Campos do Jordão (SP), 31 de agosto de 2013.
Discurso do Ministro Alexandre Tombini, Presidente do Banco
Central do Brasil, no 6º Congresso Internacional de Mercados
Boa tarde.
É com grande satisfação que participo deste sexto Congresso Internacional de Mercados Financeiros e de Capitais organizado pela BM&FBovespa.
Este Congresso representa uma excelente oportunidade para discutirmos economia, finanças e, principalmente, o sistema financeiro, aqui considerando os segmentos bancário e não bancário, e todo o mercado de capitais.
Nesse sentido, gostaria de parabenizar a BM&FBovespa pela realização deste Congresso, atualmente, um dos mais importantes eventos no âmbito do Sistema Financeiro Nacional e agradecer o Pedro Parente e o Edemir Pinto pelo convite para proferir a palestra de encerramento.
No pronunciamento desta noite, tratarei especificamente de estabilidade financeira.
A estabilidade financeira, de uma forma ou de outra, sempre esteve no radar dos supervisores. Mas, no passado, era outra a dimensão. Muito mais restrita e com um rol de instrumentos bem mais limitado. Além disso, a preocupação com a estabilidade financeira sempre foi cíclica. Nos períodos de calmaria dos mercados, como o observado durante a grande moderação, era relegada a segundo plano.
Questões relacionadas à saúde dos bancos, à assunção de riscos pelos agentes, à dinâmica dos mercados de crédito e de capitais, à evolução dos preços dos principais ativos da economia e aos fluxos de capitais eram tratadas de forma não sistêmica. A regulação financeira era centrada essencialmente em regras microprudenciais, baseadas no pressuposto de que a solvência das instituições financeiras individualmente asseguraria a estabilidade de todo o sistema financeiro.
A crise internacional de 2008 impôs uma nova realidade às preocupações com a estabilidade financeira.
A estabilidade dos sistemas financeiros, tanto em nível nacional quanto global, tornou-se questão central na agenda dos supervisores, que passaram a se preocupar com a saúde e a solvência do sistema como um todo, e não somente das instituições individualmente, como prevalecia no pré-crise. O princípio e o objetivo de se avaliar potenciais impactos sobre a estabilidade financeira passou a estar presente em todas as ações e políticas dos supervisores. Em vários países, os mandatos das autoridades foram modificados para se adequarem a essa nova responsabilidade, conferindo-a assim, perenidade.
Ampliaram-se consideravelmente os atores envolvidos nesse processo. Embora os supervisores continuem sendo os protagonistas e, em última instância, os responsáveis por garantir a estabilidade financeira, há agora
maior engajamento dos demais entes do governo e dos próprios agentes do mercado.
Por fim, em um contexto de forte interconexão entre as instituições globais e os mercados, criou-se o Comitê Internacional de Estabilidade Financeira, o Financial Stability Board, para fortalecer a cooperação entre supervisores de diferentes jurisdições.
No Brasil, talvez por influência dos períodos de turbulência observados nas décadas de 1980 e 1990, o princípio da estabilidade financeira faz-se presente, há mais tempo, nas ações, nas políticas e no modus operandi da nossa supervisão. O Banco Central do Brasil há vários anos tem como uma de suas missões institucionais assegurar a estabilidade financeira e o bom funcionamento do nosso sistema.
Isso não significa que ficamos parados no tempo.
Muito pelo contrário. Nos últimos anos fortalecemos o princípio da estabilidade financeira em todas as nossas medidas, ações e políticas, no campo da administração, da regulação, da organização do sistema financeiro e das operações com o mercado.
Entre todos os aperfeiçoamentos, destaco três:
Primeiro. Instituímos, aperfeiçoamos e fortalecemos os fóruns de coordenação no âmbito do próprio Banco Central e de supervisores nacionais, bem como ampliamos e intensificamos a nossa representação nos fóruns internacionais. Isso tem propiciado uma visão mais abrangente dos mercados e dos segmentos que compõe o sistema financeiro, nacional e internacional, o que contribui para adoção de ações e políticas para a manutenção e o fortalecimento da estabilidade financeira no País.
No âmbito do Banco Central, constituímos o Comitê de Estabilidade Financeira (Comef), fórum que contribui de forma decisiva para a formulação de políticas e a implantação de ações que visam mitigar potenciais riscos ao sistema.
No contexto nacional, intensificamos o intercâmbio de informações e a coordenação de ações e de políticas com os demais supervisores financeiros, por meio de iniciativas bilaterais ou de forma mais abrangentes no âmbito do Comitê de Regulação e Fiscalização dos Mercados Financeiro, de Capitais, de Seguros, de Previdência e Capitalização (Coremec).
No contexto internacional, ampliamos e fortalecemos também a nossa coordenação com os supervisores de outros países, intensificando nossa representação nos fóruns internacionais, como o FSB e o Comitê de Basileia, e o intercâmbio bilateral com países em que estão presentes instituições financeiras brasileiras ou cujas instituições estão presentes em nosso mercado. Atualmente o Brasil preside o FSB regional.
Segundo. Ampliamos e fortalecemos nossos sistemas de registros e de monitoramento, propiciando uma avaliação mais abrangente e precisa do comportamento dos agentes e dos mercados.
Aperfeiçoamos os sistemas de registro e de liquidação: ampliamos a central de risco de crédito (SCR); reforçamos a regulamentação dos registros privados; exigimos informações de melhor qualidade e tempestividade no seu fornecimento; e incentivamos o mercado a criar outros sistemas de registro, como a Central de Cessão de Crédito (C3) e a Central de Exposição de Derivativos (CED).
A propósito, por meio das centrais de registro, realizamos atualmente um mapeamento completo e contínuo de todas as exposições com derivativos envolvendo instituições financeiras. E ao contrário do que observamos em 2008, não identificamos no momento estratégias com alavancagem ou aceleradores. Mais do que isso: os derivativos tidos como exóticos, hoje, são insignificantes em relação ao valor nocional total.
O terceiro aperfeiçoamento foi adotar postura mais pró-ativa para mitigar potenciais riscos à estabilidade financeira.
Como exemplo, destaco as normas editadas para moderar a tomada excessiva de riscos nas operações de crédito ao consumo e no ingresso intenso e vultoso de capitais internacionais voláteis. Todos esses movimentos, de forma isolada ou combinada, ameaçavam a estabilidade da economia e a do próprio sistema financeiro.
Essas providências foram importantes para manter o bom funcionamento dos nossos mercados em um período de expansão da liquidez internacional e de intenso fluxo de capitais, principalmente para as economias emergentes. Com tais ações, mesmo diante de ampla liquidez internacional, o fluxo de capital volátil para o Brasil moderou; os prazos ampliaram-se e a natureza do capital mudou, compondo-se, já há algum tempo, majoritariamente de investimento estrangeiro direto.
Senhoras e senhores:
O compromisso com a estabilidade financeira está presente em todas as medidas, ações e políticas do Banco Central do Brasil.
E esse compromisso se faz presente no atual contexto, em que está em curso processo de transição na economia mundial. Diga-se de passagem, transição positiva, pois significa que a recuperação da maior economia do mundo está ganhando força e isso representará maior crescimento da economia e do comércio global à frente.
Nos últimos cinco anos, o mundo conviveu com a flexibilização das condições monetárias nas economias avançadas, com política monetária convencional no extremo e várias iniciativas não convencionais.
No entanto, o processo de normalização das condições monetárias nas economias avançadas já começou. A comunicação do Banco Central dos Estados Unidos, parte integrante desse processo, já mudou. E essa mudança está se refletindo nas variáveis financeiras.
Os mercados se anteciparam aos fatos e, na ausência de informações claras e precisas de como se dará esse processo de retirada dos estímulos monetários, os preços dos ativos financeiros estão mais voláteis, oscilando ao sabor de cada dado sobre o ritmo de atividade da economia norte-americana.
As economias emergentes são as mais impactadas por essa volatilidade. Sempre foi assim. E não é diferente no caso da economia brasileira.
No entanto o Brasil está preparado para enfrentar essa volatilidade. O sistema financeiro está sólido, com elevados níveis de capital, liquidez e provisões. E o Banco Central irá adotar as providências necessárias para assegurar a estabilidade do sistema financeiro e da economia e o bom funcionamento dos mercados.
Nos últimos anos, observamos uma recomposição da natureza dos ingressos de recursos estrangeiros, com o aumento dos capitais de mais longo prazo e a moderação dos de curto prazo. Essa recomposição tem sido importante nesse momento de maior volatilidade dos mercados internacionais.
A propósito, desde que a volatilidade aumentou em meados de maio, continuamos observando fluxo positivo tanto de investimento direto quanto de portfólio, inclusive com o aumento da participação de investidores estrangeiros na dívida mobiliária pública interna. Não obstante, é importante ressaltar que eventuais saídas pontuais são naturais, não representando mudança de tendência nem alterando as condições de financiamento do país e o acesso de empresas brasileiras ao mercado financeiro internacional.
Ademais, ao longo dos últimos dois anos, continuamos ampliando nosso colchão de segurança e de liquidez. Adicionamos quase US$90 bilhões às nossas reservas internacionais, que hoje ultrapassam US$370 bilhões.
Esse colchão permite ao Banco Central, nesse período de transição, marcado por níveis mais elevados de volatilidade e pelo aumento da aversão ao risco, ofertar proteção (hedge) aos agentes econômicos e, se necessário, liquidez aos diversos segmentos do mercado.
Na semana passada o Banco Central anunciou o programa de leilões de swap cambial e de venda de dólares com compromisso de recompra.
Semanalmente, pelo menos até o final deste ano, realizaremos leilões de swap cambial, no montante de US$2 bilhões, e de venda com compromisso de recompra, no total de US$1,0 bilhão. Se necessário, realizaremos operações adicionais.
Esse programa, além de conferir previsibilidade, ofertará aos agentes econômicos proteção cambial (hedge) superior a US$100 bilhões, se considerarmos o montante de proteção que já foi disponibilizado.
Nossa estratégia é clara: utilizaremos nosso amplo rol de instrumentos para reduzir volatilidade excessiva e mitigar potenciais riscos à estabilidade financeira. E essa estratégia estará presente durante todo o período de transição entre o mundo atual e o mundo à frente, de condições monetárias normalizadas e maior crescimento da economia e do comércio global.
Senhoras e senhores:
O trabalho árduo que realizamos nos últimos anos – supervisores e mercado – resultou em um sistema financeiro mais sólido e eficiente.
Mas nossa agenda de trabalho apenas se renova. Temos importantes iniciativas em curso, como:
• as ações no âmbito do Programa “Otimiza BC”, que visam reduzir custos administrativos, operacionais e processuais e consolidar um novo modelo de governança para a racionalização do fluxo de informações entre o Banco Central e o Sistema Financeiro;
• o projeto de revisão do arcabouço regulatório referente ao segmento não bancário de intermediação, para promover ambiente de negócios mais equilibrado, com menores custos operacionais e com potencial para o desenvolvimento de novas atividades compatíveis com as transformações observadas pelo mercado de capitais nos últimos anos; e
• o Certificado de Operações Estruturadas (COE), que dará maior transparência e segurança jurídica e operacional às operações estruturadas de captação.
Estamos acompanhando de perto também o projeto da BM&FBovespa de integração de suas clearings de ações, derivativos, ativos e câmbio. É, sem dúvida, um projeto audacioso e complexo, à altura do moderno e eficiente Sistema de Pagamentos Brasileiro.
Finalizando, parabenizo novamente a BM&FBovespa pela realização deste sexto Congresso Internacional de Mercados Financeiros e de Capitais e agradeço o Pedro Parente e o Edemir Pinto pelo convite para proferir esta palestra de encerramento.
Boa noite a todos. Alexandre Tombini