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O dialeto caipira no município de Itatiba-SP

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Academic year: 2021

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

INSTITUTO DE ESTUDOS DA LINGUAGEM

LUNA SARTORATTO PLAZA

O DIALETO CAIPIRA NO MUNICÍPIO DE ITATIBA-SP

CAMPINAS

2019

(2)

O DIALETO CAIPIRA NO MUNICÍPIO DE ITATIBA-SP

Dissertação de mestrado ao Instituto de Estudos da Linguagem da Universidade Estadual de Campinas para obtenção do título de Mestra em Linguística.

Orientador: Prof. Dr. Emilio Gozze Pagotto

Este exemplar corresponde à versão final da Dissertação defendida pela aluna Luna Sartoratto Plaza,

orientada pelo Prof. Dr. Emilio Gozze Pagotto

CAMPINAS

2019

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Biblioteca do Instituto de Estudos da Linguagem Leandro dos Santos Nascimento - CRB 8/8343

Plaza, Luna Sartoratto,

P699d PlaO dialeto caipira no município de Itatiba-SP / Luna Sartoratto Plaza. – Campinas, SP : [s.n.], 2019.

PlaOrientador: Emilio Gozze Pagotto.

PlaDissertação (mestrado) – Universidade Estadual de Campinas, Instituto de Estudos da Linguagem.

Pla1. Sociolinguística. 2. Dialeto caipira. 3. Análise do Discurso. I. Pagotto, Emilio Gozze. II. Universidade Estadual de Campinas. Instituto de Estudos da Linguagem. III. Título.

Informações para Biblioteca Digital

Título em outro idioma: The Caipira dialect in the city of Itatiba-SP Palavras-chave em inglês:

Sociolinguistics Caipira dialect Discourse Analysis

Área de concentração: Linguística Titulação: Mestra em Linguística Banca examinadora:

Emilio Gozze Pagotto [Orientador] Livia Oushiro

Cláudia Regina Brescancini Data de defesa: 23-08-2019

Programa de Pós-Graduação: Linguística Identificação e informações acadêmicas do(a) aluno(a)

- ORCID do autor: https://orcid.org/0000-0002-4860-1628 - Currículo Lattes do autor: http://lattes.cnpq.br/5369843749217163

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Emilio Gozze Pagotto

Livia Oushiro

Cláudia Regina Brescancini

IEL/UNICAMP 2019

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O sotaque é aquilo que se ouve, o que se vai assimilando e vai soltando...

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AGRADECIMENTOS

Devo agradecer a muitas pessoas pela realização desta pesquisa, não somente pelo apoio emocional, mas sobretudo pela ajuda na realização do trabalho, desde as orientações bibliográficas e inspirações até a coleta e a análise de dados.

Agradeço primeiramente ao meu orientador Emilio Gozze Pagotto pela sabedoria, experiência, paciência e bom humor com os quais tive a felicidade de ter contato desde a realização da monografia no final de 2016 até hoje.

Agradeço aos informantes deste trabalho, pois sem eles a pesquisa não existiria. Sou muito grata a maneira como fui tratada e acolhida em suas casas, à disponibilidade que tiveram para conversarem comigo, sobretudo àqueles que confiaram em mim e me receberam em suas casas sem nem mesmo ter nenhum amigo em comum.

Agradeço aos meus pais Edi e Alejandro por me incentivarem desde há muito tempo a estudar e a pesquisar coisas que eu gosto e também pela ajuda com a busca pelos informantes no município e às idas às casas dos entrevistados.

Agradeço ao meu companheiro Matheus por estar sempre ao meu lado nesses últimos anos da minha vida e também por ter me ajudado a encontrar informantes pelas ruas de Itatiba.

Agradeço à Erica, à Camila, à Clélia, à Ercília, ao Lono, à Flávia, à Leandra, à Lidia, à Natalina, à Carolina, à Cláudia, à Iluá, à Maria, ao Gustavo, à Fabiana, ao Fábio, à Cintia, à minha avó Olivia, à Nadya, à Bárbara e ao Serrinha por terem me ajudado a encontrar informantes.

Agradeço aos meus amigos Lisa, Victor Santos, Victor Lopes, Carolina, Luma, Nina e Caique que participaram também da minha trajetória no mestrado sempre me aconselhando e me dando apoio em tudo. Agradeço também à Diana, que sempre esteve presente nos momentos mais difíceis e importantes. Agradeço ao Matthew pela amizade e pelas dicas sobre linguística.

Agradeço enormemente ao colega Victor Carreão pela valiosa ajuda com a dissertação, sobretudo na realização dos testes estatísticos.

Agradeço à professora Livia Oushiro pela disciplina dada de introdução ao uso da plataforma R para análises sociolinguísticas em 2017. Sem esse curso

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tudo seria mais difícil. Ademais, agradeço às suas relevantes orientações na qualificação, por aceitar o convite de integração da banca de defesa da dissertação e por corrigir, questionar e sugerir ideias para a publicação da dissertação.

Agradeço ao professor Lauro Baldini e ao professor Fábio Ramos Barbosa pela disciplina de introdução à Análise do Discurso em 2018, e também pelas orientações na realização da análise discursiva das entrevistas.

Agradeço novamente ao professor Lauro Baldini por ter feito parte da banca de qualificação e por ter feito apontamentos que me auxiliaram na redação da dissertação.

Agradeço à professora Cláudia Brescancini por aceitar fazer parte da banca de defesa da dissertação e por fazer comentários e questionamentos essenciais para a finalização deste trabalho.

O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES) – Código de financiamento 001.

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RESUMO

Este trabalho é uma pesquisa de interface entre a Sociolinguística e a Análise do Discurso, cujo objetivo é a descrição do dialeto caipira no município de Itatiba, localizado no interior do estado de São Paulo, bem como o entendimento da construção de sentido dessa palavra - caipira - nessa comunidade de fala. Para a análise descritiva desse dialeto em Itatiba, foram selecionadas nove variáveis de natureza fonológica: realização das consoantes /t/ e /d/ antes de /i/ (passível de palatalização ou não); realização de /r/ em coda; realização de /ɾ/ em primeira posição de ataque; realização de /ɾ/ em segunda posição de ataque; realização de “r forte” em ataque; troca da lateral alveolar por [ɾ] no ataque da sílaba, chamada de rotacismo em ataque silábico; troca de glide [w] por [ɻ] na coda da sílaba, chamada de rotacismo em coda silábica; troca da lateral palatal [ʎ] pelo glide [j], fenômeno chamado de vocalização (ou iotização), da lateral palatal e realização de vogais átonas finais /e/ e /o/ (passível de elevação ou não). A escolha das variáveis se deu com base nos trabalhos de Amaral (1920), publicação mais antiga que se tem sobre o dialeto caipira no Brasil, Rodrigues (1974) e Castro (2006), pesquisas realizadas nos municípios de Piracicaba e regiões de Minas Gerais e Paraná, respectivamente. O corpus é constituído por dados de produção de fala de 30 pessoas nascidas e residentes em Itatiba, que foram retirados de entrevistas sociolinguísticas feitas individualmente com cada um dos informantes. As entrevistas serviram de meio para levantamento quantitativo de variantes e para análise discursiva, cujo propósito é averiguar o que se entende por caipira em Itatiba e como os itatibenses constroem a própria cidade no discurso. Para a análise dos processos de variação, foi adotada a Teoria da Variação e Mudança, concebida por Labov (2008 [1972]) e Weinreich; Labov; Herzog (2006 [1968]), para averiguação das correlações entre as variantes e algumas categorias sociais, além da análise discursiva de alguns trechos das entrevistas, amparada pela Teoria Materialista do Discurso, concebida por Pêcheux (1997 [1988]).

Palavras-chave: Sociolinguística, dialeto caipira, Análise do Discurso; palatalização das oclusivas dentais antes de /i/; variação linguística.

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ABSTRACT

This work is an interface between Sociolinguistics and Discourse Analysis, whose objective is the description of the Caipira dialect in the city of Itatiba, localized in the interior of the state of São Paulo, as well as an analysis of the meaning construction of word – caipira – in this speech community. For the descriptive analysis of the Caipira dialect nine phonological variables were selected: the realization of the stops /t/ and /d/ before the vowel /i/ (subject to palatalization or not), the realization of /r/ in syllable coda position; the realization of /ɾ/ in first onset position; the realization of /ɾ/ in second onset position; the realization of “strong r” in onset position; replacements of lateral to [ɾ] in onset position, called rhotacism in onset position; replacements of glide [w] to [ɻ] in coda position, called rhotacism in coda position; replacements of palatal lateral [ʎ] to glide [j], phenomenon called vocalization (or iotization) of palatal lateral and realization of final unstressed vowels /e/ and /o/ (subject to raising or not). The choice of variables was based on the works by Amaral (1920), the oldest publication of the caipira dialect in Brazil, Rodrigues (1974) and Castro (2006), researches carried out in the city of Piracicaba and regions of Minas Gerais and Paraná, respectively. The corpus consists of speech production data of 30 people who were born and live in Itatiba, recorded individual sociolinguistic interviews. The interviews served as a means for the quantitative survey of variants and for discourse analysis, whose purpose is to ascertain what is meant by Caipira in Itatiba and how people born in Itatiba build the city itself in discourse. For the analysis of the variation processes, we adopted the Theory of Variation and Change, conceived by Labov (2008 [1972]) and Weinreich; Labov; Herzog (1906), to investigate the correlations between the variants and some social categories, in addition to the discursive analysis of some of the interviews, supported by the Materialistic Discourse Theory, conceived by Pêcheux (1997 [1988]).

Key-words: Sociolinguistics; caipira dialect; Discourse Analysis; palatalization of dentals stops before /i/; linguistic variation.

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1: Mapa da Região Metropolitana de Campinas...24

Figura 2: Distribuição dos bairros em Itatiba...33

Figura 3: Comparação entre redes muito densas e pouco densas...53

Figura 4: Palatalização, segundo o modelo linear...67

Figura 5: Modelo geométrico de traços...68

Figura 6: Palatalização, segundo a Geometria de Traços...70

Figura 7: Palatalização de /k/ e /t/ no Português do Brasil...71

Figura 8: Estratificação dos informantes...97

Figura 9: Bairros dos informantes entrevistados...98

Figura 10: Realização de /r/ em posição de ataque no Brasil...125

Figura 11: Ampliação dos bairros dos entrevistados...262

(12)

LISTA DE TABELAS

Tabela 1: Comparação entre o número de habitantes na zona rural e na zona urbana no município de Itatiba...30 Tabela 2: Porcentagem de habitantes não naturais em Itatiba entre os anos de 1980 e 2010...31 Tabela 3: Ocorrência da africada palato-alveolar [tò] em relação à região

geográfica no Brasil...72 Tabela 4: Realização da africada palato-alveolar [tò] por faixa etária e região geográfica no Brasil...73 Tabela 5: Realização da palatalização em Louveira por faixa etária...74 Figura 6: Resultados gerais da palatalização das oclusivas dentais em

Florianópolis...76 Tabela 7: Critérios de classificação da classe social para os informantes da zona urbana...103 Tabela 8: Critérios de classificação da classe social para os informantes da zona rural...104 Tabela 9: Variáveis independentes linguísticas da palatalização...109 Tabela 10: Variáveis independentes sociais...113 Tabela 11: Respostas dos informantes para a última pergunta da

entrevista...156 Tabela 12: Realização de africada palato-alveolar, africada alveolar e oclusiva dental antes de /i/...171 Tabela 13: Realização de oclusivas dentais antes de /i/ para cada variável independente linguística...172 Tabela 14: Realização de oclusivas dentais antes de /i/ para cada variável independente social...174 Tabela 15: Distribuição de africadas alveolares por faixa etária...179 Tabela 16: Distribuição de africadas alveolares por faixa etária e

sexo/gênero...179 Tabela 17: Diferença de percentual entre africadas (palatais e não palatais) e oclusivas dentais...180

(13)

Tabela 18: Estimativas (em log odds) da variante oclusiva dental em relação às variáveis independentes...182 Tabela 19: Percentual de africadas por classe social e escolaridade...184 Tabela 20: Percentual de africadas para cada informante segundo classe social e escolaridade...185 Tabela 21: Estimativas (em log odds) da variante oclusiva dental em relação à classe social e à escolaridade...187 Tabela 22: Realização de /t/ e /d/ antes de /i/ por informante...192 Tabela 23: Realização de /r/ em coda (retroflexo e tepe)...202 Tabela 24: Realização de realização de /r/ em coda para cada variável

independente social...203 Tabela 25: Ocorrência de /r/ em coda para cada informante que produziu

tepe...205 Tabela 26: Realização de /ɾ/ em 1ª posição de ataque (retroflexo e

tepe)...207 Tabela 27: Realização de /ɾ/ em 1ª posição de ataque para cada variável

independente social...208 Tabela 28: Ocorrência realização de /ɾ/ em 1ª posição de ataque para cada informante que produziu retroflexo...210 Tabela 29: Realização de /ɾ/ em 2ª posição de ataque (retroflexo e

tepe)...214 Tabela 30: Realização de /ɾ/ em 2ª posição de ataque para cada variável

independente social...215 Tabela 31: Ocorrência de /ɾ/ em 2ª posição de ataque para cada informante que produziu retroflexo...216 Tabela 32: Realização de “r forte” (vibrante e fricativa)...222 Tabela 33: Realização de “r forte” para cada variável independente

social...223 Tabela 34: Ocorrência de “r forte” para cada informante que produziu

vibrante...224 Tabela 35: Realização de rotacismo em ataque silábico...228

(14)

Tabela 36: Realização de rotacismo em ataque para cada variável

independente social...229 Tabela 37: Percentual de variantes para cada informante que realizou

rotacismo em ataque silábico...231 Tabela 38: Realização de rotacismo em coda...233 Tabela 39: Realização de rotacismo em coda para cada variável independente social...234 Tabela 40: Percentual de variantes para cada informante que realizou

rotacismo em coda silábica...235 Tabela 41: Percentual de vocalização da lateral palatal...237 Tabela 42: Percentual de vocalização da lateral palatal para cada variável independente social...238 Tabela 43: Percentual de variantes para cada informante que realizou

vocalização da lateral palatal...239 Tabela 44: Ocorrências de elevação das vogais átonas finais...243 Tabela 45: Percentual de elevação de /e/ para cada informante que apresentou variação...244 Tabela 46: Percentual de elevação de /o/ para cada informante que apresentou variação...245 Tabela 47: Percentual de variantes do dialeto caipira para cada informante....249 Tabela 48: Informantes totais por faixa etária, classe social e região...263

(15)

LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico 1: Realização das oclusivas dentais de acordo com a idade de cada falante...176 Gráfico 2: Realização das oclusivas dentais de acordo com os níveis de

escolaridade...177 Gráfico 3: Realização de /ɾ/ como tepe na 1ª posição de ataque silábico de acordo com a idade de cada falante...212 Gráfico 4: Realização de /ɾ/ como tepe na 2ª posição de ataque silábico de acordo com escolaridade...217 Gráfico 5: Realização de /ɾ/ como tepe na 2ª posição de ataque silábico de acordo com a idade de cada falante...219 Gráfico 6: Percentual da variante retroflexa nas três posições na sílaba

segundo a faixa etária...220 Gráfico 7: Realização de “r forte” de acordo com a idade dos informantes...226 Gráfico 8: Realização de lateral alveolar de acordo com a idade dos

informantes...230 Gráfico 9: Percentual de [e] e [o] de acordo com a faixa etária...243

(16)

SUMÁRIO Introdução...20 1. Itatiba...23 1.1. Introdução...24 1.2. A emancipação de Jundiaí...25 1.3. A era do café...26 1.4. A imigração italiana...26 1.5. A indústria têxtil...27 1.6. Os móveis coloniais...28 1.7. O crescimento desordenado...29 1.8. Os bairros de Itatiba...32 2. Fundamentação teórica...39 2.1. Introdução...40

2.2. Sociolinguística e Análise do Discurso...40

2.2.1. Teoria da Variação e Mudança...40

2.2.2. Em busca de uma teoria de interface...56

2.2.3. Análise do Discurso...62

2.3. Fonologia...66

2.3.1. Geometria de Traços...66

2.3.2. A fonologia da palatalização...70

2.3.3. A palatalização no Português Brasileiro...71

2.3.4. As africadas alveolares [ts] e [dz]...74 3. O caipira...77 3.1. Introdução...78 3.2. A cultura caipira...79 3.3. A construção de um estereótipo...82 3.4. O caipira hoje...86 3.5. O dialeto caipira...90

(17)

3.5.1. Caracterização do dialeto caipira...92

4. Metodologia...95

4.1. Introdução...96

4.2. A estratificação do corpus...96

4.2.1. Classe social...99

4.3. A busca pelos informantes...105

4.4. Sobre as entrevistas...105

4.5. A análise de dados...108

4.5.1. As variáveis independentes linguísticas...108

4.5.2. As variáveis independentes sociais...109

4.5.3. Testes estatísticos...113

4.5.4. Análise discursiva do corpus...114

5. Outras variáveis a serem analisadas...116

5.1. Introdução...117

5.2. Realização de /r/ em coda...117

5.2.1. Variação dialetal no Brasil...117

5.2.2. Enfraquecimento...119

5.2.3. O /r/ caipira...120

5.3. Realização de /ɾ/ em 1ª e 2ª posição de ataque...122

5.4. Realização de “r forte”...124

5.5. Rotacismo...127

5.6. Vocalização da lateral palatal...129

5.7. Elevação de vogais átonas finais...130

6. Análise discursiva das entrevistas...132

6.1. Ser caipira em Itatiba...133

6.1.1. As perguntas...133

(18)

6.1.3. A identificação parcial: meio caipira...143

6.1.4. A percepção pelo outro: dizem que é caipira...146

6.1.5. A negação: caipira é o outro...149

6.1.6. Conclusões...153

6.2. A avaliação social da palatalização...157

6.2.1. A variante não palatalizada em Itatiba...159

6.3. A avaliação social do /r/ retroflexo em Itatiba...164

7. Análise quantitativa dos dados...170

7.1. Realização das oclusivas dentais antes de /i/ (palatalização)...171

7.1.1. Resultados Gerais...171

7.1.2. Estatuto das africadas alveolares...178

7.1.3. Regressão logística...180

7.1.4. Falantes mal comportados...189

7.1.5. Conclusões...200

7.2. Realização de /r/ em coda...202

7.2.1. Discussão dos resultados...202

7.2.2. Conclusões...206

7.3. Realização de /ɾ/ em 1ª posição de ataque...207

7.3.1. Discussão dos resultados...207

7.3.2. Conclusões...212

7.4. Realização de /ɾ/ em 2ª posição de ataque...214

7.4.1. Discussão dos resultados...214

7.4.2. Conclusões...220

7.5. Realização de “r forte” ...222

7.5.1. Discussão dos resultados...222

7.5.2. Conclusões...226

7.6. Rotacismo em ataque silábico...228

(19)

7.6.2. Conclusões...232

7.7. Rotacismo em coda silábica...233

7.7.1. Discussão dos resultados...233

7.7.2. Conclusões...236

7.8. Vocalização da lateral palatal...237

7.8.1. Discussão dos resultados...237

7.8.2. Conclusões...241

7.9. Elevação das vogais átona finais...243

7.10. Diagnósticos dos processos de variação em Itatiba...247

Considerações finais...253

Referências Bibliográficas...256

(20)

Introdução

A formulação do objeto de estudo desta pesquisa1 surgiu de uma monografia realizada no final de 2016, cujo objetivo foi descrever processos de variação linguística na fala de pessoas com mais de 65 anos em Itatiba, município localizado no interior de São Paulo. Nesse estudo, pôde-se verificar a presença de variantes linguísticas pertencentes ao dialeto caipira no município, com base nos trabalhos de Amadeu Amaral e outros estudiosos da área, como Ada Natal Rodrigues e Vanderci Castro.

O objetivo de observar os processos de variação e possíveis mudanças linguísticas em Itatiba continua sendo um norteador aqui, contudo por Itatiba estar localizadas na região considerada berço do dialeto caipira, novas questões surgiram para a realização da pesquisa.

Por esse motivo, este trabalho visa ao entendimento da relação do município com o universo caipira, visto que essa cultura e seu dialeto estão atravessados por estereótipos sociais. Estereótipos são importantes peças para a compreensão de processos de variação e mudança linguística, já que podem revelar a avaliação social dos falantes.

Na tentativa de análise da construção do estereótipo caipira em Itatiba, foi objetivado observar a relação do termo caipira com outros termos no discurso dos itatibenses por meio do material retirado das entrevistas sociolinguísticas. Dessa forma, buscou-se uma teoria que sustentasse a construção de sentido de uma palavra, bem como sua relação com a história, com a ideologia e com a política; e a Análise do Discurso se apresentou como possibilidade para esse objetivo, portanto este trabalho é uma pesquisa de interface entre essa área e a Sociolinguística.

Desse modo, as principais linha teóricas desta pesquisa são a Teoria da Variação e Mudança, concebida inicialmente por William Labov, e a Análise Materialista do Discurso, concebida por Michel Pêcheux.

1 O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de

(21)

Foram entrevistados 30 informantes nascidos em Itatiba e foram analisados os seguintes fenômenos fonológicos para observação do processo de variação linguística:

1) Palatalização das oclusivas dentais diante de /i/ (variação entre [t]/[d], [ts]/[ds] e [tʃ]/[dʒ]), como nas palavras tia e dia.

2) Realização de “r” forte em ataque silábico (variação entre a fricativa glotal [h] ou fricativa velar [x] e a vibrante múltipla [ř]), como nas palavras carro e rato.

3) Realização de /ɾ/ em primeira posição de ataque silábico (variação entre tepe [ɾ] e retroflexo [ɻ]), como na palavra caro.

4) Realização de /ɾ/ em segunda posição de ataque silábico (variação entre tepe [ɾ] e retroflexo [ɻ]), como na palavra trabalho.

5) Realização de /r/ em coda silábica (variação entre tepe [ɾ] e retroflexo [ɻ]), como na palavra carta.

6) Rotacismo em ataque silábico (variação entre tepe [ɾ] e lateral [l]), como na palavra planta, que pode ser pronunciada como pranta quando ocorre rotacismo.

7) Rotacismo em coda silábica (variação entre o glide [w] e o retroflexo [ɻ]) como na palavra animal, que pode ser pronunciada como animar quando ocorre rotacismo em coda.

8) Vocalização (ou iotização) da lateral palatal (variação entre a lateral palatal [ʎ] e o glide [j]), como na palavra mulher (lateral palatal), que pode ser pronunciada como muié (glide).

9) Elevação das vogais médias em posição átona final (variação entre [e] e [i] e entre [o] e [u]), como nas palavras dente e barco, que podem ser pronunciadas como denti e barcu quando são elevadas as vogais finais.

As variáveis selecionadas foram retiradas dos trabalhos de Amadeu Amaral, Ada Natal Rodrigues e Vanderci Castro, pois a ideia é averiguar se as variantes, que são consideradas marcas do dialeto caipira por esses autores, ainda estão presentes em um município que faz parte da região considerada irradiadora da cultura caipira (interior de São Paulo).

Pretendeu-se observar quais fatores sociais e linguísticos influenciam na variação e as possíveis mudanças linguísticas que orientam esses processos, assim como a relação dessas variáveis com a construção de sentido da palavra

(22)

caipira em Itatiba. Objetiva-se descobrir quem são as pessoas que mais

produzem as variantes consideradas caipiras e como estas demarcam o que os itatibenses pensam a respeito desse rótulo.

Algumas pesquisas dialetológicas que se propuseram a estudar o dialeto caipira no Brasil formularam hipóteses de transformação desse dialeto no interior de São Paulo. Como no município se manifestam atualmente características atribuíveis ao dialeto caipira, a análise dos processos de variação fonológica se justifica na tentativa de examinar em que ritmo e para que direção esse dialeto está mudando em Itatiba.

(23)

Capítulo 1

Itatiba

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1.1. Introdução

Itatiba se localiza na Região Metropolitana de Campinas e fica situada a 80 quilômetros da cidade de São Paulo. Estima-se que hoje tenha 101.471 habitantes numa área de 322 quilômetros quadrados.

Figura 1: Mapa da Região Metropolitana de Campinas

Fonte: Adaptado de Wikipédia

A história de Itatiba é muito parecida com a de outros municípios do interior de São Paulo, pois sua região foi habitada por mestiços brasileiros, escravos recém libertos e imigrantes italianos. Apesar do processo de urbanização, sua área rural ainda é muito grande. A área urbana de Itatiba (26,12

(25)

quilômetros quadrados) fica no centro, tem atualmente 85.666 habitantes, e não compreende uma área tão grande quanto a área rural (296,16 quilômetros quadrados) que fica em seu entorno e tem um total de 15.805 habitantes.

1.2. A emancipação de Jundiaí

Itatiba passou por um processo gradativo até se tornar um município. Uma parte de seu território atual ficou conhecida no ano de 1814 pela capela que havia sido construída ali, a Capela de Nossa Senhora de Belém; em 1830, passou a ser uma freguesia; em 1857 passou a ser uma vila que fazia parte do município de Jundiaí. Somente em 1876 se emancipou e se tornou a Cidade do Belém de Jundiaí. Foi em 1877 que passou a se chamar Itatiba.

Itatiba significa muita pedra em tupi. Segundo Sangiorgi (1969, p.103), porque um dos legisladores envolvidos na lei que possibilitou que o município se tornasse independente sabia tupi e deu esse nome, por causa das pedreiras presentes em diversas regiões do território itatibense que até hoje existem.

Segundo Camargo (2011), a região de Itatiba ficou desconhecida pelos portugueses por 250 anos desde o início da colonização de São Paulo, porque depois que os bandeirantes expulsaram os índios (tribo dos Guarulhos) que viviam ali, aqueles seguiram a rota no sentido de Minas Gerais, Mato Grosso e Goiás, sem explorar muito a área.

O que atraiu o povoamento da região de Itatiba, depois de anos sem ser muito explorada, foi o rio Atibaia, segundo Gabuardi (2004). A autora afirma que no período de 1810 a 1825, alguns criminosos fugiram de Piracaia (antiga Santo Antônio da Cachoeira) e foram para o rio Atibaia, mas os policiais que os perseguiam os pegaram e quando estavam voltando às suas cidades, viram a área de Itatiba próxima ao rio. Então espalharam a notícia de que havia uma região fértil ali, que aos poucos começou a ser povoada por correntes migratórias compostas por famílias de lavradores de localidades próximas.

(26)

1.3. A era do café

Itatiba foi um dos municípios pioneiros na produção de café no Centro-leste de São Paulo. As primeiras fazendas produtoras de café datam no início de 1850. Segundo Camargo (2011), esse é um dos fatores que contribuiu para o aumento da população nesse território a partir de 1850. Por mais que a riqueza gerada tenha se concentrado nos Barões do Café, ela foi responsável pelo avanço tecnológico e industrial de Itatiba:

Ao olharmos para o passado podemos verificar que uma série de serviços e melhoramentos foram implantados em Itatiba por conta da riqueza gerada pelo café: o Telégrafo (1888), Telefone (1895), o Teatro São Joaquim (1876), o antigo Grupo Escolar Cel. Júlio Cesar (1896), o serviço de abastecimento de água (1898) e a luz elétrica (1906), dentre outros. (CAMARGO, 2011, p. 15)

A cultura cafeeira em Itatiba viabilizou também a construção da Companhia Estrada de Ferro Itatibense, inaugurada em 1899. Com o gradativo término do cultivo de café em Itatiba, em 1952, a Companhia encerrou suas atividades, período em que as empresas de ônibus já haviam se instalado em Itatiba.

1.4. A imigração italiana

No começo da segunda metade do século XIX no Brasil, iniciou-se um movimento de branqueamento da nação brasileira, pautado num nacionalismo que valorizava o mestiço originado do brasileiro com os europeus que começaram a migrar para o país nessa época. Na virada do século, esse movimento se intensificou e se passou a incentivar a mão de obra europeia, foi nesse período em que muitos imigrantes italianos começaram a trabalhar nas fazendas em São Paulo. Desse modo, os imigrantes italianos foram requisitados para trabalhar nas lavouras de café, substituindo a mão-de-obra escrava. Em Itatiba não foi diferente, pois foi na produção cafeeira que se concentraram os trabalhadores italianos, já que o cultivo do café começou a exigir demandas de trabalho cada vez mais altas.

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No período de 1884, alguns imigrantes italianos já haviam chegado a Itatiba e a Morungaba (município muito próximo de Itatiba, chamado antigamente de Barra Mansa). A família Bertoni foi uma das primeiras a chegar e seus descendentes vivem no município até hoje.

Foi em 1888 que chegaram mais italianos ao município. Segundo Camargo (2011), a população era composta por 7.500 moradores em 1883, passou para 11.639 em 1900, atingindo o número de 25.000 habitantes em 1912. O autor também afirma que no ano de 1888, 40% da população itatibense era de origem italiana.

Graças ao trabalho de Camargo (2011), foi possível estimar quantas e quais famílias são descendentes de italianos em Itatiba. O autor fez uma pesquisa historiográfica no município por meio da investigação de cada família italiana desde o momento de sua chegada ao município. Foram estudadas 237 famílias itatibenses descendentes de italianos. Camargo (2011) ainda investigou os primeiros anos da chegada dessas famílias em Itatiba, observando suas principais profissões e em que regiões do município elas se instalaram inicialmente. O pesquisador verificou que do total de famílias estudadas 198 são descendentes de imigrantes do Vêneto, região que hoje se encontra dividida pelas províncias de Belluno, Padova, Rovigo, Treviso, Veneza, Verona e Vicenza.

Em Itatiba, foram muitos imigrantes que conseguiram adquirir terras e posteriormente exercer outras funções na zona urbana, como carpinteiro, professor, comerciante. Atualmente, percebem-se os vestígios dessa ascensão social, pois muitas famílias de origem italiana são conhecidas por serem ou terem sido donas de muitos comércios e indústrias importantes na cidade.

1.5. A indústria têxtil

A primeira indústria construída em Itatiba foi uma fábrica de cerveja e refrigerante, segundo Gabuardi (2004); em 1893, foi fundada a fábrica de fósforos Santa Rosa. Até meados de 1928, o município tinha como principal atividade a produção de fósforos, mas em 1938 a fábrica foi vendida para a companhia Brasileira de Fósforos. Mais tarde, essa fábrica foi fechada.

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Alguns anos depois, Itatiba passou a ter como principal fonte de economia a indústria têxtil. Uma importante fábrica de tecido do município foi a Têxtil Paulo Abreu S.A., fundada em 1936. Segundo Gabuardi (2004), foi a partir desse cenário que outras indústrias passaram se instalar em Itatiba. Diante do movimento nacionalista e desenvolvimentista trazido pela Revolução de 30 no Brasil, os municípios de São Paulo começaram a se modernizar e se urbanizar rápido. Em Itatiba não foi diferente:

Tal quadro fez com que os fazendeiros de café empregassem seu capital em outros ramos de atividade. Com isso, outras indústrias foram implantadas em Itatiba, principalmente as têxteis. Mas também surgiram as indústrias de calçados, massas, bebidas, troles, entre outras. Dessa forma, a cidade passou a receber, a partir de 1940, uma grande quantidade de mão-de-obra vinda das fazendas. Era o êxodo rural, que ocorria em todo o Brasil. (GABUARDI, 2004, p. 62)

Com a vinda de outras indústrias, o comércio cresceu em Itatiba; a partir daí, começaram a ser construídas lojas, hospitais e escolas na cidade. Muitos dos estabelecimentos comerciais construídos no centro pertenciam a imigrantes italianos e alguns deles existem até hoje, como a casa de fotografia Nicolau Parodi, que foi inaugurada em 1915.

Em 1950, além de contar com um centro comercial, Itatiba já tinha ônibus circulando no município, o que fez com que muitos itatibenses pudessem ir com mais frequência para as cidades vizinhas, como Campinas e Jundiaí.

1.6. Os móveis coloniais

Na década de 1960, foi implantada a indústria de móveis coloniais que impulsionou a venda desse tipo de produto no município. A primeira empresa que deu início a essa atividade em Itatiba se chamava Colonial Comércio e Indústria de Móveis. Segundo Gabuardi (2004), o dono dessa empresa, José Chadadd, começou com a venda de móveis usados no centro de Itatiba até se tornar empreendedor de uma das fábricas que mais gerou lucro na cidade.

Nos anos de 1970, Itatiba ficou conhecida na região pela qualidade de seus móveis coloniais de madeira maciça. Depois que Chadadd começou a lucrar com seu negócio, outros empresários passaram investir na venda de

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móveis também; duas avenidas inteiras de Itatiba eram tomadas só por estabelecimento que vendiam móveis coloniais.

O município recebia tantos compradores de cidades vizinhas que em 1967 foi realizada a primeira edição da Feira de Móveis Coloniais, a FEIMOC, que hoje não se restringe mais somente à venda de móveis.

Contudo, quase todas essas indústrias faliram na década de 1990 por causa da queda brusca de vendas de móveis coloniais no município. Como o Brasil enfrentava um período de recessão, muitas pessoas deixaram de comprar móveis coloniais, que eram mais caros.

A indústria de móveis coloniais não conseguiu se adaptar à modernização do mercado, sendo substituída pela produção de novos modelos mais baratos. Mesmo depois do término da crise econômica no país, a indústria de móveis coloniais nunca mais voltou a ser frutífera no município, pois a população se adaptou ao novo design dos móveis mais modernos. Atualmente, a Avenida 29 de Abril ainda é repleta de lojas de móveis, mas não coloniais. Restou apenas uma loja de móveis coloniais no município.

1.7. O crescimento desordenado

Os dados comentados demonstram os altos e baixos que Itatiba passou até o final do século XX, sendo o cultivo de café, a indústria de tecidos e as fábricas de móveis coloniais os propulsores da economia local no passado. Alguns dos participantes entrevistados para esta pesquisa recordam com nostalgia essas eras que Itatiba teve.

Um dos períodos mais marcado pelo sucesso econômico do município se deu após a instalação das principais fábricas de móveis coloniais. Esse fato propiciou mais qualidade de vida para os moradores e por isso chamou a atenção de pessoas de outras localidades que passaram a migrar para Itatiba. Foi nesse momento em que o aumento da densidade populacional de Itatiba teve seu ápice, como se pode observar na tabela 1:

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Tabela 1: Comparação entre o número de habitantes na zona rural e na zona urbana no município de Itatiba

Ano Total Zona urbana Zona rural

1940 13.153 5.145 8.008 1950 14.459 7.853 6.606 1960 20.892 12.336 8.556 1970 28.376 20.767 7.609 1980 41.630 35.536 6.094 1991 61.645 54.078 7.567 2000 81.197 65.925 15.272 2010 101.471 85.666 15.805

Fonte: dados do IBGE

Embora a concentração na área urbana tenha aumentado já em 1950, primeiro momento em que a situação se inverte – mais pessoas morando na zona urbana que na zona rural –, o êxodo rural se deu, de fato, em 1960, quando o número de habitantes na zona urbana aumentou abruptamente (de 7.853 para 12.336). Dos anos 60 a 2010, o número de habitantes na zona urbana não parou de crescer, assim como o processo de industrialização na cidade. O começo da expansão demográfica coincide com a implantação das fábricas de móveis coloniais em Itatiba – década de 1960 –, portanto parece que o sucesso desses produtos foi um dos fatores que atraiu a chegada de novos moradores para o município.

Apesar de a maior parte da população ainda viver na zona urbana, nota-se um aumento no número de habitantes na zona rural entre 2000 e 2010. É provável que esse aumento esteja relacionado à construção de condomínios nos arredores do município e com a vinda de pessoas de outras cidades para Itatiba. Como muitas dessas pessoas vêm de grandes centros urbanos, como São Paulo, geralmente elas optam por morar em lugares mais isolados, por isso escolhem a zona rural.

O aumento da população no município em períodos mais recentes provavelmente está ligado à migração de pessoas de outras cidades e/ou regiões para Itatiba. Sua proximidade com Campinas e São Paulo pode ser um dos fatores que justifica o fato de grande parcela da população no município ser de outras cidades. Como se vê na tabela 2, desde a década de 1980, mais de 40% dos residentes em Itatiba não eram naturais de lá:

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Tabela 2: Porcentagem de habitantes não naturais em Itatiba entre os anos de 1980 e 2010 Ano Número de habitantes não naturais do município Porcentagem de habitantes não naturais do município Número total de habitantes no município 1980 18.009 43,25% 41.630 1991 28.569 46,35% 61.645 2010 47.412 46,72% 101.471

Fonte: dados do IBGE

Muitos dos informantes de pesquisa comentaram a expansão do município de forma negativa, referindo-se a um crescimento desordenado, pois apesar de a população em Itatiba ter crescido muito e rapidamente, segundo eles, a infraestrutura da cidade não foi capaz de acompanhar esse processo. O centro da cidade ainda é pequeno, o que contribui para o aumento do tráfego nas ruas, por exemplo. Outros problemas mencionados pelos entrevistados referem-se à falta de condições dos serviços públicos do município para comportar tantos moradores, como a carência do sistema de saúde pública.

Algumas reclamações nas entrevistas vieram acompanhadas também por um incômodo com a chegada de pessoas de fora, chamadas assim por eles, sobretudo nas entrevistas com informantes de uma faixa etária mais avançada.

Apesar de a expressão pessoas de fora ter sido usada de forma geral, como referência a pessoas de quaisquer lugares, notou-se um incômodo maior com aquelas provenientes do Nordeste e do Norte do Brasil, como se pode observar nos seguintes trechos retirados das entrevistas feitas com os informantes:

Fátima2: As pessoas que vinham de lá de cima para trabalhar aqui, chamam

de Pião, compravam carro de cinco mil, colocava vinte mil de som, vinha na 25 de Março comprava aqueles shortes, aqueles óculos espelhados, aqueles tênis, que sabe, é bem mais barato e subiam lá em cima, ostentando.

2 Todos os nomes que aparecem, neste trabalho, relativos aos informantes são pseudônimos,

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Alice: O pessoal loteia e vende a chácara e trazem... E os donos que compram

a chácara, de São Paulo, da onde for, trazem aqueles caseiros lá do Nordeste,

da Bahia... É só gente estranho que tem.

Muitos deles se demonstraram insatisfeitos com as mudanças do município, preferindo Itatiba como era antes; isso se traduziu em comentários nostálgicos, em que a comparação entre passado e presente é dolorosa.

1.8. Os bairros de Itatiba

A disposição dos bairros em Itatiba não é muito diferente da de uma cidade pequena comum: quanto mais se afasta do centro, há mais residências precárias e mais famílias de baixa renda que ali habitam.

O centro é a área urbana mais antiga, por isso suas poucas residências atuais são majoritariamente de famílias de classe média que vivem no município há muitos anos. Há os bairros intermediários que não estão tão próximos do centro, mas tampouco estão na região periférica do município; dentre eles, alguns são mais prestigiados socialmente, como o bairro Giardino D’Itália, outros não, como o Jardim Santo Antônio.

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Figura 2: Distribuição dos bairros em Itatiba

Fonte: Adaptado de Google Maps

Na figura 2, a área traçada de vermelho é o centro do município, foi a primeira região a ser urbanizada; ao longo dos anos, a urbanização começou a se expandir para os arredores até compor área traçada de branco, que equivale ao perímetro urbano de Itatiba. Quanto mais se distancia do centro, mais os bairros se aproximam das rodovias que ligam o município a outras cidades, como Valinhos, Campinas e Jundiaí.

Há muitos núcleos residenciais nas regiões periféricas da cidade, como o Núcleo Residencial Porto Seguro e Pedro Fumachi. Além desses conjuntos habitacionais, há também condomínios de classe média alta localizados na região periférica do município, como Ville Chamonix e Parque das Laranjeiras. Tais condomínios estão localizados nas áreas fronteiriças entre zona rural e zona urbana, sendo a maioria deles chácaras.

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O centro da cidade

Antes mesmo que Itatiba se emancipasse de Jundiaí, a Capela de Belém (atual Igreja do Rosário) já havia sido edificada; foi a partir dela que o centro do município passou a ser construído, local onde houve a abertura das primeiras ruas de Itatiba. Mais tarde, em 1833, foi construída uma igreja maior, a Matriz e ao se redor foram se instalando casas, área antes chamada de Largo de Matriz que hoje é conhecida por ter ali a Praça da Bandeira.

Muitos locais comentados pelos informantes, como os dois cinemas (Cine Santa Rosa e Cine Marajoara), a cadeia pública, que hoje não existem mais, estavam localizados no centro da cidade.

O comércio foi tomando conta do centro de Itatiba, muitos edifícios residenciais foram demolidos, sendo que hoje há poucas residências nessa área. Uma das informantes entrevistadas que mora no centro em dado momento da entrevista comenta essa mudança:

Ligia: O barulho, sabe... Me incomoda menos, o que me incomoda mais é essa

solidão que não tem gente, só tem roda rodando. Você sabe que no domingo, eu fiquei com medo, porque eu tinha... Os vizinhos saíram, eu fiquei sozinha aqui, daí eu fiquei no terraço aí olhando. Só carro, não tem uma pessoa passando.

Exatamente por ser um centro comercial, atualmente as casas dessa área são de alto valor imobiliário. Como Itatiba é um município de porte pequeno e sua população continuou crescendo nos últimos anos, o centro está em constante mudança, muitos comércios são substituídos por outros frequentemente, já que a demanda por atividades de lazer e compras tem crescido, como explica Geromel (2010):

Devido à maior demanda da população por serviços e opções em restaurantes e lojas, o centro está em processo de crescimento em número de estabelecimentos, para atender esta nova demanda do mercado consumidor. Desta maneira, a especulação imobiliária ocorre de maneira significativa na área central itatibense, valorizando o patrimônio dos moradores do local e também dos comerciantes. (p. 63)

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Em relação às pessoas que já moravam no centro antes da valorização imobiliária, é importante assinalar que elas são, em sua maioria, descendentes das primeiras famílias italianas a chegar no município quando ele estava em processo de emancipação. Muitas dessas famílias são, hoje, de classe média por terem construído indústrias e comércios, quando Itatiba estavam começando a se urbanizar.

A maioria dessas indústrias não existe mais hoje, mas elas empregaram grande parte dos itatibenses durante anos e foram a fonte de economia da cidade por um tempo. Pode-se dizer que as famílias donas dessas indústrias deixaram um legado para seus descendentes e são recordadas no município até hoje.

A periferia

Como o centro foi tomado pela abertura massiva de comércios e a consequente especulação imobiliária, as famílias com menos condições financeiras passaram a construir suas casas nas áreas limítrofes do município. Aos poucos, bairros foram se formando nessas regiões e seu território cresceu muito, como por exemplo, o Parque São Francisco, que é atualmente o bairro mais populoso de Itatiba.

Esses bairros são conhecidos por agruparem muitas famílias de outros estados do país, sobretudo da região do Nordeste e do estado de Minas Gerais. Algumas delas já residem em Itatiba faz muito tempo, pois enquanto as casas e os terrenos do centro eram muito visados, foi na área periférica do município que algumas pessoas viram oportunidade de comprar terrenos mais baratos e poder construir suas residências. Os descendentes dessas famílias já nasceram em Itatiba, como dois dos jovens entrevistados que residem no Parque São Francisco: um deles é filho de paraibanos e a outra é filha de mineiros.

Na periferia de Itatiba, há também famílias que são recém-chegadas de outros locais, pois apesar de alguns desses bairros já serem extensos e populosos, o valor dos aluguéis é mais barato que nos bairros mais próximos do centro. É nesses bairros periféricos que se concentram não somente os habitantes com menos condições financeiras, mas também aqueles com menos acesso à saúde e à educação, e são locais com altos índices de tráfico de

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drogas.

A Prefeitura de Itatiba, junto com Instituto Sou da Paz3, levantou alguns dados estatísticos em 2009 no município, com o objetivo de realizar um diagnóstico sobre índice de violência e criminalidade em Itatiba. Constatou-se que o Índice Paulista de Vulnerabilidade Social (IPVS), que mede o desenvolvimento social e econômico da população, é mais alto na periferia, em bairros como o Parque São Francisco, Núcleo Residencial Afonso Zupardo, Núcleo Residencial Pedro Costa e Porto Seguro.

Os critérios utilizados para coletar o IPVS são os indicadores relativos ao tamanho das residências, escolarização, renda e idade dos responsáveis dos domicílios e quantidade de crianças nas casas. Nos grupos em que o IPVS é mais alto, encontrados majoritariamente nos bairros mencionados, aproximadamente 21% dos responsáveis completaram o Ensino Fundamental e 59,9% dessas famílias recebem até três salários mínimos; enquanto nos bairros localizados próximos do centro da cidade, uma média de 44% dos chefes de domicílio completaram o Ensino Fundamental e 37,6% dessas famílias recebe o equivalente a três salários mínimos.

Por causa desses altos índices de vulnerabilidade social, os centros comunitários de assistência social estão distribuídos por esses bairros, como o CRAS (Centro de Referência de Assistências Social), por exemplo. Trata-se de um local em que são feitas atividades socioeducativas e consultas psicoterapêuticas para crianças e idosos que vivem nas ruas ou passaram pela Fundação Casa; ele se localiza no Parque São Francisco e seu atendimento é voltado somente para a população desse bairro.

O Instituto se deparou com relatos de profissionais do CRAS que afirmaram que um dos principais problemas na região é o tráfico de drogas. Muitos dos jovens que frequentam o programa estão ligados a essa atividade. O diagnóstico ainda menciona a carência de postos de saúde em alguns desses bairros:

Com relação às principais dificuldades na área da saúde apontada por profissionais atuantes no município, destaca-se a falta de financiamento das outras esferas de governo, o que dificulta a ampliação e resolutividade dos serviços, como, por 3 Diagnóstico da Violência e Criminalidade do Município de Itatiba. Prefeitura de Itatiba e Instituto

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exemplo, a expansão das equipes do Programa Saúde da Família em bairros como Jardim das Nações, Centenário e Jardim Harmonia. Também há necessidade de mais escriturários para as Unidades Básicas de Saúde. (p. 20)

Todos os conjuntos habitacionais de Itatiba estão localizados nesses bairros da periferia, exatamente por ser a área de maior concentração de pessoas com rendas inferiores. Portanto, os bairros mencionados são áreas sob condições mais precárias que o centro e os bairros próximos a ele.

Os condomínios

Não são somente as famílias de classe baixa que estão nas áreas limítrofes de Itatiba, há muitos condomínios de classe média alta nessas áreas também. Muitos deles só são ocupados nos finais de semana e feriados, pois muitas pessoas trabalham em cidades próximas e vão para Itatiba no momento de descanso. Por essa proximidade a grandes centros, como São Paulo e Campinas, tornou-se uma facilidade ir para Itatiba em busca de tranquilidade.

Segundo Geromel (2010), a construção de condomínios fechados começou na década de 1970, com a construção do primeiro condomínio fechado, Parque das Laranjeiras, mas foi nos anos de 1990 que eles começaram a se multiplicar pela cidade.

A ocupação do território de Itatiba pode ser resumida como um centro tomado pelos itatibenses de famílias tradicionais italianas; as extremidades divididas entre bairros periféricos com famílias com condições socioeconômicos menos favoráveis, bem como moradores vindos do Nordeste e de Minas Gerais e há os condomínios fechados, em que reside a classe média proveniente de outras cidades, sobretudo da capital paulista.

O Quilombo Brotas

Em uma das regiões periféricas de Itatiba, no bairro Santa Filomena, existe um sítio, local que foi por muitos anos um quilombo. Conserva-se o nome

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quilombo até hoje pela herança histórica e por ser uma comunidade rural ainda

habitada pelos descendentes de escravos que lá viveram.

O Quilombo Brotas existe há mais de dois séculos graças ao fato de um casal de escravos ter comprado o sítio em que se situava o quilombo depois de terem sido libertos e seus descendentes vivem lá até hoje. O Quilombo conserva muitas características do passado, entretanto as constantes construções nas áreas vizinhas vêm alterando o modo de vida desse local:

Nas últimas décadas esse grupo viveu uma grande mudança no espaço em torno de seu território, o surgimento do loteamento “Nova Itatiba” e, consequentemente, a destruição de área da mata nativa, o que provocou o deslocamento de parte da fauna para o Quilombo, último refúgio de mata e fonte de água para estes animais. (GALVÃO, 2010)

O assoreamento de um córrego localizado nessa área causado pela construção do bairro Nova Itatiba também foi uma consequência ruim para o Quilombo, já que fez com que alguns peixes e crustáceos desaparecessem, como assinala a autora. Portanto, atualmente essa comunidade quilombola já não vive de subsistência.

Segundo Galvão (2010), atualmente o Quilombo Brotas tem 12 hectares de terra, em que vivem, em média, 150 pessoas e 32 famílias. Seu nome tem origem em um escravo chamado Brotas, que vivia nessa área e ajudava os outros escravos a fugirem.

Apesar de ser um sítio, uma das entrevistadas que vive no Quilombo, Brotas não foi classificada como informante da zona rural, pelo fato de o quilombo estar localizado dentro da área urbana. Só foram considerados da zona rural os informantes que vivessem em territórios minimamente afastados do centro urbano do município e cujas moradias se caracterizassem por um sítio.

Este capítulo resume a história de Itatiba de acordo com seus cilclos econômicos e comente brevemente a organização espacial do município; a seguir, serão apresentados os pressupostos teóricos deste trabalho e a justificativa pela escolha pela realização de uma pesquisa de interface entre duas áreas distintas dentro da Linguística.

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Capítulo 2

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2.1. Introdução

Este capítulo está dividido em duas partes, a primeira reúne os tópicos teóricos relevantes da Teoria da Variação e Mudança, formulada por Labov (2008 [1972]) e Weinreich; Labov; Herzog (2006 [1968]), e da Análise Materialista do Discurso, concebida por Pêcheux (1997 [1988]); a segunda parte explora a análise do processo de palatalização das oclusivas dentais antes de /i/ no Português Brasileiro, sob a perspectiva da Teoria da Geometria de Traços de Clements e Hume (1995).

A primeira seção traz os pontos, dos dois campos (Sociolinguística e Análise do Discurso), que motivaram a realização de uma pesquisa de interface entre essas subáreas para análise do objeto em questão: o dialeto caipira em Itatiba.

Já a segunda seção coloca em evidência a escolha de um modelo de análise fonológica específico (Geometria de Traços) para descrição do processo de palatalização, fenômeno relacionado a uma das variáveis analisadas – a realização de /t/ e /d/ antes de /i/.

2.2. Sociolinguística e Análise do Discurso

2.2.1. Teoria da Variação e Mudança

Um dos alicerces teóricos adotados aqui é a Teoria da Variação e Mudança, pois um dos objetivos da pesquisa é a observação de variáveis linguísticas e possíveis mudanças no falar itatibense.

A Teoria da Variação e Mudança concebe a língua em sua heterogeneidade, entretanto constatar que as línguas variam não é o suficiente para formular uma linha teórica em que a variação tenha um papel central. É pela compreensão e esquematização das consequências que a noção de sistema heterogêneo traz à língua que deve se orientar o estudo sociolinguístico. Nas palavras de Weinreich; Labov; Herzog (2006 [1968]):

Não basta apontar a existência ou a importância da variabilidade: é necessário lidar com os fatos de variabilidade

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com precisão suficiente para nos permitir incorporá-los em nossas análises de estruturas linguísticas. (p. 107)

A heterogeneidade concebida nessa teoria não se constitui apenas pelo reconhecimento da variação linguística e diferenças dentro do sistema linguístico, mas, sim, pela formulação de um modelo de língua que incorpora a variação linguística como fenômeno inerente ao funcionamento linguístico.

Essa proposta se deu tanto pela tentativa de observar a língua em seu real funcionamento, quanto pela necessidade de revisão do processo de mudança linguística. Tanto o modelo estruturalista quanto o gerativista tiveram que adotar uma concepção homogênea da língua para construir seus respectivos objetos de estudo: aspecto sincrônico e o aspecto diacrônico da língua, considerados impossíveis de serem observados simultaneamente por Saussure.

Foi na desassociação entre estrutura e homogeneidade que a Teoria da Variação e Mudança se propôs a observar a língua sob a perspectiva sincrônica e diacrônica ao mesmo tempo. É justamente pela heterogeneidade do sistema linguístico que se pode visualizar uma mudança em andamento.

Antes de discutir a relação entre variação e mudança, é necessário compreender a noção de variação (variabilidade) dentro do sistema. Segundo Weinreich; Labov; Herzog (2006 [1968]), deve-se diferenciar a variabilidade

inerente da alternância de código (code switching).

Variação inerente é a variação existente dentro do sistema linguístico do

sujeito que se estabelece já em seu vernáculo4, definido por Labov (2008 [1972],

p. 244) como a forma de falar em que há o menor grau de monitoramento possível. Quanto mais monitoramento houver dentro de um contexto, mais se afasta do vernáculo do sujeito e mais difícil é determinar se a variação é inerente ao seu sistema linguístico ou não.

É claro que no estudo sociolinguístico é muito difícil isolar completamente o vernáculo, já que as condições de coleta de dados recaem no paradoxo do

observador, que consiste na dificuldade do sociolinguista de coletar dados que

mais se aproximem do vernáculo de um informante, porém para realizar a

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investigação, o pesquisador normalmente entrevista o sujeito, atividade que já traz consigo determinado grau de monitoramento.

A alternância de código se caracteriza pela alternância de variantes pertencentes a sistemas diferentes:

Mas para demonstrar que temos um verdadeiro caso de alternância de código, é necessário mostrar que o falante se move de um conjunto consistente de regras coocorrentes para outro. (LABOV, 2008 [1972], p. 221)

A variação inerente engloba duas ou mais variantes que pertencem a um mesmo sistema; nesse caso, a variação compõe uma regra gramatical do sistema. Já a alternância de código pode estar relacionada ao monitoramento de fala, por isso deve-se ter noção da avaliação das variáveis e de suas variantes, pois as formas mais prestigiadas serão, naturalmente, usadas em contextos de maior monitoramento de fala. Mas deve-se assinalar que a variação estilística da fala nem sempre está relacionada somente à alternância de código.

A variabilidade inerente no sistema não indica, necessariamente, que há uma mudança linguística, contudo toda mudança linguística pressupõe a existência de variabilidade no sistema. Essa afirmação é um princípio empírico da Sociolinguística Variacionista, conforme as palavras de Weinreich; Labov; Herzog (2006 [1968], p. 125): Nem toda variabilidade e heterogeneidade na

estrutura linguística implica mudança; mas toda mudança implica variabilidade e heterogeneidade.

Por isso, o processo de variação pode dar pistas e indícios de uma mudança em andamento. O aparato teórico-metodológico laboviano permitiu a observação de tais pistas de mudanças linguística. Para Labov (2008 [1972]), existem fatores linguísticos e sociais que podem influenciar o processo de variação linguística. Ao longo de suas pesquisas, o autor notou que determinados fatores sociais pareciam ter relevância no processo de variação, configurando padrões sociais que se repetiam: idade, classe social, sexo e etnia.

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Idade e classe social

Labov (2008 [1972]) constatou que um processo de variação distribuído em informantes de diferentes faixas etárias e diferentes classes sociais poderia indicar uma mudança linguística em andamento.

Em relação à faixa etária, o pesquisador postulou que fala dos mais velhos poderia refletir a fala do passado, enquanto a fala dos mais jovens reflete a fala do presente. Trata-se de uma projeção do tempo real (fala antiga) no que o autor chamou de Tempo Aparente.

É importante frisar que essa hipótese pressupõe que a fala do indivíduo não se altera drasticamente ao longo dos anos, como se a maior parte de sua estrutura linguística permanecesse intacta até sua velhice.

Estudos mais recentes, como Paiva e Duarte (2003), já foram feitos com metodologias adotadas em que foi possível observar a mudança em tempo real, a fim de verificar possíveis alterações ocorridas na fala de indivíduos durante um período de sua vida ou dentro de uma comunidade de fala. As conclusões parecem apontar que a fala de algumas pessoas muda mais que a de outras ao longo da vida.

Labov (2008 [1972]) deixa claro que o fator da idade não é suficiente por si só para determinar o processo de mudança, pois nem sempre o curso da mudança se dá dos mais velhos para os mais jovens.

Em sua pesquisa realizada nas lojas de departamento em Nova York5, Labov (2008 [1972]) teve dificuldade para determinar o padrão estabelecido de acordo com a faixa etária dos vendedores, porque os dados das duas lojas de alto prestígio não convergiam: enquanto os informantes mais velhos que trabalhavam na Macy’s (segunda loja de maior prestígio social) apresentaram um elevado número de pronúncia de (r-1) total (variante de maior prestígio social), os informantes mais velhos que trabalhavam na Saks (primeira loja de maior prestígio social) apresentaram um índice mais baixo dessa variante.

Os resultados inesperados encontrados na loja Saks só podem ser explicados conjuntamente por outros dois fatores: classe social e grau de

5 Estudo realizado em 1962, em que o pesquisador analisou a fala de vendedores de três lojas

de departamento em Nova York: Saks, Macy’s e Kleins (cada uma com determinado grau de prestígio social, do mais alto ao mais baixo, segundo a ordem colocada aqui).

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insegurança linguística. Segundo o pesquisador, a insegurança linguística

compreende a forma como o grau de insegurança social de um falante se reflete em sua fala.

Labov (2008 [1972]) concluiu que os informantes mais jovens de ambas as lojas de alto prestígio possuem suas inseguranças linguísticas, por não terem atingido ainda o mesmo status social da loja em que trabalham. Segundo o autor, a transição de uma forma antiga para uma nova norma padrão compreende um

processo que se aprende tarde na vida (2008 [1972], p. 85).

Em relação aos informantes mais velhos, verificou-se que o grau de insegurança linguística é muito mais baixo nos vendedores da Saks, quase inexistente, pois eles já atingiram uma posição social almejada. São pessoas mais velhas e provavelmente a nova norma linguística em relação ao <r> ainda não havia começado a se implementar quando tais sujeitos eram jovens. Os vendedores mais velhos da Macy’s também não deveriam estar familiarizados com esse processo quando eram jovens, mas como ainda não atingiram a posição social almejada, atentam-se mais a sua fala:

A classe média desenvolve o uso de (r-1) cedo na vida – como uma expressão variável na formalidade relativa a ser encontrada em níveis estilísticos. Para os outros grupos da cidade de Nova York, não existe base sólida para (r-1) no estilo vernacular da fala casual; para eles, (r-1) é uma forma que requer alguma atenção ao modo de falar, se for usada. Tal como em tantas outras marcas formais de alternância de estilo, a classe média baixa exagera o processo de correção.” (LABOV, 2008 [1972], p. 85).

O grau de insegurança linguística depende da avaliação que se tem de uma variante, visto que quanto mais alto o grau de insegurança linguística dos informantes, mais será produzida a variante de alto prestígio social (hipercorreção).

A hipersensibilidade da classe baixa em relação às variantes inovadoras, e a possível hipercorreção dos informantes dessa classe, demonstraram o cruzamento dos dois fatores (idade e classe social) e como isso pode explicar o curso da mudança linguística.

Há casos em que o processo de mudança ocorre da classe média para a classe baixa (a variante de prestígio social é tomada como a variante inovadora

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e substitui a anterior) e há casos em que o caminho é contrário: a variante de menor prestígio social se dissemina da classe baixa para a classe média e substituiu a outra.

Por isso a noção de avaliação é de igual importância para o entendimento da mudança linguística, já que é por ela que se cristalizam formas linguísticas consideradas de alto prestígio social, que por sua vez, podem ser tomadas como formas padrão que norteiam os processos de hipercorreção.

Segundo Labov (2008 [1972]), a avaliação social é um mecanismo que não pode ser explicado de antemão por forças da estrutura social, ele deve ser explicado dentro da comunidade linguística.

Essas correlações objetivas demonstram claramente que algum mecanismo de interação social está em ação, o qual não pode ser o produto de simples pressões estruturais ou da simples imitação. Parece que a variação social desempenha um papel sistemático na mudança linguística. Para saber como, precisamos ver que informação social é comunicada por essas variações. A noção de prestígio precisa ser definida em termos das pessoas que a usam e da situação em que é usada; ou seja, retirada da área de especulação e posta sob o foco da investigação empírica. (p. 354)

Para o autor, a avaliação social possibilita o entendimento do funcionamento dos processos de variação, já que é por essa avaliação que se determina quais variantes são de prestígio social e quais não são. Em outras palavras, o valor que os falantes compartilham em uma comunidade de fala a respeito das variáveis linguísticas pode estar relacionado a possíveis substituições de determinadas variantes por outras, ou seja, à mudança linguística.

Sexo/gênero

Labov notou um padrão que se repetia ao longo de seus estudos: variantes de maior prestígio social são mais produzidas por mulheres que por homens. O autor explica isso da seguinte forma: pelo fato de as mulheres não terem seu status assegurado na sociedade, por terem se inserido tardiamente no mercado de trabalho, entre outras questões relacionadas ao papel

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subordinado da mulher em relação ao homem na cultura ocidental, a única maneira de manter determinada posição social é na língua.

Women are said to rely more on symbolic capital than men because they possess less material power. (...) It is interesting to note that no sociolinguistic argument views this behavior of women as a form of superiority or an advantage to them. However, this does emerge in the popular view that women speak better or more correctly than men do. In disadvantaged communities, sensitivity to exterior standards of correctness in language is associated with upward social mobility. (LABOV, 1990, p. 214)

Dessa forma, as mulheres veriam na língua uma possibilidade de ascensão social, mas é claro que não se trata de algo controlado por elas, isto é, plenamente consciente. Em contraposição, os homens, por terem condições financeiras (e/ou empregos) melhores que as mulheres, não possuem essa mesma necessidade, desse modo têm mais liberdade para produzir as formas consideradas de menos prestígio. Sustenta-se, nesse sentido, que há uma hipercorreção maior por parte das mulheres.

Labov (1966a) ainda atribui possíveis associações, no Ocidente, das variantes menos prestigiadas socialmente à virilidade, pois estas remetem à linguagem da classe operária, supostamente marcada pela masculinidade e pela rudeza.

No entanto, é de se considerar que tais conclusões datam o período entre as décadas de 1960 e 1970, quando os primeiros estudos de Labov foram realizados. É necessário reavaliar o fator sexo/gênero para os dias atuais, como assinala Freitag (2015)

Mas se a Sociolinguística tem como premissa, em tendência ampla, o estudo da relação entre língua e sociedade, precisa considerar que a sociedade muda; se a sociedade muda, as explicações do modelo teórico-metodológico deveriam, também, mudar: a explicação de as mulheres preferirem as formas padrão ou não estigmatizadas, por conta de seu papel como mães e educadoras, talvez fosse válida e pertinente nos anos 1960; hoje, não se pode dizer que é este o papel das mulheres na sociedade. (p. 17)

Referências

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