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PROGRAMA DE ATUALIZAÇÃO EM NEONATOLOGIA
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A medicina é uma ciência em permanente atualização científica. À medida que as novas pesquisas e a experiência clínica ampliam nosso conhecimento, modificações são necessárias nas modalidades terapêuticas e nos tratamentos farmacológicos. Os autores desta obra verificaram toda a informação com fontes confiáveis para assegurar-se de que esta é completa e de acordo com os padrões aceitos no momento da publicação. No entanto, em vista da possibilidade de um erro
nem os autores, nem a editora ou qualquer outra pessoa envolvida na preparação da publicação deste trabalho garantem que a totalidade da informação aqui contida seja exata ou completa e não se responsabilizam por erros ou omissões ou por resultados obtidos do uso da informação. Aconselha-se aos leitores confirmá-la com outras fontes. Por exemplo, e em particular, recomenda-se aos leitores revisar o prospecto de cada fármaco que planejam administrar para certificar-se de que a informação contida neste livro seja correta e não tenha produzido mudanças nas doses sugeridas ou nas contra-indicações da sua administração. Esta recomendação tem especial importância em relação a fármacos novos ou de pouco uso.
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Marisa Márcia Mussi-Pinhata – Livre-docente em pediatria, professora associada do Departamento de Puericultura e Pediatria da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (USP), coordenadora do Núcleo de Estudos sobre Infecção Materna, Perinatal e Infantil (NEIMPI) da USP
Cristina Gardonyi Carvalheiro – Doutora em pediatria, médica assistente do Setor de Neonatologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da USP Aparecida Yulie Yamamoto – Doutora em pediatria, pesquisadora do Departamento de Puericultura e Pediatria da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da USP
ATUALIZAÇÃO EM
TOXOPLASMOSE CONGÊNITA
INTRODUÇÃO
O Toxoplasma gondii é um protozoário intracelular obrigatório que afeta cerca de 1/3 da
população mundial.1,2 A infecção aguda em crianças e adultos (inclusive gestantes)
imunocompetentes é geralmente assintomática. Em cerca de 10% dos acometidos, ocorrem manifestações inespecíficas e autolimitadas que raramente requerem tratamento específico. A forma congênita da doença ocorre quando uma mulher adquire toxoplasmose aguda pela primeira vez durante a gravidez. Mulheres infectadas até três meses antes da concepção apresentam risco mínimo ou inexistente de transmissão congênita. Em mulheres portadoras de imunodeficiência, a reativação da toxoplasmose latente durante a gestação pode, raramente, levar à transmissão para o feto.2 Cerca de 40% das gestantes infectadas transmitirão a toxoplasmose ao feto
se não forem submetidas a tratamento.
Infecções maternas ocorridas no primeiro trimestre da gestação têm 14% de risco de acarretar infecção fetal, enquanto que infecções ocorridas no terceiro trimestre registram risco de 59%. No segundo trimestre, o risco é intermediário (29%).3 De maneira oposta, o risco de
desenvolvimento de doença clinicamente aparente na criança é maior quando a infecção materna ocorre no início da gestação, decrescendo de 61%, com 13 semanas, para 25%, com 26 semanas, e 9%, com 36 semanas gestacionais.4
MARISA MÁRCIA MUSSI-PINHATA
CRISTINA GARDONYI CARVALHEIRO
APARECIDA YULIE YAMAMOTO
ATUALIZAÇÃO E
TOXOPLASMOSE CONGÊNIT
A
OBJETIVOS
Ao final deste capítulo, pretende-se que o leitor seja capaz de:
■■■■■ descrever o risco de infecção fetal após a ocorrência de toxoplasmose aguda na gestação; ■■■■■ conhecer dados disponíveis sobre a incidência de toxoplasmose congênita em diferentes
locais;
■■■■■ identificar as formas de apresentação clínica da toxoplasmose congênita;
■■■■■ descrever o prognóstico tardio de crianças com toxoplasmose congênita não-tratada; ■■■■■ interpretar dados clínicos e laboratoriais em gestantes com suspeita de toxoplasmose aguda
e avaliar o risco de infecção congênita;
■■■■■ reconhecer as limitações do diagnóstico laboratorial de toxoplasmose congênita em
recém-nascidos;
■■■■■ definir um caso comprovado de toxoplasmose congênita;
■■■■■ indicar tratamento adequado para casos suspeitos e comprovados de toxoplasmose
congênita;
■■■■■ realizar acompanhamento clínico e laboratorial de crianças portadoras de toxoplasmose
congênita suspeita ou comprovada;
■■■■■ descrever as formas de prevenção da toxoplasmose congênita.
ESQUEMA CONCEITUAL
Atualização em toxoplasmose congênita Epidemiologia Quadro clínico Diagnóstico Detecção de IgG Testes de avidez de IgG Detecção de IgMDiagnóstico da infecção fetal Reação em cadeia da polimerase (PCR) Ultra-sonografia gestacional Diagnóstico da infecção no recém-nascido Detecção de IgG Detecção de IgM Detecção de IgA
Tratamento Tratamento das infecções materna e fetal
Tratamento após o nascimento Abordagem inicial em algumas situações freqüentes
Acompanhamento de crianças com toxoplasmose provável ou confirmada Prevenção
Conclusão Casos clínicos
Diagnóstico da infecção materna
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EPIDEMIOLOGIA
A transmissão da toxoplasmose ocorre com a ingestão de cistos teciduais do parasita presentes em carne animal (gado bovino, suíno, caprino e aves) ou de oocistos eliminados nas fezes de felinos (gatos), que podem estar presentes em alimentos, água e outros materiais. Condições socioeconômicas, hábitos culturais e alimentares determinam a chance de exposição às formas infectantes do Toxoplasma gondii,1, 5 conforme mostra o
Quadro 1.
Quadro 1
FATORES QUE INFLUENCIAM A CHANCE DE EXPOSIÇÃO AO TOXOPLASMA GONDII
As diferentes formas de exposição ao parasita determinam variações importantes na prevalência da doença em regiões geográficas distintas.1 De maneira geral, a soroprevalência para
toxoplasmose varia atualmente entre 16 e 40% nos Estados Unidos e no Reino Unido e entre 50 e 80% na América Central, na América do Sul e na Europa continental, valores que vêm diminuindo nas últimas décadas.6
O conhecimento da soroprevalência de toxoplasmose em gestantes pode ser útil para avaliar
o risco de ocorrência de toxoplasmose congênita em uma população. Uma análise matemática
teórica realizada em 1974 por Frenkel7 estimou que o risco máximo ocorreria em populações com
prevalência de soropositividade de 50 a 80% em mulheres em idade fértil. Nessas populações, a prevalência prevista por essa estimativa seria de 44 a 46 por 10 mil gestações.
No Brasil, as taxas de soroprevalência gestacional situam-se entre 41,9 e 92%.8, 9, 10
Esses dados incluem grande parte da população brasileira no grupo de maior risco de ocorrência de toxoplasmose congênita, de acordo com Frenkel.7
Fatores Gatos Carne Higiene e alimentação Clima Ocupação e hábitos Aumentam o risco
Número elevado de animais Contato direto freqüente
Consumo de carne crua ou malpassada Tipo de carne consumida*
Manipulação de alimentos Consumo de água não-tratada Consumo de leite não-pasteurizado Temperatura e umidade ambiental elevadas Contato com solo
Jardinagem
Reduzem o risco
Alimentação com ração Confinamento do gado Congelamento para consumo Lavagem de mãos
Clima frio e seco Uso de luvas
* O tipo de carne mais implicado na transmissão da toxoplasmose é variável. Em geral, carnes ovinas e suínas têm sido consideradas as principais fontes.
ATUALIZAÇÃO E
TOXOPLASMOSE CONGÊNIT
A A prevalência de toxoplasmose congênita tem sido estimada entre 3 e 10,5 casos para cada 10 mil recém-nascidos na maioria dos países da Europa continental. No Brasil, têm sido encontrados valores semelhantes, entre 3,3 e 19,6 casos para cada 10 mil recém-nascidos, com variações regionais. Nos Estados Unidos, por sua vez, a incidência é menor que 1:10.000, como pode ser observado na Tabela 1.
Tabela 1
ESTIMATIVAS DE INCIDÊNCIA DE TOXOPLASMOSE CONGÊNITA EM DIFERENTES LOCAIS
Um estudo recente, realizado na Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, da Universidade de São Paulo (USP), avaliou a presença de IgM anti-Toxoplasma gondii no teste do pezinho de cerca de 90% dos recém-nascidos da região de Ribeirão Preto (SP), estimando a incidência de toxoplasmose congênita em 3,3 casos para cada 10 mil crianças. Deve-se ressaltar que, considerando possíveis limitações do teste sorológico utilizado, esse valor pode ser mais elevado.10
Localidade (autor, ano)
Suíça (Berger et al, 1992) Bélgica (Thoumsin et al, 1992) EUA (Guerina et al, 1994) Hungria (Szénázi et al, 1997) Noruega (Jenum et al, 1998) França (Ambroise-Thomas et al, 2001) Dinamarca (Lebech et al, 1999) Polônia (Paul et al, 2000) Suécia (Evengård et al, 2001) Romênia (Crucerescu, 2001) Turquia (Altintas et al, 2001) Eslovênia (Logar et al, 2002)
Brasil
Campos de Goytacazes - RJ (Bahia-Oliveira et al, 2001) Brasil (Camargo Neto et al, 2000) Passo Fundo - RS
(Mozzatto & Procianoy, 2003) Porto Alegre - RS (Lago et al, 2003) Ribeirão Preto - SP (Carvalheiro et al, 2005)10
* IC = intervalo de confiança
Incidência de toxoplasmose congênita, por 10 mil
recém-nascidos (IC 95%)* 7,2 (4,5-11,1) 9,6 (5,8-14,8) 0,8 (0-1) Zero 3 (1,5-5,5) 10 3 (2-4,4) 5,5 (3-9) 0,7 (0,1-2,1) 8,1 (0-45,4) 10,5 (0-58,3) 5,1 (2,6-9,2) 19,6 (6,4-45,7) 3,3 (2,5-4,4) 8 (0,2-44,5) 6 (1-11) 3,3 (1,1-7,7) Número de participantes do estudo 29.020 20.901 635.000 17.735 35.940 Não relata 89.873 27.516 40.978 1.226 953 21.270 2.550 140.914 1.250 10.000 15.162
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1. Mulheres infectadas pelo Toxoplasma gondii no início da gravidez possuem menor risco de acarretar infecção fetal. Discuta essa afirmação.
... ... ... ...
2. Mulheres portadoras de imunodeficiência podem transmitir toxoplasmose para o feto?
... ... ... ...
3. Como ocorre a transmissão da toxoplasmose na gravidez?
... ... ... ...
4. Reflita sobre a incidência de casos de toxoplasmose congênita no mundo.
... ... ... ...
QUADRO CLÍNICO
Cerca de 85% dos recém-nascidos com toxoplasmose congênita não apresentam sinais clínicos evidentes ao nascimento.1,2,11,12 Essas crianças, no entanto, têm elevadas
freqüências de prematuridade, retardo de crescimento intra-uterino, anormalidades liquóricas e cicatrizes de coriorretinite.1,13,14 Em algumas delas, as manifestações clínicas
evidentes podem aparecer apenas após semanas ou até anos.1,15
Entre as crianças com doença clínica aparente ao nascimento, as manifestações são variadas e podem ter graus diversos de gravidade. A ocorrência da tríade clássica da toxoplasmose congênita, com hidrocefalia, calcificações cerebrais e coriorretinite, não é comum.1, 2 Os sinais e sintomas
ATUALIZAÇÃO E
TOXOPLASMOSE CONGÊNIT
A Tabela 2
FREQÜÊNCIA DE ALGUMAS MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS EM CRIANÇAS COM TOXOPLASMOSE CONGÊNITA SINTOMÁTICA
A ocorrência de seqüelas tardias é freqüente em todas as formas clínicas da
toxoplasmose congênita não-tratada, inclusive em casos subclínicos ou
oligossintomáticos,1 podendo ser identificada até a segunda década de vida em
aproximadamente 85% dos recém-nascidos com infecção assintomática.11 Cerca de
85% dessas crianças evoluem com cicatrizes de coriorretinite, e quase 50%, com anormalidades neurológicas.16, 17
Nas crianças com manifestações clínicas identificadas ao nascimento, as seqüelas
são freqüentes e graves, com 55 a 85% delas apresentando retardo mental, 25 a 75%
com convulsões, espasticidade ou paralisia e 50 a 86% com dificuldade visual severa, além da possibilidade de surdez em proporção que varia de 2 a 58%.1,16,17
Freqüência (%) em crianças com: Doença neurológica 94 55 51 50 50 29 28 25 21 17 17 16 13 6 5 3 2 2 1 0 Doença generalizada 66 84 77 18 4 80 0 77 90 68 77 48 0 25 0 18 20 0 25 41 Sinais e sintomas Coriorretinite Anormalidades liquóricas Anemia Convulsões Calcificações intracranianas Icterícia Hidrocefalia Febre Esplenomegalia Linfadenopatia Hepatomegalia Vômitos Microcefalia Diarréia Catarata Sangramentos Hipotermia Glaucoma Rash cutâneo Pneumonite
Fonte: Adaptado de Remington JS, McLeod R, Thulliez P, Desmonts G. Toxoplasmosis. In: Remington JS, Klein JO, editores. Infectious Diseases of the Fetus & Newborn Infant. 5th ed. Filadélfia: W.B Saunders Co.; 2001. p. 205–346.
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DIAGNÓSTICO
O diagnóstico de toxoplasmose aguda e congênita pode ser comprovado pela detecção de taquizoítos em tecidos ou fluidos corporais, por meio de técnicas histológicas e do isolamento do parasita após inoculação em camundongos ou células de cultura.2,18,19 Porém, comparativamente
aos testes sorológicos, esses métodos são mais trabalhosos, de maior custo e de resultados mais demorados.
O teste sorológico considerado padrão-ouro para diagnóstico de toxoplasmose gestacional e congênita é o teste do corante (dye test), que apresenta excelente sensibilidade e especificidade. No entanto, esse teste é geralmente realizado apenas em laboratórios de referência, pois requer utilização de parasitas vivos.1
Testes sorológicos realizados por meio de outros ensaios são usados com maior freqüência na prática clínica. Seja qual for o teste escolhido, a interpretação dos resultados é difícil, sendo freqüente a necessidade de ensaios múltiplos.
DIAGNÓSTICO DA INFECÇÃO MATERNA
Estes são alguns dos procedimentos utilizados no diagnóstico de toxoplasmose materna.
Detecção de IgG
Os testes mais freqüentemente utilizados para detectar a IgG são o ensaio imunossorvente
ligado à enzima (enzyme-linked immunosorbent assay – ELISA) e a reação de imunofluorescência (RIF). A IgG aparece uma a duas semanas após a aquisição da infecção e
eleva-se gradativamente até atingir um valor máximo, em um a dois meses, diminuindo em ritmos variados e geralmente persistindo por toda a vida.19 Assim, deve ser realizada comparação de
pelo menos duas amostras consecutivas de soro, obtidas com intervalo ≥ três semanas, para que seja possível detectar a soroconversão de negativo para positivo e/ou o aumento dos títulos (em pelo menos quatro vezes), indicando infecção aguda.
Testes de avidez de IgG
Os testes de avidez de IgG ajudam a discriminar a infecção adquirida recentemente da infecção antiga. Valores ≥ 60% geralmente indicam infecção adquirida há mais de três ou quatro meses. Valores ≤ 30% sugerem infecção ocorrida nos últimos três ou quatro meses. Entretanto, baixos valores no índice de avidez podem persistir além desse período. Os valores intermediários são inconclusivos. Quando realizada durante o primeiro trimestre, a avidez de IgG pode ser útil para descartar infecções ocorridas durante a gestação.19,20
ATUALIZAÇÃO E
TOXOPLASMOSE CONGÊNIT
A
Detecção de IgM
Os testes mais utilizados na detecção de IgM são também o ELISA e o RIF. Os anticorpos de classe IgM surgem mais precocemente que a IgG e, em geral, têm diminuição mais rápida, tornando-se negativos em alguns metornando-ses. No entanto, em algumas pessoas, a IgM pode permanecer detectável por anos após a infecção aguda. Resultados falso-positivos nos testes são freqüentes, o que dificulta ainda mais sua interpretação desses resultados.2,19,21
DIAGNÓSTICO DA INFECÇÃO FETAL
A seguir, são detalhados alguns procedimentos utilizados no diagnóstico de toxoplasmose no feto.
Reação em cadeia da polimerase (PCR)
Quando realizada em líquido amniótico após 18 semanas de gestação, a PCR para detecção de DNA do Toxoplasma gondii é mais sensível, rápida e segura do que os métodos sorológicos tradicionais, realizados em sangue fetal. A especificidade e o valor preditivo positivo para o diagnóstico pré-natal de toxoplasmose congênita têm sido relatados como próximos a 100%. No entanto, a falta de padronização na técnica da PCR dificulta a generalização de resultados obtidos em diferentes laboratórios.20,21 Deve ser considerado também o risco proveniente da necessidade
de realização de amniocentese.
Ultra-sonografia gestacional
Anomalias ultra-sonográficas são encontradas em cerca de 30% dos fetos infectados, principalmente quando a infecção ocorre no primeiro (76%) e no segundo trimestres (22%).22 As
lesões mais freqüentemente visualizadas são cerebrais, como dilatação ventricular e calcificações cerebrais. Podem também ser detectados aumento na espessura da placenta, imagens hiperdensas intestinais e hepáticas, ascite, hepatoesplenomegalia e derrame pericárdico.21-23
DIAGNÓSTICO DA INFECÇÃO NO RECÉM-NASCIDO
Os procedimentos descritos a seguir são utilizados no diagnóstico de toxoplasmose no recém-nascido.
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Detecção de IgG
No recém-nascido, a detecção de IgG anti-Toxoplasma gondii não é adequada para diagnóstico da infecção congênita devido à transferência transplacentária desses anticorpos para o feto durante a gestação. Apesar de a comparação das concentrações de anticorpos maternos e os do recém-nascido auxiliar no diagnóstico, é pouco freqüente que a criança tenha títulos maiores que os maternos. Em geral, o diagnóstico sorológico de toxoplasmose congênita é baseado no acompanhamento seqüencial dos anticorpos IgG durante o primeiro ano de vida.
Detecção de IgM
A detecção de IgM é útil para a identificação de anticorpos produzidos diretamente pelo feto e recém-nascido infectados, pois os anticorpos de classe IgM não atravessam a barreira placentária. A interpretação dos resultados dos testes, no entanto, é complexa. Em crianças com toxoplasmose congênita, esses anticorpos podem não estar presentes ao nascimento.1,24,25 Além disso, existe a
possibilidade de resultados falso-positivos nos primeiros dias de vida, devido à contaminação por sangue materno.18,26
Dentre as técnicas laboratoriais mais utilizadas, o ELISA IgM deixa de detectar 25% dos casos de toxoplasmose congênita. Quando o ensaio imunoenzimático é elaborado de forma a separar a fração IgM da IgG, antes do processamento da detecção de IgM (técnica conhecida como “captura de IgM”), evitam-se interferências nos resultados causadas pela presença de fator reumatóide (falso-positivos) ou de níveis elevados de IgG materna (falso-negativos). O exame de reação de aglutinação por imunoabsorção (immunosorbent agglutination assay - ISAGA) IgM parece ser mais sensível do que o ELISA, mas é pouco disponível. Já o RIF IgM é significativamente menos sensível do que ambos, com probabilidade de detecção de apenas 25% dos casos de toxoplasmose congênita. Esse fato é atribuído à interferência dos altos títulos de anticorpos IgG maternos, que competem pela ligação aos sítios antigênicos.27
Detecção de IgA
Quando realizada por meio de técnicas ELISA ou ISAGA, a detecção de IgA parece apresentar melhor sensibilidade que a detecção de IgM na criança, com resultados positivos em 75 a 93% das crianças infectadas.24,25 Deve-se ressaltar que tanto a IgA quanto a IgM podem estar presentes
isoladamente.19 A detecção de IgA é pouco utilizada em nosso meio, devido a seu custo elevado.
A avaliação dos resultados da investigação diagnóstica de mãe e criança permite estimar o risco de infecção congênita e avaliar a necessidade de tratamento neonatal. O Quadro 2 detalha algumas definições de caso importantes para o diagnóstico de toxoplasmose aguda gestacional, fetal e congênita.
ATUALIZAÇÃO E
TOXOPLASMOSE CONGÊNIT
A Quadro 2
DEFINIÇÕES DE CASOS DE INFECÇÃO POR TOXOPLASMA GONDII EM GESTANTES E DE TOXOPLASMOSE CONGÊNITA
Grupo de pacientes Infecção primária materna durante a gestação Infecção fetal Infecção congênita Categoria de infecção Comprovada (risco médio estimado de infecção fetal: 21,3%) Provável (risco estimado de infecção fetal: 4,1%) Possível (risco estimado de infecção fetal: 0%) Gestante não-infectada Comprovada Feto não-infectado Comprovada Criança não-infectada Definição de caso
■■■■■ Soroconversão, com amostras colhidas após a concepção ■■■■■ Infecção congênita comprovada no feto
■■■■■ Soroconversão, com primeira amostra colhida até dois
meses antes da concepção
■■■■■ Aumento significativo nos títulos de IgG, com presença de IgM e/ou IgA
■■■■■ Títulos elevados de IgG, presença de IgM e/ou IgA e
surgimento de linfadenopatia durante a gestação
■■■■■ Títulos elevados de IgG e presença de IgM e/ou IgA na
segunda metade da gestação
■■■■■ Títulos elevados e estáveis de IgG, sem IgM, na segunda
metade da gestação
■■■■■ IgG elevada e presença de IgM e/ou IgA na primeira
metade da gestação
■■■■■ Mulheres soronegativas durante toda a gestação ■■■■■ Amostra sérica positiva antes da concepção ■■■■■ IgM e/ou IgA positivas sem aparecimento de IgG ■■■■■ Presença de DNA do Toxoplasma gondii em líquido
amniótico, sangue ou tecido fetal (PCR)
■■■■■ Mãe soronegativa
■■■■■ IgM e/ou IgA positivas na mãe, sem aparecimento
de IgG
■■■■■ Amostra materna positiva antes da concepção ■■■■■ Aumento nos títulos de IgG durante os primeiros
12 meses de vida, com ou sem sinais clínicos clássicos de toxoplasmose (hidrocefalia, calcificações
intracranianas, coriorretinite)
■■■■■ Persistência de positividade de IgG após os primeiros 12 meses de vida, com ou sem sinais clínicos clássicos de toxoplasmose (considerar que os títulos de IgG podem ser reduzidos pelo tratamento materno ou pós-natal)
■■■■■ IgM positiva nos primeiros 6 meses de vida (repetir teste se
a amostra for colhida nos 2 primeiros dias de vida)
■■■■■ IgA positiva nos primeiros 6 meses de vida (repetir teste se
a amostra for colhida nos 10 primeiros dias de vida)
■■■■■ Soronegativação* durante os primeiros 12 meses de vida,
na ausência de tratamento (títulos baixos de IgG podem raramente persistir por mais alguns meses)
■■■■■ Crianças soronegativas* 6 meses após o término do
tratamento
*Confirmar soronegativação com duas sorologias consecutivas, colhidas com dois meses de intervalo.
Fonte: Mombro M, Perathoner C, Leone A, Buttafuoco V, Zotti C, Lievre MA, et al: Congenital toxoplasmosis: assessment of risk to newborns in confirmed and uncertain maternal infection. Eur J Pediatr 2003; 162: 703-6.
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5. Como são detectadas a IgG e a IgM no diagnóstico da infecção materna?
... ... ... ...
6. Como é realizado o diagnóstico da infecção no recém-nascido?
... ... ... ...
7. Ainda que os recém-nascidos não apresentem sinais clínicos decorrentes da infecção, poderão vir a apresentá-los mais adiante. Explique por quê.
... ... ... ...
8. Embora as situações clínicas descritas a seguir não sejam freqüentemente encontradas, na impossibilidade de se obter o resultado de um teste laboratorial para confirmação da etiologia diante da suspeita clínica de infecção congênita, selecione as manifestações mais sugestivas de toxoplasmose congênita. A) coriorretinite, calcificações intracranianas e hidrocefalia;
B) microcefalia, calcificações intracranianas, petéquias; C) catarata, cardiopatia congênita, hepatoesplenomegalia; D) hidropsia, anemia, aplasia da série vermelha.
ATUALIZAÇÃO E
TOXOPLASMOSE CONGÊNIT
A
9. Dentre as afirmações abaixo, selecione aquela que NÃO é correta com relação aos anticorpos IgG anti-Toxoplasma gondii na criança com suspeita de toxoplasmose congênita.
A) Embora os anticorpos IgG maternos transferidos passivamente para o feto tenham meia-vida de aproximadamente um mês, esses podem ser detectados na criança por diversos meses, geralmente desaparecendo completamente com 1 ano de idade.
B) A produção dos anticorpos IgG na criança infectada e não-tratada geralmente é detectável em torno de três meses após o nascimento. Dessa maneira, o declínio dos títulos observado do nascimento até esse período não permite afirmar que a criança não seja infectada.
C) Na criança tratada, a detecção dos anticorpos IgG naturalmente produzidos pode ser verificada somente após seis meses, sendo recomendada sua monitorização até pelo menos 1 ano de idade.
D) A ausência de IgM, mesmo na presença de altos títulos de IgG ao nascimento, exclui o diagnóstico de toxoplasmose congênita.
Resposta no final do capítulo
TRATAMENTO
Os fármacos usados para tratamento das toxoplasmoses agudas materna, fetal e congênita são a espiramicina, a sulfadiazina e a pirimetamina, com variados esquemas de uso em países e centros diferentes.28 A sulfadoxina é usada em substituição à
sulfadiazina em alguns locais por apresentar eficácia semelhante e intervalos de administração mais cômodos,29 porém não está disponível no Brasil. Outros
medicamentos, como sulfametoxazol + trimetoprima, clindamicina, rifampicina, tetraciclinas e macrolídeos, têm sido avaliados, mas não há dados clínicos que suportem seu uso.1
TRATAMENTO DAS INFECÇÕES MATERNA E FETAL
O objetivo do tratamento da toxoplasmose aguda durante a gestação é evitar a ocorrência de infecção fetal ou iniciar precocemente o tratamento de um feto infectado.3
A espiramicina pode reduzir a freqüência de transmissão do Toxoplasma gondii da mãe para o feto em até 60%, mas não altera significativamente a gravidade da infecção nesse último. Assim, quando a infecção fetal é comprovada ou muito provável, tem sido proposto uso de pirimetamina e sulfadiazina em esquemas que variam consideravelmente em diferentes locais.2,21,28
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Com o tratamento à base de pirimetamina e sulfadiazina, além da redução da taxa de transmissão materno-fetal da toxoplasmose, houve diminuição dos sinais clínicos ao nascimento e da possibilidade de dano severo no recém-nascido.1,2,3 Apesar disso, uma metanálise de diversos
estudos sobre tratamento de toxoplasmose gestacional, realizada em 2003, concluiu que a eficácia desses medicamentos para redução de toxoplasmose congênita ainda é duvidosa, devido à inexistência de estudos clínicos controlados.30
TRATAMENTO APÓS O NASCIMENTO
O tratamento da toxoplasmose congênita após o nascimento visa interromper a destruição tecidual por taquizoítos em proliferação e diminuir a ocorrência de seqüelas a longo prazo. É importante ressaltar que as medicações disponíveis atualmente não são
efetivas contra formas encistadas do parasita e, portanto, podem não ser úteis para
a prevenção de infecção latente ou ativação tardia da doença.2
O uso da associação de sulfadiazina e pirimetamina durante todo o primeiro ano de vida de crianças comprovadamente infectadas tem sido associado ao melhor prognóstico tardio, com menor freqüência de anormalidades motoras e cognitivas, de surgimento de novas lesões oftalmológicas e de deficiência auditiva, principalmente nos casos mais graves.1,31,32 Por sua vez,
a ocorrência de deficiência visual não é alterada pelo tratamento, provavelmente devido à presença de lesões graves já ao nascimento.31
A espiramicina tem sido pouco utilizada em recém-nascidos infectados após demonstração de que não é efetiva para tratamento de encefalite por Toxoplasma gondii em pacientes com aids.31 Ainda é empregada por alguns grupos para tratamento de
infecções congênitas assintomáticas, utilizando-se inicialmente seis semanas de
sulfadiazina + pirimetamina, seguidas de ciclos alternados de quatro semanas de sulfadiazina + pirimetamina com seis semanas de espiramicina, até completar um
ano de tratamento.1
Deve-se salientar que as recomendações recentes sugerem uso de sulfadiazina +
pirimetamina continuamente por todo o tratamento, mesmo em crianças
ATUALIZAÇÃO E
TOXOPLASMOSE CONGÊNIT
A Quadro 3
MEDICAMENTOS UTILIZADOS PARA TRATAMENTO DE TOXOPLASMOSE CONGÊNITA
A impossibilidade, por razões éticas, de realização de estudos clínicos controlados comparando crianças tratadas e não-tratadas dificulta a comprovação de que o tratamento tenha sido a causa da melhoria no desempenho tardio dos casos de toxoplasmose congênita. Além disso, as crianças submetidas ao tratamento recomendado, atualmente, são comparadas com casos não-tratados diagnosticados e acompanhados na década de 1950. Apesar da dificuldade de comparação de grupos tão distintos, as semelhanças entre os quadros clínicos iniciais e a diferença no prognóstico em médio prazo são dignas de nota.
O principal efeito colateral do uso da pirimetamina é a depressão da medula óssea, geralmente gradual e reversível. A neutropenia, em geral transitória, é o efeito tóxico mais importante do tratamento, tendo sido relatada em até 35% das crianças tratadas.31,33
O ácido folínico é associado ao tratamento com finalidade única de antagonizar esse efeito da pirimetamina. Deve-se ressaltar que o ácido fólico, de menor custo e mais facilmente disponível, não apresenta efeito semelhante. Não há relato de toxicidade hematológica mantida após o final do tratamento.31
Outros possíveis efeitos colaterais são anemia, pancitopenia, hiperbilirrubinemia prolongada, reação alérgica, náuseas, cólicas, vômitos e diarréia, sem interferência no ganho ponderal.33 Em geral,
nenhum deles leva à necessidade de suspensão do tratamento.
Medicamento Sulfadiazina Pirimetamina Ácido folínico Prednisona ou prednisolona Posologia
100mg/kg/dia em duas doses diárias, durante um ano. Pode ser manipulada como solução de 100mg/mL.
1mg/kg/dia em uma dose diária, durante dois a seis meses, dependendo da intensidade de acometimento. A seguir, utilizar 1mg/kg/dia três vezes por semana, até que se complete um ano de uso do medicamento. Pode ser manipulada como solução de 2mg/mL.
5mg administrados três vezes por semana, aumentando para 10mg após um mês de vida ou peso ≥ 4,5kg. A dose deve ser ajustada conforme a contagem absoluta de neutrófilos em sangue periférico:
■■■■■ 10mg diariamente, se 750 a 900 neutrófilos/mm³;
■■■■■ 10 a 20mg diariamente (suspendendo a pirimetamina), se menos de 500
neutrófilos/mm³.
O uso deve ser mantido até uma semana após o final do tratamento com pirimetamina. Pode ser manipulado como solução de 5mg/mL ou comprimidos de 5mg.
1mg/kg/dia em duas doses diárias, se houver coriorretinite em atividade
com risco de perda visual e/ou proteinorraquia ≥≥≥≥≥ 1.000mg/dL em bebês
menores de 1 mês de idade. Utilizar até melhora do processo inflamatório,
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10. Quais são os fármacos de escolha no tratamento da toxoplasmose congênita?
... ... ... ...
11. Você está diante de uma criança de 36 horas de vida com diagnóstico de toxoplasmose congênita comprovada. A fundoscopia ocular mostra coriorretinite macular bilateral em atividade, o hemograma apresenta 850 neutrófilos/mm3, a
bilirrubina total é de 9,0mg/dL e a bilirrubina direta, 0,6mg/dL. Selecione o esquema que você considera mais adequado para esta criança.
A) Sulfadiazina + pirimetamina + ácido folínico.
B) Sulfadiazina + pirimetamina + ácido folínico + corticosteróides.
C) Espiramicina alternada com sulfadiazina + pirimetamina + ácido folínico. D) Espiramicina + corticóide.
Resposta no final do capítulo
12. Qual é o objetivo do tratamento da toxoplasmose durante a gestação?
... ... ... ...
13. Qual o objetivo do tratamento após o nascimento?
... ... ... ...
14. Quais os possíveis efeitos colaterais do tratamento em crianças e como deve ser conduzida a terapêutica nessa situação?
... ... ... ...
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ABORDAGEM INICIAL EM ALGUMAS SITUAÇÕES FREQÜENTES
Muitas vezes, a definição do estado de infecção e, portanto, da continuidade ou suspensão do tratamento só é possível após a disponibilidade do conjunto de dados, que inclui a repetição de exames laboratoriais após um período de seguimento. A abordagem inicial deve ser individualizada. A seguir, exemplificam-se duas situações freqüentes.1. Crianças assintomáticas cujas mães foram identificadas como tendo possível toxoplasmose aguda na gestação, pela presença de IgM anti-Toxoplasma gondii, avidez alta no primeiro trimestre ou não-realizada, PCR negativa no líquido amniótico ou amniocentese não-realiza-da, títulos de IgG estáveis durante a gestação.
Essa é uma situação freqüente, na qual a probabilidade de infecção congênita é muito baixa. Devem ser solicitados os exames previstos para recém-nascidos com suspeita de infecção. Se forem normais com IgM negativa, IgG com títulos iguais ou inferiores aos maternos, não iniciar tratamento e assegurar a repetição dos títulos de IgG da criança em 30 dias. Se os títulos de IgG se mantiverem ou decrescerem, é necessário manter o acompanhamento, com controle a cada dois meses, até a negativação. Se houver títulos crescentes (por exemplo, se o teste utilizado for o RIF, com incremento de 1:256 para 1:4.000), instituir o tratamento e repetir fundoscopia ocular. Observar que o incremento de títulos em uma diluição (por exemplo, de 1:64 para 1:256) pode somente refletir variação laboratorial, devendo ser repetido.
2. Crianças assintomáticas, cujas mães tenham sofrido infecção primária comprovada durante a gestação, associada à detecção do DNA do Toxoplasma gondii no líquido amniótico pela rea-ção em cadeia da polimerase (PCR positivo).
Devido à alta possibilidade de infecção, comprovada na presença de PCR positivo no líquido amniótico, além dos exames laboratoriais para toda criança com suspeita de infecção, é preciso solicitar também tomografia de crânio e liquor. Deve-se iniciar tratamento com sulfadiazina +
pirimetamina, mesmo se os exames complementares forem normais e independentemente do
resultado da IgM e da IgG. A definição conclusiva do estado de infecção será feita durante o seguimento.
ACOMPANHAMENTO DE CRIANÇAS COM TOXOPLASMOSE
PROVÁVEL OU CONFIRMADA
Para todos os recém-nascidos com suspeita de toxoplasmose congênita devem ser solicitados:
■■■■■ ELISA ou RIF para toxoplasmose do RN (IgM e IgG) ■■■■■ ELISA ou RIF para toxoplasmose da mãe (IgM e IgG) ■■■■■ ELISA IgM de captura do RN
■■■■■ Hemograma completo ■■■■■ Ultra-sonografia de crânio ■■■■■ Fundoscopia ocular
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Se a infecção fetal/congênita for comprovada ou muito provável, devem ser realizadas também punção liquórica (avaliar bioquímica, celularidade e sorologia para toxoplasmose) e tomografia de crânio sem contraste, mais adequada do que a ultra-sonografia para detecção de calcificações intracranianas. Em crianças sintomáticas, avaliar a função hepática e descartar outras infecções congênitas (em especial, citomegalovirose, sífilis e rubéola).
Durante o 1º ano de vida, os títulos de IgG anti-Toxoplasma gondii devem ser avaliados a cada dois a três meses em todos os casos suspeitos de toxoplasmose congênita, mesmo aqueles com resultados sorológicos negativos ao nascimento.15
Em crianças não-infectadas, a depuração da IgG anti-Toxoplasma gondii materna leva à redução gradativa dos títulos até a negativação durante o primeiro ano de vida. Em casos de transferência placentária de altos títulos de anticorpos maternos, pode haver persistência de níveis muito baixos de IgG por mais alguns meses.18 Em geral, ocorre diminuição pela metade dos títulos de IgG a
cada 30 dias.1 Em avaliação realizada em 54 crianças não-infectadas com suspeita de infecção
congênita ao nascimento, acompanhadas no Hospital das Clínicas de Ribeirão Preto, a idade mediana de soronegativação utilizando o RIF foi de 183 dias.34 Recomenda-se confirmar um
resultado negativo em segunda amostra de sangue, colhida após intervalo de dois meses, principalmente nas crianças tratadas, pois podem iniciar tardiamente a produção de anticorpos.1
Crianças infectadas apresentarão títulos positivos de IgG com 1 ano de vida ou aumento desses títulos durante esse período. Tais dados constituem os principais critérios de confirmação do diagnóstico, principalmente em crianças assintomáticas.18 No estudo citado, títulos de IgG =1:1.000
aos 3 e 6 meses de idade mostraram-se úteis para confirmar o diagnóstico.34 No entanto, cerca de
15% das crianças infectadas podem apresentar negativação transitória da IgG durante o tratamento, fato associado, principalmente, ao tratamento pré-natal iniciado nos dois primeiros trimestres de gestação e ainda sem explicação precisa.35
Outro fenômeno que ocorre em pelo menos 70% das crianças tratadas com sulfadiazina +
pirimetamina é o aumento significativo dos títulos de IgG anti-Toxoplasma gondii após a suspensão
do tratamento. O mecanismo fisiopatológico preciso também não é conhecido. Supõe-se que seja devido à reativação do parasita, o que acarreta preocupação com relação ao surgimento de novas lesões oculares, fato não demonstrado em todos os estudos.36
Crianças que estejam usando sulfadiazina + pirimetamina devem ser submetidas a avaliações clínica e hematológica semanais nos primeiros 2 meses de vida para controle dos efeitos desses fármacos, tais como anemia, neutropenia e plaquetopenia. Havendo estabilização da contagem de neutrófilos periféricos, a avaliação pode ser espaçada gradativamente, mantendo avaliações mensais até o final do tratamento. A periodicidade de retornos deve ser reavaliada a cada consulta.
Avaliações oftalmológicas devem ser repetidas semestralmente ou de acordo com a necessidade. Sugere-se uma reavaliação três meses após o término do tratamento, momento em que ocorre o aumento da IgG anti-Toxoplasma gondii. Manter avaliações anuais após idade escolar.
Devido à possibilidade de ocorrência de deficiência auditiva em crianças sintomáticas, deve ser realizada avaliação auditiva comportamental e/ou objetiva, principalmente se houver acometimento neurológico.
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A principal dificuldade prática no acompanhamento de casos suspeitos de toxoplasmose congênita é a definição do diagnóstico no caso de crianças assintomáticas e com estado de infecção inconclusivo. Nesses casos, o início, a manutenção e a suspensão do tratamento serão definidos individualmente, de acordo com os resultados dos exames sorológicos e a evolução clínica. Sugere-se iniciar tratamento com sulfadiazina + pirimetamina nos recém-nascidos filhos de mães com toxoplasmose aguda comprovada durante a gestação. A manutenção do tratamento deve ser avaliada em um mês, após repetição dos testes sorológicos da criança.
15. Como deve ser a abordagem nos casos em que a criança é assintomática, mas a mãe foi identificada, por meio de exames, como tendo toxoplasmose aguda na gestação?
... ... ... ...
16. Que exames devem ser solicitados para recém-nascidos sob suspeita de infecção?
... ... ... ...
17. Conhecendo as limitações dos diferentes métodos sorológicos utilizados na rotina diagnóstica para confirmação de infecção congênita (tais como complexidade, disponibilidade restrita, pouca rapidez, possibilidade de resultados falso-positivos e falso-negativos), qual dos exames listados a seguir seria mais adequado para tomada de decisão imediatamente após o parto?
A) pesquisa de IgM anti-Toxoplasma gondii pela RIF; B) pesquisa de IgM anti-Toxoplasma gondii pelo ISAGA;
C) pesquisa de IgM anti-Toxoplasma gondii pelo ELISA de captura;
D) pesquisa de anticorpos anti-Toxoplasma gondii pela reação de Sabin-Feldman.
Resposta no final do capítulo
18. Como deve ser o acompanhamento após o nascimento dos casos de comprovada infecção? ... ... ... ...
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PREVENÇÃO
A abordagem mais completa para a prevenção da toxoplasmose congênita é o modelo implementado na França há 25 anos, que visa à prevenção primária, secundária e terciária.37
Resumidamente, o programa envolve as seguintes etapas:
1. Identificar mulheres jovens suscetíveis e limitar o risco de contaminação durante a gestação por meio de aconselhamento apropriado. Para tanto, há necessidade de se realizar testes sorológicos no início da gestação e, quando negativos, promover as medidas para prevenção primária e repetir a sorologia a cada um a três meses para identificar a soroconversão. 2. Identificar (por meio da detecção da soroconversão de negativo para positivo) e tratar a
toxoplasmose gestacional tão precocemente quanto possível, de maneira a prevenir ou limitar a transmissão ao feto e as suas conseqüências.
3. Diagnosticar e tratar a infecção fetal.
4. Diagnosticar e tratar a toxoplasmose congênita em recém-nascidos para prevenir riscos de reativação e complicações tardias, especialmente oculares.
A prevenção primária da toxoplasmose, ou seja, a prevenção da infecção materna durante a gestação por meio da divulgação de informações sobre o risco da infecção e as maneiras de evitá-la, pode diminuir a taxa de soroconversão em até 63%.38 É a etapa
mais simples e menos onerosa. A decisão de estender um programa preventivo às etapas subseqüentes depende das fontes financeiras, das atitudes em relação à intervenção médica, especialmente durante a gravidez, e do grau de certeza sobre a possibilidade de controle da infecção.
As seguintes recomendações devem ser fornecidas às gestantes soronegativas:39 ■■■■■ Não comer qualquer tipo de carne crua ou mal-passada.
■■■■■ Ingerir verduras, legumes e frutas bem lavados e descascados. ■■■■■ Evitar contato com fezes de gato.
■■■■■ Evitar manipular areia e terra (ou utilizar luvas), pois podem estar contaminados com fezes de
gato. Se houver caixa de areia para gato em casa, a areia deve ser trocada por outra pessoa, diariamente.
■■■■■ Lavar muito bem as mãos após a manipulação de carnes e vegetais crus e antes de comer. ■■■■■ Evitar o acesso de insetos (mosquitos, baratas) à cozinha.
■■■■■ Lavar muito bem facas, tábuas e outros utensílios de cozinha após uso em carnes e vegetais
crus.
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19. Dentre as medidas listadas abaixo, selecione a que contém as informações mais adequadas que uma gestante soronegativa deve conhecer para prevenção da toxoplasmose gestacional.
A) Ingerir somente verduras bem cozidas e frutas cristalizadas. Ter contato apenas com gatos que habitam regularmente a sua casa.
B) Evitar ingerir carne crua bovina, ovina ou suína. Frango, peixes e frutos do mar crus estão liberados.
C) Lavar as mãos rigorosamente antes das refeições, evitar a ingestão de carne crua de qualquer tipo, de verduras e frutas mal lavadas e de água não-tratada. Evitar contato com gatos, manuseio de solo e jardinagem sem luvas. D) Ter o cuidado de trocar caixa de areia de gatos semanalmente.
20. Indique a conduta mais adequada a tomar diante de um recém-nascido assintomático, com IgM anti-Toxoplasma gondii negativa, IgG com título baixo e igual ao materno, fundo de olho normal, sem alterações liquóricas e tomografia computadorizada de crânio normal, mas filho de mãe tratada com sulfadiazina, pirimetamina e ácido folínico, por apresentar soroconversão documentada durante a gestação (último trimestre), avidez de 18% e detecção do parasita no líquido amniótico positiva por PCR.
A) Tranqüilizar a mãe e não instituir terapia, porque provavelmente trata-se de um caso não-infectado, pela ausência de IgM e o baixo título de IgG. B) Não tratar, mas assegurar acompanhamento clínico e monitorização dos
anticorpos IgG durante o primeiro ano de vida.
C) Instituir de imediato tratamento com sulfadiazina, pirimetamina e ácido folínico e acompanhamento clínico e laboratorial com monitorização dos anticorpos IgG durante o primeiro ano de vida.
D) Não tratar, uma vez que o tratamento antiparasitário não está indicado para crianças assintomáticas.
21. Com relação ao risco de infecção fetal como resultado da infecção primária materna pelo Toxoplasma gondii, NÃO se pode inferir que:
A) o risco de infecção fetal é multifatorial, dependendo do período gestacional da infecção materna, da competência imunológica materna durante a parasitemia, do grau de parasitemia e da virulência das diferentes cepas; B) a probabilidade de infecção fetal é de apenas 1% quando a infecção primária
materna ocorre durante o período periconcepcional, mas aumenta com o progredir da gestação;
C) a transmissão da toxoplasmose para o feto pode ocorrer mesmo quando a mãe imunocompetente teve infecção anteriormente ao período gestacional; D) a infecção adquirida no segundo e terceiro trimestres resulta, na gestante
não-tratada, em infecção fetal em 30-54% e 60-65%, respectivamente.
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CONCLUSÃO
A toxoplasmose congênita constitui um desafio na prática clínica. Para a indicação de tratamento adequado, são necessários dados detalhados a respeito de exames maternos, condutas no pré-natal e exames da criança. Ainda assim, a confirmação do diagnóstico é difícil ao nascimento e, em geral, requer acompanhamento prolongado.
É papel do pediatra conhecer a complexidade do diagnóstico definitivo, tomar medidas adequadas diante de uma criança com suspeita de infecção e orientar a família a respeito da conduta adotada, como forma de minimizar seqüelas tardias e amenizar a ansiedade familiar em relação ao tratamento e prognóstico das crianças infectadas.
CASOS CLÍNICOS
Caso clínico 1
Recém-nascido do sexo masculino; idade gestacional de 39 semanas, avaliada por Capurro somático; peso de 2.980g; parto cesárea, indicado por desproporção cefalopélvica; Apgar 8 e 9. Ao exame físico, apresentava baço a 3cm do rebordo costal esquerdo e perímetro cefálico de 36cm. Mãe com 28 anos, primigesta, realizou pré-natal durante toda a gestação. Com dez semanas, as sorologias para sífilis, HIV e hepatite B foram negativas; o RIF para toxoplasmose mostrava IgM negativa e IgG 1:64. Com 35 semanas de gestação, realizou ultra-sonografia, sendo evidenciada hidrocefalia fetal.
22. Reflita sobre o caso apresentado; faça sua avaliação, indicando exames, provável diagnóstico e tratamento; depois, compare suas respostas com os comentários das autoras.
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Exames:
Diagnóstico:
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A Trata-se de um recém-nascido com diagnóstico intra-útero de hidrocefalia. Dentre os exames complementares, a ultra-sonografia transfontanela evidenciou hidrocefalia máxima, com calcificações cerebrais na tomografia de crânio, conforme mostra a Figura 1. A fundoscopia ocular mostrou opacidade vítrea à direita e placa cicatrizada de coriorretinite à esquerda. Liquor: 83 células (100% linfócitos); proteinorraquia de 284mg/dL.
Diante desses achados, foi investigada a possibilidade de infecção congênita, com pesquisa de possíveis agentes etiológicos, incluindo citomegalovirose, toxoplasmose, rubéola, sífilis, hepatite B e herpes simples. Foram encontrados os seguintes resultados: detecção do DNA do citomegalovírus (CMV) na urina pela PCR negativa, VDRL (Venereal Disease Research Laboratory) negativo, reação de hemaglutinação para rubéola 1:124, antígeno de superfície do vírus da hepatite B (AgHBs) negativo, PCR para pesquisa do CMV e herpes simples negativa, RIF para toxoplasmose IgM negativo e IgG >1:4.000.
A avaliação clínica e complementar desta criança mostrava evidências de infecção congênita, com presença de hidrocefalia e coriorretinite associadas à esplenomegalia. Na busca pelo provável agente etiológico, chamavam a atenção os altos títulos de IgG anti-Toxoplasma gondii. Nos antecedentes obstétricos maternos, encontrou-se a informação da presença de títulos baixos de anticorpos IgG no início da gestação (1:64). Embora esse resultado possa ser interpretado como imunidade materna pré-concepcional ao Toxoplasma gondii, o achado de títulos significativamente maiores no recém-nascido foi altamente sugestivo de toxoplasmose congênita.
Diante da presença de manifestação neurológica grave e exsudato inflamatório ocular com turvação vítrea, foi iniciado tratamento com sulfadiazina, pirimetamina e ácido folínico, durante um ano, e corticosteróides até a melhora do quadro ocular. A criança evoluiu com atraso do desenvolvimento neuromotor e microcefalia. Confirmou-se o diagnóstico de toxoplasmose congênita pela persistência dos anticorpos IgG específicos após 1 ano de idade.
Figura 1 – Tomografia computadorizada de
crânio mostrando hidrocefalia e calcificações cerebrais grosseiras
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O caso demonstra a complexidade da interpretação dos resultados laboratoriais na toxoplasmose aguda materna, ressaltando a importância da obtenção de amostras séricas maternas
subseqüentes para a verificação da estabilidade dos títulos de anticorpos IgG anti-Toxoplasma
gondii, bem como a possibilidade do diagnóstico de toxoplasmose congênita diante de um quadro
de hidrocefalia fetal, independentemente dos resultados sorológicos maternos.
Caso clínico 2
Recém-nascido do sexo feminino, peso de 2.495g, 47cm, perímetro cefálico de 31cm, Apgar 8/10 e exame físico normal. Mãe primigesta fez pré-natal adequado e tinha sorologia negativa para toxoplasmose no primeiro trimestre de gestação. Com 21 semanas, a mãe apresentou quadro de adenomegalia, com positivação da IgG e da IgM anti-Toxoplasma gondii e avidez de IgG <10%. Foi iniciado tratamento com espiramicina. Após o resultado positivo da PCR para toxoplasmose no líquido amniótico, foram iniciados sulfadiazina, pirimetamina e ácido folínico para a mãe. Não foram detectadas anormalidades na ultra-sonografia obstétrica. Com 37 semanas de gestação, o tratamento foi modificado para espiramicina, sendo realizado parto cesariano com 39 semanas e cinco dias.
23. Reflita sobre o caso apresentado; faça sua avaliação, indicando exames, provável diagnóstico e tratamento; depois, compare suas respostas com os comentários das autoras.
Nesse caso, a infecção aguda materna foi comprovada pela soroconversão documentada e reforçada pela baixa avidez de IgG. A presença de quadro clínico sugestivo na mãe permitiu determinar que a infecção ocorreu no segundo trimestre, com risco de 29% de transmissão congênita. A PCR positiva para toxoplasmose no líquido amniótico confirmou a ocorrência de infecção fetal. Assim, foi iniciado tratamento do feto com sulfadiazina + pirimetamina, como forma de diminuir o risco de desenvolvimento de doença clinicamente aparente na criança.
A criança não apresentava manifestações clínicas sugestivas de infecção congênita. A investigação complementar mostrou cicatrizes de coriorretinite na região nasal inferior à esquerda, com ultra-sonografia transfontanela e radiografia de crânio normais. Entretanto, foram detectadas calcificações grosseiras esparsas no parênquima cerebral na tomografia de crânio, conforme a Figura 2. O exame de liquor mostrou 18 células (100% linfócitos) com proteinorraquia de 94,4mg/dL. A função hepática era normal. No hemograma, foi constatada neutropenia, com 944 neutrófilos/mm3.
Exames:
Diagnóstico:
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O tratamento foi iniciado no 6º dia de vida (a criança nasceu em outro hospital) com sulfadiazina + pirimetamina, sendo programado uso diário de pirimetamina devido ao acometimento neurológico. Como a criança já apresentava neutropenia, talvez decorrente do tratamento intra-útero, o ácido folínico foi introduzido na dose diária de 10mg. Durante os primeiros quatro meses de tratamento, manteve número absoluto de neutrófilos entre 600 e 1.100/mm3, mesmo com aumento da dose do
ácido folínico para 20mg diariamente e alterações freqüentes no uso da pirimetamina (diário ou três vezes por semana), de acordo com o grau de neutropenia.
Aos 4 meses, o paciente desenvolveu neutropenia severa, com cerca de 250 neutrófilos/mm3,
sendo a pirimetamina suspensa. No entanto, a recuperação ocorreu apenas após a suspensão da sulfadiazina. O reinício do tratamento foi gradativo, com doses baixas e espaçadas, aumentadas progressivamente até as doses habituais. A criança manteve neutropenia (800-1.500 neutrófilos/ mm3) até 1 ano de idade, não sendo possível o uso diário da pirimetamina. Pela utilização irregular
das medicações, o tratamento foi prolongado por mais três meses após completar 1 ano de idade, estimado pelo tempo em que não se fez uso de nenhum medicamento.
A despeito dessas intercorrências, a criança evoluiu com desenvolvimento neuropsicomotor adequado, sem novas lesões oculares e com normalização do hemograma após o término do tratamento. O diagnóstico foi confirmado pela persistência de positividade da IgG anti-Toxoplasma
gondii com 1 ano de vida e aumento dos títulos ao final do tratamento.
Esse caso exemplifica a necessidade de controle hematológico rigoroso durante o tratamento. Apesar da neutropenia importante, o tratamento foi realizado aproximadamente como previsto. Vale ressaltar também a boa evolução neurológica e ocular, sugerindo benefícios do tratamento precoce.
Figura 2 – Tomografia computadorizada de
crânio mostrando calcificações grosseiras esparsas pelo parênquima cerebral
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RESPOSTAS ÀS ATIVIDADES E COMENTÁRIOS
Atividade 8Resposta: A
Comentário: Embora a tríade clássica de coriorretinite, calcificações intracranianas e hidrocefalia seja encontrada em menos de 10% dos casos sintomáticos, sua presença é altamente sugestiva de toxoplasmose congênita.
Atividade 9 Resposta: D
Comentário: Considerando que a produção de IgM é muito baixa no recém-nascido, mesmo com a utilização de técnicas laboratoriais sensíveis, como o ELISA IgM de captura, até 25% dos casos de toxoplasmose congênita podem não ser identificados.
Atividade 11 Resposta: B
Comentário: Em crianças sintomáticas, é indicado uso de sulfadiazina + pirimetamina por um ano. Como há presença de lesão ocular em atividade, com risco de perda visual, o uso de corticosteróides está indicado até melhora do processo inflamatório.
Atividade 17 Resposta: C
Comentário: A reação de Sabin-Feldman é o teste sorológico clássico de alta especificidade e sensibilidade, mas seu uso é restrito em decorrência da complexidade do método. O RIF IgM tem a limitação de ser muito menos sensível do que o ISAGA e o ELISA de captura – esses últimos apresentam sensibilidades similares, sendo o ISAGA pouco mais sensível. Entretanto, é pouco disponível para uso na rotina diagnóstica.
Atividade 19 Resposta: C
Comentário: Não há necessidade de cozinhar verduras, apenas realizar lavagem adequada. Oocistos de Toxoplasma gondii eliminados nas fezes de gatos só se tornam infectantes após a esporulação, que ocorre em alguns dias. Portanto, a caixa de areia de gatos deve ser trocada diariamente.
Atividade 20 Resposta: C
Comentário: Considerando os benefícios do tratamento precoce na prevenção das seqüelas oculares, o fato de a mãe ter toxoplasmose aguda confirmada no terceiro trimestre de gestação, quando as chances de transmissão são maiores, e de o achado do parasita no líquido amniótico ser altamente preditivo de infecção fetal, a conduta mais adequada seria iniciar imediatamente com a medicação.
Atividade 21 Resposta: C
Comentário: A transmissão de infecção materna ocorrida antes do período gestacional é descrita somente em mulheres portadoras de imunodeficiência grave.
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REFERÊNCIAS
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ATUALIZAÇÃO E
TOXOPLASMOSE CONGÊNIT
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Presidente:
Dioclécio Campos Júnior
1º Vice-Presidente:
Nelson Augusto Rosário Fº
2º Vice-Presidente:
Fábio Ancona Lopez
Secretário Geral:
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Mário José Ventura Marques
2º Diretor Financeiro:
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3º Diretor Financeiro:
Marilúcia Rocha de Almeida Picanço
Diretoria de Patrimônio:
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Coordenação de Informática:
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Conselho Acadêmico Presidente:
Reinaldo Menezes Martins
Secretário:
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Conselho Fiscal:
Clóvis José Vieira da Silva Alda Elizabeth B. I. Azevedo Nei Marques Fonseca
Assessorias da Presidência:
Anamaria Cavalcante e Silva Carlos Eduardo Nery Paes João de Melo Régis Filho Marco Antonio Barbieri Nelson de Carvalho Assis Barros Virginia Resende Silva Weffort
Coordenação de Grupos de Trabalho
Álvaro Machado Neto
Diretoria de Qualificação e Certificação Profissional:
José Hugo Lins Pessoa
Coordenação da Área de Atuação:
Mauro Batista de Morais
Coordenação da Recertificação:
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Fernando José de Nóbrega Representantes:
IPA: Sérgio Augusto Cabral Mercosul: Vera Regina Fernandes Diretoria dos Departamentos Científicos:
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Coordenação do CEXTEP
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Diretoria de Cursos e Eventos:
Ércio Amaro de Oliveira Filho
Diretoria Adjunta de Cursos e Eventos:
Lúcia Ferro Bricks
Coordenação da Reanimação Neonatal:
José Orleans da Costa
Coordenação da Reanimação Pediátrica:
Paulo Roberto Antonacci Carvalho
Centro de Treinamento em Serviços: Coordenação:
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Coordenação do CIRAPs:
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Coordenação da Graduação:
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Coordenação Adjunta de Graduação:
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Diretoria de Publicações da SBP Diretor de Publicações:
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Editor do Jornal de Pediatria:
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Defesa da Criança e do Adolescente: Coordenação:
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Comissão de Sindicância:
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