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O IMPACTO DA REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA SOBRE AS CONDIÇÕES DE TRABALHO E AS RELAÇÕES DE GÊNERO

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Academic year: 2021

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O IMPACTO

DA REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA

SOBRE AS CONDIÇÕES DE TRABALHO

E AS RELAÇÕES DE GÊNERO

Zuleica Lopes Cavalcanti de Oliveira

1 INTRODUZINDO O TEMA

O processo de reestruturação produtiva que vem ocorren-do em escala internacional ao longo das últimas décadas tem acarre-tado transformações substanciais no processo de reorganização do trabalho com repercussões significativas sobre o volume e a configu-ração do emprego bem como sobre os requisitos de qualificação e os padrões de gestão da força de trabalho. A natureza e os contornos assumidos pelo processo de mudança no “mundo” do trabalho tem sido objeto de interpretações diversas expressando, a grosso modo, a gran-de complexidagran-de e a dinâmica que tem presidido as suas transforma-ções. O mundo do trabalho foi afetado em todas as suas dimensões experimentando modificações substanciais nas relações e condições de trabalho, nos processos de trabalho e na própria natureza da sociabi-lidade do trabalhador. Os novos processos de trabalho não resultam mais apenas dos modelos fordista ou taylorista mas derivam da sua combinação com a flexibilização dos processos de trabalho e de produ-ção ou mesmo de sua substituiprodu-ção. Os novos processos de trabalho estão mais voltados para a articulação entre a competitividade, a capacidade inovadora e a produtividade. A flexiblização dos processos de trabalho e de produção forjou a existência de um novo trabalhador adaptado às exigências impostas pela nova forma de organização do processo produtivo. A demanda se volta para um trabalhador poliva-lente, mais educado e com níveis mais elevados de participação.

As estratégias empresariais empregadas com vistas ao atendimento das novas exigências do mercado tem apontado para a busca da redução dos custos sociais e salariais da força de trabalho. As empresas têm recorrido a flexibilização do trabalho e a subcontratação

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em detrimento da garantia da estabilidade do emprego. Como conse-qüência deste quadro ocorre uma dualização no interior da empresa que se expressa na constituição de um núcleo reduzido de profissionais e de trabalhadores altamente qualificados voltados para as tarefas criativas e, de outro, a existência de uma massa de trabalhadores que são responsáveis pela execução do trabalho precário e fragmentado. No caso particular das relações de gênero, um dos pressupostos básicos é o de que no quadro da reestruturação se verifica uma associação entre o trabalho feminino e a desqualificação. Neste quadro o trabalho qualificado e mais prestigiado fica a cargo dos homens enquanto que são degradadas as condições de trabalho para as mulheres. As mulhe-res se alocariam, em geral, nas funções rotinizadas, desqualificadas sendo, por sua vez, mais expostas a intensificação do ritmo de trabalho e ao aumento do controle das tarefas executadas. As evidências empí-ricas têm, por outro lado, mostrado que as estratégias empresariais de adaptação ao ajuste têm se caracterizado por respostas individuais e heterogêneas. A proposta do ensaio aqui esboçada se insere nesta temática visando identificar alguns dos aspectos das transformações que têm marcado o mundo do trabalho em período recente.

O objetivo do presente trabalho é o de trazer novos ele-mentos para o debate que tem fundamentado a discussão sociológica sobre os efeitos diferenciados da inovação tecnológica entre a força de trabalho masculina e feminina. A idéia é a de avaliar não somente o impacto da reestruturação produtiva sobre o perfil da força de traba-lho, inserida nas ocupações de escritório, como também as repre-sentações dos trabalhadores sobre as suas condições de trabalho no novo contexto da flexibilização. Para tanto se utilizará um estudo de caso realizado em uma empresa multinacional que já empreendeu a sua reestruturação em inícios da década de 90, adaptando-se assim as novas tendências desenhadas para o mercado de trabalho em período recente. Por que a escolha de uma empresa multinacional como a unidade de análise deste ensaio? Porque julgo que no cenário da reestruturação produtiva a opção pelo estudo de caso em uma empresa multinacional se constitui em um procedimento valioso já que este tipo de empresa pode fornecer por sua maior capacidade de adaptação, boas indicações sobre a configuração do emprego neste contexto. Além do mais, considerei ser também mais pertinente realizar o estudo de caso em uma organização que tinha anteriormente um compromisso com a garantia do emprego e que manifesta, por outro lado, uma preocupação específica com a questão da diversidade da força de

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trabalho. A Metropolitan1 tem uma clara orientação que está voltada para assegurar condições mais igualitárias entre os homens e as mulheres.

Foi após a Segunda Guerra Mundial que a Metropolitan se

transformou em uma grande corporação. Neste época a Metropolitan

se voltou para a fabricação e venda de computadores que alcançaram posteriormente uma posição de vanguarda em termos de tecnologia.

A Metropolitan entrou no Brasil por volta de 1917 tendo a sua atuação

dificultada pela reserva de mercado que criou impedimento para a sua expansão no país, restringindo o trabalho de seus profissionais apenas aos computadores de grande porte.

O estudo de caso foi estruturado segundo a articulação de dados de natureza quantitativa e qualitativa que se constitui, a meu ver, na melhor estratégia para a compreensão do objeto de estudo já que ela permite a identificação de suas várias dimensões constitutivas. O outro ponto que cabe ser explicitado refere-se à escolha do método do estudo de caso que possibilita, talvez como nenhum outro, realizar a organização dos dados sociais preservando, por sua vez, o caráter unitário do objeto social que está sendo investigado.

As informações de natureza quantitativa são originárias do arquivo de dados do Departamento de Recursos Humanos da empresa, estando relacionado ao período de 1986 a 1996. Este arquivo inclui informações tanto sobre o cargo como também sobre o nível do cargo, permitindo ainda levantar as diversas situações do emprego, a exemplo dos empregados efetivos, dos que foram desligados da empre-sa e dos que se aposentaram durante o período mencionado. As outras informações estão referidas às características pessoais do empregado, como a idade, estado civil, escolaridade, número e idade dos filhos. Estes dados são, contudo, pontuais, estando relacionados ao período atual. Já as informações de cunho qualitativo foram coletados por intermédio de entrevistas feitas com quarenta empregados da empre-sa, em torno de vinte para cada sexo, realizadas durante os meses de maio e de junho de 1997. Procurou-se examinar a percepção dos trabalhadores sobre a perda da garantia do emprego e do impacto da reestruturação sobre as suas condições de trabalho, com repercussões sobre as relações de gênero.

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2 A EMPRESA REESTRUTURADA:

UM OLHAR SOB AS CONDIÇÕES DE TRABALHO E AS RELAÇÕES DE GÊNERO

A reestruturação empreendida pela Metropolitan

encami-nhou-se no sentido da substituição da produção em massa de um único produto integrado pela produção de uma gama variada de produtos e de serviços especializados na área de computadores, o que é feito em conjunto com várias empresas e sob a sua articulação. A adaptação da organização ao processo de especialização flexível foi realizada de forma bem-sucedida, resultando em uma maior eficiência, maior produtividade e um menor custo de suas atividades. A Metropolitan

mantém atualmente uma posição bastante confortável na área de infra-estrutura da indústria de computação, participando de modo significativo de uma associação de empresas que está voltada para o atendimento das necessidades de seus consumidores. Para tanto, foi preciso empreender uma profunda mudança no perfil dos trabalhado-res da organização.

O novo padrão tecnológico tem alterado significativamen-te o volume e a composição da mão-de-obra no insignificativamen-terior da empresa. O conhecimento desta experiência de reestruturação contribui, em gran-de medida, para evigran-denciar a natureza das mudanças que já se fazem sentir nas relações de trabalho, como permite também vislumbrar os seus reflexos sobre o relacionamento entre as categorias de gênero. A primeira evidência marcante trata da drástica redução verificada no volume da mão-de-obra da organização, depois da reestruturação que foi feita durante a primeira metade dos anos 90 (Gráfico 1). Atualmen-te, a proporção dos trabalhadores efetivos é bem menor do que a dos que foram desligados da companhia, ao longo do período 1986-1996, valendo salientar que a diferença apontada é mais significativa para as mulheres do que para os homens.

A reserva de mercado, que impôs restrição à produção e à venda de computadores que não fossem de grande porte, impossibili-tou a capacitação dos técnicos da Metropolitan em termos de tecnologia

dos microcomputadores. Este foi um fator adicional ao quadro criado pelo comércio global, cuja principal conseqüência foi a de levar à redução significativa dos empregados da empresa. Isto foi feito, ini-cialmente, por intermédio das aposentadorias voluntárias e depois pela demissão de parte considerável de seu quadro efetivo de

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mão-de-obra. Outro mecanismo utilizado para a redução de pessoal foi o da terceirização de funções, o que já vinha sendo feito anteriormente, porém em menor escala. Antes dos anos 90, a estratégia de terceiriza-ção incidiu apenas sobre os serviços básicos, como o do pessoal de limpeza, manutenção básica, restaurante e segurança. Já durante a década de 90, ela se aprofundou, atingindo o trabalho de escritório, em suas funções de administração de estoques, telefonia, serviços de recepção e o staff secretarial que foi mantido somente no âmbito das Diretorias e da Presidência.

Gráfico 1

SITUAÇÃO DE EMPREGO DOS TRABALHADORES DA METROPOLITAN POR SEXO

Os resultados das políticas de desligamento efetuadas pela empresa podem ser acompanhadas pela relação entre a saída e a entrada e permanência de trabalhadores nela registrados nos últimos dez anos (Tabela 1). Neste particular, os anos de 1992 e de 1994, quando a relação apontada atinge, nitidamente, novos patamares, podem ser considerados como mais significativos. As políticas de desligamento atingiram, de modo particular, a mão-de-obra feminina. De fato, com exceção de 1996, a proporção de saídas para as mulheres superou sempre aquela verificada para os homens, sendo o diferencial de saída segundo as categorias de gênero especialmente expressivo no ano de 1995. O maior índice de desligamento das mulheres reflete, em grande parte, a mudança havida nos requisitos das habilidades e

29,20 24,10 32,80 64,50 72,10 59,20 6,30 3,80 8,00 0 10 20 30 40 50 60 70 80

Total Mulheres Homens

%

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competências que passaram a ser exigidos para os trabalhadores da

Metropolitan após a sua reestruturação. Os postos de trabalho de nível

médio, antes mais numerosos, foram sendo gradativamente reduzidos dentro da empresa, o que repercutiu sobre as mulheres. Eram elas que ocupavam, em maior número, os postos de trabalho de nível médio, sobretudo na área de suporte da companhia que compreende, entre outras atividades aquelas de natureza administrativa de rotina não-manual e o staff secretarial (Tabela 2). Uma parcela importante das

atividades de nível médio foram terceirizadas, como por exemplo, as funções de recrutamento e de seleção, telefonia, toda a parte de suporte administrativo, área operacional de pessoal da empresa, além da parte de manutenção predial e do staff secretarial.

Tabela 1

RELAÇÃO ENTRE A ENTRADA,

SAÍDA E PERMANÊNCIA DOS TRABALHADORES DA METROPOLITAN NOS ÚLTIMOS 10 ANOS, POR SEXO E SEGUNDO ANOS

Homens Mulheres Entrada Saída Empregados em 31/12 de saída% Entrada Saída Empregados em 31/12 de saída%

Aposen-tados Desli-gados Aposen-tados Desli-gados

1987 – – – 752 – – – – 392 – 1988 101 – 28 825 3,28 77 – 22 447 4,69 1989 121 – 56 890 5,92 108 1 40 514 7,39 1990 117 – 54 953 5,36 82 – 41 555 6,88 1991 102 1 62 992 5,97 97 5 68 579 11,20 1992 168 11 141 1008 13,10 152 5 125 601 17,78 1993 138 3 137 1006 12,22 130 4 107 620 15,18 1994 60 1 244 821 22,98 55 – 194 481 28,74 1995 40 77 119 665 22,76 24 20 146 339 32,87 1996 25 36 121 533 22,75 13 7 72 273 22,44

Valores em número de pessoas.

% de Saída = S / (E + P)

S = número de funcionários que saíram (aponsentados ou desligados) E = número de funcionários que entraram

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A conseqüência mais visível da estratégia de organização no tocante à mão-de-obra foi a da Metropolitan adquirir uma

confor-mação mais “masculina”, já que os fluxos de entrada e de saída dos trabalhadores favoreceram invariavelmente aos homens ao longo dos últimos dez anos (Tabela 1). O processo de reestruturação das ativi-dades da empresa redundou em um aumento dos requisitos de habili-dades e de competências de seus empregados. A comparação entre algumas características sociodemográficas dos empregados, dos desli-gados e dos aposentados da Metropolitan permite a identificação de

alguns aspectos que apontam no sentido da mudança do perfil de habilidades de seus trabalhadores (Tabelas 3, 4, 5). O primeiro aspecto a salientar diz respeito à juventude dos empregados da companhia (Tabela 3). Eles predominam no grupo etário de 25 a 34 anos, tendên-cia que está referida a ambos os sexos e às atividades que compreen-dem tanto as áreas-fim como as de suporte da companhia. Esta predominância é especialmente expressiva para as mulheres que estão inseridas nas áreas-fim, que têm concentrada nesta faixa 71,57% de seu efetivo contra 46,05% registrado para os homens. Vale ressaltar a maior juventude dos empregados alocados nas áreas-fim uma vez que apenas 3,92% das mulheres e 13,49% dos homens lotados nestas atividades têm 45 anos e mais de idade (Tabela 3). O diferencial etário não é expressivo entre os empregados e os que foram desligados da

Metropolitan. Ele só ganha significado quando se compara à

distribui-ção de idade destes com a dos aposentados, pois estes últimos se concentram obviamente nas faixas acima de 45 anos (Tabelas 3, 4, 5).

Tabela 2

SITUAÇÃO DE EMPREGO

DOS TRABALHADORES DA METROPOLITAN SEGUNDO SEXO E ÁREA DE ATIVIDADE

%

Empregados Desligados Aposentados

Total Homens Mulheres Total Homens Mulheres Total Homens Mulheres

Fim 55,8 63,3 41,1 65,1 67,7 62,1 60,3 63,1 52,6

Suporte 44,2 36,7 58,9 34,9 32,3 37,9 39,7 36,9 47,4

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Tabela 3

EMPREGADOS DA METROPOLITAN POR ÁREA DE ATIVIDADE SEGUNDO ALGUMAS CARACTERÍSTICAS SÓCIO-ECONÔMICAS

Áreas fim Áreas suporte

Total

100,00% Homens100,00% Mulheres100,00% 100,00%Total Homens100,00% Mulheres100,00%

Idade até 24 6,90 6,58 7,84 7,45 5,11 10,27 25 a 34 52,46 46,05 71,57 51,55 53,41 49,32 35 a 44 29,56 33,88 16,67 17,39 13,64 21,92 45 a 54 11,08 13,49 3,92 22,98 26,70 18,49 55 e mais 0,00 0,00 0,00 0,62 1,14 0,00 Estado civil solteiros 48,28 43,42 62,75 58,39 53,41 64,38 casados 47,29 53,62 28,43 36,96 43,18 29,45 outros 4,43 2,96 8,82 4,66 3,41 6,16 Nível de escolaridade 2º ciclo completo 13,30 15,79 5,88 5,28 3,41 7,53 superior incompleto 17,00 17,76 14,71 19,57 17,61 21,92 superior completo 56,90 55,26 61,76 66,46 69,89 62,33 pós-graduação 8,62 6,58 14,71 5,59 6,25 4,79 sem informação 4,19 4,61 2,94 3,11 2,84 3,42 Data de admissão até 1985 30,54 36,51 12,75 34,47 36,36 32,19 1986 a 1991 33,00 30,59 40,20 24,22 27,84 19,86 1991 e mais 36,45 32,89 47,06 41,30 35,80 47,95 Nível de cargo médio 19,21 19,74 17,65 18,01 10,23 27,40 superior 80,79 80,26 82,35 81,99 89,77 72,60 Tem filhos sim 50,00 55,26 34,31 44,41 51,14 36,30 não 50,00 44,74 65,69 55,59 48,86 63,70

Tem filhos < 5 anos

sim 21,92 23,03 18,63 13,66 17,05 9,59

não 78,08 76,97 81,37 86,34 82,95 90,41

Nível do cargo superior

51 a 53 12,20 9,84 19,05 35,23 31,65 40,57

54 a 56 58,54 55,74 66,67 38,26 31,01 49,06

57 a 59 23,78 27,46 13,10 19,70 27,85 7,55

60 e mais 5,49 6,97 1,19 6,82 9,49 2,83

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Tabela 4

TRABALHADORES APOSENTADOS DA METROPOLITAN POR ÁREA DE ATIVIDADE SEGUNDO

ALGUMAS CARACTERÍSTICAS SÓCIO-ECONÔMICAS

Áreas Fim Áreas Suporte

Total

100,00% Homens100,00% Mulheres100,00% 100,00%Total Homens100,00% Mulheres100,00%

Idade 25 a 34 1,18 1,54 0,00 1,79 0,00 5,56 35 a 44 2,35 3,08 0,00 3,57 5,26 0,00 45 a 54 70,59 80,00 40,00 76,79 76,32 77,78 55 e mais 25,88 15,38 60,00 17,86 18,42 16,67 Estado civil solteiros 15,29 6,15 45,00 19,64 7,89 44,44 casados 68,24 81,54 25,00 73,21 86,84 44,44 outros 16,47 12,31 30,00 7,14 5,26 11,11 Nível de escolaridade primário completo 2,35 0,00 10,00 0,00 0,00 0,00 1º ciclo incompleto 1,18 1,54 0,00 0,00 0,00 0,00 1º ciclo completo 0,00 0,00 0,00 3,57 5,26 0,00 2º ciclo incompleto 0,00 0,00 0,00 1,79 2,63 0,00 2º ciclo completo 8,24 1,54 30,00 7,14 0,00 22,22 superior incompleto 11,76 13,85 5,00 16,07 13,16 22,22 superior completo 72,94 80,00 50,00 60,71 68,42 44,44 pós-graduação 3,53 3,08 5,00 10,71 10,53 11,11 Data de admissão até 1985 94,12 92,31 100,00 87,50 86,84 88,89 1986 a 1991 1,18 1,54 0,00 5,36 5,26 5,26 1992 e mais 4,71 6,15 0,00 7,14 7,89 5,56 Nível do cargo Médio 15,19 3,39 50,00 8,16 2,94 20,00 Superior 84,81 96,61 50,00 91,84 97,06 80,00 Tem filhos sim 82,35 90,77 55,00 87,50 100,00 61,11 não 17,65 9,23 45,00 12,50 0,00 38,89

Tem filhos < 5 anos

sim 1,18 1,54 0,00 5,36 5,26 5,56

não 98,82 98,46 100,00 94,64 94,74 94,44

Nível do cargo superior

51 a 53 10,45 1,75 60,00 6,67 3,03 16,67

54 a 56 23,88 24,56 20,00 42,22 33,33 66,67

57 a 59 61,19 68,42 20,00 46,67 57,58 16,67

60 e mais 4,48 5,26 0,00 4,44 6,06 0,00

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Tabela 5

TRABALHADORES DESLIGADOS DA METROPOLITAN POR ÁREA DE ATIVIDADE

SEGUNDO ALGUMAS CARACTERÍSTICAS SÓCIO-ECONÔMICAS

Áreas Fim Áreas Suporte

Total

100,00% Homens100,00% Mulheres100,00% 100,00%Total Homens100,00% Mulheres100,00%

Idade até 24 16,71 16,26 17,27 20,11 18,84 21,33 25 a 34 44,22 45,67 42,43 47,15 42,39 51,75 35 a 44 25,88 22,49 30,06 23,84 26,81 20,98 45 a 44 12,89 15,40 9,81 8,54 11,59 5,59 55 e mais 0,29 0,17 0,43 0,36 0,36 0,35 Estado civil solteiros 52,53 50,52 55,01 52,85 49,28 56,29 casados 40,59 46,37 33,48 40,57 46,01 35,31 outros 6,78 2,94 11,51 6,58 4,71 8,39 sem informação 0,10 0,17 0,00 0,00 0,00 0,00 Nível de escolaridade primário completo 0,10 0,17 0,00 0,00 0,00 0,00 1º ciclo incompleto 0,10 0,00 0,21 0,00 0,00 0,00 1º ciclo completo 1,34 1,73 0,85 1,07 1,81 0,35 2º ciclo incompleto 0,96 1,21 0,64 1,07 1,45 0,70 2º ciclo completo 15,66 13,32 18,55 18,33 20,65 16,08 superior incompleto 21,59 20,93 22,39 21,17 19,93 22,38 superior completo 56,26 57,44 54,80 53,38 48,91 57,69 pós-graduação 4,01 5,19 2,56 4,63 6,88 2,45 sem informação 0,00 0,00 0,00 0,36 0,36 0,35 Data de admissão até 1985 32,76 36,33 28,36 24,91 33,70 16,43 1986 a 1991 37,44 35,81 39,45 54,45 48,91 59,79 1992 e mais 29,80 27,85 32,20 20,64 17,39 23,78 Nível do cargo médio 40,19 29,20 53,63 54,80 43,12 66,08 superior 59,81 70,80 46,37 45,20 56,88 33,92 Tem filhos sim 28,84 28,72 29,00 18,68 19,93 17,48 não 71,16 71,28 71,00 81,32 80,07 82,52

Tem filhos < 5 anos

sim 28,84 28,72 29,00 18,68 19,93 17,48

não 71,16 71,28 71,00 81,32 80,07 82,52

Nível do cargo superior

51 a 53 51,45 42,22 68,66 57,87 43,95 80,41

54 a 56 32,48 35,31 27,19 28,74 36,31 16,49

57 a 59 15,43 21,48 4,15 11,02 15,92 3,09

60 e mais 0,64 0,99 0,00 2,36 3,82 0,00

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Uma outra indicação que merece destaque diz respeito ao elevado nível de escolaridade dos empregados da Metropolitan. Ele se

expressa sobretudo no seu maior acesso aos cursos de pós-graduação (Tabelas 3, 4, 5). Cabe mencionar o nível de escolaridade mais elevado das mulheres na área-fim já que 76,47% delas têm curso superior, completo contra 61,84 atingido pelos homens. Característica que é reforçada considerando-se apenas o segmento com pós-graduação na qual a proporção para as mulheres é de 14,71% e a dos homens 6,58%. Por outro lado, as evidências denotam talvez uma busca por maior qualificação que se traduz no aumento da proporção dos homens e das mulheres alocadas nas ocupações de nível superior tanto nas ativida-des-fim como de suporte da empresa, proporção que supera a dos trabalhadores que já foram desligados da Metropolitan (Tabelas 3 e

4). O aumento da participação dos empregados nas ocupações de nível superior resultou da necessidade de reposição dos mais qualificados que saíram da companhia em razão da aposentadoria compulsória (Tabelas 3 e 5).

O novo perfil da trabalhadora da Metropolitan é

constituí-do por mulheres mais jovens, solteiras, sem filhos e com nível de escolaridade mais alto. A maior escolaridade não se traduz, entretan-to, em melhores remunerações. Enquanto somente 9,84% dos homens das áreas-fim estão nos níveis mais baixos dos cargos de nível superior (51 a 53), a proporção de mulheres na mesma situação atinge 19,05%. Já nos níveis mais elevados (60 e mais) a posição se inverte, 6,97% para os homens e 1,19% para as mulheres.

A Metropolitan realizou uma modificação crucial na

con-formação do perfil da mão-de-obra em seu processo de adaptação à produção flexível. Esta modificação aponta no sentido da constituição de um novo segmento de trabalhadores mais jovens, mais escolariza-dos e mais qualificaescolariza-dos. O novo segmento de trabalhadores, gerado após a reestruturação da companhia, é, na realidade, expressão de um tipo de trabalhador que se torna cada vez mais necessário ao funcio-namento da produção flexibilizada, sobretudo em razão de seu maior conhecimento técnico individual. Desta forma, a estratégia empresa-rial utilizada pela companhia no contexto desta nova forma de produ-ção não parece se adequar ao modelo da desqualificaprodu-ção do trabalho, mas reafirmar, em contrapartida, a tese que associa o aumento da qualificação às transformações ocorridas no mundo do trabalho. A tendência de aumento das habilidades e competências foi, por sua vez,

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acompanhada pela intensificação do trabalho, que se traduz pelo aumento efetivo do número de horas trabalhadas. A sobrecarga de trabalho é vivenciada, de modo geral, por todos os trabalhadores da companhia, muito embora ela seja mais acentuada entre aqueles que detêm maiores níveis de responsabilidade, em particular entre os que estão alocados em cargos gerenciais. Em geral, os empregados da

Metropolitan trabalham, em média, dez horas diárias. Um

entrevista-do com mais de dez anos de companhia e que trabalha em uma área-fim da empresa afirmou que a Metropolitan absorve demais.

“Até 1993, nem tanto, tínhamos uma vida mais estruturada [...] eu podia me dar ao luxo de sair às 17 horas. Aí a coisa ficou ruim agora, ficou ruim em termos de horário. A gente, na melhor das hipóteses, sai daqui às 20 horas. Eu moro em Niterói, é um cansaço tremendo e normal-mente então você trabalha muito e ainda tem as viagens [...] A qualidade de vida piorou” (Engenheiro, área-fim, 34 anos de idade).

O aumento efetivo do número de horas trabalhadas reflete o incremento da carga de trabalho. O mesmo entrevistado chegou a colocar “que a carga de trabalho aumentou brutalmente”. Ele explica

que o aumento de sua carga de trabalho coincidiu com a mudança de área que ele vivenciou dentro da empresa.

“Foi porque os vendedores saíram e a área ficou descoberta e aí que surgiu a oportunidade para mim [...] mas os vendedores da época não ti-nham esse stress todo, pois era praticamente um vendedor para um cliente... agora uma pessoa atende 10 clientes, isto aí em áreas geo-gráficas diferentes”.

A sobrecarga de trabalho é enfatizada por ele e justificada, entre outros aspectos pelo fechamento de escritórios da empresa no âmbito estadual. Além do mais, o quadro de empregados da matriz regional tem de dar suporte para toda a América Latina. Ele completa que é uma

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“correria danada e hoje a Metropolitan é dife-rente, tem menos gente, e você tem que rapida-mente dar uma solução para o cliente [...] hoje não dá mais para fazer amizade com os clien-tes, conversar com todo mundo... era muito interessante”.

A intensificação do trabalho é vivida de forma mais aguda pelas mulheres, sobretudo aquelas com menores níveis de qualificação e que têm de conciliar as atividades na empresa com as atividades na família:

“Ah, eu não tenho hora para sair não, às vezes eu saio às seis e meia, sete horas. Sexta-feira eu saí daqui dez para as sete. Não parece muito, mas atrapalha a gente porque às vezes eu saio daqui, passo no mercado para comprar alguma coisa, às vezes não vai dar prá fazer janta... Aí eu chego em casa e trabalho e não tenho nem tempo de sentar e ver televisão”... (Secretária terceirizada, 39 anos).

Outra secretária descrevendo um dia típico de sua vida, destacou:

”quando dá vou embora às 5:30 horas, quando não dá vou embora às sete, oito, nove, dez ou onze da noite, pode ser. Aí eu chego em casa, eu vou corrigir o dever de casa, aí desço do salto, tiro o batom e aí vou ser mãe... e, quando vou dormir, eu já fico contando quanto tempo eu tenho para dormir por que aí às 5:30 horas eu tenho que acordar de novo. É duro, é uma arte” (Secretária terceirizada, 34 anos).

Os requisitos de maior qualificação têm sido, também, percebidos pelos trabalhadores da Metropolitan. Os entrevistados

fizeram menção às maiores dificuldades encontradas nos dias de hoje para o ingresso e a permanência na empresa. O processo de recruta-mento da empresa é muito seletivo e a permanência na Metropolitan

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competitivi-dade interna está cada vez mais intenso. A intensificação dos requisi-tos de qualificação foi ressaltada por um dos entrevistados, que salien-tou a necessidade de níveis elevados de qualificação para entrar na

Metropolitan ou para concorrer com êxito por vagas de trabalho nas

áreas mais valorizadas do mercado:

“Na minha área, hoje em dia, é necessário uma excelente qualificação, falar o inglês fluente para conseguir uma vaga, se quiser entrar com facilidade é preciso ter uma pós-graduação, você então entra com grandes chances mesmo, mais do que os outros” (Analista financeiro, área de suporte da companhia, 25 anos).

Outro entrevistado, um engenheiro que ingressou na com-panhia há mais de quinze anos, assinalou as dificuldades que vem enfrentando por não ter um conhecimento suficiente de inglês. Ele mencionou o fato de que por exigências do desempenho de suas funções ele tem algumas vezes de participar de treinamento com técnicos norte-americanos que só se comunicam em inglês, o que tem trazido conseqüências para o seu aprendizado (Engenheiro, área-fim da com-panhia, 43 anos).

A maior exigência por um perfil de trabalhadores mais qualificados é percebido também pelas mulheres que estão alocadas nas atividades do staff secretarial da Metropolitan, que afirmam que

o desenvolvimento de suas funções nos dias de hoje está estreitamente associado ao conhecimento de inglês e de informática. Uma das secre-tárias que foi entrevistada, ressaltou que

“aqui, também, você tem que ter um tempo próprio para entender, lidar com comandos, que a gente chama de BPS, GML, que são as siglas dos comandos, é fazer trabalho no book-master... Nós temos que fazer apresentações com quadros, com letras, para eles [gerentes] mostrarem em reuniões, em projetor” (Secretá-ria, área de suporte da companhia, 41 anos).

A tendência de aumento de qualificação, aliada à intensi-ficação do trabalho expressa, na realidade, o incremento na complexi-dade das tarefas. Um alerta é, contudo, feito a respeito da construção

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de estruturas de habilidades e de competências que não resultam da regulação espontânea do mercado, correspondendo a um elenco de fatores diversos. Estes fatores têm a ver, basicamente, com as estra-tégias organizacionais tidas como eficazes pelos empregadores no que tange às diferentes modalidades de organização do trabalho. Outros fatores propulsores das estruturas de habilidades residem tanto nas características dos sistemas educacionais como na capacidade de in-fluência das organizações de trabalhadores para a sua definição.

Desta forma, as habilidades requeridas para o desempenho de determinadas posições ocupacionais não são simplesmente dadas pelo sistema educacional ou pela natureza da produção tecnológica, mas são também configuradas por processos de trabalho que são derivados das estratégias organizacionais escolhidas pela empresa (Crompton, Purcell, 1996). Por outro lado, as habilidades não podem ser consideradas simplesmente como mercadorias, pois elas são inse-paráveis dos indivíduos, correspondendo a um conjunto de expectati-vas sociais, necessidades e direitos que estão a eles associadas (Jones, 1996).

A alteração no perfil dos trabalhadores da companhia foi profunda, sobretudo em termos da mão-de-obra feminina. Uma mu-dança substancial operou-se na composição interna da força de traba-lho feminina, com impactos reais sobre a divisão de trabatraba-lho por gênero. Para isto concorreu a própria melhoria verificada no padrão de escolaridade da mulher. A exclusão histórica experimentada pelas mulheres, quanto à aquisição de credenciais que poderiam capacitá-las à empreender uma trajetória de trabalho em igualdade de condições com os homens, foi se atenuando ao longo das últimas décadas. Hoje, uma parcela importante das mulheres das camadas médias já pode se apropriar dos recursos culturais que viabilizam o seu acesso àquelas credenciais. E, nesta parcela, a participação das mulheres da Metro-politan é, sem dúvida, das mais relevantes. Além de terem níveis

elevados de escolaridade elas são egressas, em maior número, de carreiras educacionais que não têm uma nítida configuração feminina. Assim, enquanto somente 7,9% das mulheres brasileiras e fluminen-ses vêm das áreas de ciências exatas, cerca de 36,1% das trabalhadoras

da Metropolitan são oriundas deste tipo de formação universitária

(Tabela 6). É interessante ressaltar que apesar das mulheres brasi-leiras e fluminenses ingressarem de modo mais pronunciado nas carreiras educacionais voltadas para a área de ciências humanas já

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começa a ocorrer uma tendência que aponta no sentido do crescimento de sua participação nas carreiras de ciências exatas. A comparação entre os dados dos Censos Demográficos de 1980 e 1991 mostra que enquanto a proporção de mulheres nas carreiras das áreas de ciências humanas manteve-se a mesma durante este período, em torno de 53,0% nas áreas das ciências exatas, o incremento foi bastante signi-ficativo, passou de 18,2% para 26,2, entre 1980 e 1991.

A existência de uma oferta de mulheres mais escolarizadas favoreceu a substituição realizada pela Metropolitan no perfil de suas

trabalhadoras. Atualmente, cerca de 48% da mão-de-obra feminina foi admitida na empresa depois de sua fase de reestruturação. Não há dúvida de que a ausência de práticas discriminatórias abertas e a existência de uma orientação real em prol da igualdade de oportuni-dades têm contribuído para que os homens e as mulheres da compa-nhia passem a se alocar, em maior grau, em funções ocupacionais semelhantes. Estas condições contribuem para que as mulheres rea-lizem um desenvolvimento mais amplo de carreiras ocupacionais fora dos “nichos” tradicionais femininos. Por outro lado, se as mulheres têm tido maiores possibilidades de mobilidade em termos das posições de autoridade e de comando dentro da organização, é possível esperar que a estrutura de carreira masculina também experimente alterações com repercussões sobre a divisão de trabalho por gênero.

A reestruturação feita pela companhia acarretou o estabe-lecimento de um padrão de atividade feminina diverso do anterior. As mulheres que permaneceram ou que foram posteriormente incorpo-radas pela companhia têm um perfil de habilidades e de competências que se aproxima mais do perfil masculino, o que pode vir a lhes garantir um acesso maior aos cargos profissionais ou mesmo aos cargos de natureza gerencial. Mas, a despeito disto, as mulheres permanecem auferindo remunerações inferiores às masculinas mes-mo, nas áreas-fim da Metropolitan, bem como permanecem também

submetidas à dupla jornada (casa/trabalho). Tal fato é uma clara indicação da permanência da matriz patriarcal que cria obstáculos para a efetiva concretização da cidadania feminina. O modelo do homem como provedor da família continua informando a percepção dos indivíduos, com repercussões sobre a própria política salarial da empresa o que faz com que os níveis salariais femininos continuem sendo inferiores aos masculinos e o trabalho doméstico permaneça sendo uma atribuição das mulheres.

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2.1 “Hoje estou aqui, amanhã posso estar lá”

Um dos efeitos mais notáveis do processo de reestrutura-ção da Metropolitan, no que diz respeito às relações de trabalho, foi o

da perda de segurança do emprego. A busca de uma maior competiti-vidade fez com que a empresa passasse a estabelecer um novo relacio-namento com seus empregados, não mais ancorado na política de garantia do emprego que se constituía em um dos seus pilares básicos. Este fato se refletiu basicamente na redução dos postos de trabalho permanentes e no reforço da segmentação da força de trabalho, o que foi feito, em grande medida, por intermédio da subcontratação de parte da mão-de-obra de empresas de pequeno porte. Como salientado anteriormente, a companhia empreendeu uma política de enxugamen-to de suas atividades e do número de empregos efetivos, ao mesmo tempo em que passou a contar com uma mão-de-obra caracterizada pelo aumento e variedade de habilidades e de competências.

A insegurança no emprego adquire um impacto considerá-vel para os trabalhadores da Metropolitan, já que o emprego era um

direito de fato, assegurado antes da implementação da produção flexível. Alguns dos empregados que foram entrevistados chegaram inclusive a afirmar, como um gerente de desenvolvimento que traba-lha na área-fim da companhia e que tem 26 anos de idade, que

“na época da vigência da garantia do emprego você só saía da Metropolitan se você roubasse ou fizesse alguma coisa de muito errado, não havia o clima de livre mercado dentro da companhia”.

A repercussão da falta de segurança no emprego é, porém, vivenciada de modo diferenciado pelos vários segmentos de trabalha-dores da companhia bem como pelas categorias de gênero. O desvendar destas vivências se reveste no objeto de análise do presente tópico da pesquisa. Em primeiro lugar, fica claro o impacto geracional quando se trata da perda de segurança no emprego. Ela é crucial para os mais velhos, sobretudo para os menos qualificados que estão há mais tempo na companhia. Esses trabalhadores tiveram a oportunidade de parti-cipar da experiência da não garantia do emprego que era assegurado pela Metropolitan antes da reestruturação de suas atividades. Talvez

por isso a possibilidade da perda de emprego é tão traumática para este segmento de trabalhadores:

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“É horrível, eu tenho pesadelos com isto e eu me considero um cara bom, eu era, na minha turma tanto de colégio como de universidade, um dos primeiros da turma e aqui na empresa acredito ter também um destaque e mesmo assim eu fico muito inseguro e o mundo só tende a piorar” (Engenheiro, 34 anos, área-fim, há mais de 10 anos na companhia).

A falta de perspectivas quanto a uma nova colocação no mercado de trabalho faz com que os trabalhadores mais antigos da

Metropolitan vejam, na “abertura de um pequeno negócio”, a

alterna-tiva mais plausível de sobrevivência após a sua saída da empresa. Eles têm consciência da dificuldade que terão de enfrentar para se alocar em outra empresa, devido não apenas à sua idade, mas principalmente em função da falta de habilidades que são hoje requeridas aos traba-lhadores para ingressarem e permanecerem na força de trabalho. São habilidades que se fundamentam em um conhecimento técnico indi-vidual, que é, ao mesmo tempo, especializado e polivalente, e que possibilita, em grande medida, uma interação criativa com as novas modalidades do processo de trabalho. Daí a maioria deles afirmar que vêm fazendo uma poupança para montar um negócio que dê garantias a eles fora da Metropolitan.

O impacto da falta de segurança no emprego não é menor entre as mulheres com mais tempo de companhia. Para elas, a garantia do emprego representou, ainda, a possibilidade de fazer escolhas no âmbito de suas vidas privadas:

“muita coisa que eu fiz na vida foi por causa da empresa, a faculdade que eu fiz, foi por causa da empresa, e o fato de eu ter podido me separar na hora que eu quis, foi por causa da empresa” (Mulher gerente, área de supor-te, 47 anos).

A associação entre a garantia do emprego e as opções de vida pessoal, sobretudo por tornar possível as decisões quanto às separações e aos recasamentos, foi feita por mais de uma das antigas trabalhadoras da Metropolitan. Uma delas, que tem mais de vinte anos

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separa-ções e os seus casamentos posteriores, ao fato de que podia contar com o seu emprego:

“eu tinha a segurança do meu trabalho, que na época a Metropolitan me dava, entendeu? Hoje eu não sei, para esse pessoal novo, a Metropo-litan mudou a filosofia dela, a MetropoMetropo-litan tinha a política da garantia do emprego, ela não demitia ninguém... então isso me deu se-gurança” (Analista de sistemas, área de supor-te, 40 anos).

Esta mulher, que está inserida em uma função de natureza profissio-nal, assinalou, em seu depoimento, que hoje, depois da reestruturação produtiva da empresa, ela talvez não pudesse mais empreender esta trajetória de vida: “hoje as minhas atitudes são diferentes... eu não confio mais no tempo da companhia”.

A percepção dos trabalhadores mais jovens, quanto ao impacto da falta de garantia do emprego, se afastou de modo profundo da que foi expressada pelos trabalhadores mais velhos. Em geral, eles procuram mostrar que este fato não tem nenhuma repercussão sobre suas vidas, na medida em que não conheceram, na prática, a situação de garantia do emprego. Esta posição é compartilhada por todos, sobretudo por aqueles com níveis maiores de qualificação, muito embora não haja um consenso sobre os benefícios ou malefícios oca-sionados pela perda da garantia de emprego. Uns defendem os aspec-tos negativos da garantia de emprego, argumentando que ela tolhe o desenvolvimento dos indivíduos que acabam se acomodando a uma dada situação de trabalho. Enquanto outros deixam antever os male-fícios trazidos pela insegurança no emprego para as condições atuais de trabalho.

De qualquer modo, eles enfatizam o seu desconhecimento da situação na qual o emprego estava garantido, como um dos entre-vistados que ressaltou

“que já nasci assim, ou melhor, entrei no mer-cado assim, eu já estou acostumado, já faz parte, eu não consigo ver outro mercado, eu não conheço, não estou entrando no mérito se é positivo ou negativo, acho até que é negativo,

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mas é a realidade” (Analista financeiro, área de suporte da companhia, 25 anos).

A noção da garantia do emprego foi substituída pela idéia de empregabilidade, que se constitui na categoria-chave para o enten-dimento das condições que capacitam o trabalhador a permanecer vinculado ao mercado de trabalho no contexto da produção flexibili-zada. A condição de empregabilidade que é uma categoria construída pelos próprios trabalhadores é dada por um elenco de fatores que reflete o perfil de habilidades e de competências que dá condições aos indivíduos de competirem de forma satisfatória no mercado. É este perfil de habilidades e de competências que os novos trabalhadores da

Metropolitan estão buscando, pois é ele que garante a sua

empregabi-lidade atual e futura. Quais são, por sua vez, os requisitos básicos que compõem o perfil deste novo trabalhador na visão do segmento mais jovem de empregados da Metropolitan? Grosso modo, ele compreende

a integração de uma formação especializada com uma visão holística. O requisito de uma formação alicerçada em conhecimentos de cultura geral e de cunho mais especializado passa a ser considerado como fundamental, sobretudo porque as transações comerciais realizadas na área da tecnologia de ponta estão cada vez mais demandando a interação entre estas habilidades.

A condição de empregabilidade compreende uma miríade de requisitos, que incorporam também o conhecimento de línguas estrangeiras, sociabilidade e a capacidade intuitiva que passa a ser valorizada de modo predominante pelo mercado. O requisito de rápida mudança da tecnologia exige, por outro lado, uma reciclagem perma-nente. Isto reforça a importância das habilidades de natureza técnica, sobretudo em áreas que se constituem em verdadeiros booms no

mercado, a exemplo das atividades ligadas à construção de Banco de Dados e à Internet, entre outras. Profissionais com este perfil, segundo relato de alguns entrevistados, jamais terão dificuldades de inserção no mercado de trabalho.

A construção do perfil que assegura a condição de empre-gabilidade passa, por sua vez, a ser uma tarefa de total responsabili-dade do próprio empregado. Dificilmente a empresa irá bancar, como ocorria anteriormente, curso de inglês ou de pós-graduação para o seu corpo de trabalhadores. A procura por qualificação é vista como uma obrigação do empregado, que deve procurar uma reciclagem

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constan-te. A participação da empresa neste processo é vista como estando restrita, apenas, ao fornecimento de condições que permitam ao tra-balhador assegurar a sua visibilidade no mercado. Estas condições são fornecidas, via de regra, pela alocação do trabalhador nas atividades-fim da companhia. Uma regra observada por um dos entrevistados para garantir a empregabilidade é a de que

“se você está em uma empresa de livre mercado é importante ficar longe das funções internas. Existe uma série de funções em que você traba-lha para manter a máquina funcionando e se você sair para o mercado não tem valor” (Ge-rente de projetos, área-fim, 26 anos).

Ou seja, as funções que estão relacionadas com os processos de traba-lho da Metropolitan acabam deixando os trabalhadores mais

vulnerá-veis, pois, de acordo com a outra regra, para se manter empregado

“é preciso se manter aberto para o mercado como um todo. Você tem que trabalhar na Me-tropolitan de olho no mercado para ver se você está trabalhando em coisas que te tornem um profissional valorizado” (Gerente de projeto, área-fim, 26 anos).

A importância de estar alocado em funções que dão visibi-lidade ao trabalhador é reafirmada por outro empregado, que mostra a sua preocupação com o fato de não estar inserido nas funções fins da companhia. De acordo com a sua visão, isto não dá flexibilidade nem capacidade para buscar outras inserções no mercado de trabalho. Os processos de trabalho da Metropolitan são muito exclusivos,

particu-larmente no que diz respeito ao sistema de computação e de informa-ção. Assim, a categoria empregabilidade está freqüentemente asso-ciada à noção de habilidades. É a sua aquisição que garante as condições para se tornar e permanecer empregado. A configuração destas habilidades é, na visão do segmento mais jovem de trabalhado-res da Metropolitan, dada pelo mercado, que adquire uma visão sem

precedentes enquanto força reguladora de suas atividades, mesmo daquelas que transcendem as fronteiras do mercado de trabalho.

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As mulheres mais jovens, assim como os homens, vêem na empregabilidade a fórmula que as capacita a se manter no mercado de trabalho. Manter-se no mercado significa, para uma delas, ter conhe-cimento, estar atualizada, ter bons relacionamentos e entregar-se ao trabalho

“eu tenho que ser uma excelente funcionária, eu tenho que exercer as minhas funções muito bem e dar um pouco mais além... A empregabi-lidade depende de onde você estiver trabalhan-do tanto em termos de empresa como de áreas” (Especialista de vendas, área-fim, 27 anos).

A noção de que as habilidades são dadas pelo mercado se apoia, via de regra, na suposição mais geral de que a dinâmica de preços e de custo é o principal e único mecanismo regulador do mercado de trabalho (Jones, 1996). Esta visão também se fundamenta no paradig-ma do mercado competitivo da economia neoclássica, que não leva em consideração a relevância dos fatores culturais para a configuração do mercado. O mercado não é apenas uma instituição de natureza econô-mica, ele é uma instituição social (Jones, 1996). Desta forma, as habilidades são construídas socialmente, assentando-se em um quadro de referência normativo, no qual o critério de gênero tem um papel relevante. Determinadas habilidades são socialmente construídas por gênero, como é o caso da maioria dos “nichos” femininos existentes no mercado de trabalho. O mercado de trabalho é mais do que uma instituição de caráter meramente econômico, ele reproduz e reforça as estruturas sociais e as hierarquias sociais, o que se aplica também ao cenário organizacional (Rubery, 1996).

A busca pela empregabilidade é também valorizada pelas mulheres mais jovens com níveis menores de qualificação, indicando a importância do efeito geracional para a compreensão de como os trabalhadores da Metropolitan lidam com a questão da segurança do

emprego. Para os mais jovens, a noção de empregabilidade veio, sem dúvida, substituir o conceito da garantia do emprego. Isto vale tanto para os homens como para as mulheres com níveis distintos de qualificação, muito embora a empregabilidade só possa ser efetiva-mente assegurada no contexto da produção flexibilizada para aqueles com maiores credenciais de escolaridade. Uma das entrevistadas afir-mou que

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“é preciso fazer o possível para desempenhar bem, estar sempre atualizada, assim você passa a ser fundamental... acho que sempre existe espaço para os bons... eu acho essa coisa de funcionário público um absurdo” (Assistente administrativa, área de suporte, 27 anos).

Outra jovem trabalhadora, analista de sistemas, queixou-se porém, da dificuldade de conviver com uma situação de insegurança do emprego,

“tipo vem uma estratégia mundial lá de fora, a função que você exerce hoje não tem mais sentido... então vem essa pressão para reduzir o número de funcionários, dessa pressão é eu que gostaria de cair fora... trabalhar tranqüilo sabendo que você vai poder voltar e fazer aqui-lo, você pode ter uma carreira, estudando você consegue, isso é que seria o ideal no trabalho” (Analista de sistemas, área-fim, 29 anos).

Ela salientou, no entanto, que a falta de segurança no emprego não a abala por enquanto, porque ela sabe que ainda tem algum tempo de trabalho pela frente, o pior é para os empregados mais antigos, pois o mercado exige, cada vez mais, profissionais que sejam mais jovens.

O reingresso no mercado de trabalho para os profissionais com mais de 40 anos de idade, sobretudo para aqueles do sexo mascu-lino, torna-se cada vez mais difícil, o que explica, em grande medida, o menor efeito da falta de segurança do emprego para o segmento mais jovem de trabalhadores da companhia2. De qualquer modo, a instabi-lidade das relações de trabalho, geradas no contexto da reestruturação da companhia, traz conseqüências tanto para a qualidade do emprego como para a própria gestão da companhia, na medida em que o advento da insegurança do emprego veio acompanhado de um menor compro-metimento dos trabalhadores com a Metropolitan. É consensual, na

fala dos trabalhadores mais antigos de ambos os sexos, o fato de que os trabalhadores mais jovens não têm nenhum envolvimento com a

2 Dados do CAGED para os últimos 12 meses mostraram que, qualquer que seja a região do país, “a demanda por estes trabalhadores é praticamente inexistente” (Urani, 1997).

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empresa “eles não vestem a camisa como nós fazíamos”. Isto se comprova nos depoimentos dos mais jovens que esperam da Metropo-litan apenas empregabilidade, em primeiro lugar, e também, um

salário compatível com as suas aspirações. Eles se mostram prepara-dos para se moverem no mercado em busca destes objetivos a qualquer momento, pois sabem que o seu período de trabalho nos moldes de trabalho assalariado está se tornando cada vez mais curto. Se não garantirem a sua empregabilidade, eles sabem que mais cedo ou mais tarde irão engrossar as fileiras daqueles que terão como o único caminho possível o auto-emprego.

3 BIBLIOGRAFIA

CROMPTON, G., PURCELL, K. Changing forms of employment, organizations, skills and gender. London: Routledge, 1996.

RUBERY, J. The labour market outlook and the outlook for labour market analysis. In: CROMPTON, R., DUNCAN, G., PURCELL,

K. Changing forms of employment, organizations, skills and

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