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O direito de morrer com dignidade: a ponderação entre os princípios que protegem a vida e a dignidade da pessoa humana

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UNIJUÍ – UNIVERSIDADE REGIONAL DO NOROESTE DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

CASSIANE CÔRTES FOLETTO

O DIREITO DE MORRER COM DIGNIDADE:

A PONDERAÇÃO ENTRE OS PRINCÍPIOS QUE PROTEGEM A VIDA E A DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA

Ijuí (RS) 2013

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CASSIANE CÔRTES FOLETTO

O DIREITO DE MORRER COM DIGNIDADE:

A PONDERAÇÃO ENTRE OS PRINCÍPIOS QUE PROTEGEM A VIDA E A DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA

Monografia final apresentada ao Curso de Graduação em Direito, objetivando a aprova-ção no componente curricular Monografia. UNIJUÍ – Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul.

DCJS – Departamento de Ciências Jurídicas e Sociais.

Orientadora: Ms. Eloísa Nair de Andrade Argerich

Ijuí (RS) 2013

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Dedico este estudo a todos os pacientes que, de uma forma ou de outra, desejaram usufruir o direito de uma morte digna.

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AGRADECIMENTOS

Primeiramente agradeço a Deus, por me oportunizar a vida e por permitir que tudo aconteça na hora certa.

À minha mãe, Elisabete, que me deu a vida e as oportunidades de procurar ser, a cada dia, uma pessoa melhor.

Àminha orientadora, Mestre Eloísa, pela paciência e disponibilidade.

A todos que colaboraram de uma maneira ou de outra com a elaboração deste estudo, muito obrigada!

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A MORTE

A morte vem de longe Do fundo dos céus Vem para os meus olhos Virá para os teus

Desce das estrelas Das brancas estrelas As loucas estrelas Trânsfugas de Deus Chega impressentida Nunca inesperada Ela que é na vida A grande esperada! A desesperada Do amor fratricida

Dos homens, ai! Dos homens Que matam a morte

Por medo da vida.

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RESUMO

O presente trabalho de pesquisa monográfica faz uma análise entre as diversas espécies de morte, tanto na área da medicina legal, quanto do direito brasileiro. A análise é feita a partir dos princípios fundamentais da vida e da dignidade da pessoa humana. São abordadas as diversas modalidades ligadas à eutanásia, à distanásia, bem como à ortotanásia, conceituando-as e interligando-as aos referidos princípios e o seu importante papel nas escolhas que envolvam a defesa pela vida ou pela morte digna. Discute-se ainda acerca do direito à morte e a ponderação entre os princípios que protegem a vida e a dignidade da pessoa humana.

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ABSTRACT

The present research monograph is an analysis between different kinds of death, both in the area of forensic medicine, as Brazilian Law. The analysis is based on the fundamental principles of life and human dignity. Addresses the various forms related to euthanasia, dysthanasia and orthothanasia, conceptualizing them and linking them to these principles and their important role in the choices involving the defense of life or death with dignity. It discusses about the right to die and weighing the principles that protect the life and dignity of the human person.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 8

1 O CONCEITO DE MORTE NA MEDICINA LEGAL E NO DIREITO ... 10

1.1 As diferentes espécies de morte na Medicina Legal ... 11

1.2. A morte para o Direito: morte encefálica ... 14

1.3 A eutanásia, a distanásia e a ortotanásia... 16

2 O DIREITO DE MORRER COM DIGNIDADE: A PONDERAÇÃO ENTRE OS PRINCÍPIOS QUE PROTEGEM A VIDA E A DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA ... 21

2.1 Direito à vida ... 21

2.2 Princípio da dignidade da pessoa humana ... 27

2.3 O direito de morrer com dignidade: a ponderação ... 30

CONCLUSÃO ... 33

REFERÊNCIAS ... 36

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INTRODUÇÃO

O presente trabalho de pesquisa monográfica tem como objetivo fazer um estudo sobre as diferentes espécies de morte, as distinções entre a eutanásia, distanásia e ortotanásia, tendo como objetivo verificar qual é a mais adequada para que a pessoa humana tenha uma morte digna.

Não se pode deixar de mencionar que o indivíduo nasce não tendo opção de escolha. Seu nascimento ocorre independentemente de sua vontade, sendo o nascimento com vida, o marco de sua personalidade jurídica, o que lhe atribui direitos, deveres e obrigações.

Assim, como a vida, a morte é algo inevitável, independente da vontade do ser humano e tem se constituído em um verdadeiro tabu. É um tema que se apresenta como algo aterrorizante, pois mesmo com todos os avanços da medicina ninguém conseguiu evitá-la.

A morte é tratada com silêncio. Todas as pessoas, não interessa a idade, o sexo, credo religioso, nível socioeconômico, religião têm medo de morrer, isso é universal e, mesmo com os avanços tecnológicos e científicos, ainda não foi descoberto como tornar o ser humano imortal.

Ressalta-se que, assim, como o ser humano tem direito a uma existência digna, também lhe deveria ser garantido este direito à morte, já que esta postura está diretamente ligada ao princípio da dignidade da pessoa humana.

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A finalidade desta pesquisa é demonstrar a importância do conhecimento da medicina legal e dos princípios constitucionais do direito para a vida e a morte.

Para tanto, inicia-se o primeiro capítulo com uma análise das espécies de morte na medicina legal, a morte encefálica, bem como a distinção entre a eutanásia, distanásia e a ortotanásia, para demonstrar que sendo a morte a consequência da vida, somente se admite a morte com o cumprimento do ciclo natural, sem a interrupção precoce da vida em função de doença irreversível.

Nesse sentido, de todos os tipos existentes, aborda-se o método da arte de morrer bem, ou seja, a ortotanásia, pois essa reúne todos os requisitos de aceitabilidade perante o Direito, a Medicina, a Religião e o senso ético.

Não se coloca em discussão a indisponibilidade da vida, mas o direito do cidadão em decidir a respeito do seu fim, buscando a dignidade da morte por meio do princípio da autonomia.

No segundo capítulo conceitua-se a garantia fundamental da vida, relacionando-a diretamente com o princípio da dignidade da pessoa humana, bem como se faz uma ponderação nos casos de eutanásia, distanásia e a ortotanásia para demonstrar, por derradeiro, que o prolongamento da vida pode provocar mais sofrimento e agonia do que bem-estar ao paciente em situação irreversível. Não há como negar que se o ser humano tem o direito de viver com dignidade, também tem o direito de morrer da mesma forma.

Salienta-se, assim, que não se está defendendo o direito de morrer, mas sim, contribuir para as discussões que se faz atualmente sobre esse assunto e demonstrar que a morte sem sofrimento não configura conduta que atenta contra o primeiro e mais fundamental direito do ser humano, qual seja, a vida!

Nesta pesquisa, o método de abordagem é do tipo exploratória, quando se utiliza a coleta de dados em fontes bibliográficas disponíveis em meios físicos ou em rede de computadores. Na sua realização utilizou-se o método de abordagem hipotético-dedutivo e dialético.

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1 O CONCEITO DE MORTE NA MEDICINA LEGAL E NO DIREITO

O indivíduo nasce não tendo opção de escolha. A concepção dos seres humanos independe da vontade, sendo o nascimento com vida, o marco de sua personalidade jurídica, o que lhe atribui direitos, deveres e obrigações.

Assim como a vida, a morte é algo inevitável, inerente à vontade do ser humano. Porém, muitos têm receio de falar sobre a morte como algo aterrorizante, porque ela põe fim à vida e mesmo com todos os avanços da medicina, ninguém conseguiu evitá-la.

Oliveira Júnior (2013, p. 241) estabelece que:

A morte biológica é aquela que faz cessar todos os atributos adquiridos com a personalidade. Os romanos, de forma exacerbada, eram taxativos: mors

omnia solvit, quer dizer, a sua ocorrência coloca fim a todas as relações

jurídicas.

A morte ainda é tratada com silêncio. "O medo é a resposta mais comum diante da morte. O medo de morrer é universal e atinge todos os seres humanos, independente da idade, sexo, nível socioeconômico e credo religioso." (LUWISCH, 2011).

Moura (2007, p. 39) se posiciona também neste sentido:

Trata-se de tema delicado, a morte da pessoa humana, que possui vários aspectos, entre os quais podemos mencionar: jurídico, clínico, moral, emocional, social, cultural, religioso, filosófico. Em nossa cultura, em que sempre estamos voltados para o que é bom e agradável, para a vida, esse tema é quase um tabu. Não se deve e, em muitos casos, não se pode falar na morte. Aprendemos que não é conveniente nem educado tocar neste assunto. Pessoas há que não pronunciam a palavra morte. Preferimos usar sinônimos, termos técnicos e eufemismos. Ocorre, porém, que os seres humanos são mortais, ou seja, a vida humana tem começo, meio e fim.

Assim como o ser humano tem direito a uma existência digna, também lhe deveria ser garantido o direito à morte, já que esta postura está diretamente ligada ao princípio da dignidade da pessoa humana.

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A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (CF/88) menciona o direito à vida e à dignidade da pessoa humana como algo inviolável, não mencionando a morte, como se esta não fizesse parte do ciclo natural da vida.

Por mais que um paciente esteja em coma permanente e irreversível, não se exige um tratamento específico dos profissionais de saúde, mas devem ser-lhe administrados os cuidados básicos, incluindo-se alimentação. Se clinicamente ficar estabelecido que exista uma possibilidade de recuperação, requer-se o tratamento.

Oliveira Júnior (2013, p. 241) assim se posiciona em relação ao sentido da vida:

A vida, de todos os bens, é o mais precioso, pois resume o homem em sua essência, com a carga de direitos e obrigações que integram sua personalidade. A Constituição Federal em seu preâmbulo, compromete-se a instituir um Estado Democrático onde serão assegurados os direitos sociais e individuais, dentre eles a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna.

Certamente que a vida é considerada o bem mais valioso que uma pessoa possui e o texto constitucional brasileiro assegura que este direito não seja violado, estando intimamente relacionado com a segurança, bem-estar e justiça.

1.1 As diferentes espécies de morte na Medicina Legal

No início do século XX as causas da morte eram as epidemias, os acidentes, principalmente os desastres naturais, os ataques de animais e problemas do coração. Hoje em dia, as maiores causas de morte são as doenças cardíacas, as doenças cerebrais crônicas e o câncer, o qual, principalmente nesta região geográfica, é diagnosticado em números alarmantes, muitas vezes atacando de modo tão silencioso que, quando descoberto, acaba aniquilando rapidamente ou ainda levando o paciente a um tratamento prolongado e doloroso (PESSINI; BARCHIFONTAINE, 2000, p. 251).

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Nesse sentido, Pessini e Barchifontaine (2000) elencam que com o decorrer do século e com a descoberta de novas tecnologias para o tratamento de doenças, as pessoas doentes demoram mais para morrer:

As pessoas não ficavam ‘morrendo durante muito tempo’. O espaço de tempo entre adoecer e o morrer era de cinco dias. Hoje esse tempo espaço de tempo entre o momento da descoberta da doença até morte aumentou de cinco dias para cinco anos, e mais do que se falar em morte se fala do processo de morrer. (PESSINI; BARCHIFONTAINE, 2000, p. 251).

Os autores supracitados também descrevem que a definição clássica da morte foi formulada por Hipócrates cerca de 500 anos antes de Cristo (PESSINI; BARCHIFONTAINE, 2000, p. 255-256).

Acha-se no De morbis, 2º livro, parte 5: ‘Testa enrugada e árida, olhos cavos, nariz saliente, cercado de coloração escura. Têmporas deprimidas, cavas e enrugadas, queixo franzido e endurecido, epiderme seca, lívida e plúmbea, pêlos das narinas e dos cílios cobertos por uma espécie de poeira, de um branco fosco, fisionomia nitidamente conturbada e irreconhecível.

A morte é um processo com velocidade variável, não sendo um fenômeno isolado, nem instantâneo. Para Benfica e Vaz (2012, p. 139), as células morrem em diferentes momentos, “o que dá a uma série de questões de ordem ética, médica e legal.”

A constatação da morte se dá de maneira em que não podem ocorrer dúvidas a respeito. Existem várias modalidades de morte, entre elas: a) a morte anatômica, que é o cessamento total e permanente de todas as grandes funções vitais (batimentos cardíacos, respiração e pulsação); b) a morte histológica, quando morrem os tecidos epiteliais, conjuntivos, musculares e nervosos. Este processo ocorre em aproximadamente 8 horas.

Para Croce e Croce Júnior (2012, p. 463) existe também a morte aparente. O adjetivo “aparente” é o mais adequado para esta situação, “pois o indivíduo assemelha-se incrivelmente a um morto, mas está vivo, por débil persistência da circulação”. As funções cardíacas são imperceptíveis, mas presentes, trazendo o indivíduo à vida de forma espontânea ou por socorro médico Essa aparência de

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morte pode durar alguns minutos, no caso de desmaios e convulsões, ou horas, se a pessoa sofrer de catalepsia, podendo até mesmo ser enterrada viva.

Quanto à morte relativa, “o indivíduo jaz como morto, vitimado por parada cardíaca diagnosticada pela ausência de pulso na artéria calibrosa [...] associada à perda de consciência, cianose ou palidez marmórea” (CROCE; CROCE JÚNIOR, 2012, p. 464). A parada cardíaca nada mais é que o cessamento súbito e inesperado da atividade mecânica do coração, por indivíduo que não possui moléstia grave. A pessoa é reanimada por massagem cardíaca retornando, assim, à vida.

A morte real, considerada como a verdadeira morte, “é o ato de cessar a personalidade e fisicamente a humana conexão orgânica, por inibição da força de coesão intermolecular e o de formar-se paulatinamente a decomposição do cadáver.” (CROCE; CROCE JUNIOR, 2012, p. 465).

Com efeito, a morte ‘parece uma decomposição, pois nunca brota o caule sem que a semente se decomponha; nunca o fruto, sem a flor secar; nunca uma forma nova, sem violar pelo menos as formas das quais nascera no crescimento e progresso de todos os seres’. (LUNA, 1973 apud CROCE; CROCE JÚNIOR, 2012, p. 75).

Assim, a morte nada mais é do que o término da vida, a decomposição do homem que se tornou cadáver.

Estão elencados nos Códigos Civil e Penal Brasileiros e no Código de Processo Penal, alguns tipos de morte, entre elas:

̶ a morte natural é a que resulta da alteração orgânica ou perturbação funcional provocada por agentes naturais, sem a interveniência de fatores mecânicos em sua produção;

̶ a morte súbita é imprevista, sem causa manifesta, atingindo pessoas em aparente estado de boa saúde;

̶ a morte violenta é aquela que tem como causa determinante a ação rápida e intensa ou continuada e persistente de um agente mecânico, físico ou químico sobre o organismo. Exemplos são os homicídios, suicídios ou acidentes;

̶ a morte fetal ocorre dentro do útero, antes da expulsão ou da extração completa do corpo da mãe independente do período da gravidez;

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̶ a morte materna é aquela em que ocorre com a mulher durante uma gestação ou dentro de um período de 42 dias após o término da gestação, independente da duração ou localização da gravidez;

̶ a morte catastrófica é ocasionada de forma violenta, de origem natural ou de ação dolosa do homem em que por um mesmo motivo, ocorre um grande número de vítimas fatais;

Para Pereira e Gusmão (2013, s.p.), a morte presumida é constatada pela ausência ou desaparecimento de uma pessoa, depois de transcorrido um prazo determinado por Lei.

Por óbvio que a morte presumida é uma das figuras jurídicas que mais provoca discussões no meio jurídico porque há uma interpretação legal determinando como se configura sua ocorrência.

1.2 A morte para o Direito: morte encefálica

Até há pouco tempo considerava-se que alguém estava morto quando cessava a respiração e os batimentos cardíacos. Hoje, essa situação se alterou, o critério decisivo para se dizer que alguém está morto é o cérebro. “Para os médicos em geral e particularmente para os neurologistas, tornou-se imperiosa a revisão do conceito de morte devido a diversos fatores.” (PESSINI; BARCHIFONTAINE, 2000, p. 256).

Por intermédio da Resolução do Conselho Federal de Medicina nº 1.480/97, a morte encefálica foi reconhecida e definida no Brasil. Atualmente, os pacientes conseguem manter suas funções cardiovasculares por muitas horas ou dias.

Cuiabano (2010, s.p.) assim refere sobre os avanços da Medicina diante do conceito de morte encefálica:

O conceito de Morte encefálica surgiu na França. Do ponto de vista legal foi na Finlândia em 1971. Já no Brasil, foi reconhecido e definido em 1997, através da Resolução CFM Nº 1.480/97. É um conceito recente na história da medicina. Muitos pacientes que antigamente morreriam rapidamente, atualmente conseguem ter suas funções cardiopulmonares mantidas por muitas horas ou dias. Alguns desses recuperam- se completamente, outros,

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variados graus de sequelas e alguns permanecem por horas ou dias em um estado de coma apnéico supra- espinhal irrecuperável antes de o coração parar de bater – eles estão em morte encefálica [...].

Morte encefálica é definida como a parada definitiva e irreversível do encéfalo (cérebro e tronco cerebral), que provoca em poucos minutos a falência de todo o organismo. O diagnóstico, quando concluído, retira qualquer esperança de recuperação ou sobrevivência. Devido aos contínuos avanços médicos, haverá cada vez mais pacientes mantidos por sistemas de suporte ventilatório, com temperatura corporal, pressão sanguínea, pulso, nutrição e necessidades de fluidos mantidos artificialmente, mas com um cérebro morto.

No Brasil, o diagnóstico de morte encefálica é realizado seguindo o “Termo de Declaração de Morte Encefálica”, onde o exame clínico é feito por dois diferentes médicos em diferentes intervalos de tempo, sendo obrigatória a utilização de exame complementar .

Com o avanço da tecnologia, o que permite a ressuscitação cardíaca, o uso de respiradores artificiais e a circulação extracorpórea, é possível a manutenção da vida.

Desta forma, uma pessoa poderia manter-se viva quase que indefinidamente, o que levaria a gastos ilimitados e dispendiosos para a manutenção de uma vida vegetativa, uma vez que não há atividade cerebral.

Com a necessidade de transplantes de órgãos e tecidos em condições favoráveis ao receptor, não havendo atividades cerebrais por mais de 12 horas, considera-se morte cerebral. A doação de órgãos deve respeitar a última vontade do doador ou o consenso da família.

Croce e Croce Júnior (2012, p. 463) citam a Resolução da Sociedade Alemã de Cirurgia em que preceitua a realidade da morte:

[...] a morte cerebral pode produzir-se antes que cessem os batimentos cardíacos (traumatismo cerebral). Considera-se que o cérebro está morto após doze horas de inconsciência com ausência de respiração espontânea, midríase bilateral e eletroencefalograma isoelétrico, ou quando o angiograma revela a parada da circulação intracraniana (durante trinta minutos). Pode ocorrer que o coração pare, mas o sistema nervoso central está intacto ou com possibilidade de recuperar-se. Convém, então, iniciar a ressuscitação; se os batimentos cardíacos não reaparecerem pode dar-se morto o paciente, mas se reaparecem, sem que se restabeleçam a consciência ou a respiração, deve seguir-se aplicando as normas usuais de assistência intensiva até que possa ser demonstrada a morte cerebral.

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No caso da morte cerebral, a respiração artificial pode prolongar a função cardíaca por tempo limitado. Essa sobrevivência induzida dos órgãos é indicada quando se prevê um prolongamento em vista de um transplante, sendo possível em caso de lesão cerebral total e irreversível, essencialmente depois de um trauma brutal.

A doação de órgãos para transplantes merecem o apoio da profissão médica, das legislações e da população em geral.

1.3 A eutanásia, a distanásia e a ortotanásia

Ortotanásia, eutanásia e a distanásia são conceitos que envolvem o processo de morrer e podem ser muitas vezes confundidos.

A palavra eutanásia, etimologicamente, é de origem grega, na qual eu significa “boa” e thanatos significa “morte”. Em termos gerais, a eutanásia pode ser entendida quando uma pessoa causa deliberadamente a morte de outra que está mais fraca, debilitada ou em sofrimento.

O sentido primitivo da eutanásia não estava relacionado propriamente ao patrocínio da morte, em função da dor e da agonia irremediável que pesavam sobre o paciente em estado terminal. Para Adoni (2003), a eutanásia não tinha por intuito causar a morte, mas possibilitar que a morte ocorresse do modo indolor.

O autor ainda esclarece que a eutanásia é definida como o ato praticado por uma pessoa, de forma intencional, com vistas a tirar a vida de alguém, após uma solicitação explícita.

Garimpando-se os registros históricos, constata-se que prática da eutanásia não é recente. Na Bíblia Sagrada, no Livro dos Reis, no segundo Livro de Samuel (capítulo 31, versículo 1 a 13), há o registro de que Saul, para não cair prisioneiro, jogou-se sobre sua espada, causando uma séria lesão física, mas sem consumar sua morte, rogando a seu escravo para que acabasse com sua vida. Na Índia, os doentes terminais afetados por doenças incuráveis eram levados até a beira do rio Ganges, e ali suas narinas e a boca eram obstruídas com o barro sagrado e, após, eram atirados ao rio para morrerem. (ADONI, 2003, p. 395).

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O conceito de eutanásia passou por diversas transformações. Atualmente, a concepção de eutanásia está ligada à ideia de provocar conscientemente a morte de alguém, por motivo de piedade ou compaixão. Ao invés de deixar a morte acontecer, buscando-se amenizar o sofrimento do paciente, a eutanásia é entendida nos dias de hoje como uma ação sobre a morte, de modo a antecipá-la (ADONI, 2003).

A prática da eutanásia não pode ocorrer mesmo quando há indícios de que a morte é inevitável, nem a pedido do paciente, nem para abreviar o sofrimento impulsionado pela piedade ou compaixão em relação ao doente. Mesmo que o enfermo padece de mal incurável e substancial sofrimento, pois a prática da eutanásia configura crime de homicídio, eventualmente poderá ser privilegiado, simples ou qualificado.

Assim como o conceito de morte é amplo, a eutanásia também possui diferentes conceitos e tipificações, entre eles:

̶ eutanásia ativa é o ato deliberado por fins misericordiosos, de ajudar a promo-

ção da morte, a fim de eliminar o sofrimento do doente;

̶ eutanásia passiva ou indireta é quando a morte do paciente ocorre, dentro de

uma situação de terminalidade ou porque não se inicia uma ação médica ou porque é feita a interrupção de uma medida extraordinária, com o objetivo de diminuir o sofrimento do paciente;

̶ eutanásia terapêutica é quando são empregados ou omitidos meios

terapêuticos, com intuito de causar a morte do paciente. É a faculdade atribuída aos médicos para propiciar uma morte suave aos pacientes incuráveis e com dor (PEREIRA; GUSMÃO, 2013).

O prefixo grego dys tem o significado de “ato defeituoso”, portanto, a distanásia significa prolongamento exagerado da morte de um paciente. O termo pode ser empregado como sinônimo de tratamento inútil. Trata-se de atitude médica que, visando salvar a vida do paciente terminal, submete-o a grande sofrimento. Nesta conduta, não se prolonga a vida propriamente dita, mas o processo de morrer.

A distanásia fere a dignidade do paciente, de forma em que é negligente com seu bem estar e cuidados necessários a fim de evitar o sofrimento e assim abreviar

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sua vida, sendo decidida alheia à vontade do paciente com ou sem a autorização de seu responsável legal, que por falta de conhecimento “concorda” com a convicção de que estando nesta situação de doente terminal não sente dor ou compreende o que se passa.

Até que ponto se deve prolongar o processo do morrer quando não há mais esperança? Manter a pessoa morta-viva para quê?

Quanto mais sofisticada for a instituição de saúde, tanto mais possível e sofisticada por ser a distanásia. Pouco importa a situação e as condições de dignidade humana do paciente, pois a distanásia tem como foco a quantidade e não a qualidade.

Assim, distanásia pode ser conceituada como a agonia prolongada, o patrocínio de uma morte com sofrimento físico ou psicológico do indivíduo, muitas vezes lúcido e senhor de suas faculdades mentais, afetado por determinada enfermidade incurável, sem qualquer perspectiva de cura ou melhora (ADONI, 2003).

Há uma inequívoca degradação do ser humano, utilizado como verdadeiro objeto-meio para satisfazer os anseios dos desenvolvimentos tecnológicos dirigidos a tratamentos médicos.

O prefixo grego orto significa “correto”. Ortotanásia tem o sentido de morte “em seu tempo”, sem abreviação, nem prolongamentos desproporcionados do processo de morrer. Nesse sentido, Pessini e Barchifontaine (2000, p. 264) complementam:

A ortotanásia, diferentemente da eutanásia, é sensível ao processo de humanização da morte, alívio das dores e não incorre em prolongamentos abusivos com a aplicação de meios desproporcionados que imporiam sofrimentos adicionais.

A ortotanásia objetiva a morte no tempo certo com os cuidados necessários, sem prolongar o sofrimento, uma vez que suas necessidades básicas como nutrição

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(alimentação por sonda), hidratação (soro) e respiração (uso de oxigênio), sem o uso de drogas que prolonguem a vida, mas que mantenham sua dignidade a fim de evitar a distanásia.

De acordo com a Resolução nº 1.805/2006, do Conselho Federal de Medicina (CFM), o conceito de ortotanásia passou a ter um contexto mais amplo, pois não envolve somente a omissão, mas também cuidados necessários que aliviam os sintomas, evitando os sofrimentos. Segundo a referida Resolução:

Na fase terminal de enfermidades graves e incuráveis é permitido ao médico limitar ou suspender procedimentos e tratamentos que prolonguem a vida do doente, garantindo-lhe os cuidados necessários para aliviar os sintomas que levam ao sofrimento, na perspectiva de uma assistência integral, respeitada a vontade do paciente ou de seu representante legal (CFM, 2006).

Sendo a morte a consequência da vida, somente se admite a morte com o cumprimento do ciclo natural, sem a interrupção precoce da vida em função de doença irreversível. Somente a ortotanásia reúne todos os requisitos de aceitabilidade perante o Direito, a Medicina e o senso ético. Não se coloca em discussão a indisponibilidade da vida, mas o direito do cidadão em decidir a respeito do seu fim, buscando a dignidade da morte por meio do princípio da autonomia. Neste perfil mais humano, não há a antecipação da morte, nem que se valha de alguém para a prática do suicídio.

Segundo Oliveira Júnior (2013, p. 241),

[...] O Papa João Paulo II, na Encíclica Evangelium Vitae deixou transparecer a opção da Igreja Católica pela ortotanásia, expressando-se da seguinte forma:

Distinta da eutanásia é a decisão de renunciar ao chamado ‘excesso terapêutico’, ou seja, a certas intervenções médicas já inadequadas à situação real do doente, porque não proporcionadas aos resultados que se poderiam esperar ou ainda porque demasiado gravosas para ele e para sua família. Nestas situações, quando a morte se anuncia iminente e inevitável, pode-se, em consciência ‘renunciar a tratamentos que dariam somente um prolongamento precário e penoso da vida, sem contudo, interromper os cuidados normais devidos ao doente em casos semelhantes’. Há, sem dúvida, a obrigação moral de se tratar e procurar curar-se, mas essa obrigação há de medir-se segundo as situações concretas, isto é, impõe-se avaliar se os meios terapêuticos à disposição são objetivamente proporcionados às perspectivas de melhoramento. A renúncia a meios extraordinários ou desproporcionados não equivale ao suicídio ou à eutanásia; exprime, antes, a aceitação da condição humana de fronte à morte.

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A ortotanásia é o método mais aceitável para a terminologia de vida. Respeita a vida e a morte do ser humano, independente de cor, raça ou religião. Todo o cidadão deveria entender que a morte digna traz conforto tanto para o doente terminal quanto para a família, a qual estará ciente das condições em que este se manteve, tendo a assistência adequada até o final da sua vida.

Pessini e Barchifontaine (2000, p. 315) relatam que uma das características da ortotanásia,

[...] é a arte de morrer bem, sem ser vítima de mistanásia, por um lado, ou de distanásia, por outro, sem recorrer à eutanásia. O grande desafio da ortotanásia, o morrer corretamente, humanamente, é como resgatar a dignidade do ser humano na última fase de sua vida, especialmente quando ela for marcada por dor e sofrimento. A ortotanásia é a antítese de toda tortura, de toda morte violenta em que o ser humano é roubado não somente de sua vida mas também de sua dignidade.

No mundo cristão pré-moderno, a arte de morrer bem tinha seus parâmetros culturais relativamente bem definidos. Morrer bem significava morrer na própria cama, em casa, rodeado pelos familiares e amigos [...]

Hoje em dia, com a medicalização da morte, o cenário muda para o leito hospitalar, [...] procura humanizar esta situação principalmente com a sedação, para que, por exemplo, os piores excessos da UTI passem despercebidos pelo doente [...]. O paradigma tecnocientífico da medicina procura prolongar a vida humana custe o que custar, e o paradigma comercial-empresarial procura prolongar a vida humana enquanto se pode arcar com o custo.

A ortotanásia permite que o doente terminal enfrente a morte com tranquilidade, pois esta não é uma doença a ser curada, mas algo que pertence à vida. Assim, há como resgatar a dignidade do ser humano que teve seus últimos dias de vida marcados pelo sofrimento e dor.

No próximo capítulo abordam-se aspectos referentes ao direito de morrer com dignidade, apresentando que a ponderação de valores se faz necessária em um momento em que se exige uma tomada de decisão entre a vida e a morte.

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2 O DIREITO DE MORRER COM DIGNIDADE: A PONDERAÇÃO ENTRE OS PRINCÍPIOS QUE PROTEGEM A VIDA E A DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA

Sabe-se que não são poucas as discussões travadas na sociedade civil, notadamente na área médica, sobre a possibilidade de uma pessoa que está padecendo de uma doença incurável ter o direito de morrer com dignidade assegurada, embora a CF/88 garante o direito à vida como o mais importante de todos.

Pode-se afirmar que, hodiernamente, estudos são realizados e avaliam a utilização do mecanismo da ponderação para analisar os princípios que protegem a vida e a dignidade humana.

Aborda-se a seguir, o direito à vida e o confronto entre os princípios que lhe dão sustentação, sem descuidar da ponderação de valores que se deve fazer para compreender esse tema.

2.1 Direito à vida

Para melhor compreender o direito à vida, necessário se faz enfatizar que este é o mais importante de todos os direitos. Está elencado na Constituição Federal de 1988 (CF/88), no título “Dos Direitos e Garantias Fundamentais” que declara a “inviolabilidade da vida”, decorrente de um direito natural, adquirido no nascimento, sendo ele intransmissível e irrenunciável. Está conectado a outros, como o direito à liberdade, à igualdade e à dignidade, segurança, saúde, entre outros.

Nesse sentido apresenta-se as palavras de Bulos (2009, p. 240), as quais são deveras explicativas, quando ressalta que:

Seu significado constitucional é amplo, porque ele se conecta com outros, a exemplo dos direitos à liberdade, à igualdade, à dignidade, à segurança, à propriedade, à alimentação, ao vestuário, ao lazer, à educação, à saúde, à habitação, à cidadania, aos valores sociais do trabalho e a livre iniciativa.

Isso significa que os fundamentos da República só subsistem porque a CF/88 assegura proteção total à vida, inclusive, protegendo todas as formas de vida.

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O princípio constitucional que assegura o direito à vida é um direito ao respeito da própria vida perante as outras pessoas. Atentar contra a vida produz um dano que é a morte, sendo superior a qualquer interesse na ordem jurídica.

A vida humana, qualquer que seja sua origem, é algo contínuo, transmissível, comum a toda espécie humana e presente em todo indivíduo humano, constituindo-se num elemento primordial e estruturante da sua personalidade.

Assim, a Constituição Federal de 1988 garante a todos os cidadãos a igualdade perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo aos brasileiros e estrangeiros aqui residentes a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade.

Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade.

A Constituição Federal proclama, portanto, o direito à vida, cabendo ao Estado assegurá-lo em seu duplo sentido, sendo o primeiro relacionado ao direito de continuar vivo e o segundo de se ter vida digna quanto a sua existência.

Pode-se mencionar que a vida humana tem início com a fecundação, mas a sua proteção jurídica enquanto tal só tem início a partir da nidação, momento em que o óvulo fecundado se fixa na parede uterina dando início à gestação, até que ocorra o nascimento.

Dantas (2012, p. 301-302) insiste em dizer que

É importante ressaltar que parte da doutrina defende que a vida humana inicia-se no ato da fecundação do óvulo pelo espermatozóide, mesmo que tal fecundação tenha se dado fora do útero materno. Defende, portanto, que, desde a concepção mesmo que extrauterina, surge a proteção do direito a vida [...] e, portando, a proteção jurídica só começa efetivamente com o surgimento do córtex cerebral, o qual, por sua vez, somente se forma quando o embrião tiver sido introduzido no útero materno.

De fato, o exposto pode ser sintetizado em apenas algumas palavras, ou seja, a vida humana “apenas começa com o surgimento do cérebro, o qual, por sua vez,

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somente teria condições de se formar após a introdução do embrião no útero materno.” (DANTAS, 2012, p. 303).

O entendimento de Sarlet (2006, p. 148), não é diferente dos autores supracitados e vem sustentar a tese esposada pelo STF na ADI 3.510, qual seja:

De qualquer forma, as efetivas perguntas sobre quando a existência como pessoa humana inicia no sentido constitucional, quando ela termina e se seus limites temporais são rígidos ou flexíveis, não devem, fundamentalmente, sob a perspectiva jurídica, ser avaliadas de forma separada em relação a ambos os direitos fundamentais, e sim respondidos de forma unificada. Se um embrião produzido por meio da técnica de manipulação genética possui dignidade humana, se uma criança pode ser compreendida como um dano patrimonial, se e sob quais pressupostos é permitida ou até mesmo recomendada a facilitação da morte, se a morte de uma pessoa em prol da salvação de outra é permitida, seja sob a forma de um “tiro de misericórdia”, seja por meio de uma correspondente distribuição de leitos em Unidades de Tratamento Intensivo ou por meio da doação de órgãos para pacientes (o que, para os pacientes não atendidos, muitas vezes significa morte certa) – sempre são afetadas, nesses casos, ao lado dos aspectos atinentes à vida, aspectos atinentes à dignidade, pois o atingido é sempre um ser humano.

Assim, o direito à vida deve ser compreendido de acordo com uma visão geral que dele se faça, incluindo na sua interpretação outros valores superiores, entre os quais se destaca a dignidade da pessoa humana, da paternidade responsável, o direito à saúde, elevando-o à categoria de princípio fundamental da Constituição Federal do Brasil, assim como o direito à liberdade, que dela se origina. Nesse passo ninguém pode ser desprovido da própria vida contra sua vontade, mas não existe um dever absoluto e incondicionado de viver.

O direito à vida é o principal fundamento de todos os direitos, já que constitui o requisito indispensável à existência e exercício de todos os demais. A Constituição Federal de 1988 protege a vida de forma geral, desde a fecundação.

Para corroborar com o exposto, Schiefer (2013) se manifesta mediante o seu estudo sobre os direitos fundamentais da pessoa humana. O autor compreende que o direito à vida é o direito de todo o ser humano de não ser privado de sua própria vida e o direito de todo ser humano de dispor dos meios apropriados de subsistência e de um padrão de vida decente. Sustenta a autora supracitada que:

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O direito humano à vida compreende um “princípio substantivo” em virtude do qual todo ser humano tem como direito inalienável a que sua vida seja respeitada; e um “princípio processual”, segundo o qual nenhum ser humano haverá de ser privado arbitrariamente de sua vida. O direito à vida é básico ou fundamental porque “o gozo do direito à vida é uma condição necessária do gozo de todos os demais direitos humanos”. Tomado em sua dimensão ampla e própria, o direito fundamental à vida compreende o direito de todo ser humano de não ser privado de sua vida e o direito de todo ser humano de dispor dos meios apropriados de subsistência e de um padrão de vida decente (preservação da vida, direito de viver). Como bem assinalado por F.Przetacznik, “o primeiro pertence à área dos direitos civis e políticos; o segundo, à dos direitos econômicos, sociais e culturais”. Em suma, o direito fundamental à vida pertence, a um tempo, ao domínio dos direitos civis e políticos e, em outro, ao dos direitos econômicos, sociais e culturais. Ilustram assim, a indivisibilidade de todos os direitos humanos. A atual doutrina internacional dos direitos humanos efetivamente se inclina no sentido de aproximar o direito à vida em sua ampla dimensão do direito de viver.

A autora destaca a importância do direito à vida, sendo que é o bem fundamental de todos os seres humanos, pois sem ela não existem outros direitos, nem mesmo a personalidade. Com base nesse entendimento, todo o homem tem direito à vida, ou seja, o direito de viver e não apenas isso, tem o direito a uma vida plena e digna, com respeito a todos os seus valores e suas necessidades, dentro de um mínimo existencial.

A titulo de informação, Ribeiro (2013) entende que o direito à vida deve estar associado à ideia de conservação da própria vida, em que cada indivíduo deve cuidá-la, porém, somente poderá violar o direito de outro em caso de legítima defesa ou em estado de necessidade. Aduz a autora que:

Assim, o direito à vida deve ser associado a um direito à conservação da vida, em que o indivíduo pode gerir e defender sua vida, mas não pode dela dispor, apenas justificando ação lesiva contra a vida em casos de legítima defesa e estado de necessidade. Assevera, ainda, sobre tutela privada e pública do direito à vida, admitindo que o direito aos alimentos é uma tutela complementar da vida, sendo diferente do direito à vida, pois não é a vida o seu objeto, mas um bem material para servir a conservação da vida.

Salienta-se que uma questão que demanda atenção é aquela que se atém aos critérios de avaliação do óbito, que evoluíram ao longo da história da Medicina, de forma que o conceito clássico da morte, em função da cessação das funções cardiorrespiratórias, cedeu lugar à morte encefálica, considerada como a extinção de toda atividade cerebral.

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Todavia, não há que se falar num direito à própria morte decorrente do direito à vida, verdadeira inversão do sentido do preceito constitucional. Destarte, o direito à vida aparece como disponível, embora essa afirmação deva ser admitida com reservas, não possibilitando a intervenção ativa de terceiros, o que implicaria verdadeira renúncia às garantias de respeito e proteção contra o Estado e demais pessoas. Diante disso, há que se entender a vida humana como objeto de tutela constitucional enquanto vida digna (XAVIER, 2007).

Silva (2010, pp. 198-199) se manifesta sobre o direito à vida, observando que a existência

Consiste no direito de estar vivo, de lutar pelo viver, de defender a própria vida, de permanecer vivo. È o direito de não ter interrompido o processo vital senão pela morte espontânea e inevitável. Existir é o movimento espontâneo contrário ao estado morte. Porque se assegura o direito à vida é que a legislação penal pune todas as formas de interrupção violenta do processo vital. É também por essa razão que se considera legítima defesa contra qualquer agressão à vida, bem como se reputa legítimo até mesmo tirar a vida a outrem em estado de necessidade da salvação própria

É fundamental compreender que a CF/88 assegura o direito à existência com dignidade, lembrando que de forma genérica o art. 5˚, caput, abrange o direito de não ser morto, privado da vida.

Em decorrência disso pode-se afirmar que a CF/88 traz a proibição da pena de morte, salvo em caso de guerra declarada, conforme art. 84, inciso XIX, e sua vedação é tradição do direito constitucional.

Segundo Lenza (2012, p. 970), o direito à vida apresenta alguns desdobra-mentos que necessitam ser expostos para melhor compreensão sobre o tema:

Em decorrência do seu primeiro desdobramento (direito de não ser privado da vida de movo artificial), encontramos a proibição da pena de morte, salvo em caso de guerra declarada, nos termos do artigo 84, XIX. Assim, mesmo por emenda constitucional, é vedada a instituição da pena de morte no Brasil, sob pena de se ferir a clausula pétrea do artigo 60, §4°., IV, lembrando, ainda, a doutrina moderna que impede, ainda a evolução

reacionária ou o retrocesso social, e, nesse sentido, não admitiria a previsão

da pena de morte, nem mesmo diante da manifestação do poder

constituinte originário.

O segundo desdobramento, ou seja, o direito a uma vida digna, garantindo-se as necessidades vitais básicas do garantindo-ser humano e proibindo qualquer tratamento indigno, como a tortura, penas de caráter perpetuo, trabalhos forçados, cruéis, etc. (grifo do autor).

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Por um lado, significa afirmar que de forma genérica, o direito à vida abrange o direito de manter-se vivo com dignidade; por outro, o de não ser morto por qualquer razão que seja, pois segundo a Constituição Federal de 1988, esse direito é o mais importante de todos os direitos catalogados, mas se encontra conectado também com os demais direitos e fundamentos da República Federativa do Brasil.

Importante se faz mencionar que quando se aborda o direito à vida vem à tona a discussão referente às células tronco embrionárias. Certamente que isso vem mostrar o quão importante e relevante foram as discussões travadas no Supremo Tribunal Federal (STF) relativamente sobre as pesquisas com células tronco embrionárias, disciplinadas pela Lei 11.105/2005 (Lei da Biossegurança), o aborto, no caso de anencefalia, e a chamada eutanásia passiva (LENZA, 2012; BULOS, 2009).

Nesse aspecto convém salientar que a sociedade precisa ficar atenta, haja vista que as decisões tomadas pelo STF trazem em seu contexto uma carga valorativa muito grande quanto aos sentimentos, angústias, valores e a existência como pessoa humana vai exigir que haja respeito, bom senso e ponderação para evitar problemas.

Sobre esse assunto, a decisão do Supremo Tribunal Federal na ADI 3.510, reconhecendo a constitucionalidade do art. 5° da Le i de Biossegurança, em 2008, acatando a tese “de que as pesquisas com células-troco embrionárias não violam o direito à vida, tampouco a dignidade da pessoa humana.” (BULOS, 2009, p. 240). Observa-se que a Corte Excelsa entendeu que tais pesquisas vêm ao encontro do próprio direito à vida e ao planejamento familiar, pois isso possibilita que muitas doenças sejam evitadas e que a pessoa possa exercer com plenitude seu direito de escolha. Nesse sentido, são esclarecedoras as palavras do Ministro Celso de Mello (apud BULOS, 2009, p. 240) ao ressaltar que

o Estado não pode ser influenciado pela religião, alertando que a decisão da Corte permitira que milhões de brasileiros que hoje sofrem e se acham postos a margem da vida, exerçam, de modo concreto, um direito básico e alienado que é ‘o direito a busca da felicidade e também o direito de viver com direito com dignidade, direito de que ninguém, absolutamente ninguém, pode ser privado. (STF, Pleno, ADI 3.510, Rel. Min. Carlos Ayres Brito, j. 29-05-2008).

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Outrossim, convém ressaltar que Sarlet (2006, p. 148) traz contribuições sobre direito à vida e à dignidade da pessoa humana, as quais são importantes de serem reproduzidas, quais sejam:

Em todos os aspectos comuns entre a dignidade da pessoa humana e direito fundamental à vida não se pode deixar de ter em vista, todavia, que os bens jurídicos “vida” e “dignidade da pessoa humana” não devem, necessariamente, repercutir em conjunto, de forma paralela, como elemento de reforço de proteção no sentido de um vínculo jusfundamental, isso é, como concorrência jusfundamental cumulativa. Pelo contrário; eles também podem entrar em conflito entre si no sentido de uma colisão de direitos fundamentais. Onde esse conflito se manifesta, porque a vida de um entra em confronto com a dignidade do outro (por exemplo, na doação de órgãos não consentida), não estamos diante de uma singularidade do ponto de vista dogmático jusfundamental; é preciso que resulte, aqui, uma solução ponderada pautada pelo critério do menor sacrifício possível de direitos fundamentais.

Destaca-se que não há como trabalhar o direito à vida sem que haja uma íntima correlação com a dignidade da pessoa humana, principalmente quando se quer enfocar o direito de morrer com dignidade e a ponderação entre os princípios que protegem a vida.

2.2 Princípio da dignidade da pessoa humana

Inicia-se este item procurando situar e compreender o significado da dignidade da pessoa humana, fundamento constitucional e de suma importância para o entendimento desta pesquisa.

Primeiramente, há necessidade de ressaltar que a Constituição Federal de 1988 apresenta no art. 1º, inciso III, o Princípio da Dignidade Humana como fundamento para que o cidadão exerça a sua cidadania e seja respeitado como pessoa, fruindo dos demais direitos fundamentais.

Nesse sentido, Dworkin (2009, p. 334) manifesta-se afirmando que

A expressão “direito à dignidade” é usada de muitas formas e muitos sentidos na filosofia moral e política. Às vezes, por exemplo, significa o direito a viver em condições, quaisquer que sejam, nas quais o amor próprio é possível ou pertinente. Aqui, porém, devemos examinar uma ideia mais limitada: a de que as pessoas têm o direito de não ser vítimas da

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comunidade, se entende como demonstração de desrespeito. Toda a sociedade civilizada tem padrões e convenções que definem essas indignidades, que diferem conforme o lugar e a época em que se manifestam.

Em geral se acredita que esse direito à dignidade é mais fundamental e urgente do que o direito à beneficência que até aqui examinamos, o qual, como enfatizei, é apenas um direito a que todos os recursos disponíveis sejam utilizados em favor do paciente.

Observa-se assim, que a dignidade da pessoa humana é considerada um princípio que está acima dos demais, apresentando um valor absoluto, reconhecendo que o ser humano merece ser respeitado como pessoa em todos os aspectos, seja na questão saúde, no campo espiritual, no emocional e, principalmente, na vida.

Na mesma linha de entendimento, Moraes (2002, p. 128) aduz que:

A dignidade é um valor espiritual e moral inerente à pessoa, que se manifesta singularmente na autodeterminação consciente e responsável da própria vida e traz consigo a pretensão ao respeito por parte das demais pessoas, constituindo-se em um mínimo invulnerável que todo estatuto jurídico deve assegurar, de modo que, somente excepcionalmente, possam ser feitas as limitações ao exercício dos direitos fundamentais, mas sempre sem menosprezar a necessária estima que merecem todas as pessoas enquanto seres humanos.

Muito pertinentes as palavras do referido autor, haja vista que a CF/88 adotou a dignidade da pessoa humana como valor supremo do estado democrático de Direito, e por isso, esse deve ser o primeiro a assegurar a proteção do cidadão.

Sarlet (2006) esclarece que a dignidade da pessoa humana foi construída a partir da natureza racional do ser humano. Por isso, Kant assinala que a autonomia da vontade, entendida como a faculdade de determinar a si mesmo e agir em conformidade com a representação de certas leis, é um atributo apenas encontrado aos seres racionais, servindo de limitação a autonomia da vontade.

Awad (2006, p. 114) enfatiza que “a proteção à dignidade inserida como fundamento do próprio Estado Democrático, é pressuposto da participação social do indivíduo no próprio destino desse estado, e, pois, condição de cidadania”.

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Não há como negar que o princípio da dignidade da pessoa humana está no ápice do ordenamento jurídico brasileiro e é aquele que goza de um status superior aos demais.

Awad (2006, p. 118) salienta que

A dignidade da pessoa humana é critério aferidor da legitimidade substancial de uma determinada ordem jurídico-constitucional, já que diz com os fundamentos e objetivos, em suma, com a razão de ser do próprio poder estatal.

O princípio aqui explanado é um dos que ocupa maior proeminência no ordenamento jurídico brasileiro, dos que possuem maior “peso” perante os demais princípios e normas constitucionais e infraconstitucionais, e se traduz como princípio estruturante ou fundamental. Seus efeitos alcançam todo ordenamento jurídico, uma vez que se encontra entre os princípios fundamentais do ordenamento jurídico pátrio.

Não se pode negar que assiste razão ao autor supracitado quando afirma que a dignidade da pessoa humana serve de suporte e critério para toda e qualquer ação que diz respeito aos direitos fundamentais.

Atendo-se ao exposto, não resta duvida que os ensinamentos de Sarlet (2006, p. 118) são fundamentais para sustentação desta pesquisa. “Assim, não há como negar que os direitos à vida, bem como os direitos de liberdade e igualdade correspondem diretamente às exigências mais elementares da dignidade da pessoa humana [...]”.

Esclarecem Chimenti et al. (2010, p. 68), que

a dignidade da pessoa humana é uma referência constitucional unificadora dos direitos fundamentais dos direitos inerentes à espécie humana, ou seja, daqueles direitos que visam garantir o conforto existencial das pessoas, protegendo-as de sofrimentos evitáveis na esfera sociais.

Importa referir que o ser humano goza de total proteção jurídica do Estado e é reconhecido por seus pares, logo, jamais poderá ser tratado com descaso, negligência ou mero instrumento. Assim, na excelente lição de Van Holbe (apud DANTAS, 2012, p. 141):

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A proteção da dignidade da pessoa humana parte do pressuposto parte de que o homem, em virtude tão somente de sua condição humana e independentemente de qualquer outra circunstancia, é titular de direitos que deve ser reconhecidos e respeitados por seus semelhantes e pelo estado. Logo em seguida afirma que, em razão deste princípio, o ser humano jamais poderá ser tratado como coisa, objeto e mero instrumento, de forma a negar sua condição humana.

À luz das considerações acima, não há como olvidar, neste contexto, que o princípio da dignidade da pessoa humana é utilizado como referência para realização da ponderação entre o direito à vida e o direito de morrer.

Neste sentido, é importante lembrar que o primeiro capítulo deste estudo referiu-se ao conceito de morte, à morte encefálica, à eutanásia, à distanásia e à ortotanásia, os quais foram abordados com o intuito de esclarecer que no momento de decidir entre a vida e a morte, valores são utilizados como instrumento de sopesamento entre um e outro, tendo como parâmetro o princípio da ponderação.

De inicio, faz-se necessário entender o que significa o princípio da proporcionalidade para melhor compreender a ponderação entre o direito à vida e a dignidade da pessoa humana, nos casos de eutanásia, distanásia e ortotanásia.

2.3 O direito de morrer com dignidade: a ponderação

Bonavides (2009, p. 394), “em sentido amplo, entende que o princípio da proporcionalidade é a regra fundamental a que devem obedecer tanto os que exercem quanto os que padecem o poder”. Isso significa dizer que a proporcionalidade é a relação entre fim e meio, e sempre tem que ser verificada a sua efetividade com a utilização dos meios menos gravosos para o atendimento dos interesses da pessoa humana, haja vista que essa deve ser analisada em todos os seus aspectos.

É de assinalar que o princípio da proporcionalidade é apenas uma das facetas da razoabilidade e não se pode negar que esse nasceu na visão de doutrinadores administrativas. Portanto, utiliza-se a seguir a opinião de alguns autores da área do direito administrativo para sustentar a nossa tese de que se deve utilizar a ponderação entre os princípios que protegem a vida e a dignidade da pessoa humana. Para Medauar (2000, p. 154),

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O princípio da proporcionalidade consiste, principalmente, no dever de não ser impostas, aos indivíduos em geral, obrigações, restrições ou sanções em medida superior àquela estritamente necessária ao atendimento do interesse publico, segundo critério de razoável adequação dos meios aos fins. [...]

Isso, demonstra que há momentos que deve ser sopesada a relação meios e fins. Na mesma linha de sustentação, Di Pietro (2012, p. 80) afirma que:

Na realidade [...], a proporcionalidade deve ser medida não pelos critérios pessoais do administrador, mas segundo padrões comuns na sociedade em que vive; e não pode ser medida diante dos termos frios da lei, mas diante do caso concreto.

Em rigor, o principio da proporcionalidade diz respeito ao sopesamento de valores no momento em que se vai tomar uma decisão e imprimir medidas relacionadas com determinadas situações, e no presente caso, relacionadas com o direito de morrer com dignidade.

Adianta-se que quando se fala em morrer com dignidade, não se está dizendo que se concorda com a morte, mas sim com o fim do padecimento, da dor, da agonia que passam determinadas pessoas quando não possuem condições de ter uma sobrevivência digna.

Assim, pode-se afirmar que a vida é um bem jurídico que está acima de todos os demais direitos, mas existem circunstâncias que possibilitam que se analise de uma forma ponderada se há necessidade da manutenção de uma vida com sofrimento.

Há muita discussão sobre o tema, ou seja, a morte com dignidade. A seguir abordam-se aspectos fundamentais para entender o que é melhor: manter uma pessoa viva ligada a aparelhos, em pré-agonia, em consequência de doença incurável ou terminal, ou consumar a sua morte pelo desligamento de aparelhos que, artificialmente, a mantêm viva?

Na verdade, cumpre observar que é nesse momento que a ponderação assume um papel fundamental para decidir entre os princípios que protegem a vida e a dignidade da pessoa humana.

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Reveste-se de fundamental importância o princípio da dignidade da pessoa humana. Sustenta Awad (p. 119, 2006) que “[...] que o princípio da pessoa humana reveste-se de uma certa singularidade, pois, se assim não fosse, de que adiantaria ao Estado garantir a vida se essa não é digna”.

Ora, é bem verdade que a dignidade é inerente ao ser humano, pois sem dignidade não se vive, não se sobrevive. Registra-se que Sarlet (2006, p. 69) foi muito feliz ao afirmar que

[...] que a dignidade, como qualidade intrínseca da pessoa humana, não poderá ser ela própria concedida pelo ordenamento jurídico [...].

Assim, quando se fala - no nosso sentir equivocadamente- em direito à dignidade, se está, em verdade, a considerar o direito a reconhecimento, respeito, proteção e até mesmo promoção e desenvolvimento da dignidade, podendo inclusive falar-se em direito a uma existência digna, sem prejuízo de outros sentidos que se possa atribuir aos direitos fundamentais relativos a dignidade da pessoa humana.

Enfim, não há como deixar de salientar que ao se falar em dignidade humana se está reportando ao mínimo existencial, no qual se prevê que uma pessoa deve ter o mínimo de condições para poder sobreviver. Esse mínimo existencial está intimamente relacionado com a saúde, educação, moradia, educação, segurança e outros direitos que se fazem necessários para que se garanta uma vida razoável e dentro de padrões mínimos, mas dignos de uma pessoa humana.

Por último, afirma-se, sem sombra de dúvida, que no caso de uma pessoa que tem uma vida vegetativa, ou seja, que está vivendo com sofrimento, agonizando, e sem condições mínimas de vida, é possível utilizar a técnica da ponderação de valores e, assim, dar fim ao padecimento, à dor, à agonia que impede a pessoa de viver com dignidade.

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CONCLUSÃO

No presente estudo foi possível constatar que a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (CF/88) menciona o direito à vida e à dignidade da pessoa humana como algo inviolável, não mencionando a morte, como se esta não fizesse parte do ciclo natural da vida.

Todos sabem que a vida é considerada o bem mais valioso que uma pessoa possui e o texto constitucional brasileiro assegura para que não haja violação de tal direito que está intimamente relacionado com a segurança, bem-estar e justiça.

O estudo também destacou a importância do direito à vida, sendo que esta é o bem fundamental de todos os seres humanos, pois sem ela não existem outros direitos, nem mesmo a personalidade. Com base nesse entendimento, todo o homem tem direito à vida, ou seja, o direito de viver e não apenas isso, mas o direito a uma vida plena e digna, respeito os seus valores e suas necessidades, dentro de um mínimo existencial.

Ainda, observou-se que o principio constitucional que assegura o direito à vida é um direito ao respeito a própria vida perante as outras pessoas. Atentar contra a própria vida produz um dano que é a morte, sendo superior a qualquer interesse na ordem jurídica.

A vida humana, qualquer que seja sua origem, é algo contínuo, transmissível, comum a toda espécie humana e presente em todo indivíduo humano, constituindo-se num elemento primordial e estruturante da sua personalidade.

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Assim, a Constituição Federal de 1988 garante a todos os cidadão a igualdade perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo aos brasileiros e estrangeiros aqui residentes a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade.

Também foi muito relevante a analise realizada sobre o princípio da dignidade da pessoa humana e sua relação com o direito à vida e o direito à morte com dignidade.

Nesse sentido, pode-se concluir que a dignidade da pessoa humana foi construída a partir da natureza racional do ser humano. Por isso, Kant assinala que a autonomia da vontade, entendida como a faculdade de determinar a si mesmo e agir em conformidade com a representação de certas leis, é um atributo apenas encontrado aos seres racionais, servindo de limitação a autonomia da vontade.

Deve-se, ainda, enfatizar que no decorrer deste trabalho concluiu-se, também, que a vida é um bem jurídico que está acima de todos os demais direitos, mas existem circunstâncias que possibilitam que se analise de uma forma ponderada se há necessidade da manutenção de uma vida com sofrimento.

Em relação à morte, observou-se que a ortotanásia é o método mais aceitável para a terminologia de vida. Respeita a vida e a morte do ser humano, independente de cor, raça ou religião. Todo o cidadão deveria entender que a morte digna traz conforto tanto para o doente terminal quanto para a família, a qual estará ciente das condições em que este se manteve, tendo a assistência adequada até o final da sua vida.

Constatou-se também que sendo a morte uma consequência da vida, somente se admite a morte com o cumprimento do ciclo natural, sem a interrupção precoce da vida em função de doença irreversível. Somente a ortotanásia reúne todos os requisitos de aceitabilidade perante o Direito, a Medicina e o senso ético. Não se coloca em discussão a indisponibilidade da vida, mas o direito do cidadão em decidir a respeito do seu fim, buscando a dignidade da morte por meio do

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princípio da autonomia. Neste perfil mais humano, não há a antecipação da morte, nem que se valha de alguém para a prática do suicídio.

Por derradeiro, significa dizer que de forma genérica, o direito à vida abrange o direito de manter-se vivo com dignidade. Por outro lado, o de não ser morto por qualquer razão que seja, pois segundo a Constituição Federal de 1988, esse direito é o mais importante de todos os direitos catalogados, mas se encontra conectado também com os demais direitos e fundamentos da República Federativa do Brasil.

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Referências

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