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A comunicação das alterações climáticas - um estudo sobre os efeitos do framing da saúde

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Academic year: 2021

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2º CICLO DE ESTUDO

MESTRADO EM CIÊNCIAS DA COMUNICAÇÃO – CULTURA, PATRIMÓNIO E CIÊNCIA

A Comunicação das Alterações Climáticas

Um estudo sobre os efeitos do framing

da saúde

Julia Maços de Oliveira Guttler

M

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Julia Maços de Oliveira Guttler

A Comunicação das Alterações Climáticas

Um estudo sobre os efeitos do framing da saúde

Dissertação realizada no âmbito do Mestrado em Ciências da Comunicação - Cultura, Património e Ciência, orientada pelo Professor Doutor José Manuel Pereira Azevedo

Faculdade de Letras da Universidade do Porto setembro de 2018

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A Comunicação das Alterações Climáticas

Um estudo sobre os efeitos do framing da saúde

Julia Maços de Oliveira Guttler

Dissertação realizada no âmbito do Mestrado em Ciências da Comunicação - Cultura, Património e Ciência, orientada pelo Professor Doutor José Manuel Pereira Azevedo

Membros do Júri

Professor Doutor José Manuel Pereira Azevedo Faculdade de Letras - Universidade do Porto Professora Doutora Helena Laura Dias de Lima

Faculdade de Letras- Universidade do Porto Professora Doutora Liliana Oliveira

Centro de Estudos de Comunicação e Sociedade - Universidade do Minho

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Sumário

DECLARAÇÃO DE HONRA ... 6 AGRADECIMENTOS ... 7 RESUMO ... 8 ABSTRACT ... 9 LISTA DE FIGURAS ... 10 LISTA DE INFOGRAFIAS ... 10 LISTA DE TABELAS ... 11 INTRODUÇÃO ... 12

CAPÍTULO I. A COMUNICAÇÃO DAS ALTERAÇÕES CLIMÁTICAS ... 18

ALTERAÇÕES CLIMÁTICAS: MAIS DO QUE UM FENÓMENO CIENTÍFICO, UMA IDEIA E UMA QUESTÃO SOCIAL ... 18

LACUNA DE CONHECIMENTO-AÇÃO (KNOWLEDGE-ACTION GAP) ... 22

DESAFIOS DA COMUNICAÇÃO DAS ALTERAÇÕES CLIMÁTICAS – A “SUPER WICKED COMMUNICATION PROBLEM” ... 25

Invisibilidade física e social do fenómeno ... 26

Aspetos geográficos: ... 27

Aspetos Temporais ... 27

Ceticismo quanto às ações propostas ... 28

Incerteza ... 28

Ausência de Sinais ... 29

Enquadramentos e modelos mentais inadequados ... 29

CAPÍTULO II. O FRAMING DAS ALTERAÇÕES CLIMÁTICAS ... 31

COMUNICAÇÃO PERSUASIVA E FRAMING ... 31

A Mudança Comportamental ... 32

A Comunicação Persuasiva e o Framing ... 38

OFRAMING APLICADO ÀS ALTERAÇÕES CLIMÁTICAS ... 44

Tipologia dos Framings das Alterações Climáticas ... 45

Enquadramento em termos de perdas e ganhos ... 51

O enquadramento do medo ... 53

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5

CAPÍTULO III. ALTERAÇÕES CLIMÁTICAS COMO UM PROBLEMA DE SAÚDE PÚBLICA ... 58

CONTEXTUALIZAÇÃO ... 59

OFRAMING DA SAÚDE E OS MEDIA ... 61

SAÚDE: UMA QUESTÃO DE RELEVÂNCIA PESSOAL ... 62

CREDIBILIDADE ... 65

FRAMING DA SAÚDE: UM ENQUADRAMENTO DE GANHOS DUPLOS ... 67

SIMILARIDADES ENTRE A COMUNICAÇÃO DE SAÚDE E A COMUNICAÇÃO DAS ALTERAÇÕES CLIMÁTICAS ... 68

CAPÍTULO IV. ESTUDO EMPÍRICO ... 70

QUESTÃO DE INVESTIGAÇÃO E HIPÓTESES ... 71

JUSTIFICAÇÃO DAS VARIÁVEIS INDEPENDENTES E DEPENDENTES ... 72

DESENHO METODOLÓGICO ... 72

PROCEDIMENTOS ... 72

PRODUÇÃO DOS CONTEÚDOS AUDIOVISUAIS E ESTRUTURA NARRATIVA ... 73

STORYBOARD E NARRATIVA - FRAMING AMBIENTAL: ... 77

PLATAFORMA DO EXPERIMENTO ... 79

DIVULGAÇÃO,RECRUTAMENTO E AMOSTRAGEM ... 80

ESTRUTURA DO INQUÉRITO ... 82

A ANÁLISE DOS DADOS ... 84

CAPÍTULO V. RESULTADOS DA INVESTIGAÇÃO ... 86

AMOSTRA:CARACTERIZAÇÃO DOS PARTICIPANTES ... 86

ENVOLVIMENTO E PERCEÇÕES GERAIS DOS INQUIRIDOS COM A TEMÁTICA ... 89

NÍVEL DE ENVOLVIMENTO POR GÉNERO, FAIXA ETÁRIA E NACIONALIDADE ... 95

EFEITOS PERSUASIVOS DO FRAMING DA SAÚDE ... 98

Aspectos gerais ... 98

Efeitos persuasivos do framing por variável sociodemográfica ... 101

CAPÍTULO VI. CONCLUSÃO E LIMITAÇÕES DO ESTUDO ... 118

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ... 121

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Declaração de honra

Declaro que a presente dissertação é de minha autoria e não foi utilizado previamente noutro curso ou unidade curricular, desta ou de outra instituição. As referências a outros autores (afirmações, ideias, pensamentos) respeitam escrupulosamente as regras da atribuição, e encontram-se devidamente indicadas no texto e nas referências bibliográficas, de acordo com as normas de referenciação. Tenho consciência de que a prática de plágio e auto-plágio constitui um ilícito académico.

Porto, 17 de setembro de 2018 Julia Maços de Oliveira Guttler

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Agradecimentos

Ao professor Azevedo, que foi impecável durante todo o processo, partilhando conhecimentos com enorme paciência, inspirando-me através do exemplo, em cada encontro de orientação, a prosseguir na carreira académica.

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Resumo

O aumento do conhecimento sobre as alterações climáticas não implicou nas mudanças comportamentais tão necessárias para a redução da problemática, que ainda é marcada por uma limitada adoção de comportamentos pró-ambientais. O framing de mensagens sobre as alterações climáticas é, por sua vez, considerado um recurso eficaz no âmbito da comunicação persuasiva sobre o tema, já que, a depender da forma como as ACs são enquadradas, podem evocar diferentes atitudes no recetor, desencadeando mudanças comportamentais igualmente distintas. Nos últimos anos, o framing da saúde ganhou proeminência, crescendo o número de investigações centradas nos efeitos desta abordagem sobre as atitudes, perceções e predisposição para adoção de comportamentos pró-ambientais. Esta investigação visa contribuir para a reflexão e, através de um estudo empírico, testou os efeitos do framing da saúde, comparando-os aos efeitos do framing ambiental da mesma mensagem. O estudo concluiu que os framings testados variam em eficácia de acordo com os segmentos da amostra e com o comportamento pró-ambiental a ser adotado, revelando, portanto, que o nível de eficácia de cada framing depende das características da audiência e dos objetivos de comunicação. Neste sentido, o uso estratégico deste recurso na comunicação das ACs deve incluir a segmentação da audiência de acordo com as características do grupo ao qual a mensagem está a ser dirigida.

Palavras-chave: framing; comunicação das alterações climáticas; eficácia comunicativa;

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Abstract

Increasing knowledge about climate change has not generated the behavioural changes that are so necessary to reduce the problem, which is still marked by a limited adoption of pro-environmental behaviour. The framing of messages about climate change is, in turn, considered an effective resource in the context of persuasive communication on the subject, since, depending on the way in which climate change is framed, it evokes different attitudes in the recipient, triggering different behavioural changes. In recent years, health framing has gained prominence, increasing the number of investigations centred on the effects of this approach on attitudes, perceptions and predisposition for adopting pro-environmental behaviours. This research aims to contribute to this area of investigation and, through an empirical experiment, tested the effects of health framing, comparing the effects of environmental framing of the same message. The study concluded that the frames tested vary in effectiveness according to the segments of the sample and with the pro-environmental behaviour to be adopted, thus revealing that the effectiveness of each framing depends on the characteristics of the audience and the communication objectives. In this sense, the strategic use of this resource in the communication of the climate must include segmentation of the audience according to the characteristics of the group to which the message is addressed.

Keywords: framing; communication on climate change; effective communication;

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Lista de Figuras

Figura 1: The action Gap on Climate Change(Bushell, Buisson, Workman, & Colley,

2017) ... 23

Figura 2: A Teoria da Ação Racional contemplando as variáveis externas (Moutinho e Roazzi, 2010). ... 35

Figura 3: Modelo Transteórico ... 36

Figura 4: Plataforma do experimento - site ... 79

Figura 5: Caminho dos participantes no site ... 80

Figura 6: Flyer de divulgação da investigação ... 81

Figura 7: Dados Sociodemográficos ... 88

Figura 8: Envolvimento (número total de ações que estaria disposto a adotar) ... 91

Lista de Infografias

Infografia 1: Dimensões do framing – adaptação de Entman (1993) ... 37

Infografia 2: Fases da Tomada de Decisão – Adaptado de conteúdos Pelletier e Sharp, 2008 ... 43

Infografia 3: Framings adicionais das ACs ... 51

Infografia 4: Estrutura dos vídeos ... 76

Infografia 5: Storyboard vídeo framing ambiental ... 77

Infografia 6: Storyboard vídeo framing saúde ... 78

Infografia 7: Efeitos do framing sobre a amostra ... 100

Infografia 8: Efeitos do framing sobre as nacionalidades ... 103

Infografia 9: Efeitos dos framings sobre os géneros ... 108

Infografia 10: Efeitos do framing sobre as faixas etárias ... 110

Infografia 11: Efeitos dos framings por área de estudos ... 114

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Lista de Tabelas

Tabela 1: Adaptações de (Nisbet M. C., 2009; Nisbet M. C.2008) ... 46 Tabela 2: Grupos do Facebook - divulgação da promoção ... 82 Tabela 3: Estrutura do inquérito ... 84

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Introdução

A temperatura do mundo subiu nos últimos cinquenta anos – uma elevação atribuída principalmente à ação humana, através das emissões de gases de efeito estufa (GEEs)1. O

Painel Intergovernamental para as Mudanças Climáticas (IPCC), entidade referência na consolidação da investigação científica sobre o tema, prevê que a temperatura média continuará a subir durante o século XXI, entre 1,1 e 6,4º C, o que representaria riscos graves para a vida como a conhecemos hoje 2 (IPCC, 2015).

Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), as alterações climáticas (ACs) são a maior ameaça global à saúde do século XXI, com impactos diretos sobre a morbidade e a mortalidade3. Publicações como o British Medical Journal corroboram e afirmam que a

incapacidade de cortar as emissões provavelmente irá levar a sociedade a uma catástrofe global na área da saúde. (Jay M, 2009).

A sensibilização sobre a relação entre as ACs e a saúde pública tem vindo a crescer na última década. Relatórios científicos produzidos por organizações como o IPCC (Intergovernmental Panel on Climate Change), o Lancet e a OMS (Organização Mundial de Saúde) discorrem acerca dos potenciais desgastes para a saúde que a sociedade pode enfrentar, havendo consenso na esfera científica de que a severidade e a diversidade de impactos acompanharão este aumento.

Apesar de crescente, o debate e o diálogo sobre a relação entre as alterações climáticas e a saúde ainda são limitados, o que em parte se deve a incertezas e lacunas de conhecimento na área, que dificultam a compreensão. Uma consequência, no entanto, é certa: embora as evidências atuais ainda não sejam suficientes para prever a escala dos

1 The IPCC is now 95 percent certain that humans are the main cause of current global warming. In addition, the SYR finds that the

more human activities disrupt the climate, the greater the risks of severe, pervasive and irreversible impacts for people and ecosystems, and long-lasting changes in all components of the climate system. The SYR highlights that we have the means to limit climate change and its risks, with many solutions that allow for continued economic and human development.

2 Disponível em: https://www.ipcc.ch/ - Acesso em: 10.04.2018

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13 impactos com exatidão, há concordância de que os efeitos das alterações climáticas na saúde irão aumentar. (Jay M, 2009).

Diante de um cenário pouco animador, permanece entre a comunidade científica a necessidade de continuar a expandir a investigação existente, no intuito de avançar na compreensão da relação entre clima e saúde. Mas há ainda uma componente essencial a ser investigada em maior profundidade, que vai além das ciências naturais e da saúde: a comunicação social.

As alterações climáticas deixaram de ser apenas um fenómeno físico, quantificável e mensurável, como durante muitas décadas foram apresentadas pela comunidade científica. Desde que as ACs e os seus riscos foram expostos à sociedade, o fenómeno ganhou uma nova dimensão e tornou-se simultaneamente um fenómeno social, uma “ideia”, ultrapassando suas origens na área das ciências naturais (Hulme, 2009, p. xxv).

Conforme citado anteriormente, a ação humana é o principal elemento desencadeador do fenómeno, principalmente devido a uma atuação sobre o planeta ancorada na produção de energia a partir da queima de combustíveis fósseis. Desde a Revolução Industrial, os efeitos das atividades humanas sobre o clima têm excedido em muito os impactos provocados por processos naturais (IPCC, 2015).

A nível global, vários governos mobilizaram-se desde o momento em que as evidências do fenómeno foram comprovadas e seguiram-se inúmeras conferências para debater o tema e acordar ações para transformar o quadro. Entre os últimos acordos significativo, o acordo climático de Paris foi assinado por 195 países4 com o objetivo de restringir o

aumento da temperatura global a dois graus. Entretanto, a perspetiva, aparentemente animadora, tem exequibilidade questionável. De acordo com um estudo recente (E. Raftery, Zimmer, M. W. Frier, Startz, & Liu, 2017), baseado nas tendências atuais de emissões, as hipóteses de que a temperatura se limite a esta meta são de apenas 5%5. Para

evitar este quadro, e fazer cumprir o acordo, seriam necessários um alto envolvimento da

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https://www.publico.pt/2018/09/11/ciencia/noticia/guterres-da-prazo-de-dois-anos-a-lideres-politicos-para-lutar-contra-as-alteracoes-climaticas-1843661 Acesso em: 14.09.2018

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14 população, uma mobilização de várias esferas e, em última instância, mudanças comportamentais significativas.

É justamente devido à existência de múltiplas condicionantes, como as citadas acima, que o IPCC projeta o aumento da temperatura em intervalo de incerteza, com uma variação que dependerá dos passos que serão tomados. Esperar-se-ia não ser difícil gerar tal mobilização, tendo em vista que os riscos atingem a própria população, a qual seria também a maior beneficiada pelas suas próprias mudanças comportamentais. Mas, assim como noutras esferas, nem sempre é fácil levar a população à compreensão dos riscos envolvidos nas ACs. Mostra-se mais difícil ainda converter tal sensibilização em adoção de novos comportamentos.

É de salientar que, nas últimas décadas, a questão climática deixou a esfera restrita da ciência e adquiriu um novo patamar. A temática ganhou visibilidade nos media, conquistou outros segmentos da sociedade, tornando-se uma questão de interesse público. (Carvalho, 2011) Ao mediar e difundir o conhecimento, e as informações já conhecidas sobre o fenómeno, os meios de comunicação consolidaram-se como ferramentas essenciais para a sensibilização sobre esta problemática (Mercado, 2015).

Entretanto, apesar do aumento do nível de conhecimento sobre as alterações climáticas, tornou-se evidente que tal progresso não bastou para conter os seus avanços. Apenas comunicar a sua ocorrência e causas não foi suficiente para envolver a população na adoção de comportamentos e práticas menos nocivas para o meio ambiente, conforme o modelo do défice de informação, tradicionalmente aplicado em estudos sobre a compreensão pública da ciência, previa (Hulme, 2009).

O modelo atribui à ausência de informação a culpa pelo ceticismo e falta de ação perante os dados científicos, partindo do pressuposto de que melhorar a transmissão de informações do especialista para o público leigo implicaria na tomada de ação face à problemática. Hulme aponta que esta interpretação não consegue, por si só, explicar a inércia diante dos dados científicos, já que outras barreiras psicológicas, emocionais e comportamentais, que vão além da falta de conhecimento e da incerteza científica, dificultariam a aceitação do fenómeno pelo público. Segundo o autor, o modelo percebe

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15 a comunicação como uma via de mão única. (Hulme, 2009). Torna-se, portanto, imprescindível entender os motivos que levam a sociedade a continuar a adotar práticas que contradizem o conhecimento científico da área.

Allen (2016) propõe, para uma mensagem eficiente, que os indivíduos sejam conduzidos a um processo cognitivo que resultem nestas transformações. Identificar o que os move a adotar práticas menos nocivas incluiria uma abordagem holística, que leva em conta conhecimentos de diferentes disciplinas, como a psicologia e as ciências sociais (Bradley e Joseph P. Reser, 2016). Mapeamentos comportamentais e a ampliação do conhecimento desta dinâmica podem ser determinantes para o sucesso de iniciativas que procurem instigar mudanças comportamentais e de estilo de vida, tão necessárias para a solução da problemática das alterações climáticas.

Para além de uma maior compreensão sobre os processos de mudança comportamental, é igualmente necessário compreender em que medida estratégias de comunicação persuasiva, entre elas o framing, podem contribuir para uma melhor construção da mensagem sobre a problemática das alterações climáticas. Este conhecimento pode ser valioso para aumentar o caráter persuasivo da comunicação sobre o tema e a sua eficácia, servindo de base para uma estratégia mais ampla de ações que visem estimular comportamentos pró-ambientais e reverter um panorama potencialmente dramático.

Argumentar de forma eficiente, de modo a compartilhar com o outro uma determinada visão de mundo, é essencial no processo de persuasão. Um dos elementos que afetam o processo cognitivo que leva ao convencimento é o framing, cuja eficácia já foi demonstrada em inúmeras pesquisas, as quais verificaram que as diferentes possibilidades de enquadrar as informações sobre as alterações climáticas alcançam resultados variados e impactos diversos junto dos públicos (Pidgeon, 2010). O enquadramento, segundo Oliveira, pode influenciar atitudes e comportamentos, ao sistematizar a informação e torná-la relevante, interessante e apelativa (Oliveira & Carvalho, 2012). Nisbet e Scheufele apontam que o framing é frequentemente utilizado enquanto argumento interpretativo, desencadeando uma linha de pensamento que orienta o nível de importância atribuído a uma questão, decisão ou ação em detrimento de outras. Nesta perspetiva, o framing também operaria definindo os agentes e protagonistas de

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16 determinados âmbitos de atuação, orientando as opções políticas (Nisbet 2009a; Nisbet e Scheufele 2009, Nisbet & Newman, 2015).

A técnica do framing assume um papel especialmente relevante na abordagem de questões complexas, pois ajuda as audiências a darem sentido a informações difíceis de serem assimiladas pelo público em geral (Oliveira & Carvalho , 2012). Dependendo do ângulo como a questão é tratada, a ideia das alterações climáticas carrega consigo diferentes sentidos, o que, por sua vez, implica diferentes sequências de atuação sobre a problemática. (Hulme, 2009)

A investigação proposta pretende analisar em que medida o artifício persuasivo do framing impacta as perceções, atitudes e comportamentos sobre as alterações climáticas na esfera individual, com potencial de facilitar e influenciar atitudes pró-meio ambiente.

Centrando-se no framing da saúde, o estudo visa explorar os resultados deste tipo de abordagem na comunicação das ACs, e mais precisamente os impactos que podem ter na perceção do tema e na predisposição para uma mudança comportamental ao nível individual.

Tendo em vista a aceleração dos efeitos das alterações climática e as previsões dramáticas que vêm sendo apontadas pela comunidade científica, a pesquisa justifica-se pela urgência de gerar conhecimentos que possam influenciar positivamente o cenário, através de abordagens comunicacionais que mobilizem os indivíduos para atuarem sobre a problemática.

Salienta-se ainda que a literatura sobre o framing da saúde, aplicado às mensagens sobre as alterações climáticas, quando comparada ao número de estudos sobre os efeitos de outros framings do mesmo tema, ainda é pouco vasta, o que evidencia a importância de desenvolver investigações nesta área.

Partindo do princípio de que os contributos da comunicação persuasiva podem ser estratégicos para estimular comportamentos pró-ambientais, a investigação debruçou-se sobre três fatores-chave para prever as mudanças comportamentais: as atitudes, as

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17 perceções sobre o fenómeno e a predisposição ou motivação para adotar comportamentos pró-ambientais.

Num estudo empírico realizado no ambiente online, foram comparados dois framings da mesma mensagem sobre as alterações climáticas, no intuito de estabelecer relações causais com a perceção e atitudes evocadas no recetor da mensagem e a sua disposição para a adoção de comportamentos pró-ambientais.

A pesquisa teve como objetivo ampliar a reflexão sobre o papel da comunicação enquanto instrumento de mobilização para a adoção de comportamentos pró-ambientais e avançar no conhecimento sobre os elementos comunicativos que mobilizam o comportamento, procurando, mais precisamente, refletir sobre os efeitos do framing da saúde nas perceções, atitudes e envolvimento com as ACs.

No capítulo 1, serão discutidas algumas dimensões da comunicação ambiental com maior enfâse para a comunicação das ACs. Esta secção introduz a temática e o objeto deste estudo: o framing das alterações climáticas. O segundo e terceiro capítulos aprofundam o conceito em causa e procedem a revisão da literatura, propondo em seguida uma reflexão sobre como a abordagem da questão, na perspetiva da saúde, pode promover novas dinâmicas de comportamento face às alterações climáticas.

A metodologia e os resultados do estudo empírico ocupam os capítulos quatro e cinco, seguidos de uma última secção reservada para a discussão e considerações finais. Para conduzir a investigação, optou-se pelo método experimental, com abordagem quantitativa. Através da realização de um experimento dentro de um ambiente online, pretendeu-se obter dados quantitativos que permitam estabelecer relações causais entre o framing da saúde e os comportamentos, atitudes e perceções individuais dos participantes.

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Capítulo I. A Comunicação das Alterações Climáticas

“Climate change has become a metaphor for the imagined future of human life and civilisation on Earth.” (Hulme, 2013, p.208)

Alterações Climáticas: mais do que um fenómeno científico, uma ideia e uma questão social

De forma análoga ao que ocorre com outras problemáticas sociais, as alterações climáticas (ACs) não são construídas enquanto questão de forma objetiva, mas sim mediadas por um contexto comunicacional, seja através dos media, seja por meio das interações com amigos, familiares, escola, igreja, etc. (Hulme, 2013; Carvalho, 2002).

Neste sentido, a existência material e física do fenómeno não implica o seu reconhecimento público, que depende de uma construção de sentido estabelecida numa arena retórica ou discursiva, onde são promovidas a discussão sobre os valores sociais, políticos e éticos que circundam o tema (Hansen, 2015; Carvalho, 2002). Fundamentado na Teoria Construtivista, Hulme (2013) afirma que para além de um fenómeno físico, as alterações climáticas são um fenómeno social – uma “ideia”, marcada pelo hibridismo entre a sua realidade física e a realidade experimentada pelos indivíduos socialmente.

A temática das alterações climáticas está presente em diferentes esferas públicas (política, relações internacionais, indústria, direito, religião, etc.). Em cada uma destas, evoca interpretações, sentidos e ideologias distintos na abordagem ao tema, apresentando os atores sociais (cientistas, políticos, economistas, etc.), que, por sua vez, vão competir por fazerem ouvir a sua posição em um cenário diverso em interesses e valores, no qual as políticas relacionadas às ACs serão decididas (Carvalho, 2002)

Devido as implicações culturais do fenómeno, existe por parte dos investigadores uma tendência crescente para estudarem a problemática sob a perspetiva social e comunicativa. As investigações visam ir além de uma ciência focada apenas nos aspetos físicos das ACs, buscando preencher as lacunas de conhecimento acerca da forma como

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19 a “ideia” das alterações climáticas é construída e apropriada e como os valores e perceções sociais se relacionam com a temática. (Hulme, 2013)

A ausência de consenso, ou de casos anteriores semelhantes que permitam alguma aprendizagem e as implicações imprevisíveis das ACs são elementos que tornam o fenómeno um “super wicked problem” (Hulme, 2013), e implicam uma inerente complexidade comunicativa, que torna a temática extremamente difícil de ser compreendida, especialmente pelo público leigo (Levin, Cashore, & Bernstein, 2004; Hulme, 2013).

Nos últimos anos, investigações no campo da comunicação procuraram avançar na compreensão sobre os aspetos que dificultam a assimilação pública do tema, proporcionando progressos significativos de conhecimento sobre a eficácia das diferentes formas de abordar o assunto. A comunicação das mudanças climáticas tornou-se um campo de estudos próprio, que, entre outros, investiga de que forma suas representações nos media exercem influência sobre a perceção pública do fenómeno e as dificuldades em explicá-lo à audiência, que tendem a perceber a questão com distanciamento e sem associação às suas experiências pessoais. (Bushell, Buisson, Workman, & Colley, 2017; Nerlich, Brown, & Koteyko, 2009; Moser and Dilling, 2007; Cox, 2015)

A comunicação das alterações climáticas é o tema abordado neste capítulo, que visa dar início à reflexão sobre os desafios comunicativos enfrentados na área e as potenciais soluções para facilitar o diálogo e a compreensão pública do fenómeno e sua gravidade.

A Emergência da Comunicação das Alterações Climáticas

Apesar de o termo comunicação ambiental só ter sido adotado por profissionais e académicos a partir da década de 60, a comunicação sobre o meio ambiente remonta aos primórdios da existência humana e da interação do homem com a natureza (Jurin, Roush, & Danter, 2010). Os anos 80, no entanto, são considerados determinantes para o início da repercussão sobre as questões ambientais para além do âmbito da ciência. (Loose, 2017). Desde que, em 1988, James E. Hansen, cientista-chefe do Instituto Goddard de Estudos Espaciais da NASA, anunciou a deteção do efeito estufa e das mudanças do clima com 99% de certeza, o aquecimento global e as alterações climáticas despontaram enquanto

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20 notícia mundial, observando-se um aumento significativo da cobertura dos media sobre o tema e, sobretudo na Europa e EUA, observa-se o desenvolvimento de uma maior conscientização ambiental e o surgimento da noção de crise nesta área (Moser & Dilling, 2007; Carvalho, Pereira, Rodrigues, & Silveira, 2011). Ambos os fenómenos se consagraram, provavelmente, como os principais protagonistas na área da comunicação ambiental.

A comunicação ambiental descreve as formas e os fóruns nos quais cidadão e diferentes setores da sociedade atuam para aumentar a sensibilização e influenciar o comportamento e decisões que afetam o planeta, partindo do princípio de que a compreensão e a ação sobre a questão não dependem apenas da comunidade científica, mas também do debate presente nos media e noutras formas de comunicação interpessoal. Assim, a comunicação ambiental envolve a aplicação de abordagens, princípios, estratégias e técnicas comunicacionais na gestão e proteção do meio ambiente e na troca de informação e disseminação de conhecimento sobre o mesmo. (Cox R. , 2010).

Investigadores como Cox supõem que avançar na compreensão sobre os processos comunicativos relacionados ao meio ambiente, e sobre as culturas e contextos em que ocorrem, seja benéfico, na medida em que este conhecimento viabilizaria a capacidade de resposta das sociedades perante situações que afetam o seu próprio bem-estar. (Cox, 2015) Devido ao seu papel fundamental na redução e na adaptação às alterações climáticas, a comunicação do fenómeno encontra-se atualmente inserida numa agenda mais ampla e estratégica para gerar envolvimento e participação entre os indivíduos. (Mercado, 2015; Cox, 2015).

Tal importância, adquirida ao longo das últimas décadas, tornou-se visível em tratados internacionais, que recorrentemente enfatizam o papel de destaque da comunicação social para a sensibilização do público na direção de uma atuação mais sustentável. Um dos exemplos mais emblemáticos pôde ser observado já em 1992, durante a Cúpula da Terra no Rio de Janeiro, quando um apelo aos media evidenciou a importância do envolvimento do setor na solução da problemática. Este é apenas um de muitos exemplos que ilustram a relevância dada ao envolvimento e compromisso na divulgação de informações por

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21 profissionais desta área, entendidos como indispensáveis para sensibilizar a população em relação à preservação do meio ambiente (Mercado, 2015).

A comunicação ambiental é também uma ferramenta instrumental e, na perspetiva pragmática, adquire objetivos claros: através de técnicas de comunicação tradicionais, visa produzir respostas sociais que possam contribuir para a resolução de problemas ambientais. (Cox R. , 2010)

Analogamente à comunicação de outras temáticas, como a saúde, economia, política, etc., os media convidam o público a assumir uma perspetiva particular no que tange às alterações climáticas. Isto considerando que os meios de comunicação destacam certos valores, direcionam a atenção do público para assuntos específicos em detrimento de outras temáticas, que, por sua vez, têm o nível de atenção que lhes é imputado pela sociedade reduzido. (Carvalho, 2002)

No entanto, aspetos distintos permitem diferenciar a comunicação das alterações climáticas de outros tópicos, especialmente em relação à sua inerente complexidade. Ao englobar uma pluralidade de dimensões – entre outras, materiais, culturais, sociais, económicas e políticas –, a problemática enfrenta desafios pouco observados noutras arenas de discurso (Hansen, 2015).

Os media são a principal fonte de informação sobre as alterações climáticas. Segundo Carvalho, a comunicação social funciona como um mediador entre os cientistas e os cidadãos. Assim, os media “são atores centrais na formulação, reprodução e transformação do significado deste problema complexo e uma arena fundamental para a legitimação e/ou crítica de opções políticas e económicas” (Carvalho, 2011, p105).

Apesar do tema ser frequentemente retratado, a cobertura ainda se mostra pouco equilibrada e sistemática no que tange à frequência e é marcada por momentos cíclicos, que variam de acordo com ganchos factuais e o critério valor-notícia (Loose, 2017; Carvalho, 2011). Os valores-notícia das alterações climáticas surgem particularmente vinculados à ocorrência de eventos climáticos extremos, à realização de conferências e reuniões políticas e à publicação de resultados científicos ou relatórios que

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22 periodicamente sintetizam o conhecimento na área (Moser, 2010; Carvalho, 2011; Loose, 2017). Um dos motivos que explica o aspeto cíclico também advém da limitação do espaço, típica dos media, que acarreta a competição pela exposição das ACs frente a outras temáticas (Mazur, 1984; Ungar, 1992, Mazur e Lee, 1993 apud Hansen, 2015).

Trumbo (1996) e Nisbet & Huge (2007) investigaram os estágios que marcam o aspeto noticioso cíclico das framing, marcado por variações quanto às fontes de informação às quais os media recorrem na busca por credibilidade. Inicialmente, a abordagem do assunto versaria para o diagnóstico do problema e as suas causas, com uma clara preferência por fontes científicas. Os estágios posteriores, que assinalariam a busca por soluções, seriam marcados pela presença de vozes relacionadas a grupos governamentais e sociais. (Dunwoody, 2015)

Para além das dinâmicas com que o tema é retratado pelos media, a necessidade de comunicação eficaz (orientada para resultados) é essencial para aumentar o apoio a políticas que contribuam para a adaptação e redução dos desgastes causados pelo fenómeno. Face a um consenso científico cada vez maior a respeito das suas causas antropogénicas, a população assume protagonismo na transformação do quadro atual, e, neste sentido, a comunicação persuasiva, dirigida para promover a adoção de comportamentos mais sustentáveis e gerar envolvimento com a questão tornaram-se condicionantes para promover as transformações necessárias. (Moser & Dilling, 2007)

Lacuna de Conhecimento-Ação (Knowledge-action Gap)

Num primeiro momento, as estratégias para envolver a população com a questão das ACs versaram maioritariamente sobre o aumento da disponibilidade de informações. Se, é verdade que a iniciativa aumentou o nível de atenção dedicado ao tema, verificou-se, por outro lado, que a compreensão e a sensibilização sobre a urgência de atuar perante o problema não acompanharam tal crescimento, existindo uma baixa conversão das atitudes em adoção de comportamentos com potencial para reduzir os efeitos negativos do fenómeno. (Nisbet M. C., 2009a; Carvalho & de Oliveira, 2012a).

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23 Estudos anteriores verificaram que o alto nível de sensibilização e a maior compreensão da ciência por detrás das mudanças climáticas não se traduziram em ações, mudanças de comportamento e envolvimento significativos (Moser, 2007; Bushell, Buisson, Workman, & Colley, 2017). Constata-se atualmente a existência de um hiato entre as ações sugeridas pela comunidade científica para conter o problema e o que objetivamente está a ser implementado por governos, indústrias e população. (Bushell, Buisson, Workman, & Colley, 2017) (ver Figura 1)

Figura 1: The action Gap on Climate Change(Bushell, Buisson, Workman, & Colley, 2017)

Muitos autores já se debruçaram sobre a "lacuna de conhecimento-ação6", fenómeno que

até ao presente não conseguiu ser explicado de forma definitiva (Kollmuss & Agyeman, 2002 apud Cheng, 2011). Para Moser, uma “melhor comunicação” está para lá de simplesmente planear formas mais eficazes de transmitir informações para o público leigo. (Moser & Dilling, 2007)

Nos seus primórdios, a comunidade científica e responsáveis por políticas públicas subscreveram uma visão na qual o público era percecionado como carente de informações

6 Knowledge-action gap

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24 e educação. O Modelo do défice de Informação (Knowledge Action Gap) sugeria que a disseminação de conhecimentos levaria à conformidade entre as atitudes dos leigos com os preceitos indicados por especialistas e fundamentados por dados científicos. (Nerlich, Brown, & Koteyko, 2009)

Os resultados de um estudo realizado por Oliveira & Carvalho em Portugal comprovaram que esse modelo não pôde ser integralmente verificado na prática, concluindo que o aumento do índice de conhecimento da população portuguesa sobre a problemática desde o final dos anos 90 não resultou na adoção de atitudes e comportamentos consistentes (Oliveira & Carvalho, 2012).

Conclusões semelhantes foram encontradas em estudos efetuados junto da população europeia. Ao analisar dados do Eurobarómetro e do Energy Saving Trust 2007, Spence e Pidgeon chegaram a resultados parecidos para o resto da Europa, verificando que, embora as mudanças climáticas fossem percebidas como uma questão importante e preocupante, tanto no Reino Unido quanto no resto dos países europeus, grande parte da população ainda não adotou comportamentos mais responsáveis (Spence & Pidgeon, 2010). O cenário não se limita à Europa. No resto do mundo, é possível encontrar versões parecidas dos mesmos estudos, comprovando que, especialmente no que se refere às atitudes e, em última instância, à mudança comportamental, a comunicação das alterações climáticas tem muitos pontos de interrogação a serem respondidos.

Para Nisbet, pressupor ser suficiente trazer os factos e dados à luz implicaria ignorar o princípio básico de que a comunicação transcende um simples processo de transmissão de informações. O Modelo do défice, segundo o autor, subavalia a participação do recetor na absorção da informação, ao presumir que o mesmo conteúdo seria interpretado pelos mais diversos públicos de forma semelhante. (Nisbet M. C., 2009) Mais do a mera transmissão de dados, a comunicação das ACs é uma “negociação de sentido”, influenciada pelas perceções e outros aspetos cognitivos, afetivos e ideológicos do recetor da mensagem (Oliveira & Carvalho, 2012)

O facto de que o aumento da visibilidade do tema no debate público não tenha resultado na diminuição das emissões de carbono justifica, por si só, a crítica da comunidade

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25 científica sobre a eficácia dos atuais esforços de comunicação. (Nerlich, Koteyko, & Brown, 2008). Perante as evidências cada vez mais alarmantes, é agora crucial, mais do que nunca, refletir sobre a eficácia da comunicação sobre as alterações climáticas e os seus desafios, no intuito de possibilitar formas de comunicação que ativem as mudanças comportamentais tão necessárias para transformar o panorama atual.

Refletir sobre a comunicação das alterações climáticas exige avançar no conhecimento sobre as caraterísticas que a distinguem da comunicação sobre outras questões, como a política, a economia, a saúde e até mesmo outros temas relacionados com o meio ambiente. Por sua vez, esta reflexão deve passar pelo questionamento sobre até que ponto os preceitos de comunicação, tradicionalmente aplicados a outras temáticas, podem ter sucesso na abordagem das mudanças climáticas.

Desafios da Comunicação das Alterações Climáticas – a “super wicked

communication problem”

Conforme citado na abertura deste capítulo, as alterações climáticas são consideradas um “superwicked problem”, um termo atribuído à problemática devido a quatro pressupostos-chave que lhe são próprios: o tempo necessário para sua resolução é escasso; os culpados pelo problema são simultaneamente responsáveis pela sua solução; a autoridade necessária para combater a problemática é fraca ou inexistente; e as respostas políticas mostram-se irracionais quando relacionadas à escala do problema (Hulme, 2009). Segundo Levin, Cashore, & Bernstein (2004), a combinação destas caraterísticas faz com que técnicas conhecidas para elaboração de políticas não estejam preparadas para identificar soluções para a problemática. Presume-se que, em certa medida, o mesmo despreparo abranja à comunicação do tema, sendo possível apontar as alterações climáticas como um “super wicked communication problem”.

O histórico da comunicação sobre o tema comprovou que nem sempre foi fácil envolver o público na temática, e um vasto número de investigações debruçou-se sobre as caraterísticas que tornam as mudanças climáticas um assunto de baixo envolvimento, identificando a invisibilidade, a falta de imediatismo e a distância geográfica dos efeitos da mudança do clima como algumas de suas inerentes características que dificultam o

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26 envolvimento social com o fenómeno. Acrescenta-se ainda o aspeto temporal, que coloca os benefícios de comportamentos menos nocivos num plano futuro, apesar de as ações deverem ser adotadas no presente. (Moser & Dilling, 2007) Estas caraterísticas não só separam as alterações climáticas do quotidiano e das preocupações mais imediatas da população, mas contribuem igualmente para que a sua cobertura noticiosa atue em dinâmicas que atrapalham a recorrência do tema, já que estes elementos vão de encontro a alguns preceitos de valor-notícia e dificultam uma cobertura aprofundada e sistemática das ACs pelos media. (Loose, 2017)

Para dar continuidade a esta seção, serão elencados alguns dos desafios relacionados com a comunicação do tema, os quais contribuem para o frequente insucesso no envolvimento da população. Por insucesso, assume-se nesta dissertação uma perspetiva instrumental e pragmática da comunicação das alterações climáticas, na qual a mesma tem objetivos pré-definidos: mudar atitudes e transformar comportamentos.

Invisibilidade física e social do fenómeno

Segundo Buschell et al, os indivíduos precisam de evidências para mobilizarem-se para determinada ação. (Bushell, Buisson, Workman, & Colley, 2017), entretanto, as mudanças climáticas são um problema quase invisível e mesmo os aspetos climáticos, física e visivelmente manifestos (mudanças de padrões, estações do ano, temperatura, etc.), podem ou não estar associados ao fenómeno, o que atrapalha a perceção dos cidadãos sobre sua efetiva ocorrência (Nerlich, Brown, & Koteyko, 2009). Adicionalmente, o gás de efeito estufa não possui odor ou cor, e a sua crescente concentração na atmosfera não pode ser materialmente observada, inviabilizando uma ampla noção de que comportamentos recorrentes, relacionados às práticas e estilo de vida atuais, como o uso de carros e de energia, possam ser prejudiciais ao meio ambiente. (Loose, 2017) Loose acrescenta que os riscos do fenómeno só são percebidos nas suas manifestações quando já se tornaram acontecimentos concretos, transformando-se em eventos catastróficos para a população. (Ibidem) Carvalho acrescenta que, mesmo para os especialistas, a problemática exige uma rede científica, técnica e institucional para ser cognoscível (Carvalho, 2002)

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27 A invisibilidade diz respeito ainda aos efeitos sociais do fenómeno, que ainda não são experimentados diretamente com a mesma intensidade de outras problemáticas, como a económica (perdas de emprego), a saúde pública (obesidade), etc. (Moser e Dilling, 2007)

No que tange aos media, Loose apresenta a “invisibilidade” como um contratempo para a emergência do tema enquanto notícia, já que “os jornalistas esperam eventos “reais”, pois a sua prática fundamenta-se no acontecimento e não na previsão deste. A não existência de uma manifestação concreta pode ser vista como especulação por estes profissionais, que não costumam trabalhar com projeções ‒ e sim com factos.” (Loose, 2017, p. 7)

Aspetos geográficos:

Os impactos do aquecimento global são geralmente percecionados como remotos e localizados em regiões distantes do globo. Não obstante o caráter apelativo e impactante das imagens de eventos extremos, ou do sofrimento da fauna e da biodiversidade, grande parte da população não se sente atingida ao nível pessoal. As alterações climáticas e o aquecimento global competem por atenção em situação de desvantagem frente a ameaças e preocupações pessoais diretas, com riscos imediatos a nível local, como doenças, pobreza, condições insalubres, guerras, etc. (Moser & Dilling, 2007).

Ao perceber as alterações climáticas como um problema global, a população tende a desvalorizar a presença da problemática no local onde habitam, intensificando-se a inércia para adotar ações que poderiam contribuir para o cenário. Carvalho acredita que intensificar a atenção para o âmbito local ajudaria a aproximar a população do tema, no entanto, sua cobertura abrange com maior recorrência o caráter global, destacando cimeiras e eventos que não estão necessariamente ao alcance da população leiga. (Carvalho, 2011)

Aspetos Temporais

Também no que diz respeito aos aspetos temporais, os media encontram limitações para noticiar um problema que já foi há muito tempo identificado e evocar o valor-notícia de

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28 novidade. Para que a imprensa volte a informar sobre algo anteriormente conhecido, é necessário evocar elementos inéditos, algo extremamente difícil no caso das ACs, que é caracterizada pela lentidão de seu desenvolvimento (Loose, 2017). Segundo o autor, estas características também implicariam dificuldades para que os profissionais da área retratassem o fenómeno com maior profundidade. Neste sentido, a autora aponta que “a lógica jornalística, calcada na factualidade, impede que matérias mais centradas na interpretação da realidade nos seus múltiplos aspetos, com maior contextualização e informações sobre prevenção, tenham espaço. (Loose, 2017, p. 13)”

Ceticismo quanto às ações propostas

Acredita-se ainda que o ceticismo sobre as ações propostas não gere um senso de urgência na população. Iniciativas recomendadas, como a redução do uso de energia doméstica ou a adoção de transporte público podem provocar resistência, já que os indivíduos apresentam dificuldades para relacionar como as pequenas ações podem fazer diferença perante a dimensão global da ameaça (Bostrom, 2001 apud Moser e Dilling, 2007).

Incerteza

Outro aspeto que torna a comunicação do fenómeno ainda mais desafiadora refere-se ao elemento de incerteza. Apesar dos notáveis avanços da ciência, continuam a existir discrepâncias entre cientistas quanto ao conhecimento existente, especialmente no que se refere à intensidade dos efeitos, a sua velocidade e as formas como estes se difundirão pelo mundo (Dryzek, Norgaard, & Schlosberg, 2013). Moser aponta a falta de dados, a ineficácia para representar a complexidade da natureza através de modelos e a indeterminação inerente aos sistemas complexos como contributos negativos que intensificam a perceção de incerteza sobre o fenómeno. (Moser & Dilling, 2007)

Ressalta-se ainda o desafio de imprimir certezas típico da esfera científica. Carvalho (2011) sugere que o elemento de incerteza é próprio ao processo de investigação científico, no qual está relacionado ao rigor e objetividade. No cenário político, entretanto, este elemento seria frequentemente enfatizado para levar à inação ou justificar a resistência a políticas de mitigação (Carvalho, 2011, p. 45).

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29 Ausência de Sinais

Moser dá relevo à ausência de sinais como um dos elementos responsáveis pela falta de sucesso de muitas estratégias de comunicação. Segundo o autor, o hiato de experiências diretas do público com as ACs exige que os sinais comunicativos sejam mais amplos, claros, fortes e consistentes para suscitar o caráter de urgência e sustentar as mudanças necessárias. Entre outras, as mudanças estruturais externas incluiriam a implementação de uma política adequada para a atribuição de preços à emissão de gases ou incentivos fiscais, alterações que poderiam atuar como “sinais” para consubstanciar a comunicação do tema. (Moser S. , 2010)

Pidgeon e Spence acrescentam que, embora essencial para a promoção de comportamentos sustentáveis, a comunicação das alterações climáticas não é por si só suficiente para promover as mudanças necessárias. Diversos elementos externos dificultam a adoção de comportamentos mais sustentáveis pelos indivíduos (por exemplo: fatores económicos – falta de recursos para comprar um produto mais eficiente do ponto de vista energético). Para o autor, uma campanha de intervenção bem-sucedida envolveria, além de iniciativas no âmbito da comunicação, mudanças estruturais externas indispensáveis. (Pidgeon & Spence, 2009, p. 8)

Enquadramentos e modelos mentais inadequados

A absorção de novas informações ocorre através de quadros de referência pré-existentes, ou estruturas cognitivas (modelos mentais), para ordenar informações (Kempton, 1991 apud Moser & Dilling, 2007, p.10). Estes têm influência direta na compreensão, perceções e reações frente à informação. Moser e Dilling exemplificam: se as mudanças climáticas forem reportadas na TV acompanhadas por imagens de desastres climáticos, o quadro "clima" poder ser ativado, sugerindo que o fenómeno não poderia ser causado (nem resolvido) pelos indivíduos, mas sim resumir-se-iam a um "ato de Deus". O resultado poderia ser o desencadeamento da sensação de desamparo ou resignação (Morgan et al., 2002; Bord, O'Connor e Fisher, 2000; Bostrom et al., 1994; Read et al., 1994 apud Moser & Dilling, 2007, p. 10)

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30 Em conjunto, os aspetos mencionados acima tornam a comunicação das mudanças climáticas altamente desafiadora. A compreensão do tema por parte do público leigo depende da eficácia da mensagem, que deve ser contruída de forma clara, simples, através do uso de imagens, modelos mentais e enquadramento, os quais proporcionem um processamento cognitivo apropriado para alcançar os objetivos esperados.

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31

Capítulo II. O Framing das alterações climáticas

‘‘If only they understood how severe the problem is ... If only we could explain the science more clearly, train to be better communicators, become more media-savvy, get better press coverage . . . The science of global warming is clear, why are we not acting as a society to combat the problem? Why are they not listening? Why is no one doing anything?’’ (Moser & Dilling, 2007, p. 3)

Comunicação Persuasiva e Framing

Estudos comportamentais que investigam os elementos que motivam os indivíduos a adotarem ações pró-ambientais (reciclagem, energia renovável, redução do consumo, etc.) têm-se intensificado na última década (Cheng, Woon, & Lynes, 2011), especialmente face à constatação da ocorrência do fenómeno “knowledge action gap”, já debatido no capítulo anterior desta dissertação, que sugere que apenas a disponibilização de informações por si só não é capaz de levar ao processo cognitivo necessário para gerar as transformações comportamentais expectáveis para beneficiar o cenário da problemática.

Diante deste fracasso, evidenciou-se, sobretudo nos campos da comunicação e da psicologia, a importância de realizar investigações que permitam avançar na compreensão sobre os processos que levam os indivíduos a agirem de forma mais sustentável. Esta compreensão é determinante particularmente perante o contexto de causas e efeitos antropogénicos que caracteriza as ACs, no qual a atuação humana é considerada simultaneamente responsável pela problemática atual e por sua resolução. Os indivíduos, por sua vez, detêm poder para proporcionar transformações através de uma atuação mais sustentável, que permitam "ganhos rápidos" na redução das emissões de carbono (Pidgeon & Spence, 2009) e, nesta medida, atuar sobre os elementos que motivam comportamentos pró-ambientais de sua parte passa pela comunicação pública das ACs, que, por sua vez, beneficia-se dos conhecimento da área da psicologia na consolidação de uma estratégia eficaz da abordagem do tema.

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32 Este capítulo aborda a comunicação persuasiva, particularmente o recurso do framing ou enquadramento, e o seu papel na promoção de comportamentos pró-ambientais, iniciando com uma breve revisão de três entre as mais importantes teorias da psicologia comportamental na área, que se considera poderem ajudar a fundamentar as estratégias de comunicação sobre as ACs.

A Mudança Comportamental

Estudos comportamentais procuram explicar o fenómeno do diferencial no conhecimento-ação e ajudam a compreender os modos como o discurso e as mensagens podem conduzir à mudança de comportamento almejada (Cheng, Woon, & Lynes, 2011). De forma semelhante ao que ocorre na investigação sobre a adoção de comportamentos desejáveis em outros âmbitos, como a saúde, consumo, etc., presume-se que para prever se um individuo irá mobilizar esforços para executar ações favoráveis ao meio ambiente, é necessário analisar os elementos preditores do comportamento. (Ibidem)

Entre as teorias mais influentes no campo da psicologia comportamental, a Teoria da

Ação Racional e a Teoria da Ação Planeada, de Ajzen e Fishbein (1988), partem do

pressuposto de que as atitudes desencadeiam os comportamentos de maneira indireta; influenciando as intenções comportamentais, que, por sua vez, moldam as ações que se seguem. Ambas as teorias inferem que a racionalidade dos indivíduos tornar-lhos-iam capazes de tomar decisões sensatas na avaliação e planeamento das suas ações. (Cheng, Woon, & Lynes, 2011).

A Teoria da Ação Fundamentada (TAF) abrange os comportamentos que dependem apenas da vontade do indivíduo (controlo volitivo), sem considerar os fatores externos ou a sua perceção de controlo sobre a situação enquanto determinantes para a efetiva implementação do comportamento. De acordo com a TAF, a intenção seria a componente mais representativa para prever se este será de facto materializado na prática (Montaño & Kasprzyk, 2008).

Crenças, atitudes e normas subjetivas são proeminentes nesta teoria comportamental, na medida em que influenciam as intenções do comportamento. (Moutinho & Roazzi , 2010)

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33 As atitudes, por sua vez, podem ser avaliadas como favoráveis ou desfavoráveis e, quanto mais positivo for o julgamento sobre certa ação, maior a probabilidade de esta materializar-se. (Moutinho & Roazzi, 2010; Macovei, 2015)

Normas Subjetivas dizem respeito à pressão social exercida pelos grupos aos quais o

indivíduo pertence, relacionando-se à perceção de outros significativos, como a família, amigos, etc., sobre a pertinência de determinada ação. De acordo com a Teoria da Ação Fundamentada, a perceção externa de que determinado comportamento é importante aumentaria a motivação e intenção de adoção. (Ajzen e Fishbein apud Moutinho e Roazzi, 2010)

A Teoria da Ação Planeada (TAP) complementa os conhecimentos trazidos pela TAF, adicionando novas variáveis ao processo de mudança comportamental. A TAP reconhece que intenções positivas não irão necessariamente desencadear os comportamentos esperados, especialmente diante de barreiras situacionais ou da falta de confiança do indivíduo quanto à exequibilidade da ação ou suas próprias capacidades. (Ibidem) (ver figura 2)

Os seus pressupostos inferem que as atitudes, crenças e normas subjetivas podem ser eficientes para aumentar o grau de motivação para adotação de determinado comportamento, mas, por outro lado, outros elementos, como hábitos passados e a ausência de controlo sobre a ação, poderiam implicar uma consequente renúncia a sua adoção. O controlo, segundo Azjen e Fishbein (1988), não corresponderia apenas às dimensões externas ou situacionais, mas também à perceção de autoeficácia do indivíduo (termo integrado por Bandura, 1982). Caso este não se sinta capaz de materializar as suas motivações em ações, as chances de sucesso se tornariam diminutas. (Azjen e Fishbein apud Moutinho e Roazzi, 2010).

As teorias apresentadas ajudam a compreender o porquê dos sujeitos, apesar de muitas vezes possuírem atitudes positivas sobre a adoção de comportamentos pró-ambientais, não os implementam de facto. Por exemplo, um indivíduo pode perceber a urgência de atuar sobre a problemática ambiental, ter atitudes positivas no que se refere à adoção de ações que contribuam para reduzir o problema e estar mesmo sujeito a pressões sociais

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34 de amigos e familiares, que igualmente percebem esta relevância. No entanto, apesar de reunirem todas as condicionantes apresentadas para um alto nível de motivação, segundo a Teoria do Comportamento Fundamentado, fatores externos, nem sempre sob o seu controlo, podem acabar por barrar a adoção do comportamento pró-ambiental almejado. Alguns exemplos práticos ajudam na compreensão destas teorias aplicadas à questão do clima:

- O indivíduo pode ter uma atitude favorável à adoção de energia renovável, mas não possuir recursos financeiros para tal;

- O indivíduo pode estar disposto a reduzir o uso de automóvel, mas face a um sistema de transporte público ineficaz, considera que será muito difícil dar sequência a esta motivação, com sentimentos de autoeficácia reduzidos;

- O sujeito considera a redução do consumo de carne altamente benéfica, tanto do ponto de vista da saúde, quanto no que se refere a redução da emissão de GEE. A sua família e seus amigos apoiam e concordam e muitos já interromperam o consumo de carne vermelha, comprovando os benefícios desta ação. Contudo, o indivíduo pode apresentar uma baixa perceção da sua capacidade para cortar o consumo de carne vermelha se não identificar restaurantes que ofereçam opções alimentares compatíveis, ou se considerar que será necessário muito tempo para cozinhar caso opte por dedicar-se a uma alimentação vegetariana. Assim, apesar de apresentar atitudes favoráveis e estar sujeito a normas sociais alinhadas, a sua perceção de controlo sobre a ação é baixa e, por isso, a probabilidade de que o comportamento seja de facto adotado é reduzida.

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35 Figura 2: A Teoria da Ação Racional contemplando as variáveis externas (Moutinho e Roazzi, 2010).

Modelo Transteórico

Um terceiro modelo contribui para avançar na compreensão sobre os aspectos que fazem com que alguns indivíduos adotem comportamentos pró-ambientais e outros não. O Modelo Transteórico, desenvolvido por Prochaska et al. (1992), sugere que os indivíduos passam por seis etapas distintas para a adoção de um determinado comportamento: pré-contemplação, pré-contemplação, preparação, ação, manutenção e término. O nível de intenção do indivíduo e as atitudes relacionadas variariam de acordo com estes momentos e na medida em que se adquire informações e habilidades para desempenhar a ação, agregando a dimensão temporal às teorias apresentadas anteriormente. O Modelo Transteórico assume que a mudança comportamental ocorre de forma não linear e, mais do que um evento discreto, seria um processo que se desenrola ao longo do tempo. (Prochaska, Reeding, & Evers, 2008)

Cada teoria por si só não consegue explicar de forma autónoma a complexidade da mudança comportamental. Segundo Prochaska, Reeding, & Evers (2008), uma maior compreensão passa pela integração entre as mais relevantes teorias na área. A Teoria Transteórica traz contributos significativos para a área de comunicação das alterações climáticas, já que os conhecimentos por ela fundamentados permitem adaptar a estratégia de construção da mensagem às características de cada estágio descrito pelos autores, conforme a figura 3.

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36 Figura 3: Modelo Transteórico

Prochaska, Reeding, & Evers, 2008, p. 98

O framing, enquanto um conceito operativo, pode contribuir no processo de mudança de comportamento, já que a depender da forma como a informação é estruturada, pode ajudar a conduzir a decodificação das mensagens sobre as ACs pela audiência, promovendo impactos diversos sobre as atitudes e comportamentos.

Conforme o infográfico 1, os framings estão presentes em quatro dimensões do processo comunicacional e atuam nos contextos de: 1-emissão (comunicador/emissor da mensagem), 2. Mensagem (texto), 3. Receção (decodificação da mensagem pelo recetor) e 4. cultura (Entman, 1993).

Nesta dissertação centralizamo-nos nos aspectos 2 e 3, propondo-nos a uma análise dos impactos dos framings ambientais e da saúde, aplicados à comunicação das ACs, na receção da informação pela audiência.

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37 Infografia 1: Dimensões do framing – adaptação de Entman (1993)

(39)

38 A Comunicação Persuasiva e o Framing

As diferentes dimensões da mudança comportamental descritas na seção anterior fazem com que a comunicação exerça um papel fundamental, particularmente no tocante à comunicação persuasiva, que por sua vez, é considerada um primeiro esforço no sentido de motivar indivíduos a adotarem determinado comportamento (Pelletier & Sharp, 2008).

O estudo da retórica e da persuasão avançou muito no campo da comunicação desde as suas origens na Grécia Antiga. Definições mais recentes destacam o poder de influência destes recursos, dando relevo à sua aplicação instrumental, com o “objetivo de influenciar as escolhas humanas em assuntos específicos que requerem atenção imediata” (Hauser, 1986, apud. Peeples, 2015).

A intencionalidade é inerente à comunicação persuasiva, dado que esta visa obter uma resposta desejada no recetor da mensagem (Perloff, 2003). Para Foss, a retórica implicaria um convite à interação e à compreensão por meio de escolhas linguísticas e simbólicas, conduzindo a uma construção de significados compartilhados na sociedade (Peeples, 2015, p. 39)

Perloff (2003) destaca que, apesar de ser capaz de influenciar decisões e promover comportamentos, a persuasão dá-se num ambiente de livre escolha, o que a torna distinta do ato de coerção. A persuasão obrigatoriamente dependeria da liberdade da audiência para aceitar ou rejeitar determinada mensagem. Segundo o autor, a presunção de que o indivíduo atuaria contra a sua vontade negligenciaria um dos elementos característicos do processo: o autoconvencimento - ou seja, os recetores da mensagem devem convencer-se a si próprios a mudarem suas atitudes e comportamentos. A persuasão simplesmente envolveria a ativação de aspetos já presentes ou desejáveis pelos mesmos. Assim sendo, o autor resume a persuasão enquanto uma tentativa de convencimento a mudar atitudes e comportamentos, através de um processo simbólico mediado pela transmissão de uma mensagem (Perloff, 2003).

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39 Atualmente, a investigação em torno da comunicação ambiental analisa as forma e os efeitos da persuasão, debruçada sobre diferentes suportes comunicacionais, como anúncios, documentos governamentais e corporativos, sites, reportagens, protestos, fotografias, literatura, filmes e livros. No que se refere às alterações climáticas, a escolha de palavras, imagens, layout, etc. molda a compreensão do conteúdo pelos participantes, minimizando a possibilidade de outras interpretações igualmente factíveis (Ibidem).

Atitudes7 seriam o foco de ação da comunicação persuasiva, que por sua vez, apresenta

distinções quanto aos efeitos alcançados: podendo moldar, reforçar ou modificar as atitudes e a favorabilidade a determinadas ações (Miller, 1980 apud Perloff, 2003)

A comunicação persuasiva abrange inúmeros recursos discursivos, mas considerando o objeto de estudo desta dissertação, será discutido na sequência deste capítulo apenas os que integram o framing da mensagem - um dos recursos cada vez mais apontado para incentivar atitudes e, em última instância, estimular a adoção de comportamentos sustentáveis, através do enquadramento estratégico da informação (Oliveira & Carvalho, 2012; Hurlstone , Lewandowsky, Newell, & Sewell, 2015, J.W. Bolderdijk, 2012; Nisbet & Newman, 2015, Nisbet, 2009; Pidgeon, 2010; Cheng, Woon, & Lynes, 2011)

Framing

Segundo Entman, os framings ajudam a definir “problemas, diagnosticar as suas causas, produzir julgamentos morais sobre um tema e/ou sugerir e recomendar as soluções” (Entman, 1993, p. 52) Para o autor, o framing atua através da seleção e da enfâse para promover uma visão em particular sobre uma questão, salientando alguns aspetos da realidade em detrimento de outros na forma de estruturar a mensagem. Apresentam-se abaixo algumas tentativas de explicar o termo:

“Framing essentially involves selection and salience. To frame is to select some aspects of a perceived reality and make them more salient in a communicating

7 Nesta dissertação entende-se por atitude a tendência ou predisposição para agir, pensar ou sentir de uma determinada forma

(positiva ou negativa) face a um objeto, pessoa, situação, grupo social, instituição, conceito ou valor. Atitudes desencadeiam os comportamentos de maneira indireta; influenciando as intenções comportamentais, que, por sua vez, moldam as ações que se seguem. (Ajzen e Fishbein, 1988)

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text, in such a way as to promote a particular problem definition, causal interpretation, moral evaluation, and/or treatment recommendation for the item described.” (Entman, 1993, p. 52)

“Frames are interpretive storylines that set a specific train of thought in motion, communicating why an issue might be a problem, who or what might be responsible for it, and what should be done about it. Framing is an unavoidable reality of the communication process, especially as applied to public affairs and policy. There is no such thing as unframed information, and most successful communicators are adept at framing, whether using frames intentionally or intuitively.” (Nisbet & Newman, 2015, p. 361)

“Frames can be conceptualized as ways of organizing and defining ideas and knowledge in order to resonate with particular views of the world, values or ideals; as such, they emphasize certain aspects of an issue and de-emphasize others.” (Pidgeon & Spence, 2009, p. 5)

Estudos sobre o framing demonstraram que a maneira como a informação é estruturada influencia a forma como esta é descodificada pela audiência, afetando atitudes e promovendo comportamentos. Considerando as causas antropogénicas das alterações climáticas e o papel indissociável dos indivíduos na solução da problemática, pode-se inferir que, na busca por soluções de mitigação e adaptação, a forma como a mensagem é construída seria igualmente importante ao conhecimento científico sobre os aspectos físicos do fenómeno em si.

Investigações precedentes já demonstraram que as diferentes possibilidades de enquadrar as informações sobre as alterações climáticas alcançam resultados variados e impactos diversos nas audiências. (Pidgeon, 2010)

Segundo Carvalho, através da sistematização da informação, o enquadramento é capaz de tornar uma mensagem relevante, interessante e apelativa. A problemática das alterações climáticas se beneficiaria particularmente deste recurso em sua abordagem comunicativa, já que a técnica do framing também auxiliaria as audiências a darem

Imagem

Figura 1: The action Gap on Climate Change (Bushell, Buisson, Workman, & Colley, 2017)
Figura 2: A Teoria da Ação Racional contemplando as variáveis externas (Moutinho e Roazzi, 2010)
Figura 3: Modelo Transteórico
Tabela 1: Adaptações de (Nisbet M. C., 2009; Nisbet M. C.2008)
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Referências

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