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Algumas reflexões sobre a administração pública

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Academic year: 2020

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Algumas reflexões sobre

a administração pública

J.J.R. Fraústo da Silva*

A D E M O C R A T IZ A Ç Ã O E AS R E F O R M A S A D M IN IST R A T IV A S

Se há preocupação com um expres-sa nos p ro g ram as de G overno dos países que nos últim os decênios acei-taram o d esafio d a d em ocracia, essa é, decerto, a necessidade p ro clam ad a de u m a “ refo rm a ad m in istrativ a”, p ressu p o sto básico de um a “ política (nova) de a d m in istração pública”. A “d em o cratização das institu içõ es” é o fim últim o de tal determ inação, que abrange na sua am bigüidade um co n ju n to de objetivos nem sem pre cla ra -m en te d e fin id o s, fre q ü e n te -m e n te equiv o cad o s na sua n a tu reza e até c o n fu n d id o s com os m eios através dos q u ais eles pod em eventualm ente ser alcan çad o s.

A razão d a p re o cu p ação é clara: ■ trata-se de en fren tar as circunstâncias

difíceis, q ue n o rm a lm e n te vêm asso -ciad as à em ergência d a dem ocracia, com co n d içõ es de “g o v ern ab ilid ad e” q u e co m p atib ilizem a p a rtic ip a ç ão dos cid ad ão s com a eficácia da ad m i-nistração, assegurem u m a gestão e q u ilib ra d a dos recursos disponíveis satisfa z e n d o os d esid erato s de ju s tiça re d istrib u tiv a e g a ra n ta m o d esen -volvim ento econôm ico, reg u lan d o ci-vilizadam ente os c o n flito s sociais e m in im izan d o a ero são governativa. D ad o q ue na a d m in istra ç ã o d o E sta d o se concentram os seus recursos h u -m an o s e financeiros, será real-m ente d a eficaz c o m b in a ç ã o destes q ue d e -penderá o sucesso d a política governa-m ental, legitigoverna-m ando a escolha feita pe-lo vo to dos cid ad ão s. Todavia, a ex-p ressão “ refo rm a ad m in istra tiv a ” é m ais co rren tem en te asso ciad a aos a s-pectos de racionalização, estruturação e m odernização dos serviços públicos, v isan d o ob jetiv o s de eficiência e eficácia, q u e p o d erem o s classificar c o m o parâm etros de “p ro dutividade a d -m in istrativ a”. E -m an o s recentes, os teó rico s d as ciências d a a d m in istra

-ção têm p ro p o sto o alargam ento destes objetivos acrescen tan d o p a râ m e -tros de “ p ro d u tiv id a d e social”, dos q u ais se destacam a “eq ü id ad e”, a “ tra n sp arên cia” e a “efetividade” da a d m in istração , com o condições da Sua dem ocraticidade. E tal com o aconteceu em relação aos prim eiros, tam b ém vêm a c o m p a n h a d o s de p ro -postas de meios, instrum entos e estra-tégias p ara que possam ser atingidos, com a “ p articipação” e a “ form ação” em lugar de relevo, ao lad o d a “des- co n c e n tra çã o ”, d a “d esburocratiza- ção” e d a “ m o d ern ização ”, m ais liga-d os aos objetivos clássicos liga-de eficiên-cia e eficáeficiên-cia.

N ão cabe n o âm b ito deste artig o a d escrição p o rm e n o riz a d a destes m eios ou das estratégias preconizadas iso lad am en te ou em co n ju n to , com o n ão está tam b ém n a n ossa in ten ção dissecar conceitos ou p roceder a um exame pro fu n d o do significado dos di-ferentes objetivos. A literatu ra exis-tente sobre c a d a um destes aspectos é abundante, inclusive a de origem n a -cional. Pretendem os, sim, equacionar alguns problem as qu e se levantam re-lativam ente à aplicação indiscrim ina-d a ina-de instrum entos que se têm p o r vá-lidos e eficazes n a sua generalidade, sem u m a an álise c u id a d a do contex-to c u l t u r a l e d a s c o n d iç õ e s eco n ô m ico -fin an ceiras prevalecentes no país c u ja a d m in istração se p reten -de reform ar. A s consid eraçõ es q u e se seguem não são, assim , específicas do caso p o rtu g u ês, em b o ra em um ou o u tro exem plo se p o ssa reconhecer a no ssa realidade, o qu e perm ite, aliás, u m a m elh o r concretização dos aspec-tos q u e se p retendem salientar.

AS T E O R IA S E A R E A L ID A D E

A ela b o ra ç ão de u m a p o lítica de a d m in istra ç ã o p ú b lica (que um edi- to ria lista ita lia n o considerava, recen-temente, ser um a m issão a entregar ao seu p io r inim igo...) d e p a ra com as

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m esm as dificu ld ad es de elab o ração de outras políticas, ta n to setoriais co-m o h o rizo n tais, acrescida de o u tras qu e derivam do c a ráter in stru m en tal d a a d m in istração p ú b lica p a ra a im -p la n ta ç ã o d aquelas. N ão raro, a in-c ap ain-cid ad e p ro in-clam ad a de resposta da ad m in istração pública, ju stific a n -d o u m a sua necessária refo rm a, ser-ve de álibi p a ra a inexistência ou d e-b ilid ad e de tais políticas; m uitas ve-zes, tam b ém , a variável a d m in istra ti-va é esquecida ou secundarizada, sem se ter em c o n ta q ue tã o im p o rta n te co m o a lei o u o p la n o é a su a im ple-m entação.

M uitas das dificu ld ad es são c o n -seqüência de alterações d o ritm o de m u d an ça dos parâm etro s definidores d a c o n ju n tu ra social e eco nôm ica, q u a n d o n ão m esm o de alterações sú -bitas e im previsíveis q u e m o d ificam rad icalm en te esses p arâm etro s.

Sem preocupações de h ierarq u iza-ção, p o d em ap o n ta r-se alguns asp ectos envolventes d a situ ação a tu al, co -m uns à -m aio ria dos países e-m causa; (a) m utações ráp id as no contexto p o -lítico (por exemplo, a passagem de um regim e a u to c rá tic o a um regim e p a rlam e n ta r p lu rip a rtid á rio ); (b) p a ssa -gem de um crescim ento eco n ô m ico rá p id o a u m a fase de e stag n ação ou m esm o red u ção dos recursos d isp o níveis; (c) em ergência de novos p ro blem as qu e n ã o têm te rm o de c o m -p aração ou de referência a n te rio r que possam servir de base a soluções, p ro -ced im en to s ou p o líticas novas (p o r exem plo, o re to rn o m aciço de em i-grantes, a a d esão à C E E , etc.); (d) ocorrência freqüente de acontecim en-to s im previsíveis q u e u ltra p a ssa m a cap a c id ad e de g estão das crises, d esde cataclism os n atu rais a conflitos in te rn a c io n a is, ou até d e q u estõ es n a cio n ais com repercussões in te rn a c io -nais, com o, p o r exemplo, a política finan ceira d o s E.U.A.; (e) in te rd e p e n -d ên cia crescente en tre os -diversos se-tores d a a tiv id a d e g o v ern am en tal ou m enor independência das políticas se-toriais, co n fro n ta d a s com pressões de d escen tralização p o lítica e reg io n ali-zação a d m in istra tiv a ; ( 0 pro b lem as de ritm o tem p o ral, deriv ad o s, p o r exem plo d as in certezas n a d u ra ç ã o govern am en tal e de co n tin u id a d e p o

-lítica, bem com o d a precaried ad e das alianças p a rtid á ria s, verificando-se que os governos ten d em a m u d a r m a is r a p i d a m e n t e q u e os co m p o rta m e n to s.

Se m u ito s destes aspectos, ou o u -tro s de igual n atu reza, co n stitu em c o n d ic io n am en to s óbvios à fo rm u la -ção de u m a política sem que sejam di-retam en te c o n tra d itó rio s com os m eios e estratégias p ro p o sto s p a ra a sua re fo rm a e m o d ern ização — e re-forçando até a sua urgência — alguns h á q ue o riginam dúv id as e provocam perplexidade.

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“A incapacidade proclamada

de resposta da administração

pública, justificando sua

necessária reforma, serve de

álibi para a inexistência ou

debilidade da política

administrativa

N em sem pre explicitam ente reco-n h ecid a co m o tal, está p o r exem plo a q u e stão de escassez de recursos, m ais co rren tem en te e sinteticam ente referid a co m o “a crise”, cu jas co n se-q ü ên cias vão m u ito p a ra além das simples dificuldades de gestão co rren te e afetam to d o s os objetivos d a a d -m inistração, inclusive através d a sua influência nos co m p o rta m e n to s in d i-viduais e organizacionais. Deve, aliás, dizerse q ue a q u e stã o n ão está p ro -p riam en te n a co n statação de escassez — a a d m in istra ç ã o p ú b lica está n o r-m alr-m en te h a b itu a d a a conviver cor-m ela — m as sim n a verificação d o seu caráter perm anente e “instalado” e na ausência de perspectivas d a sua ultra- passagem em p razo curto.

C o m efeito, as m edidas de c o n te n ção de gasto s assu m em , n o rm a lm e n -te, características uniform es e genera-lizadas p e ran te a d ific u ld a d e — m as n ã o im p o ssib ilid ad e — de d efin ir p rio rid a d e s e elim in ar o su p érflu o , so b re tu d o q u a n d o d eterm in ad as uni- lateralm en te pelos serviços resp o n sá-veis pela p o lític a fin an ceira. R eduzir recursos n ã o a u m e n ta a eficiência, q u e é u m a relação p ro d u to /in v e s ti-m ento, e cria seti-m pre, externati-m ente, u m a im agem até c e rto p o n to real, de

in ca p a c id ad e e desperdício. N a reali-dade, um a visão de uniform idade e si-m etria to rn a as o rg anizações co n serv ad o ras e ac o m o d a d a s; p o r o u tro la -do, a nível in d iv id u al, a falta de perspectivas e de reco m p en sa pela efic á -cia e em p en h am en to , de g a n h o de prestígio, de p o d e r o u até de estab ili-dade, gera o pessim ism o e im obilism o e leva a qu e os responsáveis co -m ece-m a aceitar co-m o ju stificad o u-m com p o rtam en to abúlico e rotineiro. A nível dos dirigentes falta o p ró p rio estím u lo d a fu n ção a qu e são c h a m a -dos: a d m in istra r a escassez n o rm a li-z ad a é a d m in istra r a ineficiência e a ineficácia; sem c a p a c id ad e de in icia-tiva, de decisão e d a aceitação d o ris-co an u la-se o esp aço de inovação e an iq u ila-se a criatividade.

A nível n a c io n al a ad m in istra ç ã o d a escassez é em si p ró p ria p a ra d o -xal, pois é ju stam en te em perío d o s de escassez q ue a u m e n ta o ap elo aos recursos públicos, até m esm o p a ra ra -cionalizar a d istrib u ição desses recur-sos. A s áreas sociais são m ais solicitadas, com o rem édio co n tra o desem prego ou em v irtu d e deste, a a tiv id a -de assistencial é fo rçad a a a te n d e r a um m a io r n ú m ero de p ro b lem as e a p ró p ria ativ id ad e eco n ô m ica priv ad a vem d isp u ta r recursos p a ra asseg u rar a sua sobrevivência e, indiretam ente, g a ra n tir a paz social...

P ara além de se q u estio n ar, p o r-tan to , a ra c io n a lid a d e d as soluções un ifo rm izan tes, o u tra s d ú v id as su rgem q u a n to à p o ssib ilid ad e de a d o -ção de certas estratég ias de re fo rm a a d m in istrativ a, p o r exem plo das m e-didas de descentralização ad m in istrativa. C o m efeito, e em b o ra a te n d ê n -cia p a ra u m a m a io r a u to n o m iz a ç ã o celu lar estatal seja u m a d as c a racterísticas dos m o d e rn o s regim es d e m o -crático s, tal a u to n o m iz a ç ã o o rig in a m aiores exigências de in teg ração das diversidades e stru tu ra is e fu n cio n ais e exige m ecanism os d e p lan ificação e co n tro le adicionais. N ecessariam ente expande-se o a p a re lh o b u ro c rá tic o e au m en tam os gastos públicos, m esm o q u e se im p eça a ad m issã o de m ais q u a d ro s, pela necessidade prevista de c ria r sistem as de incentivos, eles p ró -p rio s -p o ten cialm en te geradores de as-sim etrias e c o n flito s, com possíveis efeitos de a rra sta m e n to . D escen

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zação e co n ten ção de gastos públicos n ão são políticas com patíveis.

O u tra q uestão, ligada com a a n te -rio r m as com raízes m ais fundas, prende-se com a p ró p ria n a tu reza do m od elo bu ro crático estabelecido e com as atitu d es e co m p o rta m e n to s p o r ele d eterm in ad o s, bem de ac o rd o com as leis rd a rd in âm ica rde g ru -pos. A ssim , a ad m in istra ç ã o pública tra d icio n al visualiza-se a si p ró p ria co m o u m a espécie de gran d e m á q u in a, m u ito u sad a, com in a tu rais p ro blem as m ecânicos e, p o r co n seq ü ên -cia, rendim ento deficiente. C o m o so-lu ção p a ra tais p ro b lem as aponta-se, tam bém naturalm ente, a “m oderniza-ção ” d a m á q u in a e a aq u isioderniza-ção de “ tecn o lo g ias” m ais avançadas. E ap o n tase, p o r o p o sição e com o p a -d rão -de referência (inatingível e in-de- inde-sejável p o rq u e o E stad o é diferente e ineficiente p o r fatalism o histórico...) o m od elo su p e rio r d a a d m in istração p riv ad a (o n d e os exem plos de in eficiência e in eficácia são bem m ais n u -m erosos qu e os de sucesso real...).

Bem de a c o rd o com a concepção “ m ecânica” d a in stitu ição , a m o d er-nização entende-se n o sen tid o tecno- ló g ico -co n su m ista de aq u isição de eq u ip a m e n to so fistic a d o e d a im p o r-ta ç ã o de v o cab u lário técnico. O “ hardw are” in fo rm á tic o invade os serviços, m u itas vezes d e sp ro p o rcio n a d o às necessidades, fre q ü en tem en -te so b red im en sio n ad o , p u lv erizad o e in co m p atív el en tre si. O calão técn i-co vem em vagas sucessivas, de a c o rd o com o ú ltim o g rito rd a m o rd a: o r -g an ização e m éto d o s, o rçam en to s- program a, orçam entos base-zero, ges-tão p o r objetivos, p lanejam ento estrtégico, an álise custos-benefício, av a-liação de p ro jeto s, etc., etc., técnicas cu jo d o m ín io no p lan o teórico se to rna um objetivo em si próprio, estim u lad o pelo seu ap e lo in telectu al e b e -leza form al. S ão m u ito s os casos em q u e n ão se p ro cu ra resolver p ro b le -m as existentes, -m as si-m a d q u irir os equipam entos e as técnicas, p ro cu ran -d o -dep o is e n c o n tra r u m a a p licação p a ra os m esm os...

P or o u tro lado, c o n fro n ta d o s com um sistem a d e sc o n tro la d o q u e p e n -sam p o d e r racio n a liz ar lim ita n d o os gastos públicos, alguns incansáveis

le-gisladores fo rjam co n tin u am en te ilu-sões de m udanças adm inistrativas, ge-neralizadas e seguram ente eficazes, qu e a p rática se encarrega de p ô r em cau sa a c u rto prazo, n ão pela carên -cia de in fo rm ação o u de tecnicism o suficiente. N a verdade, recolhem -se estatísticas, fazem -se diagnósticos, analisam -se e classificam -se funções, r e e s t r u t u r a m - s e o r g a n o g r a m a s , redistribuem -se com petências, criam - se novos órgãos para controlar as inovações e in stitu cio n alizase tu d o , p a -ra to d o o sem pre, na fo rm a de um bem p esad o d ip lo m a legal. Só que o problem a está em que se trab alh a com m odelos ab strato s, com universos an ô n im o s, n u m a perspectiva logística, esquecendo sem pre o fato r h u m a -no, os fu n cio n ário s, a quem se q u er exigir m ais, m as a quem não se d á o r e c o n h e c im e n to c o r r e s p o n d e n te , lim itando-se ao invés, as suas regalias e perspectivas e a n u la n d o as m o tiv ações para progressão nas carreiras, tu -d o isto na lógica co n tab ilística -de c o n ten ção de recursos, em alguns ca-sos a ju d a d a p o r um tem pero progres-sista de red u ção de leques salariais.

C laro q ue a q u e stã o é pacífica; a > ad m in istra ç ã o p ú b lica trad icio n al é p a u la tin a e ord eira, ignora o co n fli-to, encolhe-se (“ shrinking-violet syn- d ro m e” de D ow ns), e a d m ite com o n o rm al que o tem p o se escoe sem que os problem as individuais sejam resol-vidos, n o q ue só se p o d e louvar a sua coerência, face aos p ad rõ es aceitos co m o bo n s p a ra os cid ad ão s... Em c o n tra p a rtid a defende-se, doseia o es-forço, cria an tico rp o s e gera m ecanis-m os de resistência: é a “ b u ro cratiza- çáo ”, a sacralização de ritu ais, a in -v o cação de ro tin as in stitu cio n ais

le-“São muitos os casos em que

não se procura resolver

problemas existentes, mas sim

adquirir equipamentos e

técnicas, procurando depois

encontrar aplicação para os

mesmos...”

g itim adas pela tradição, o secretismo, a m a n ip u la ç ã o d a in fo rm a ç ã o técni-ca ou ju ríd ic a , a te rrito ria lid a d e, o co rp o rativ ism o , a reação à p a rtic ip a

-ção ou à reinvindica-ção. C riam -se até no in terio r d a p ró p ria ad m in istração m inistérios de 1 f e de 2?, de aco rd o com as depen d ên cias relativas que possam existir... N ão há re fo rm a a d -m inistrativa possível nestas condições. A qui co m o n o u tras circunstâncias, haverá q ue q u e stio n a r antes de m ais e seriam ente a racionalidade co n tab i-lística orçam entai, q ue gera a irracio-n a lid ad e ad m iirracio-n istrativ a e as coirracio-nse- conse-q ü en tes deseconom ias.

As medidas de contenção de

gastos assumem,

normalmente, características

uniformes e generalizadas

perante a dificuldade

mas

não impossibilidade

de

definir prioridades e eliminar

o supérfluo, sobretudo

quando determinadas pelos

organismos responsáveis pela

política financeira

C u rio sam en te, governantes e d irgentes a vários níveis de re sp o n sab i-lidades reconhecem os problem as, ve-rificam as distorções, pro p õ em m edi-das... e n a d a acontece; as idéias perdem -se n a b u ro cracia in stitu íd a e gerid a pelos p ró p rio s defensores d a m u d an ça, o sistem a resiste. A s a titu -des e pensam entos dos dirigentes são, com freqüência, m ais m o d ern o s que os a to s ad m in istrativ o s.

D aqui decorrem , natu ralm en te, os objetivos q u e m ais recentem ente fo -ram assinalados p ara a adm inistração pública: transparência, eqüidade, efe-tividade. É a defesa d a sociedade ci-vil, que em bora geradora d a ad m in is-tração q u e possui, seu reflexo, afin al, preten d e g a ra n tir q u e ela está de fato a o seu serviço e n ão co n stitu i um fim em si p ró p ria , a u to -estim u lan d o -se incestuosam ente. E com o in stru m e n -to p a ra asseg u rar aqueles objetivos, a nov id ad e ch am a-se ag o ra “ p a rtic i-pação”, encarad a mais com o “vigilân-cia” d o p o n to de vista dos a d m in is-trad o s, p o rq u e do â n g u lo g o v ern am en tal a discussão te ó rica seria a n tes sobre o tem a clássico d a “ n e u tra -lidade” w eberiana d a burocracia, evi-d e n te m e n te p o sta em cau sa...

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Q u a lq u e r destes aspectos m erece p o r si só u m a an álise m ais lo n g a e a p ro fu n d a d a d o q ue é possível fazer n o âm b ito das presentes reflexões; o p rim eiro choca-se, tam b ém , à p a rti-da, com a c o n ju n tu ra de escassez de recursos — a p a rtic ip a ç ão d o s a d m i-nistrados n a ad m in istração exige m e-canism os p ró p rio s, diversificados e com plexos, com inevitável au m e n to dos gastos públicos, ta n to nas e stru -tu ras co m o n a q u eb ra de rendim ento d os processos decisórios. A h istó ria in te rn acio n al recente de casos de a d -m in istração p a rtic ip a d a a b u n d a e-m exem plos elucidativos qu e ilu stram a a firm a ç ão feita. D esejável, em p rin -cípio, a p a rtic ip a ç ão tem de ser p re-cedida de u m a análise cuidada dos ní-veis em qu e se o co rre e das form as q ue p o d e assum ir, antes de enveredar p o r generalizações d em agógicas que acarretam a paralisia das instituições.

A q u e stã o d a “ n e u tra lid a d e ” da ad m in istra ç ã o p ú b lica é m u ito m ais com plexa e passível de controvérsias apaixonadas, d ad o o caráter am bíguo deste m esm o a trib u to ou d o q ue se lhe contrapõe: o “com prom etim ento”. D eixá-lo-em os p a ra q u em se sentir m otivado p o r este tip o de dilem as em qu e se en trech o cam p rin cíp io s éticos e arg u m en to s de eficácia social. A A D M IN IS T R A Ç Ã O

N E C E S S Á R IA

Form ular, num texto crítico de teo -rias e procedim entos, sugestões ou reco m en d açõ es p a ra u m a re fo rm a p o sitiva d a A d m in istração p o d e ria p a -recer ingenuidade, senão m esm o pre- tensionism o, n ão fora o fato das m es-m as rep ro d u zirees-m idéias já correntes n u m a a m o stra a m p la d o s países que enferm am de m aleitas sem elhantes as nossas e ao s q u ais as consid eraçõ es an terio res se ap licam com o m esm o g rau de p ertin ên cia. D o m esm o m o do, várias dessas sugestões n ão se p o -dem considerar novidades, m esm o em P o rtu g al, m as o certo é q ue a p rática n ã o as c o n firm a e haverá q ue re afir-m á-las p a ra su scitar a o afir-m en o s a d is-cussão e to m a r desde logo, p artid o na m esm a.

E xplicitem os an tes alg u n s p rin c í-pios, e n u m e ra d o s sem p re o c u p a ç ão hierárq u ica:

1. A A d m in istração P ú b lica deve ter um claro com prom isso nacional e o rien tar-se p o r p rin cíp io s de eficiência, eficácia e efetividade so -cial.

2. A A d m in istração P ú b lica deve p o ssib ilitar e assu m ir a expressão da dem o cracia no seu seio, irradi- can d o o a u to ritarism o c o n tra p o s-to à a u s-to rid ad e.

3. A A dm inistração P ública deve eli-m in ar a arb itraried ad e e a irracion a lid a d e b u ro cráticas, re sp eitairracion -d o os -direitos e asseg u ran -d o a ig u ald ad e d o s c id ad ão es face ao E stad o .

4. A A d m inistração Pública deve ser transparente no seu fu ncionam en-to a en-todos os níveis, evitando a co-b e rtu ra de o p çõ es p olíticas com pretensos arg u m en to s técnicos. 5. A A dm inistração Pública deve

en-c o n tra r m een-canism os a p ro p ria d o s p a ra o b sta r a o p ro b lem a d a co rru p ção ad m in istrativ a, m ais a tr a -vés de m ed id as preventivas e per- suasivas d o q u e de m ed id as p u n i-tivas.

6. A A d m in istração P ú b lica deve, p o r fim , e stim u la r a o rg an ização e m o b ilização da sociedade civil, p ro c u ra n d o a su a c o la b o ra ç ão e fo m e n ta n d o a c o n ju g a ç ã o de es-forços, d a m esm a fo rm a q ue esti-m ula a esti-m obilização das atividades p ro d u tiv as em p e río d o de crise eco n ô m ica.

P ara além destes p rin cíp io s g en é-ricos e algo vagos, com princípios que são, haverá q u e referir alg u m as c o n dições ou lin h as de força q u e os c o n cretizem , en u m eran d o se um c o n ju n -to, que se rep u ta im portante, sem cuid a r cuide estabelecer ligações, aliás ó b -vias e m últiplas, p ara n ão alo n g a r ex-cessivam ente a exposição.

S ão elas:

1. E stim ular a fo rm ação perm anente d o s fu n c io n á rio s, em p a rtic u la r d o s d irigentes, v isan d o o d ese n v o lvim ento d as c a p acid ad es p ró -prias, a a d a p ta ç ã o de a titu d e s e c o m p o rta m e n to s a d e q u a d o s a u m a so cied ad e d em o c rá tic a e a criação de um espírito receptivo à inovação e à m u d a n ç a .

2. R edüzir o c a rá te r form alista, pro- cessualista, n o rm a tiv ista e m eca- n icista d a A d m in istração , ev itan

-d o o u sim p lifican -d o a legislação, valo rizan d o a cap a c id ad e decisó- ria, a flexibilidade, o esp írito de iniciativa e o b o m senso.

3. P rivilegiar refo rm as parcelares e seletivas, ev itan d o m etas globais, soluções u n ifo rm es e sim étricas; aceitar os princípios d o increm en- talism o com o estratégias de refor-m a.

4. A ten d er às pessoas e às carreiras, n ã o às estru tu ra s e à organização. 5. P rivilegiar a ra cio n alid ad e a d m

i-n istrativ a c o i-n tra a racio i-n alid ad e o rçam en tai e contab ilística, res-p o n sa b iliz a n d o os gestores res-pelos resu ltad o s d a gestão.

6. E lim in a r falsos preconceitos de igualitarism o, p rem ian d o a q u a li-dade, o bo m desem p en h o , a res-p o n sa b ilid a d e e a ch efia, m as elim in a n d o privilégios indevido p a -ra funções iguais de caráter rotinei-ro.

“A administração necessária

exige uma mudança de

atitudes e comportamentos

que tem de vir de cima, sob

pena de ser ineficaz

...

a administração de cada

Estado será o que for o seu

alto funcionalismo

7 .E stab elecer m ecan ism o s de c o o r-d e n a ç ã o nos níveis h ierárq u ico s a d e q u ad o s, d eleg an d o c o m p e tê n -cias e resp o n sa b iliz a n d o os deci- sores.

8. D in a m iz a r a execução através de pro jeto s h o rizontais, estim u lan d o a co m p e titiv id a d e en tre serviços, s o b re tu d o n o âm b ito d o s p ro g ra -m as sociais.

9. D esenvolver c a p a c id ad e de inves-tigação e inovação n a A dm inistra-ção P ública em paralelo com a ca-p a c id a d e cien tífica e tecn o ló g ica nacional, p ro cu ran d o atin g ir um a m assa crítica de técnicos capazes de e q u a c io n a r e resolver p ro b le m as co n creto s n o s co n tex to s eco -n ô m ico e c u ltu ra l -nacio -n ais. 10. S u p e ra r a co n c e p ç ão d a variável

ad m in istra tiv a co m o se cu n d ária e a u to m á tic a , c o m u m em p o lítico s e p la n e ja d o re s econ ô m ico s.

(5)

11. P u b licar os deveres e obrigações dos fu n cio n ário s, esclarecer os seus direitos e regalias e e la b o rar guias sim ples p a ra os u tilitário s d c s serviços adm inistrativos. E m resum o, privilegie-se o indiví-d u o e a sua cap a c iindiví-d aindiví-d e inovaindiví-dora, a p o sta n d o decisivam ente n a ed u c a -ção, n a form a-ção, n o p rin cíp io do b o m desem penho, na carreira a tra e n -te, n a ch efia c o m p en sad o ra. Esse se-rá m eio cam in h o an d ad o .

O o u tro m eio está n a u ltrap assa- gem do espírito legalista e centralista q ue prevalece no seio d a A d m in istra-ção, o q ue exige u m a a titu d e volun- ta rista do G overno, sim plificando, d esb u ro cratizan d o , e d esco n cen tran - d o ro tin as e decisões. E, p o r co erên -cia, elim inando tam bém disparidades indesejáveis e privilégios m enos ju s tificad o s, d ecid id am en te e com a a u -to rid a d e necessária.

Tudo o m ais é u m a q u e stã o de es-tratégias a d e q u a d a s e de bom senso, desde qu e se d e fin am claram en te os objetivos a atingir. De o u tro m odo, se n ão se so u b er p a ra o n d e se vai, q u a l-q u e r ca m in h o nos levará lá..., o nde q u er q ue seja, indiferentem ente. O P A P E L DA FO R M A Ç Ã O E O DA IN V E S T IG A Ç Ã O

D eixam os para últim o lugar alguns co m e n tá rio s ad icio n ais sobre a im -p o rtâ n c ia d a fo rm a ç ã o e da investi-g ação e n q u a n to estratéinvesti-gias de refor-m a a d refor-m in istrativ a, erefor-m b o ra já antes lhes te n h a m o s feito referências repe-tid as, explícitas ou im plícitas.

Q u a n to à prim eira as o piniões são unânim es e os resultados incontrover-sos; na m aio ria dos países desenvol-vidos é u m a a tiv id a d e c o rren te ta n to nos d ep a rta m e n to s m inisteriais com o nas em presas e. em alg u n s casos, é tam b ém p ro p o rc io n a d a a nível su p e -rio r em u niversidades ou em escolas o u em in stitu to s a u tô n o m o s. N estas co ndições, q u a l a razão d a nova ê n fase d a d a à fo rm a ç ã o co m o e stra té -gia p riv ileg iad a de refo rm a, a p o n to de a este asp ecto ser d ed ic a d a um a fração considerável d o re lató rio do B anco M u n d ial sobre o desenvolvi-m en to d o desenvolvi-m u n d o edesenvolvi-m 1983, de o u tra s organizações com o as N ações U nidas e a O C D E se d eb ru çarem ate n ta s so bre o tem a, e de o m esm o ser o o b je

tivo cen tral de vários congressos in -tern acio n ais recentes?

A ntes de mais nad a haverá que n o -ta r que a “ fo rm ação ” trad icio n al na A d m in istração Pública é ac e n tu a d a- m ente técnica e profissionalizante, di-rig id a essencialm ente a q u a d ro s m é-dios ou de apoio. Os q u ad ro s su p e-riores têm sido m enos co n tem p lad o s e nas chefias só o foram em m uitos raros casos, em c o n traste com o que se passa no d o m ín io d a ad m in istra ção em presarial, o q ue p ode ser m a -téria p a ra alg u m a reflexão. É certo q ue em universidades e in stitu to s a u -tô n o m o s são ju sta m e n te os q u ad ro s

Necessita-se

,

de fato, para

motivar a mudança dos

comportamentos e atitudes

necessários à democratização,

de viver espontânea e

abertamente essa mesma

democratização

superiores q ue são visados, m as as prim eiras e g ran d e p arte dos segun-* dos fazem fo rm a ç ã o inicial de novos

q u a d ro s e n ão cobrem as faixas m u i-to m ais am p las d o s fu n cio n ário s já em exercício, que, n a verdade, co n tro -lam o sistem a. O im p acto dos novos q u a d ro s é, assim , lim itad o no início, e ten d e m esm o a g erar c o n flito s deli-cad o s q ue o tem p o n ã o dilui p o rq u e o déb ito das escolas é lim itado e a ex- p eriência é, tam b ém a q u i, m estra insubstituível.

E ntende-se, assim , q ue o esforço a d icio n al de fo rm a ç ã o a realizar d e ve in cid ir sobre as faixas n ão a b ra n -gidas, e nestas, so b retu d o , sobre as chefias superiores até a o nível m ais elevado. A a d m in istra ç ã o necessária exige u m a m u d a n ç a d e a titu d e s e c o m p o rtam en to s que tem de vir de ci-m a, sob p en a de ser ineficaz; c o n fo r-m e C.F. M arx ber-m d er-m o n stro u , a A d m in istração P ública de cad a E sta d o será o q u e for o seu a lto fu n c io -nalism o.

A q u e stã o está pois no m o d o de in d u zir essa m u d a n ç a de a titu d e s e c o m p o rta m e n to s através de açõès de fo rm ação , o q ue n ão é, evid en tem en -te, ta re fa sim ples, nem óbvia, p ara a

q ual exista m eto d o lo g ia g ara n tid a e transm issível; cada instituição terá de p ro cu rar o seu m odelo específico, o seu m o d o p ró p rio de atu ar, sem pre-tender im itar m odelos bem -sucedidos n o u tro s horizo n tes e n o u tro s contex-tos. E m nossa opinião, a fo rm ação a este nível deverá visar, sobretudo, o autodesenvolvim ento das capacidades próprias, incidir sobre o estudo de ca-sos e a resolução de problem as, questio n a r práticas e conceitos tra d ic io -nais, e evitar, especialmente, a tendên-cia teorizante, acadêm ica, d o u to rai, do nosso ensino.

M as m ais im p o rta n te do que o co n te ú d o das ações é o am b ien te em qu e se processam : de q ualidade, a n tes de m ais, a te sta d a pela co m p etên -cia dos m o n ito res e pelo envolvim ento bem aceiento d a in stitu ição fo rm a -d o ra em pro b lem as -de investigação ap licad a, de im p o rtâ n c ia p a ra o E s-tado, n ão ap en as decorativa ou refle-tin d o os interesses pessoais, q u a n ta s vezes um bilicais dos investigadores; de sã convivência, alegria e c a m a ra -dagem , por o u tro lado, entre todos os que trab alh am na instituição e os que a freqüentam , de m o d o a que estes se sintam p a rte dela e c o n trib u in d o p a -ra ela, estím ulo essencial ao esforço e criativ id ad e dos prim eiros; de c o n -vergência, p o r fim , entre governantes e dirigentes, espaço de encontro e d iá-logo o n d e se possam desenvolver re-lações pessoais e suscitar, através do co nhecim ento, u m a m elh o r co m p re -en são global d o s atos d a governação p o r aqueles q u e têm a m issão de os c o n d u z ir n a p rática d iá ria e d a reali-d areali-d e reali-d a A reali-d m in istração p o r aqueles qu e têm nela o seu p rin cip al in s tru -m ento.

N ecessita-se de fato, p ara m o tiv ar a m u d a n ç a d o s c o m p o rta m e n to s e a titu d e s necessários à d e m o c ra tiz a ção, de viver espontânea e ab ertam en -te essa m esm a dem o cratização , realid a realid e q ue n ã o p o realid e realideixar realide im p reg -n ar um a i-nstituição de fo rm ação coerente com os objetivos que visa, e p ro -je to qu e n ão p o d e ser só d esejo de u m a elite p a ra to d a u m a sociedade.

* J.J.R. Fraústo da Silva é

presiden-te do Instituto Nacional de A dm i-nistração de Portugal.

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