa m inutos”, ele ri. “O futebol m oderno é assim , e talvez continue sendo assim o futebol da próxim a década até que se im plem ente um a nova ideia. Com o podíam os m udar nosso futebol antiquado pelo futebol de hoj e? Com Louis van Gaal. E foi um a ideia acertada, porque renovou totalm ente o nosso sistem a”, explica.

Segundo Paul Breitner, Van Gaal representou a prim eira fase da evolução no j ogo do Bay ern: “Ele fez a equipe j ogar com posse de bola e alterou alguns m ovim entos. Com eçam os a praticar o j ogo de posição em vez do estilo clássico do Bay ern. Mas as posições eram fixas. Cada j ogador tinha seu lugar, seu círculo de influência e só. Não podia e não devia sair desse círculo. Foi assim que com eçam os a j ogar focados em passar a bola entre nós. Chegam os a fazer partidas com 80 por cento de posse de bola, m as sem ritm o. Éram os m uito lentos. Todo m undo na Allianz Arena com eçava a bocej ar a partir de m eia hora de j ogo, porque passávam os a bola sem ritm o. Os 71 m il espectadores sabiam , em cada m om ento, o que ia acontecer. Era um j ogo correto, m as m uito previsível”.

Jupp Hey nckes capitaneou a segunda fase: “Ele m anteve o sistem a do Van Gaal, m as m udou o conceito de apenas m anter a bola. Viu que a ideia era boa, m as que era necessário desenvolvê-la com velocidade, com m udanças de ritm o. Precisou de dois anos para im plantar sua filosofia. Conseguiu no segundo turno do últim o cam peonato, que ganham os com recorde de pontos [a tem porada 2012/2013]. No prim eiro turno, de agosto a dezem bro, ainda foi preciso corrigir

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m ovim entos; m as, nas prim eiras partidas do segundo turno, em j aneiro e fevereiro, a equipe j á tinha o ritm o desej ado e um j ogo com pletam ente diferente do início”, explica Breitner.

Pep Guardiola foi o escolhido para liderar a terceira etapa: “Exatam ente. Hey nckes ainda j ogava com posições fixas, m as em alta velocidade e com o obj etivo de m arcar m uitos gols. Não queríam os só a posse da bola, a ideia era m arcar m uitos gols. Agora, com Pep, j á passam os à alternância de posições, à circulação constante da bola, à m ovim entação contínua dos atletas. Estam os a cam inho de j ogar com o o Barça de dois ou três anos atrás, que j ogou m elhor do que nunca”.

A explicação de Paul Breitner acontece quando Guardiola acaba de ser apresentado com o novo técnico. Ainda há m ais esperanças que realidades. O Bay ern, não nos esqueçam os, teve sete treinadores em um a década: de Hitzfeld a Guardiola, sete treinadores. Não é exatam ente um exem plo de estabilidade, m uito em bora pareça coerente a evolução dos últim os três anos relatada por Breitner.

Em 25 de j unho de 2013, apenas um dia depois da apresentação oficial de Pep, torna-se inevitável a pergunta: com eça um a nova era no futebol europeu? Com eça a ditadura do Bay ern? Na Biergarten, cervej aria típica da Baviera no Viktualienm arkt de Munique, falam os sobre isso com três j ornalistas catalães: Ram on Besa, do El País, Marcos López, do El Periódico e Isaac Lluch, do diário Ara. Os três duvidam : “Pode ser, m as não é certo, porque o Barça ainda não entregou os pontos e outras potências vão se encorpando em outros lugares. Não sei se voltará a haver j á de im ediato um grande ditador no futebol europeu, com o foi o Pep Team. Não podem os saber se o Bay ern de Guardiola será esse novo grande ditador”.

Mounir Zitouni, j ornalista da revista alem ã Kicker, m enciona a inteligência em ocional com o fator-chave para que a Operação Guardiola sej a um sucesso: “Pep tem um plano e os j ogadores terão que m udar algum as ideias. Nós, j ornalistas, tam bém precisam os fazer um esforço de com preensão. Será m uito im portante que os j ogadores se adaptem à nova m aneira de j ogar. Mas Pep tam bém terá que se adaptar. Tem que ser um com prom isso de am bas as partes, que poderá trazer bons resultados, j á que nesse elenco existe m uita qualidade. Será um a questão de inteligência em ocional para as duas partes”.

Nas cidades m ais envolvidas com futebol na Alem anha, grupos de aficionados de todos os clubes reúnem -se com j ornalistas, blogueiros e tuiteiros para dividir opiniões e algum as cervej as. Naquela m esm a noite, nós j antam os em Munique com um desses grupos, que se cham a #tpMuc. Stefen Niem ey er, um desses fanáticos, acom panha o Bay ern em todas as viagens do tim e. Quando o trabalho de Guardiola ainda está por com eçar, Stefen considera que a decisão do clube foi

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a m ais acertada: “Em dezem bro de 2012 j á diziam que tínham os perdido a Bundesliga, a Copa da Alem anha e a Cham pions. Hoj e se diz que o Bay ern foi a equipe perfeita, m as em dezem bro de 2012 não era assim . Um a das habilidades do Bay ern consiste em sem pre buscar cam inhos para progredir e m elhorar. Fez isso com Hey nckes e faz tam bém com Pep. É claro que o legado de Hey nckes é m uito especial, m as ainda há coisas que m otivam , com o ganhar a Supercopa europeia do Chelsea de Mourinho, com quem tem os contas pendentes. Ou tentar ganhar a Cham pions League duas vezes consecutivas, fazer nossos atletas j ogarem ainda m elhor. Ou sej a, existem m etas a serem alcançadas. Pep pode conseguir. Por isso é um a decisão win-win”.

No futebol, m uitos consideram um a decisão de alto risco m udar enquanto se está ganhando. “Para m im faz todo o sentido. Guardiola, por m uitas razões, era visto com o o m elhor técnico do m undo até o ano passado. E o Bay ern tinha a oportunidade única de dar um passo adiante. Era preciso tom ar um a decisão, e estou de pleno acordo com o que foi feito. Ganham os todos: o futebol alem ão, o Bay ern de Munique, os torcedores e Guardiola. Acho que ele tem um plano de ação que consiste em aplicar o tipo de futebol que aprendeu em Barcelona, que chega perto da perfeição, m as pretende tam bém conhecer outras facetas do j ogo praticado em outras partes do m undo, outras m entalidades. Por isso decidiu trabalhar no exterior, para aperfeiçoar seu estilo e seu repertório tático. Pep teve m uito tem po para analisar o Bay ern e acho que tem a ideia de não copiar exatam ente o j ogo do Barcelona, m as de m elhorar o Bay ern m udando algum as coisas. E suponho que depois de três anos ele ainda irá a outro país, em busca de outro estilo”, diz Niem ey er.

Falam os com Christian Seifert, diretor-executivo da liga alem ã, a Deutsche Fußball Liga (dfl), e ele se diz contente com a chegada do técnico: “Na Alem anha, todo m undo está entusiasm ado com Guardiola. A contratação não provocou ciúm es ou qualquer tipo de irritação. Em todos os lugares se considera que ele fará m uito bem à Bundesliga. É um grande estím ulo. Com ele, serem os m elhores”.

Encerram os nossa busca pelas razões para a contratação voltando a Paul Breitner: “O Bay ern não pensou em ninguém m ais, só em Pep Guardiola. Proj etam os o que precisava ser feito para que ele viesse a Munique. Era nosso futuro e nossa única possibilidade”.

Os diretores do Bay ern precisaram de m uita coragem para m udar o que estava funcionando. “Se disserm os só isso, esquecem os um a verdade. Antes de com eçar a tem porada 2012/2013, Jupp Hey nckes tom ou um a decisão: era o seu últim o ano. Ele a com unicou a Hoeneβ e Rum m enigge. Ou sej a, Hey nckes iria em bora e teríam os que substituí-lo de qualquer m aneira. Então, os dirigentes do Bay ern com eçaram a pensar em Pep. Pensaram nele m uito antes de o Bay ern

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conseguir a tríplice coroa, m uito antes. Em m arço ou abril, m uita gente perguntou por que m udaríam os de técnico se Hey nckes estava ganhando tudo e o tim e j ogava m uito bem . Por quê? Por quê? Porque essa decisão quem tom ou foi Hey nckes em j unho de 2012. Com Pep não havia nenhum risco. Todo m undo estava convencido de que ele deveria ser nosso novo técnico”, explica Breitner.

“É possível que o clube volte a dom inar a Europa com o o Bay ern dos anos 1970 ou o Bay ern de pouco tem po atrás?”, pergunto a Breitner. “Tenho certeza de que o Bay ern liderará o futebol europeu nos próxim os cinco anos, m esm o que não ganhe todos os anos a Cham pions League. Na verdade, não é preciso ganhá-la todos os anos para ser o m elhor. Penso que o Bay ern entrará em um a era de ouro com o a do Barcelona nos últim os cinco anos. Estou certo disso”, ele responde.

“Você reconhece que um grande paradoxo está sendo criado? O clube de Beckenbauer contrata o filho de Cruy ff para consolidar seu sucesso”, com ento com ele. “Não, não é um paradoxo, de m aneira algum a. Respeitam os m uito o futebol holandês, e Johan Cruy ff sem pre foi um grande am igo e adversário, m as sobretudo é um a grande pessoa e foi um técnico excelente no Barça. Não é nenhum paradoxo, de form a algum a”, afirm a Breitner.

Beckenbauer e Cruy ff, j ogadores em blem áticos do Bay ern e do Barça, e sím bolos da Alem anha e da Holanda, enfrentaram -se na final da Copa do Mundo de 1974 em Munique. Agora, seus herdeiros se unem para alcançar o m esm o obj etivo: a suprem acia no futebol europeu. Sobre o tabuleiro de xadrez, Guardiola j oga com as peças verm elhas.

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Mom ento 5

O prim eiro treino Munique, 26 de junho de 2013

Se tivesse que ir para a guerra, o prim eiro soldado que Guardiola recrutaria seria Lorenzo Buenaventura.

Buenaventura é m adrugador por natureza e não vê problem as em se levantar da cam a às seis da m anhã. Guardiola o cham ou para um café bem cedo, a fim de revisar os detalhes do treinam ento desta tarde, 26 de j unho, a prim eira j ornada de trabalho no Bay ern. Já há m uito tem po eles sabem perfeitam ente em que consistirá a sessão inaugural, que será realizada na Allianz Arena, porque o clube acredita no com parecim ento em m assa dos torcedores.

Os dois precisaram de poucas conversas para concluir o plano de trabalho das prim eiras sete sem anas. Trocaram algum as ideias — Guardiola em Nova York, e Lorenzo em Cádis — e aj ustaram calendários. O clube m arcou alguns am istosos antes do início da Bundesliga, program ado para a sexta-feira, 9 de agosto. Mas a série de partidas inclui tam bém um a rodada da Copa da Alem anha e, principalm ente, a Supercopa alem ã, em Dortm und, j ustam ente contra o Borussia. Mais adiante, o Bay ern ainda participará de outro am istoso com o obj etivo de recolher fundos para as vítim as das inundações que assolaram a Baviera.

Em 14 de m aio de 2013, Guardiola escreveu um e-m ail de cinco linhas com o plano de ação das prim eiras sete sem anas e o enviou à sua equipe de colaboradores. A m eta era sim ples: ser com petitivo na Supercopa da Alem anha e com eçar a Bundesliga em boa form a. Era um docum ento singelo, preparado em catalão e alem ão, que incluía um período de retiro na Itália m uito esperado por todos. Para Pep, a viagem era um a bênção, m uito diferente das terríveis turnês de pré-tem porada que enfrentava com o Barça. Para Buenaventura, tam bém . Nos prim eiros 45 dias, o novo preparador físico do Bay ern pôde coordenar um trabalho que visava 13 j ogos (dez am istosos e três oficiais) e 45 sessões de treino, das quais doze foram j ornadas duplas, de m anhã e à tarde. No Barcelona, Buenaventura nunca teve condições sem elhantes. No Bay ern, som ando treinam entos e j ogos, os atletas realizarão cerca de sessenta sessões de trabalho em apenas sete sem anas. É um luxo para os padrões dos grandes clubes, e Buenaventura está satisfeito.

Ele não fala alem ão, som ente inglês, m as se com unica sem dificuldades com o pessoal do Bay ern. É um dos preparadores físicos de m elhor reputação no m undo, e form ou-se com Paco Seirul·lo. Apesar de ter origem no atletism o, Seirul·lo fez escola na preparação física voltada para o futebol e outros esportes

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coletivos. Pôs seu m étodo em prática no Dream Team de Johan Cruy ff e j á acum ula 25 anos de sucesso no Barça.

Buenaventura aprendeu com Seirul·lo a m etodologia dos m icrociclos estruturados, que se baseia em pequenos ciclos de treinam ento, de três a cinco dias, dedicados ao trabalho de algum a capacidade física: força de resistência, força elástica ou força explosiva, dependendo do j ogador e do m om ento da tem porada. Sem pre utilizando a bola, o treinam ento sim ula as condições técnico-táticas da partida seguinte. Ou sej a, os j ogadores treinam exatam ente com o j ogam . E em cada m inuto do treinam ento estão presentes os princípios de j ogo que Guardiola propõe.

Em todas as sessões, dá-se prioridade a determ inados obj etivos técnicos e táticos que Guardiola e Buenaventura estabeleceram : um dia é a saída de bola; no outro, a pressão depois de perder a bola no ataque, e assim por diante.

A prim eira sessão de trabalho do novo Bay ern tem um protagonista: a bola. Rum m enigge estava curioso para descobrir com o seria: “Quero ver logo os treinam entos para saber o que Pep m udará na equipe”. Matthias Sam m er disse o m esm o com outras palavras: “Agora é o m om ento de conhecer Pep, de ele nos conhecer e de trabalharm os j untos da m elhor m aneira possível”. Para Rum m enigge, Sam m er e especialm ente para os j ogadores, o prim eiro treino guarda um a grande surpresa. Não haverá corridas contínuas, nem séries de m il m etros, nem circuitos de m usculação, nem atividades de atletism o: só um a m ontanha de bolas.

Durante o café da m anhã no hotel Westin Grand München, Guardiola repassa com seus colaboradores o planej am ento do dia e às 7h30 se dirige a Säbener Straβe. Ainda não há treino a essa hora, m as os j ogadores aparecem para a revisão m édica e Guardiola quer cum prim entá-los. No gram ado da cidade esportiva do Bay ern, os recém -chegados terão contato com os veteranos da com issão técnica, que perm aneceram no clube depois da partida de Jupp Hey nckes: Herm ann Gerland, que será o prim eiro assistente técnico j unto com Dom ènec Torrent; Toni Tapalović, treinador de goleiros desde que chegou ao Bay ern com Manuel Neuer em 2011; Andreas Kornm ay er e Thom as Wilhelm i, os dois preparadores físicos que vão colaborar com Buenaventura.

Às quatro da tarde, Buenaventura e seus dois auxiliares estão na Allianz Arena organizando as atividades do dia. São acom panhados por três j ogadores da equipe j uvenil, que aprendem o que deve ser feito para depois dem onstrar os m ovim entos à equipe principal. Enquanto isso, cerca de 7 m il torcedores estão chegando. Cada um pagará cinco euros em benefício das vítim as das inundações, apesar da longa viagem até o estádio: as obras de rem odelação da estação de Fröttm aning, a m ais próxim a da Allianz Arena, obrigam o grupo a descer do m etrô em Alte Heide e fazer um a dem orada transferência em ônibus especiais.

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No m etrô de Munique quase ninguém fala ao celular, m uito em bora quase todos usem o aparelho para ler ou escrever. As viagens são silenciosas, o que surpreende quem está acostum ado à agitação m editerrânea. Só m uito de vez em quando alguém rom pe o protocolo e inicia um a conversa telefônica, m as aos sussurros, dificilm ente levanta a voz. Esse silêncio se transform a em gritaria nos dias de j ogos, quando torcedores barulhentos e alegres invadem os vagões, m uitas vezes m isturados aos adversários. Juntos, eles transform am a viagem em um concurso de cânticos, que com eça m uito antes do aconselhável para suas gargantas. Mas hoj e é dia de estreia, e quem com parece à Allianz Arena são fam ílias cheias de crianças: Guardiola chegou e o clim a é de festa.

Pep ainda não fala aos j ogadores sobre os obj etivos da tem porada. Essa conversa ficará para depois. Por diferentes razões, vários dos principais atletas estão ausentes: Javi Martínez, Dante e Luiz Gustavo, que não chegam até 15 de j ulho; Robben, Alaba, Mandžukić, Shaqiri, Van Buy ten e Pizarro, que irão diretam ente ao retiro na Itália dentro de um a sem ana; além dos lesionados Götze, Schweinsteiger e, claro, Badstuber, que será baixa durante toda a tem porada. Por isso, Guardiola evita um longo discurso. Faz 398 dias que não com anda um treinam ento e seu m aior desej o é voltar ao seu verdadeiro escritório: o gram ado. Um m inuto antes das cinco da tarde ele sobe ao cam po acom panhado de cerca de vinte j ogadores, m uitos deles da base. No círculo central, dirige ao grupo pouquíssim as palavras: “Só tenho um a exigência: todos têm que correr. Vocês podem errar um passe ou um a j ogada, m as não podem parar de correr. Se pararem , kaputt, fora do tim e”.

Em seguida, o treino com eça.

A prim eira conversa é, portanto, breve e concisa. Duas horas m ais tarde, Jan Kirchhoff, um a das novas contratações do Bay ern, diz: “Esperávam os que ele falasse em inglês, m as todas as instruções foram em alem ão”.

A sessão com eça com alguns rondos1 de aquecim ento. São form ados três círculos, cada um com oito atletas. Seis deles, situados ao longo do perím etro, com eçam a passar a bola com a m áxim a velocidade enquanto dois, no interior, tentam roubá-la. O exercício é m uito m enos dinâm ico que no Barcelona, onde os j ogadores praticam isso desde a categoria infantil. Os cam peões da Europa ainda parecem um pouco travados, e Guardiola coça a cabeça. Eles esperavam atletism o e se encontraram com um a bola.

O anel m ais baixo das arquibancadas do estádio está cheio de torcedores, m as não se ouve quase nada. O torcedor alem ão pode ser m uito barulhento e cantar sem parar dentro dessas m odernas catedrais, m as quando assiste a um treinam ento é respeitoso com os protagonistas e perm anece em silêncio. Após duas séries de rondos de oito m inutos, interrom pidas para hidratação, e de alguns m ovim entos para ativação, o aquecim ento está concluído. A bola não deixa de

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fazer com panhia para os atletas, que passam ao prim eiro exercício específico: um trabalho de resistência com três linhas. Guardiola e Buenaventura interrom pem várias vezes para corrigir os m ovim entos, porque os j ogadores têm dificuldades para com preender os detalhes, por m ais que Wilhelm i, Kornm ay er e os j uvenis repitam cada ação insistentem ente. E Pep continua coçando a cabeça. Buenaventura explica esse prim eiro exercício: “É um trabalho de resistência em setenta m etros. Na ida, o ritm o é m ais lento, porque os j ogadores realizam três exercícios técnico-táticos. A volta é som ente um a corrida. No total, eles terão corrido aproxim adam ente quatro quilôm etros em idas e voltas de um traj eto de cerca de 150 m etros. É um a atividade de resistência em que, em vez da sim ples corrida, introduzim os um trabalho de cooperação, que depois se transferirá para o j ogo. Ou sej a, há conceitos do j ogo de Pep em cada um a das linhas: um é procurar o terceiro hom em e encontrá-lo bem posicionado; outro é o dois contra um ; e o terceiro é um a sequência de passes. No início, os três j ogadores cooperam e depois cada um faz o seu trabalho — isso é totalm ente novo para eles. Nos anos anteriores, esse m esm o trabalho de resistência podia incluir séries de oitocentos m etros, m il m etros, ou de corrida contínua. Nós introduzim os a bola, a cooperação e m ais alguns conceitos de j ogo”.

No banco, Matthias Sam m er e Bastian Schweinsteiger assistem atentam ente. Basti sofreu um a cirurgia no tornozelo direito, realizada em 3 de j unho. O prim eiro inform e m édico falou em dez dias de recuperação, m as j á transcorreu m ais do que o dobro desse tem po e ele ainda não está em condições de treinar. Nas arquibancadas do estádio, Holger Badstuber e Mario Götze tam bém observam os com panheiros. Em setem bro, Badstuber terá que operar novam ente o j oelho direito. Em 3 de dezem bro de 2012, ele passou por intervenção cirúrgica devido à ruptura do ligam ento cruzado sofrida durante a partida contra o Borussia Dortm und, m as am argou um a recaída em m eados de m aio. A seu lado, Götze sente problem as m usculares. Em 30 de abril, sofrera ruptura fibrilar dos m úsculos isquiotibiais da perna esquerda durante a sem ifinal Real Madrid × Borussia Dortm und na Cham pions. Forçou a recuperação para tentar disputar a final, m as tam bém teve um a recaída e, quase dois m eses depois da lesão, segue afastado dos treinam entos. Nos três casos, as ausências são m ais longas que o anunciado. Guardiola volta a coçar a cabeça.

No gram ado, o exercício básico do dia, com andado por Buenaventura, j á term inou. Os j ogadores realizaram as corridas m ais rápido que o necessário, e no aspecto técnico dem onstraram algum as falhas, talvez pela presença de m uitos j ovens da base. Dez treinam entos depois, a m esm a atividade terá execução quase perfeita.

Em seguida com eçam as quatro séries de quatro m inutos de j ogos de posição, as denom inadas “conservações”, um a atividade m uito im portante para o

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