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Conselho Deontológico Queixa nº 17/Q/2017

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Conselho Deontológico

Queixa nº 17/Q/2017

Assunto:

Queixa conjunta apresentada por Associação Apuro, Associação Plano i, Associação Projeto Be Equal, Comissão Nacional pela Legalização de Imigrantes, ContraBANDO – Espaço Associativo, Cooperativa WelcomeHome, Instituto Companheiros Emaús, Movimento Uma Vida como a Arte, NÓs. Entre Iguais, Panteras Rosa, Precários Inflexíveis, Projeto Identidade, Saber Compreender, SOS Racismo, Street Store do Porto e Street Store de Braga contra o Diário de Notícias da Madeira, a propósito da reportagem da autoria da jornalista Andreína Ferreira com a chamada de primeira página "Sem-abrigo mancham cidade turística", publicada a 22-01-2017.

Queixa:

1. A 30 de Janeiro de 2017, o CDSJ recebeu uma queixa contra o Diário de Notícias da Madeira, a propósito da reportagem da autoria da jornalista Andreína Ferreira com a chamada de primeira página "Sem-abrigo mancham cidade turística", publicada a 22-01-2017. A queixa foi apresentada pelas organizações Associação Apuro, Associação Plano i, Associação Projeto Be Equal, Comissão Nacional pela Legalização de Imigrantes, ContraBANDO – Espaço Associativo, Cooperativa WelcomeHome, Instituto Companheiros Emaús, Movimento Uma Vida como a Arte, NÓs. Entre Iguais, Panteras Rosa, Precários Inflexíveis, Projeto Identidade, Saber Compreender, SOS Racismo, Street Store do Porto e Street Store de Braga.

2.Afirmam os queixosos:

“No passado dia 22 de Janeiro de 2017 o Diário de Notícias da Madeira publicou uma notícia intitulada “Sem-abrigo mancham cidade turística”. Esta, não apenas fomenta a ideia de que as pessoas em situação de sem abrigo põem em causa a imagem do Funchal, manchando-a, como “incomodam” os/as madeirenses e os/as estrangeiros/as, constituindo-se como “uma vergonha” ou um “mau cartaz” para quem visita a cidade.

São ainda levantadas, na notícia, questões que atentam contra a dignidade das pessoas visadas, as quais parecem não ter sido ouvidas pela jornalista que assina a peça e que, de forma abusiva, se permite tecer considerações sobre aspectos que se afiguram como especulações e não evidências.

As pessoas em situação de sem abrigo são caracterizadas como sendo, na sua maioria, dependentes de álcool e mendigas, usando “estratagemas rebuscados para angariar dinheiro” e “apoderando-se” dos espaços públicos. O foco da notícia é, em consequência, não a vulnerabilidade das pessoas em causa, mas o sentimento de desconforto que parecem causar

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por existirem e serem visíveis.

As associações signatárias repudiam o carácter profundamente discriminatório da

notícia, entendendo que a mesma contribui para o reforço de uma imagem estereotipada das

pessoas em situação de sem abrigo e para o reabilitar de modelos de exclusão social.”

Procedimentos:

3. O Conselho Deontológico do Sindicato dos Jornalistas contactou por escrito e individualmente, a 31 de Janeiro de 2017, o director do Diário de Notícias da Madeira, Ricardo Miguel Oliveira, e a jornalista Andreína Ferreira, para que apresentassem a sua versão dos factos e argumentassem em sua defesa.

Análise:

4. Quer o director do Diário de Notícias da Madeira, Ricardo Miguel Oliveira, quer a jornalista Andreína Ferreira, responderam à solicitação do CDSJ, a 10 de Fevereiro de 2017.

5. Na sua resposta o director do Diário de Notícias da Madeira, Ricardo Miguel Oliveira, começa por explicar a sua posição editorial, escrevendo:

“A Madeira, e o Funchal em particular, é, reconhecidamente, um destino turístico de excelência, e as suas receitas e subsistência assentam, maioritariamente, no turismo.

É conhecida a preocupação e a importância generalizada que os destinos turísticos têm com a sua "imagem" perante o turista, e os investimentos, não apenas monetários, feitos pelo sector público, agentes económicos e população em geral, na melhoria dessa imagem.

São disso exemplo, sobretudo nos últimos anos, as múltiplas e diversificadas intervenções feitas nas cidades de Lisboa e Porto.

É sabido que a pobreza e a exclusão social, constituem realidades que chocam e sensibilizam a generalidade das pessoas, despertam as consciências e a actuação de muitos ou alguns, mas também transmitem, ao visitante ocasional, uma visão desses destinos turísticos que, sendo real, é susceptível de os tornar menos atractivos a nível turístico.

É deste contexto, de abordagem pouco convencional pela comunicação social, é certo, mas verdadeiro, que parte a reportagem em questão, sem a ele se limitar, como uma leitura imparcial dos títulos e textos que a compõem evidencia.”

Respondendo às questões colocadas sobre a titulagem dos textos que compunham a reportagem, diz:

“A chamada de primeira página e os títulos das notícias retratam fielmente o conteúdo das mesmas e não tem qualquer "tom discriminatório e estigmatizante".

Dizer que os sem-abrigo "mancham a cidade turística" (sublinhado meu) evidencia o facto de uma cidade e uma região turística que é destino de ouro não ser capaz de dignificar quem nela habita, dar casa a quem não a tem e futuro a quem precisa.

Estigmatizantes e discriminatórias são as condições degradantes em que vivem os sem-abrigo e que alguma comunicação social branqueia ou não traz com verdade ao debate

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público, sem ser repetitivo nem sensacionalista.” Ainda sobre a reportagem em causa, advoga:

“A reportagem aborda, de forma honesta e transparente, um tema de relevante interesse público a carecer de intervenção que não se resuma a esmolas.

Demonstra carências graves de intervenção multidisciplinar e que urge maior articulação entre organismos que tutelam a área social.

Não basta dar a esmola ou o pão e a sopa.” E rejeitando as acusações, defende:

“Essa é a mensagem subliminar que a maioria da sociedade madeirense extraiu da reportagem, mas que uma ínfima parte, representada por um grupo de associações que revelam absoluto desconhecimento da realidade do Funchal (sem estar a pôr em causa o trabalho meritório que têm desempenhado nas respectivas áreas urbanas) interpretou de forma deturpada.

Em momento algum da reportagem há “críticas à existência dos sem-abrigo”.

As críticas referem-se a inércia social perante a evolução do estado de progressiva degradação humana a que estão votados os sem-abrigo nas ruas do Funchal.”

Já sobre o facto de as duas pessoas citadas na reportagem de forma desenvolvida serem emigrantes, justifica:

“A opinião dos emigrantes é válida porque sendo eles conhecedores do meio, têm também uma visão mais distanciada e descomprometida sobre a evolução do fenómeno da mendicidade e dos sem-abrigo na Madeira, e no Funchal, em particular.”

Respondendo à pergunta sobre se o contraditório tinha sido respeitado, garante:

“O contraditório foi respeitado e está devidamente posicionado e destacado, designadamente nas declarações prestadas pelo Instituto de Segurança Social da Madeira, - que é a entidade que tutela as associações que trabalham diariamente com os sem-abrigo - dedicando -se uma página ao mesmo - a página 14 - bem como a parte final da página 13.

Refira-se a este propósito que a construção dos textos obedece a uma lógica perceptível: Primeiro os factos, depois as reacções que os mesmos geram e as posições ‘oficiais’.”

Já sobre as fotografias publicadas, diz:

“Esse Conselho parece partir do princípio que as pessoas fotografadas não deram consentimento ou se opuseram a ser fotografadas, o que não corresponde à verdade.

Assim como parece não saber - e porventura não poderia saber - que as pessoas que surgem nas fotografias que ilustram a reportagem são sobejamente conhecidas - não só a sua identidade como também o modo de actuação, dada a sua condição de sem-abrigo - da

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generalidade dos Funchalenses e Madeirenses.

Muitos deles já posaram para a fotografia noutras circunstâncias e reportagens recentes neste mesmo DIÁRIO. Nessa altura não veio qualquer mal ao mundo.”

E conclui:

“Permito-me concluir, para finalizar, que só quem fizer uma leitura parcial e limitada da reportagem e do tema nela tratado - para além de desconhecer o posicionamento editorial e percurso noticioso de um jornal com mais de 140 anos de história - poderá atribuir, de forma quase difamatória, qualquer cariz discriminatório ou estigmatizante àquela, e, consequentemente, violador dos princípios deontológicos do jornalismo.

6. A jornalista Andreína Ferreira respondeu do seguinte modo ao CDSJ:

“1. Subscreve as considerações efectuadas quanto aos títulos e teor da reportagem pelo Director Ricardo Miguel Fernandes Oliveira.

2. Esclarece que não foi a autora da chamada de primeira página, mas que são da sua autoria os restantes títulos das notícias que compõem a reportagem.

3. Chegou à conclusão que alguns dos sem-abrigo têm esquemas para ganhar dinheiro, estão alcoolizados ou são toxicodependentes e que dopam animais, com base em factos que presenciou e presencia diariamente em zonas públicas, não só como jornalista mas como cidadã, e em fontes que merecem toda a sua credibilidade.”

Deliberação:

7. O CDSJ concorda com o director do Diário de Notícias da Madeira, Ricardo Miguel Fernandes Oliveira, no que se refere à importância e necessidade de a comunicação social falar dos problemas sociais, nomeadamente dos sem-abrigo.

O CDSJ acredita que não houve da parte da jornalista autora do trabalho, nem do director responsável pela sua publicação qualquer intuito de discriminar os sem-abrigo.

No entanto, em relação à reportagem em causa, o CDSJ considera que pela situação socialmente sensível e problemática em que vivem os sem-abrigo deveria ter havido mais cuidado editorial, quer na organização da informação quer das declarações.

O CDSJ considera também que deveria ter havido mais preocupação em estabelecer o contraditório. Deveriam ter sido ouvidos e citados na reportagem os próprios visados, bem como outras instituições da sociedade civil que os representam.

Assim como considera que as fotos deveriam ter sido publicadas com o cuidado de omitir (tapar) as caras, uma vez que a exposição pública através da publicação no jornal da imagem de pessoas em situação de vida sensível e problemática deve ser evitada. A identidade dos fotografados devia assim ter sido preservada, tanto mais que se encontram em situação de fragilidade social.

O CDSJ conclui que houve desequilíbrio na ordenação da informação deixando para segundo plano a posição das entidades oficiais e ignorando os próprios visados pela reportagem. Bem como uma injustificada exposição pública da imagem de pessoas em fragilidade social através das fotos.

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Mais considera que o desequilíbrio na apresentação da situação, que é feita em tom acusatório, a remissão para um plano secundário da posição e explicações das entidade oficiais que lidam com os sem-abrigo na Madeira, pode levar a que sejam feitas leituras discriminatórias dos envolvidos, os sem-abrigos.

Lisboa 13 de Fevereiro de 2017

Pelo Conselho Deontológico do Sindicato dos Jornalistas

São José Almeida (Presidente)

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