• Nenhum resultado encontrado

Mana vol.3 número1

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2018

Share "Mana vol.3 número1"

Copied!
27
0
0

Texto

(1)

DISSELKAM P, Annet t e. 1994. L’Ét hi-que Protestante de M ax W eber. Paris: Presses Universit aires de France. 217 pp.

Emerson Giumbelli

Dou tora n d o, PPG AS-M N -UFRJ

A Ética Prote stan te e o Esp írito d o Cap i-talism o, te xto d e M a x We b e r p u b lica d o orig in a lm e n te e m 1904, foi e con tin u a se n d o u m a re fe rê n cia fu n d a m e n ta l e m se tra ta n d o d e q u e stõe s q u e p rob le m a tiza m a s re la çõe s e n tre re lig iã o e socie d a d e . Isso se a p lica ig u a lm e n te a situ a -çõe s tã o op osta s q u a n to a con stitu içã o h istórica d a s cosm olog ia s q u e d e fin e m a “ m od e rn id a d e ” ocid e n ta l e o sig n ifica d o e im p a cto d os n ovos g ru p os p e n -te costa is n o Bra sil. A im p ortâ n cia d e se u a ssu n to e a re p e rcu ssã o d e q u e g o-za – a lia d a s a o p re stíg io d e se u a u tor – con fe re m lh e , e n fim , u m lu g a r ce rto e n -tre os “ clá ssicos” d a s ciê n cia s socia is. Esse te xto é o te m a d o livro d e An n e tte Disse lk a m p , re su lta d o d e su a te se d e d ou tora d o, a p re se n ta d a à Sorb on n e e orie n ta d a p or Ra ym on d Bou d on . A a u tora te m u m a p re te n sã o crítica , q u e d e -se n volve ta n to sob re o a rg u m e n to e xp osto n o te xto d e We b e r e a lg u m a s ou -tra s p a rte s d e su a ob ra , q u a n to sob re o m od o p e lo q u a l o m e sm o te xto foi a p rop ria d o rop or ou tros a u tore s. E, com o ve -re m os, a p e cu lia rid a d e d os -re su lta d os a q u e ch e g a su a a n á lise re sid e e xa ta

m e n te n a e xig ê n cia d o isola m e n to e n -tre e ssa s d u a s d im e n sõe s.

(2)

so d o lu te ra n ism o, a s con clu sõe s d e We b e r d e corre m d a a n á lise d e te xtos d ou -trin á rios, já o im p a cto d o ca lvin ism o/ p u rita n ism o é p e n sa d o sob a form a d e u m a m otiv ação p sicológ ica. Assim , d a -d o q u e a in son -d a b ili-d a -d e -d os -d e síg n ios d ivin os torn a va -se in su p ortá ve l e m u m te m p o n o q u a l a ce rte za d a sa lva çã o e ra in d isp e n sá ve l, form u lou -se , n os m e ios p u rita n os, a id é ia d e q u e o su ce sso p ro-fission a l con sistia u m sin a l visíve l d a e le içã o. Por fim , Disse lk a m p p rocu ra m ostra r q u e We b e r p ostu la u m a re la çã o n e ce ssá ria e n tre a s d isp osiçõe s p rod u -zid a s p or e xig ê n cia s re lig iosa s e o “ e sp í-rito d o ca p ita lism o” , n a q u a l a s p rim e i-ra s ocu p a m p re ce d ê n cia cau sal sob re o ú ltim o.

Pa rtin d o d e ssa re con stru çã o, com se u s trê s p on tos fu n d a m e n ta is, é q u e a a u tora e la b ora rá u m a “ tip olog ia críti-ca ” d e vá ria s re fe rê n cia s b ib liog rá ficríti-ca s q u e te ce ra m con sid e ra çõe s e a va lia çõe s sob re a Ética Prote stan te . Tra ta -se d a p rim e ira p a rte d o livro, n a q u a l Disse l-k a m p con te m p la d e ze n a s d e tra b a lh os, org a n iza n d o-os d e m od o a con stitu ir u m a e sp é cie d e jog o d os e rros: vá ria s form a s d e m a l-e n te n d id os a re sp e ito d o a rg u m e n to e fe tivo d e We b e r. Assim , h á d ive rsos a u tore s q u e p e n sa m e sta r re fu ta n d o We b e r q u a n d o m ostra m q u e a re -la çã o e n tre p rote sta n tism o e ca p ita lis-m o n ã o é , d e u lis-m a p e rsp e ctiva h istórica , con sta n te ou n e ce ssá ria , d e ixa n d o d e p e rce b e r a a u ton om ia con fe rid a a o “ e s-p írito” n a Ética Prote stan te ; h á os q u e o d e fe n d e m e m te rm os te óricos, a firm a n d o q u e ta l re la çã o é p ostu la d a e n q u a n -to a fin id a d e , q u a n d o We b e r p rocu ra va a p on ta r u m a ca u sa lid a d e ; e h á os q u e o a ta ca m p e la a n á lise d o e n sin a m e n to m ora l p rote sta n te e xp lícito, m ostra n d o su a d istâ n cia d a é tica ca p ita lista , se m a te n ta r p a ra q u e We b e r e sta va in te re ssa d o n os e fe itos p sicológ icos d e sse s e n -sin a m e n tos. A m e sm a p re ocu p a çã o e m

re sg a ta r a e sp e cificid a d e e a u te n ticid a -d e -d a Ética Prote stan te m a n ife sta -se q u a n d o Disse lk a m p p rocu ra in se rir o te xto d e We b e r e n tre p e rce p çõe s a n te riore s e con te m p orâ n e a s sob re a re la -çã o e n tre p rote sta n tism o e p rog re sso e con ôm ico. Re ve la -se q u e e sse vín cu lo já e ra su ste n ta d o p or te xtos d o sé cu lo XVII e torn a ra -se , n o sé cu lo XIX, u m d os d og m a s d a p rop a g a n d a b u rg u e sa p rote sta n te , m a s se g u n d o fórm u la s d is-tin ta s d a q u e la s u tiliza d a s p or We b e r.

A a u tora , p orta n to, q u a n d o form u la os crité rios d e su a tip olog ia , d e sloca o foco d a m e ra p ostu la çã o d a e xistê n cia d e re la çõe s e n tre p rote sta n tism o e ca p ita lism o p a ra o p la n o b e m m a is com p le -xo d os te rm os e m q u e se coloca m e ssa s re la çõe s e d a su a lóg ica . Essa in te re ssa n te e stra té g ia é , p oré m , con tra b a la n -ça d a p or u m a p e rsp e ctiva e stre ita , q u e ch e g a a re su lta d os q u a se se m p re n e g a -tivos e xp re ssos n a in te n çã o d e re ve la r os “ m a l-e n te n d id os” sofrid os p e la te se w e b e ria n a n a su a a p rop ria çã o p or ou -tros a u tore s. Da í q u e a tip olog ia con sig a cob rir a p e n a s os a u tore s q u e com -p re e n d e ra m m a l a Ética Prote stan te , d e ixa n d o d e fora tod os os d e m a is. O u tra p ossib ilid a d e a p a rtir d o m e sm o m a -te ria l con tin u a se n d o a in ve stig a çã o d o “ We b e r” q u e a s a p rop ria çõe s p rod u zira m a o lon g o d o te m p o, ou , p a zira le la m e n te , m a s p a rtin d o d os m e sm os p rin -cíp ios, a e la b ora çã o d e u m a le itu ra d e We b e r in form a d a p or q u e stõe s a tu a is. Disse lk a m p , a o con trá rio, op tou p or u m a in cu rsã o visa n d o re sta b e le ce r o We b e r d e 1904 n o q u e con sid e ra se r a e sp e cificid a d e d e su a “ te se ” . É a u m a crítica d e ssa “ te se ” , d e vid a m e n te d e -p u ra d a d os “ m a l-e n te n d id os” , q u e se d e d ica a te rce ira e m a is e xte n sa p a rte d o livro d e Disse lk a m p .

(3)

i-çõe s. A p rin cip a l d e la s e sta ria n o d u p lo ca rá te r a ssu m id o p e la é tica p u rita n a , sim u lta n e a sim e n te u sim a p e rve rsã o d o d og -m a d a p re d e stin a çã o e u -m sin a l d e d istin çã o e xp r e sso n o su ce sso p r ofissio -n a l. M a is d e ta lh a d a s sã o a s crítica s h is-tórica s, e la b ora d a s p e lo re cu rso a h istoria d ore s d o p rote sta n tism o e p e lo e xa m e d os e scritos d e C a lvin o, d e p re g a -d ore s p u rita n os e -d e livros p op u la re s. Ela s p rocu ra m m ostra r q u e a id é ia d e p re d e stin a çã o n ã o g e rou os e fe itos a fir-m a d os p or We b e r: o d e se sp e ro e fir-m q u e ca ía m m u itos fié is con ve n cid os d e su a d a n a çã o sig n ifica q u e , p a ra e le s, a p re d e stin a çã o e ra fie lm e n te a ce ita ; n a s p re -g a çõe s p u rita n a s, a e xorta çã o à s “ b oa s ob ra s” n e la s a p a re cia com o a n tíd oto con tra o re la xa m e n to é tico, e n q u a n to a ce rte za d a sa lva çã o viria a tra vé s d a fé . Disse lk a m p con sid e ra q u e We b e r tin h a ra zã o a o a p roxim a r a s virtu d e s p u rita -n a s d a é tica b u rg u e sa (a m b a s co-n cor-d a va m n o e stím u lo a o tra b a lh o lu cra ti-vo, n a con d e n a çã o d a p e rd a d e te m p o, n a s e xig ê n cia s d e ord e m e d iscip lin a ), m a s re fu ta -o e m se tra ta n d o d e Lu te ro, p ois u m a a n á lise d os e scritos d o re for-m a d or d e for-m on stra q u e n a d a h á d e for-m od e rn o n os sig n ifica od os a trib u íod os à ca -te g oria Be ru f.

H á , p or fim , a s crítica s d e vié s te ó-rico e m e tod ológ ico, re p e tid a m e n te a n u n cia d a s n o livro: a “ te se ” d a Ética Prote stan te , e m su a p róp ria form u la çã o, p e ca a o a ce ita r a p ossib ilid a d e d e e x-p lica çã o d e u m a m u d a n ça n a s a titu d e s e con ôm ica s p e la su a re m issã o a u m a cre n ça re lig iosa , in d e p e n d e n te m e n te d a s “ circu n stâ n cia s socia is e e con ôm ica s e fe tiva s” e m q u e isso ocorra . O u se ja , We b e r e q u ivoca se ta n to a o d istin -g u ir u m a m e n ta lid a d e d e su a s con d i-çõe s con cre ta s d e e xistê n cia , q u a n to a o p ostu la r su a re la çã o u n ívoca com a d ou -trin a p rote sta n te . As a lte rn a tiva s p ro-p osta s ro-p or Disse lk a m ro-p a ssu m e m d u a s

form a s d istin ta s. De u m la d o, com p ila a u tore s cu ja s a n á lise s d a h istória d o p rote sta n tism o, a in d a q u e d ive rg e n te s, a p on ta m p a ra a n e ce ssid a d e d e in corp ora r o “ con te xto socia l” . De ou tro, re corre a u m ou tro te xto d o p róp rio We -b e r (A s S e itas Prote stan te s e o Esp írito d o Cap italism o), o q u a l, se g u n d o e la , p e rm ite e xp lica r a d isse m in a çã o d o e th os b u rg u ê s p e los a n se ios d e re con h e cim e con to socia l d os icon d ivíd u os, a te con -d d os p e la su a a -d e sã o à s rig orosa s se i-ta s p u rii-ta n a s.

(4)

i-vocou q u a n to a su a “ te se ” , n ã o é p ossíve l q u e os q u e “ e rra ra m ” sob re e le te -n h a m “ a ce rta d o” q u a -n d o se tra ta d a s re la çõe s e n tre p rote sta n tism o e ca p ita -lism o?

En fim , o livro d e Disse lk a m p con stitu i u m re cu rso va lioso p a ra a com -p re e n sã o crítica d o te xto d e We b e r e p a ra o a com p a n h a m e n to d os d e b a te s q u e se se g u ira m , a lé m d e tra ze r a p orte s in te re ssa n te s sob re a h istória in icia l d o p rote sta n tism o. N o e n ta n to, n e m e xp lo-ra a s vá ria s p e rsp e ctiva s a p licá ve is a o ca m p o in te le ctu a l e m q u e se d e se n volve ra m a form u la çã o e re ce p çã o d a q u e -le te xto, n e m re sp on d e tota lm e n te à s q u e stõe s q u e le va n ta a p rop ósito d a va -lid a d e d os a rg u m e n tos w e b e ria n os.

GALLOIS, Dominique Tilkin. 1994. M ai-ri Revisitada. A Reintegração da Forta-leza de M acapá na Tradição Oral dos W aiãpi. São Paulo: NHII-USP/ FAPESP. 92 pp.

Tânia Stolze Lima

Profª d e An trop olog ia , IC H F-UFF

M a iri é u m a p a n e la d e b a rro g ig a n te s-ca , d e fu n d o p on tia g u d o e b os-ca vira d a p a ra b a ixo, q u e os h u m a n os, im p rovi-sa d a m e n te , e rg u e ra m p a ra a li se p ro-te g e re m p rim e iro d o in cê n d io e d e p ois d o d ilú vio p rovoca d os p or Ia n e ja r, o (re )cria d or Wa iã p i d e sse m u n d o on d e vive m os e a g im os com o ra m os in con ci-liá ve is d a h u m a n id a d e . A Forta le za d e Sã o J osé d e M a ca p á foi e rg u id a p e los p ortu g u e se s e m 1688 e re con stru íd a e m 1765, à m a rg e m d o Am a zon a s. M a iri é , m u ito p rova ve lm e n te , a Forta le za d e M a ca p á . Prova : a n a rra tiva d a e xp e -riê n cia d e u m fin a d o q u e e ste ve p re so n a Forta le za e e n te n d e u q u e a li ou Tu -p ã ou Ia n e ja r d e ixou su a -p e le -p a ra ir

vi-ve r a lh u re s a o se r m orto ou p e los b ra si-le iros ou p e los Wa iã p i; e q u e viu , n a im a g e m d e C risto p re so à cru z, n a p róp ria róp e le d e Tu róp ã , os re síd u os d o sa n -g u e q u e se rviu d e tin ta p a ra a e scrita p rim ord ia l, in ve n ta d a p or Ia n e ja r, re cu -sa d a p e los Wa iã p i e a p rop ria d a p e los b ra sile iros.

(5)

in va sõe s. O s Wa iã p i e xp e rim e n ta m a tu a lm e n te o se n tim e n to d e q u e n ã o h á m a is p a ra on d e fu g ir. Pa ra n ã o fa la r d os q u e e stã o im p la n ta d os e m su a s te rra s, os b ra n cos a s ce rca m , te n d o se a p od e -ra d o ta m b é m d a ca sa d e a rg ila , e a li fu n d a d o a cid a d e d e M a ca p á . Su a h tória n os ú ltim os trê s sé cu los é u m a h is-tória d e m ig ra çõe s, m e lh or d ize n d o, d e fu g a s. N o sé cu lo XVIII, com a in va sã o e u rop é ia d o b a ixo Xin g u , a b a n d on a ra m se u s vizin h os e a tra ve ssa ra m o Am a zon a s. C ozon h e ce zon d o a li a vid a e m a ld e a m e n tos m ission á rios, fin a lm e n te e m -p re e n d e ra m n ova s fu g a s e ocu -p a ra m a s te rra s on d e vive m h oje , n a se n sa çã o d e q u e n ã o h á m a is p a ra on d e ir.

G a llois os con h e ce h á q u a se vin te a n os. Ap ós se d e d ica r a o e stu d o d os m a te ria is h istóricos re la tivos à su a sa í-d a í-d o Xin g u – fa to í-d o q u a l os Wa iã p i se e sq u e ce ra m com p le ta m e n te , situ a n d o a cria çã o d a h u m a n id a d e n o Am a zon a s, p re cisa m e n te e m M a iri-Forta le za d e Sã o J osé – e a o e stu d o d e se u siste m a sociocosm ológ ico, a a u tora ve m e xe cu ta n d o d e sd e 1991 u m a “ p e sq u isa -a çã o” , d -a q u -a l M -airi Re v isit-ad -a é u m d os re su lta d os. Esse é u m livro q u e , con form e su b lin h a a a u tora , “n ão se d e stin a aos W aiãp i”. Tod a via , su a s q u e stõe s fora m in d ire ta m e n te coloca -d a s p e los Wa iã p i; g ra n -d e p a rte -d os se u s m a te ria is n ã o fora m sim p le sm e n te co-lh id os p e la a n trop ólog a , m a s p rod u zid os p e los Wa iã p i, a isso e stim u la zid os p e la im p la n ta çã o d os p rog ra m a s d e e d u -ca çã o e con trole te rritoria l a sse ssora d os p e la a u tora , e a re fle xã o a í re a liza d a d e ve tra ze r-lh e s ou tra s con trib u içõe s.

N o p ólo a çã o d a p e sq u isa , o livro d e se n volve u m a q u e stã o é tica re la tiva à m e lh or m a n e ira d e in scre ve r o sa b e r w a iã p i p a ra os Wa iã p i. N o p ólo p e sq u i-sa d a a çã o, ofe re ce -n os u m a re fle xã o sob re a p ossib ilid a d e e a im p ossib ilid a -d e -d e a p lica r a n oçã o -d e h istória à

so-cie d a d e w a iã p i. M e u s com e n tá rios vi-sa rã o e sse se g u n d o p ólo, m a s e n fa tizo q u e n e m o e sp írito d o livro – e e ssa é u m a d a s ra zõe s d e se u in te re sse – te m com p rom isso com e ssa d ivisã o e n tre p e sq u isa e a sse ssoria , e n tre é tica e te x-to a n trop ológ ico, n e m p od e re i re stitu ir os p a ssos e a s n u a n ça s d e ssa re fle xã o.

H á m u ita s m a n e ira s d e se tom a r a h istória com o te m a d e in ve stig a çã o a n -trop ológ ica , m a s d ificilm e n te a lg u m a d e ixa ria d e se orie n ta r, d e cla ra d a m e n te ou n ã o, a o sa b or ou con tra a corre n te , p e la d istin çã o e n tre h istória q u e n te e fria , p rop osta p or Lé vi-Stra u ss. Alg u n s a con sid e ra m u m d iscu rso id e ológ ico q u e u ltra ja os n a tivos d e tod o o m u n d o, e n q u a n to ou tros a d m ite m q u e e la te m , q u a n d o m e n os, o m é rito d e a ssin a la r a p re se n ça d e ou tra s form a s d e vive r e p e n sa r o te m p o. É q u a se in a cre d itá ve l q u e se te n h a te n ta d o u ltra p a ssá -la su s-te n ta n d o q u e a s socie d a d e s in d íg e n a s tê m u m a h istória q u e n te . N e m tod o m u n d o é Sa h lin s, e , q u a n to a o m a is, se -ria in te re ssa n te sa b e r se os ín d ios se id e n tifica m con osco.

G a llois n ã o é tod o m u n d o e n ã o so-fre d ificu ld a d e e m só a ce ita r con sid e ra r o va lor d e ve rd a d e d o m ito com a con -d içã o -d e con clu ir q u e a h istória n ã o p a ssa d e e stória . C om o p roce d e r, p ois, q u a n d o n os é d a d o o a ce sso à p a la vra viva d e u m p ovo com o os Wa iã p i, p a la -vra s q u e p rod u ze m e fe itos d e se n tid o q u e fu lm in a m n ossa con sciê n cia e fe -re m n ossa va id a d e a o se m ostra -re m p i-tore sca s a o n osso ou vid o, ob rig a m -n os a re fle tir sob re a p ossíve l p e trifica çã o d o sa b e r in d íg e n a q u e e sta ría m os e fe -tu a n d o e m n ossos e s-tu d os e tn og rá ficos e a p re se n ta m u m h ib rid ism o e sca n d a -loso p a ra n ossa d istin çã o a n a lítica e n tre m ito e h istória .

(6)

a d icotom ia a n a lítica se ria a d e te rm in a -çã o e tn og rá fica d a s ca te g oria s e m te rm os d a s q u a is a tra d içã o ora l é ord e n a -d a . C om e fe ito, a a u tora m ostra com o os Wa iã p i con ce b e m u m a d u p la b ip a rtiçã o d o te m p o: d e u m la d o, d u a s id a d e s con stitu íd a s com o te m p os q u a lita tiva -m e n te d ife re n te s, d a s q u a is a -m a is a n ti-g a é m a rca d a p e la p re se n ça d e Ia n e ja r e n tre os h u m a n os e p e la p osse d a lin -g u a -g e m p or a q u e le s q u e h oje e stã o d e stitu íd os d e la ; d e ou tro, d ois te m p os d ife re n cia d os p e la a u sê n cia ou p re se n -ça d e u m a m e m ória g e n e a lóg ica p a ra com os a n te p a ssa d os; ou se ja , u m p a ssa d o re m oto e u m re ce n te . M ostra a in -d a com o ta l b ip a rtiçã o se a rticu la com a a u sê n cia ou p re se n ça d e u m a e xp licita -çã o b a sta n te p re cisa , p e lo n a rra d or, d a fon te d e in form a çã o.

C on tu d o e sse s crité rios w a iã p i, a liá s, b a sta n te d ifu n d id os n a Am a zôn ia in d íg e n a , n ã o d ã o con ta d o ca rá te r a te m p ora l d o m ito, e , a ssim , d e su a ca -p a cid a d e d e in va d ir a te m -p ora lid a d e h istórica . C om o se p re te n d e sse m fu g ir à su a p róp ria re g ra , os Wa iã p i ta m b é m p rod u ze m re la tos q u e se re p orta m a o m e sm o te m p o à s d u a s te m p ora lid a d e s. É p re ciso d e sta ca r q u e M a iri ve io a se torn a r a Forta le za d e Sã o J osé p or m e io d a h istória q u e se con ta sob re u m te ste -m u n h o ocu la r. Eixo d o -m ito e d a h istó-ria , a Forta le za re sp on d e a ssim p or u m a con tin u id a d e fu n d a m e n ta l e n tre Ia n e ja r e a cid a d e d e M a ca p á , e n tre o te m -p o d a cria çã o e se -p a ra çã o d os h u m a n os e u m a a tu a lid a d e m a rca d a p e la visita -çã o fre q ü e n te à cid a d e ocu p a d a p e los b ra sile iros. Ta lve z a a b ord a g e m com p a -ra tiva p ossa u m d ia la n ça r a lg u m a lu z n ova sob re e ssa m iste riosa n e ce ssid a d e q u e tra d içõe s com o a d os Wa iã p i a p a -re n ta m te r d e -re la tos q u e forn e ça m u m te ste m u n h o ocu la r m od e rn o p a ra fa tos e sta b e le cid os n a orig e m d os te m p os. De tod a form a , o te ste m u n h o d e tam o

Ku re sisi, o Wa iã p i q u e viu q u e M a iri e s-tá d e p é e é a Forta le za , m ostra a im b rca çã o n a m e sm a (ta lve z se ja m e lh or d i-ze r a lig a çã o u m b ilica l op e ra d a p or u m a ) n a rra tiva d o m ito e d a h istória . O u se ja , a d istin çã o e tn ocon ce itu a l con h e -ce su a s p róp ria s lim ita çõe s e , p a ra a a n á lise , re p re se n ta ria u m a d ificu ld a d e m a is d o q u e u m a solu çã o.

A a u tora te n ta re solve r o im p a sse a d ota n d o, e m p rim e iro lu g a r, u m a p e rsp e ctiva m a is in clu siva , ca rsp a z d e a b ra n -g e r m ito e h istória , e q u e se tra d u z n a ca te g oria a n a lítica “ e tn oh istoriog ra fia ” . As d u a s ca te g oria s te m p ora is e os d ois m od os d a e n u n cia çã o a e la s a ssocia d os su rg e m , a ssim , com o os d ois m e ca n ism os b á sicos d e u ism a h istoriog ra fia w a iã -p i. Su a com -p le m e n ta rid a d e e su a d e te r-m in a çã o p e lo con te xto sã o a s id é ia s con d u tora s d e tod a a a p re se n ta çã o d e fa la s re g istra d a s e m d ois p e ríod os d is -tin tos, o d a p e sq u isa e a q u e le d a p e s-q u isa -a çã o.

C om b a se n a com p le m e n ta rid a d e e n a im b rica çã o d a s ca te g oria s e d os m o-d os o-d e e n u n cia çã o, a a u tora con clu i q u e ta is m e ca n ism os n ã o fu n d a m e n ta ria m g ê n e ros n a rra tivos d istin tos. N e sse ca -so, o q u e fa ze r? En con tra n d o u m a sa íd a in e sp e ra d a p a ra o im p a sse , a h ip óte se é q u e e le s fu n d a m e n ta m a rg u m e n tos, ch a m a d os h istóricos e m íticos. Disso re -su lta a lg o in te re ssa n tíssim o, q u e , a liá s, m e re ce ria u m a a te n çã o m a ior d a a u to-ra . N a d a im p e d e q u e o a rg u m e n to h is-tórico se ja a p lica d o p or u m n a rra d or e m u m re la to d e fa tos tra n scorrid os com a n te p a ssa d os d e scon h e cid os, n o te m p o d e Ia n e ja r, in clu sive . Alé m d isso, os m e sm os fa tos p od e m se r n a rra d os com ê n fa se n o a rg u m e n to m ítico ou n o h is-tórico.

(7)

i-ta çõe s e con tra p osiçõe s e n tre ca te g o-ria s g e n é rica s, e n q u a n to o h istórico e s-ta b e le ce re la çõe s d e con tin u id a d e a fim d e re con stitu ir a tra m a d os a con te cim e n tos e d a s re la çõe s. Ele s sã o cocim p le m e n ta re s e , o q u e n ã o é m e n os im p or -ta n te , con stru íd os a o lon g o d a p e rfor-m an ce n a rra tiva , a q u a l é in te ira rfor-m e n te su b ord in a d a a u m p a d rã o d e tra n sm is-sã o ora l e sp e cífico, rotu la d o d e d iá log o – u m a n oçã o q u e , já p e los b re ve s e p re ciosos m a te ria is e tn og rá ficos a p re se n -ta d os, e xig e u rg e n te m e n te u m a crítica e tn og rá fica n a m e sm a lin h a d a q u e la a q u i re a liza d a com o m ito e a h istória .

Pod e rse ia q u e stion a r a lg u n s p on -tos d a a rg u m e n ta çã o d a a u tora : a e xis-tê n cia d e h íb rid os n ã o é con tra d itória com a e xistê n cia d e tip os; a re form u la -çã o d a d icotom ia m ito e h istória e m te r-m os d e a rg u r-m e n tos é e voca d ora d a d is-tin çã o le vistra u ssia n a e n tre m ito e rito; e m a is isso ou a q u ilo. En tre ta n to, d e ve r-se -ia ta m b é m re ssa lta r q u e su a a n á lir-se su g e re q u e solu çõe s re ce n te m e n te e n -con tra d a s p a ra e xp lica r a im b rica çã o d o m ito e d a h istória , a sa b e r, a p roje çã o d e ssa d istin çã o p a ra o p la n o d a con s-ciê n cia in d íg e n a e d a s form a s d e m a n i-p u la çã o socia l, é m a is d o q u e in sa tisfa-tória . N ã o se rá tra n sfig u ra n d o n ossa s ca te g oria s e m u m a con sciê n cia b ip a rti-d a rti-d os ín rti-d ios q u e n os a p roxim a re m os d e u m a com p re e n sã o m a is ju sta d e su a s m a n e ira s d e vive r, p e n sa r e in scre ve r o te m p o. N ote -se a í u m a e stra n h a in ve r-sã o d a d ire çã o u su a l d o m é tod o a n tro-p ológ ico: o tro-p roce d im e n to q u e tro-p a rte d e d ife re n ça s su p e rficia is e m b u sca d e u m p rin cíp io g e ra l (n ã o im p orta n d o o m od o com o se o con ce b e ) é con ve rtid o e m u m p roce d im e n to q u e p a rte d a s se m e lh a n -ça s a p a re n te s e b u sca a s d ife re n -ça s p ro-fu n d a s. Se ria p re ciso in d a g a r-se sob re a s ve rd a d e ira s con se q ü ê n cia s d e ssa in -ve rsã o m e tod ológ ica , p ois, se rá q u e n ã o a ca b a m os p or r e stitu ir, d e m a n e ira

su b -re p tícia , a q u ilo m e sm o q u e e sta mos fin a lm e n te d isp ostos a p ôr e m q u e stã o? Pe trifica m os M a iri e a p e le d e Tu p ã , p e trifica m os a té m e sm o a s p a la vra s n o p a p e l, a o p a sso q u e , p a ra o p róp rio Ia -n e ja r, o -n osso d e sti-n o e ra le g íve l/ i-n scritíve l a n te s d a orig e m d a e scrita . Se te -m os co-m o p rin cíp io q u e a h istória , n a a ce p çã o d e d e vir socia l e h u m a n o, é ca -p a z d e e x-p lica r d e sd e a s m itolog ia s q u e se con ce b e m com o a te m p ora is a té a s h istória s e scrita s p e los h istoria d ore s, p a ra os Wa iã p i os m itos g e ra m fa la s a d e q u a d a s p a ra se fa ze r a h istória , n os n ossos e e m tod os os se n tid os. Ain d a q u e n os a p a re ça com o u m a h istória con tra a h istória , e la n os in d a g a sob re a ra -zã o p e la q u a l b u sca m os a lg u m a ra -zã o fora d a s p a la vra s.

(8)

GOODY, Jack. 1995. The Expansive M oment: The Rise of Social Anthropo-logy in Brit ain and Af rica, 1918- 1970. Cambridge: Cambridge Universit y Press. 235 pp.

Ana Claudia Cruz da Silva

M e stra n d a , PPG AS-M N -UFRJ

Por oca siã o d a m orte d e M e ye r Forte s, J a ck G ood y foi con vid a d o a e scre ve r se u ob itu á rio. Pa ra isto, p e sq u isou a r-q u ivos e m G a n a (on d e Forte s re a lizou b oa p a rte d e su a s p e sq u isa s), n a Lon d on Sch ool of Econ om ics e n o In te rn a -tion a l Africa n In stitu te . Te n d o e m m ã os e sse m a te ria l e ou vin d o re corre n te s co-m e n tá rios d e a n trop ólog os a co-m e rica n os e ru ssos sob re a “ n a tu re za con se rva d o-ra ” (:5) d a a n trop olog ia b ritâ n ica com re la çã o a o im p é rio colon ia l, G ood y p e n -sou e m e scre ve r Th e Ex p an siv e M o-m e n t. O livro n ã o p re te n d e re la ta r a h is-tória d a a n trop olog ia socia l b ritâ n ica , e m b ora p ossa se r u m a b oa fon te sob re su a s lin h a s d e p e sq u isa e n tre os a n os 30 e 60.

A ob ra te ria d ois ob je tivos ce n tra is: o p rim e iro, m a p e a r a s re la çõe s e n tre in stitu içõe s e p rofission a is d a a n trop olog ia , p a ssa n d o p or q u e stõe s q u e e n volve ria m e n sin o, p e sq u isa , fin a n cia -m e n to, in stitu cion a liza çã o e e xp a n sã o d a d iscip lin a . Ap e sa r d e su a s le m b ra n -ça s p e ssoa is e d e se u s con ta tos com con te m p orâ n e os e m e m b ros d a g e ra çã o a n te rior, G ood y fa z q u e stã o d e a p oia r su a p e sq u isa som e n te n o m a te ria l e n -con tra d o n os a rq u ivos, o q u e in clu i, a lé m d os d ocu m e n tos in stitu cion a is e p ap e rs, vá ria s corre sp on d ê n cia s p e s-soa is q u e , com o e le m e sm o re ssa lta , n ã o a p re se n ta m n a d a q u e n ã o p u d e sse se r d e d om ín io p ú b lico, se n d o q u e os a sp e ctos m a is p e ssoa is som e n te sã o u tiliza d os n a m e d id a e m q u e sã o re le va n

-te s p a ra o d e se n volvim e n to d a a n trop o-log ia socia l b ritâ n ica .

O se g u n d o ob je tivo se ria d e riva d o d o p rim e iro. G ood y p re te n d e ria , a p a r-tir d a e xp osiçã o d a s re d e s d e re la çõe s e d os m ovim e n tos q u e p e rp a ssa m a a n -trop olog ia b ritâ n ica n e ste m om e n to, n e g a r a te se d a su b m issã o d a d iscip lin a à s a u torid a d e s colon ia is, d e fe n d e n d o-a d a a cu sa çã o re corre n te d e q u e se ria “ fi-lh a d o colon ia lism o” (:3), e a trib u íd a p rin cip a lm e n te à a n trop olog ia a m e rica -n a d os a -n os 60 e 70, e m b ora G ood y -n ã o e xp licite os “ a cu sa d ore s” .

O p e ríod o a b ra n g id o p e la p e sq u isa é com p osto p or trê s g e ra çõe s d e a n trop ólog os, cu jos a tore s trop rin citrop a is e m ca -d a u m a -d e la s sã o M a lin ow sk i e Ra -d clif-fe -Brow n , n a p rim e ira ; Forte s, Eva n s-Pritch a rd e G lu ck m a n , n a se g u n d a ; e o p róp rio G ood y, n a te rce ira . Essa s trê s g e ra çõe s vive ra m o p e ríod o d e m a ior e xp a n sã o d a a n trop olog ia socia l b ritâ -n ica , q u e G ood y e xp lica com o o m o-m e n to e o-m q u e se fe z a crítica d a a n trop olog ia trop ra tica d a a n te riorm e n te (te n ta tiva s d e re con stru çã o d o p a ssa d o, com -p a ra çõe s g lob a is, tra b a lh os d e ca m -p o m a l fe itos e tc.), e e m q u e h ou ve u m g ra n d e in cre m e n to d os fin a n cia m e n tos p a ra p e sq u isa a ssocia d o à p re se n ça d e p e sq u isa d ore s a lta m e n te m otiva d os.

(9)

colon ia is. G ood y le m b ra a in d a q u e o m e sm o a con te cia n a Fra n ça e n a Ale -m a n h a , a fir-m a n d o q u e o p róp rio M a u ss d e u cu rsos p a ra a d m in istra d ore s d a s colôn ia s fra n ce sa s. N e sse s d ois p a íse s, o a cú m u lo d e d a d os sob re g ru p os a fri-ca n os cole ta d os p or e sse s “ e tn óg ra fos” e sta ria m a is a va n ça d o d o q u e n a G rã Bre ta n h a , p orq u e n e ssa é p oca o in te re sse d o g ove rn o b ritâ n ico e sta ria con ce n tra d o n a Ín d ia . Em re la çã o a os a n -trop ólog os p rofission a is, G ood y re ssa lta q u e b oa p a rte d e le s tin h a u m a lin h a d e p e n sa m e n to d e e sq u e rd a , in flu e n cia d a p or M a rx e Fre u d , e e sta va m e n volvid os com os m ovim e n tos p e la in volvid e p e n -d ê n cia -d os p a íse s q u e e stu -d a va m . Alg u n s te ria m , in clu sive , op ta d o p e la a n -trop olog ia e m con se q ü ê n cia d e su a p a r-ticip a çã o n e sse s m ovim e n tos.

Alé m d isso, G ood y ch a m a a a te n çã o p a ra o fa to d e q u e u m a p a rte con sid e rá -ve l d os a n trop ólog os a p oia d os p e los p rog ra m a s d e fin a n cia m e n to n ã o e ra d e orig e m b ritâ n ica , o q u e ta m b é m tra zia p rob le m a s e m u m a socie d a d e com o a in g le sa . Esse s d ois e le m e n tos – a form a -çã o d e e sq u e rd a e a n a cion a lid a d e n ã o b ritâ n ica d os a n trop ólog os b e n e ficia d os com re cu rsos p a ra p e sq u isa – sã o ou tro a rg u m e n to im p orta n te d e G ood y con tra a id é ia d a cola b ora çã o e n tre a a n trop o-log ia e o g ove rn o.

Aq u i va le re g istra r q u e o a u tor p rop õe u m a rop rob le m a tiza çã o d o q u e re -p re se n ta va , n e sse con te xto, se r “ d e e sq u e rd a ” ou “ d e d ire ita ” . G ood y su ste n -ta q u e Forte s e Eva n s-Pritch a rd , p or e xe m p lo, fora m m u d a n d o su a s id é ia s a o lon g o d e su a tra je tória , se n d o q u e o p rim e iro tin h a u m a p osiçã o m a is “ ra d i-ca l” d o q u e o se g u n d o q u e , p rin cip a l-m e n te d e vid o à su a orig e l-m socia l, p e m a n e cia m a is p róxim o d a cla sse g ove r-n a r-n te . É sa b id o ta m b é m q u e M a lir-n ow sk i e Ra d cliffe Brow n n u n ca d e m on stra ra m te n d ê n cia s p rop ria m e n te re volu

-cion á ria s. Essa s in form a çõe s p od e ria m sig n ifica r q u e o p e n sa m e n to m a rxista , n a ve rd a d e , n ã o tin h a u m a in flu ê n cia tã o forte q u a n to se su p u n h a , e sta n d o m a is p re se n te e n tre os a n trop ólog os e m in ício d e ca rre ira d o q u e n a q u e le s q u e re a lm e n te d om in a va m a a n trop olog ia .

Se g u n d o G ood y, foi M a lin ow sk i o g ra n d e a rticu la d or d a p rofission a liza -çã o d a a n trop olog ia n a G rã -Bre ta n h a , q u e te ria ocorrid o d e p ois d a Prim e ira G u e rra M u n d ia l. Su a h a b ilid a d e p a ra le va n ta r re cu rsos foi re sp on sá ve l p e la e xp a n sã o d o ca m p o d e p e sq u isa n e ssa é p oca . E, e m re la çã o a isso, u m d os p on -tos im p orta n te s n a a rg u m e n ta çã o d e G ood y é q u e o m a ior fin a n cia d or d a s p e sq u isa s, a Fu n d a çã o Rock e fe lle r, e ra a m e rica n o. A a ju d a d e órg ã os e stra n -g e iros som a d a a os d e m a is a sp e ctos já a p on ta d os im p lica ria u m a g ra n d e d e s-con fia n ça p or p a rte d os a d m in istra d o-re s d a s colôn ia s e m o-re la çã o a os p e sq u sa d ore s, n e g a n d o a in d a m a is a p ossib i-lid a d e d e u m a re la çã o d e coop e ra çã o e n tre e le s.

(10)

tod os os fin a n cia d os e ra m ob rig a d os a a ssistir se u s se m in á rios e re ce b ia m tre i-n a m e i-n to d e tra b a lh o d e ca m p o; a lé m d isso, G ood y re la ta q u e M a lin ow sk i d i-rig ia a d istrib u içã o d os re cu rsos (e xe r-cia “ p a tron a g e m ” (:26)) e e ste s e ra m se m p re n e g a d os, p or e xe m p lo, p a ra Eva n s-Pritch a rd , q u e fa zia op osiçã o a e le , o q u e o te ria le va d o a e sta b e le ce r u m a forte lig a çã o com Ra d cliffe -Brow n (:16). Este , p or su a ve z, foi d ire tor d e ou tro con se lh o d e p e sq u isa , ta m b é m cria d o p e la Fu n d a çã o Rock e fe lle r, o Au stra lia n N a tion a l Re se a rch C ou n cil.

O u tro a rg u m e n to d e G ood y a fa vor d a a u ton om ia d a a n trop olog ia socia l se -ria o d e q u e os in te re sse s d a Fu n d a çã o Rock e fe lle r n ã o coin cid ia m com os in te -re sse s d a a n trop olog ia e a m b os n ã o coin cid ia m com os d o g ove rn o b ritâ n ico. O s p e sq u isa d ore s n ã o e sta va m in te re ssa d os e m e stu d a r a s re la çõe s d e con -ta to cu ltu ra l – ob je tivo d a Fu n d a çã o –, m a s e m fa ze r u m e stu d o p rofu n d o d a s socie d a d e s n a tiva s à s q u a is e sta va m se d e d ica n d o, a té m e sm o p orq u e n ã o q u e -ria m con flitos com a s a u torid a d e s lo-ca is, o q u e ce rta m e n te ocorre ria lo-ca so e stu d a sse m os im p a ctos ca u sa d os n a s p op u la çõe s p e la p re se n ça d o colon iza -d or. N o e n ta n to, cre io q u e ta l a u ton om ia tin h a liom ite s e q u e , se os p e sq u isa d ore s n ã o p e rse g u ia m o te m a re com e n d a d o p e la Fu n d a çã o, a o m e n os a p re se n ta va m re su lta d os q u e lh e sa tisfa -zia m . Pe n so q u e a a p roxim a çã o e n tre a Fu n d a çã o e M a lin ow sk i n ã o se d e u a p e n a s p e la id e n tifica çã o d a p rim e ira com os m é tod os d o se g u n d o, com o su -g e re G ood y, já q u e tod a re la çã o é u m a via d e m ã o d u p la . Assim , é p ossíve l e p e cu la r q u e a p róp ria ê n fa se m a lin ow s-k ia n a n a q u e stã o d o tra b a lh o d e ca m p o te n h a se d a d o ta m b é m e m fu n çã o d os in te re sse s d a Fu n d a çã o e n q u a n to n a n cia d ora d os p roje tos. N o ca p ítu lo fin a l, G ood y ch e g a a a p ofin ta r fin e ssa d ire

-çã o a o d ize r q u e os a sp e ctos u tilitá rios d a a n trop olog ia b ritâ n ica sã o re su lta d o “ d os d e se jos d e se u p atrão am e rican o d om in a n te , a Fu n d a çã o Rock e fe lle r” (:145, ê n fa se s m in h a s). As re fe rê n cia s a os d e se jos d o p a trã o a m e rica n o sig n i-fica m m a is q u e u m a p e q u e n a su b m is-sã o se m in te rfe rê n cia n o tra b a lh o.

O m e sm o ocorre com a s in form a -çõe s re la tiva s à p a rticip a çã o e fe tiva d e a n trop ólog os p e rte n ce n te s a o In te rn a -tion a l Africa n In stitu te ju n to a os g ove r-n os color-n ia is e à lig a çã o d e Eva r-n s-Prit-ch a rd com o g ove rn o colon ia l d o Su d ã o. Esse tip o d e e n volvim e n to p od e ria con -tra d ize r, ou a o m e n os p rob le m a tiza r, a te se ce n tra l d e G ood y. De fa to, n ã o é p ossíve l d e te rm in a r com p re cisã o q u e os a n trop ólog os n ã o cola b ora va m com o g ove rn o p orq u e e ra m d e e sq u e rd a ou p orq u e d e le n ã o re ce b ia m ve rb a s, n e m q u e cola b ora va m p orq u e d e ve ria m ob e d e ce r a os “ p a trõe s” fin a n cia d ore s p a ra con tin u a r re ce b e n d o os fu n d os. Pe n so q u e tod os e sse s fa tore s fa ze m p a rte d a s d e te rm in a çõe s q u e g u ia va m a s a çõe s socia is e os d e stin os d a a n tr o-p olog ia b ritâ n ica . O o-p rob le m a é o fa to d e G ood y forn e ce r tod a s e ssa s in form a -çõe s se m re la cion á -la s e n tre si.

(11)

GRAHAM , Laura. 1995. Perf orming Dreams. Discourses of Immort alit y among t he Xavant e of Cent ral Brazil. Aust in: Universit y of Texas Press. 290 pp.

M arcela Stockler Coelho de Souza

Dou tora n d a , PPG AS-M N -UFRJ

Em 1984, re torn a n d o à a ld e ia d e Pi-m e n te l Ba rb osa p a ra d a r con tin u id a d e à p e sq u isa in icia d a e m 1981, La u ra G ra h a m p re se n cia u m a in trig a n te p e r-form an ce , e n volve n d o tod a a com u n i-d a i-d e , i-d e trê s ca n tos-i-d a n ça e n sin a i-d os e m son h o p e los a n ce stra is m íticos a o ch e fe Wa rod i. Essa ce rim ôn ia se rá o ob -je to d o livro: a tra vé s d e la , a a u tora va i e n fa tiza r o lu g a r d a s d ife re n te s p rá tica s e xp re ssiva s q u e a in te g ra m n a con stitu içã o e p e rp e stitu a çã o d a id e n tid a d e xa -va n te – o foco n u m e ve n to e sp e cífico p e rm ite lh e e xa m in a r os p roce ssos p e -los q u a is “ m e a n in g s u n fold in p e rform a n ce ” (:5) n o p la n o rform icro e rform q u e a re -corrê n cia d a form a g a ra n tiria , a lé m d a s a lte ra çõe s d e con te ú d o, o se n tim e n to su b je tivo d e con tin u id a d e cu ltu ra l e a g ê n cia h istórica .

Ap ós u m a in trod u çã o e m q u e sã o a p re se n ta d a s p re m issa s te órica s, m é tod os e cola b ora tod ore s n a tivos, os ca p ítu -los 2 e 3 d e se n h a m os con te xtos h istóri-co e e tn og rá fiistóri-co. En tre os Xa va n te q u e tra n sp u se ra m o Ara g u a ia e m m e a d os d o sé cu lo XIX, os d e Pim e n te l Ba rb osa con stitu e m os d e sce n d e n te s d a q u e le s q u e p e rm a n e ce ra m n a á re a d a g ra n d e a ld e ia d e Tsoré p re , n a re g iã o d o rio d a s M orte s, os p rim e iros visita d os p or M a y-b u ry-Le w is. Soy-b a lid e ra n ça d o cé le y-b re Ap öw ˜e (p a i d e Wa rod i) e sse foi o p rim e iro g ru p o xa va n te a e sta b e le ce r con -ta to p a cífico com a socie d a d e n a cion a l n a d é ca d a d e 40. G ra h a m a d icion a a p e rsp e ctiva p a rticu la r d e ssa com u n id a

-d e a o cre sce n te corp o -d e e stu -d os -d isp o-n íve is sob re a h istória xa va o-n te , d e li-n e a li-n d o a o m e sm o te m p o o p a li-n o d e fu n d o d o con te xto im e d ia to d o son h o d e Wa rod i. In trod u zn os e n tã o n e ssa socie -d a -d e a tra vé s -d a e xp lora çã o -d e su a p a i-sa g e m son ora (sou n d scap e ). C om e ça p e los silê n cios, com u m a rica d e scriçã o d os p a d rõe s d e in te ra çã o ve rb a l d os a fin s, tra ça n d o e m se g u id a u m m a p a d os d ife re n te s g ê n e ros voca is se g u n d o se u s con te xtos, ritm os d iá rios e sa zon a is e ciclo d e vid a , com ê n fa se n o te m a d a e ficá cia d a s form a s e xp re ssiva s n o e n -g e n d ra m e n to d e u m “ se n se of con ti-n u ity or a ti-n d p e rsiste ti-n ce th rou g h tim e , from d a y to d a y, from se a son to se a son , a n d a cross g e n e ra tion s” (:92).

(12)

tra b a la n ça ria a ssim a s força s ce n trífu -g a s d o fa ccion a lism o xa va n te . Por fim , o re la to m ítico (ca p ítu lo 6) é ta m b é m in -corp ora d o a o d iscu rso d e Wa rod i, n u m a form a fra g m e n ta d a e e líp tica q u e con -tra sta com a d a s n a rra tiva s “ te a -tra is” e s-cu ta d a s e m con te xto fa m ilia r, m a s q u e op e ra u m a id e n tifica çã o p rog re ssiva e n -tre o p on to d e vista d o n a rra d or e o d os p rota g on ista s m íticos, n u m a fu sã o q u e a n te cip a a m e ta m orfose d os d e m a is p a rticip a n te s d a ce rim ôn ia , d e ssa ve z a tra -vé s ta m b é m d e e le m e n tos visu a is e ci-n e sté sicos (d e cora çã o corp ora l, d a ci-n ça ), ob je to d o ú ltim o ca p ítu lo.

A d e scriçã o a m p lia e re e la b ora d a -d os p re se n te s n u m a a n á lise a n te riorm e n te p u b lica d a q u e d isp u n h a o la m e n to ritu a l, os ca n tos d a ñ ore e a ora -tória n u m con tin u u m e n tre os p ólos d a m u sica lid a d e e d a se m a n ticid a d e cor-re sp on d e n te à org a n iza çã o cosm olog ica m e n te in form a d a d o e sp a ço socia l xa -va n te e n tre os p ólos d a “ n a tu re za ” e d a “ cu ltu ra ” . Ag ora , con tu d o, o fio q u e u n e a s vá ria s form a s d iscu rsiva s é a d u -p la d in â m ica e x-p re ssã o in d ivid u a l/ co-le tiva , in ve n çã o/ con tin u id a d e cu ltu ra l, im p lica d a n o m od o p a rticu la r e orig in a l com o e sta s se re a liza m e com b in a m n e ssa p e rform an ce in ova d ora , a p a rtir d o p roje to d e Wa rod i e se u con te xto im e -d ia to (cisã o -d a a l-d e ia , com p e tiçã o e n tre com u n id a d e s, p re se n ça d a p e sq u isa d ora ). Da tora n sform a çã o d e u m a e xp e riê n -cia on írica su b je tiva n u m a e xp e riê n -cia cole tiva a tra vé s d a tra n sm issã o d o ca n -to, p a ssa n d o p e la d e sp e rson a liza çã o d o d iscu rso n a rra tivo e cu lm in a n d o n a id e n tifica çã o d o n a rra d or e , p e la p e rfor-m an ce , d e tod a a corfor-m u n id a d e corfor-m os “ im orta is” , é o m e sm o p roce sso q u e e s-tá se n d o d e scrito. Este p roce sso é o q u e fa z d a s in stâ n cia s a n a lisa d a s “ d iscou r-se s of im m orta lity” : d a im orta lid a d e p e ssoa l d e Wa rod i e d a im orta lid a d e d a cu ltu ra xa va n te , con stru íd a s in te rd e

-p e n d e n te m e n te : “ By e m b e d d in g h is p e rson a l q u e st for a d istin g u ish e d im -m orta lity w ith in th e ve ry p ra ctice s th a t e n su re th e fu tu re of th e m a ll, Wa rod i ce le b ra te d com m u n ity va lu e s tog e th e r w ith h is p e rson a l in te re sts. […] Th e ve ry sa m e d iscu rsive p ra ctice s th a t g u a ra n te e th e Xa va n te ’s cu ltu ra l su rvi-va l a re th ose th a t w ill g ive Wa rod i, a s a cre a tor, th e g ift of a d istin g u ish e d im -m orta lity” (:224).

O m od o d e e xp osiçã o n os re m e te con tin u a m e n te d a p e rform an ce e m foco a ou tra s p e rform an ce s, com o se G ra h a m p rocu ra sse e m ce rta m e d id a sim u -la r, e m su a e scrita , a e xp e riê n cia q u e con stitu iria , e m su a con ce p çã o, o “ q u a -d ro in te rp re ta tivo” u tiliza -d o p a ra a tri-b u ir sig n ifica d os a e ve n tos e xp re ssivos, a sa b e r, a e xp osiçã o a n te rior a ou tros e ve n tos d o m e sm o tip o (:7). O re su lta d o é u m e stilo n a rra tivo q u e re con strói vi-va m e n te a a tm osfe ra son ora d a vid a n a a ld e ia , n u m a e tn og ra fia d o u n ive rso a cú stico xa va n te q u e d e m on stra a m p la -m e n te o re fin a -m e n to d a d e scriçã o e tn o-g rá fica p ossíve l a o se tom a r os a sp e ctos form a is e con te xtu a is d o d iscu rso, e n ã o a p e n a s se u con te ú d o, com o ob je to.

(13)

ltu ra lm e n te , in sistin d ose sob re o ca rá -te r su b je tivo e “ p e ssoa l” d o son h o, ora e m te rm os a n a líticos, ora com o re p re -se n ta çã o in d íg e n a , d e m od o u m ta n to a m b íg u o. Pa ra le la m e n te , a a p re se n ta -çã o d e p rá tica s d iscu rsiva s e sp e cífica s com o re p re se n ta çõe s p ra g m á tica s d e u m a con ce p çã o “ b a k h tin ia n a ” d a lin -g u a -g e m e d o d iscu rso (:166-167), con tra H a b e rm a s e a filosofia d a lin g u a g e m (:140142), n ã o a ca b a ria re d u zin d o o sig -n ifica d o d e ssa s p rá tica s a os te rm os d e u m d e b a te con ce b id o sob re ou tra s p re m issa s? Por fim , o tra ta m e n to d a s ca te -g oria s d e e sp íritos q u e G ra h a m -g losa com o “ im orta is” é ig u a lm e n te b re ve (d iscre p â n cia s n otá ve is e n tre su a d e s-criçã o e a d e M a yb u ry-Le w is se q u e r sã o re g istra d a s), sob re tu d o d ia n te d a ce n tra lid a d e d o te m a d a op osiçã o vi-vos/ m ortos n a e tn olog ia com p a ra tiva d o con tin e n te . C on te sta n d o a ca ra cte ri-za çã o d a s socie d a d e s jê com o “ th isw orld orie n te d ” , e m con tra ste com g ru p os a m a zôn icos cu ja vid a ritu a l ce n tra -se n o xa m a n ism o, e la su g e re q u e “ th e p rob le m for e th n og ra p h e rs h a s b e e n th a t th is oth e r w orld is n ot a w orld th a t is se e n : th e w orld of th e im m orta l cre a -tors is a w orld th a t is h e a rd ” (:100) – u m d ia g n óstico q u e a lé m d e n ã o fa ze r ju sti-ça a Se e g e r, fon te cita d a d o con tra ste , d e sca rta d e m od o su m á rio a in tu içã o d e u m a d ife re n ça im p orta n te , q u e d e ve se r ce rta m e n te m e lh or d e te rm in a d a e d e vid a m e n te m ovid u la vid a , m a s q u e se ria p re -cip ita d o a b a n d on a r.

N ã o se tra ta a q u i d e ce d e r a o re cu r-so fá cil d e cob ra r a u m a u tor a q u ilo q u e e le n ã o te n tou fa ze r, m a s d e in q u irir so-b re os lim ite s d e q u a lq u e r “ a so-b ord a g e m d a cu ltu ra ” q u e con fu n d a a se le çã o d e u m n íve l p rivile g ia d o d e a n á lise com a d e scob e rta d e u m n íve l p rivile g ia d o d e sig n ifica çã o, e se fu rte a ssim à n e ce ssi-d a ssi-d e ssi-d e con fron ta r se u s re su lta ssi-d os com a q u e le s ob tid os p or e stu d os q u e se

si-tu a m n ou tros re g istros. G ra h a m a p óia su a d e scriçã o n a e tn og ra fia xa va n te e xiste n te , m a s e m su a s in te rp re ta çõe s n ã o d ia log a com a s q u e stõe s p osta s a li ou n a e tn olog ia jê e su l-a m e rica n a e m g e ra l, com o se a e con om ia sim b ólica con stitu tiva d a s id e n tid a d e s p e ssoa is e cole tiva s, q u e ta n to a p rod u çã o re ce n te d e n ossa su b d iscip lin a te m te n ta d o e lucid a r, fosse irre le va n te p a ra a com -p re e n sã o d a -p e rform an ce e m foco. Isso re fle te p rova ve lm e n te a a titu d e crítica d os a d e p tos d o “ d iscou rse ce n tre d a p -p roa ch to cu ltu re ” d ia n te d a in s-p ira çã o e stru tu ra lista d e m u itos d e sse s e stu d os. Te m o, n o e n ta n to, q u e o p rin cíp io d e q u e “ th e ‘syste m ’ is a p re cip ita te of p a st e xp re ssive p e rform a n ce s” , d e q u e a lan g u e é u m “ p re cip ita te of in sta n ce s of p arole ” (:7), n ã o se ja su ficie n te , q u a l-q u e r l-q u e se ja se u va lor ú ltim o, p a ra a b olir a com p le xid a d e d e ssa ord e m d e fe n ôm e n os q u e a a n trop olog ia te m te n -ta d o a p re e n d e r sob a s su a s n oçõe s d e cu ltu ra – d e m od o q u e n ossa s m e lh ore s ch a n ce s con tin u a m p osta s n a s te n ta tiva s d e com b in a çã o e a ju ste d a s d ife re n te s p e rsp e ctiva s e in stru m e n tos d e ob -se rva çã o d isp on íve is.

GUENIFFEY, Pat rice. 1993. Le Nombre et la Raison: La Révolut ion Française et les Élect ions(pref ácio de François Furet). Paris: Éd. de l’École des Hautes Études en Sciences Sociales. 560 pp.

Gabriela Scotto

Dou tora n d a , PPG AS-M N -UFRJ

(14)

livre su frá g io, a o d e fin ir a virtu d e , os ta -le n tos e a ca p a cid a d e com o os ú n icos crité rios d e a d m issã o, os con stitu in te s in stitu íra m o p rin cíp io d e m ocrático d e se le ção. As h on ra s e a s re sp on sa b ilid a d e s d e ixa m d e se r o fru to d o n a scim e n to, d o fa vor ou d a in trig a , p a ra se r a re -su lta n te d o m é rito p e ssoa l con sa g ra d o p e la op in iã o. Em 1790, com e xce çã o d o p od e r e xe cu tivo con fia d o a o re i, n ã o e xiste fu n çã o p ú b lica p a ra a q u a l se u s d e p ositá rios n ã o te n h a m sid o e le itos.

O tra b a lh o d o h istoria d or Pa trice G u e n iffe y a b ord a u m m om e n to e sp e cí-fico e con tu rb a d o d a h istória p olítica fra n ce sa : o p e ríod o q u e se e ste n d e d a Re volu çã o d e 1789 a té 1795 q u a n d o, a p ós a m orte d e Rob e sp ie rre , in sta u ra -se a b re ve e xp e riê n cia d a Re p ú b lica C on stitu cion a l. Pe ríod o d e m u ta çã o, ru p tu ra e d issolu çã o d a ord e m e xiste n -te , m a s d u ra n -te o q u a l, a o con trá rio d o q u e ocorre e m u m g olp e d e Esta d o, ve -rificou -se u m m od o d e in stitu içã o d a a u torid a d e e d e re g u la çã o d os con flitos p olíticos q u e re q u e ria m a con stru çã o d e u m con se n so, a o m e n os re la tivo, a ce rca d o ca rá te r d a s n ova s in stitu içõe s.

G u e n iffe y d e d ica -se à a n á lise d e u m ob je to tra d icion a lm e n te n e g lig e n -cia d o p e la h istoriog ra fia : o m om e n to d o v oto – o in sta n te e m q u e a s p e ssoa s vi-ra m cid a d ã os, in d e p e n d e n te m e n te d a s circu n stâ n cia s q u e ce rca m a con voca -çã o d os e le itore s, e d os re su lta d os d o e scru tín io. Assim , a p rop osta d o a u tor é a n a lisa r o d e se n volvim e n to d a s e le i-çõe s n a s a sse m b lé ia s p rim á ria s, n o q u e e la s tê m d e p a rticu la r, e n ã o a p e n a s co-m o u co-m fa tor su p le co-m e n ta r a se rviço d a com p re e n sã o d a s p e rip é cia s d a h istória p olítica d u ra n te a Re volu çã o. O re g im e e le itora l a d ota d o p e la C on stitu in te re -p ou sa va n u m m od o d e e le içã o in d ire ta e m d ois n íve is: o con ju n to d os “ cid a d ã os a tivos” , con g re g a d os e m a sse m -b lé ia s p rim á ria s re u n id a s n u m can ton

(d istrito e le itora l), e le g ia os e le itore s; e ste s, p or su a ve z, n u cle a d os e m d e p a rta m e n tos, d e sig n a va m os re p re se n rta n -te s. A p a rtir d e fon -te s e d a d os d ive rsos (a ta s d e se ssã o e le itora l, te ste m u n h os d e é p oca , d e cre tos e re g u la m e n tos e le itora is, d e b a te s con sa g ra d os à org a n iza -çã o d a s n ova s in stitu içõe s), G u e n iffe y a n a lisa a s m od a lid a d e s e le itora is p a ra com p re e n d e r com o os p rin cíp ios e p roce d im e n tos fora m a p lica d os con cre ta -m e n te .

O livro, a b u n d a n te e m d a d os h istó-ricos m u ito p orm e n oriza d os – o q u e tor-n a a le itu ra , p or ve ze s, u m ta tor-n to d e tor-n sa –, a o in vé s d e se g u ir a ord e m cron ológ ica d a s su ce ssiva s e le içõe s e d a s re la -çõe s d e sta s com os a con te cim e n tos, or-g a n iza -se e m torn o d e a lor-g u m a s q u e s-tõe s ce n tra is: o d e se n rola r d e u m a e le i-çã o, d e sd e a d e fin ii-çã o d a s con d içõe s e xig id a s p a ra vota r a té a p rocla m a çã o d os re su lta d os (ca p ítu los 1-2). Q u a is e ra m os fin s d a “ d e m ocra cia d a s e le i-çõe s” ? Q u e re p re se n ta i-çõe s e n volvia m o voto (ca p ítu lo 3)? Q u a n tos e le itore s e xe rcia m se u s d ire itos p olíticos e com o e xp lica r a a b ste n çã o n os ca sos e m q u e e sta e ra sig n ifica tiva (ca p ítu los 4-6)? Q u a is a s m od a lid a d e s d os siste m a s e le itora is e com o e ra fe ita a e scolh a n a a u sê n cia d e ca n d id a tos d e cla ra d os (ca -p ítu los 7-8)? Q u a is fora m os re su lta d os e com o a va lia r su a im p ortâ n cia p olítica (ca p ítu los 910)? O ú ltim o ca p ítu lo, d e -d ica -d o a o p e río-d o -d a Re p ú b lica C on sti-tu cion a l (1795-1797), e n ce rra o livro n a form a d e con clu sã o.

(15)

ca d a cid a d ã o e xp re ssa r su a op in iã o, n e m u m a e scolh a e n tre op çõe s e ca n d i-d a tos p a ra , com o voto, con trib u ir p a ra a d e fin içã o d a s g ra n d e s orie n ta çõe s p o-lítica s. Isso p orq u e o siste m a e le itora l im a g in a d o p e la Asse m b lé ia C on stitu in -te e rig iu -se sob re d u a s con ce p çõe s d i-fe re n te s d e re p re se n ta çã o. Por u m la d o, a q u e re p ou sa va n ã o a p e n a s sob re a id é ia d o voto com o u m d ire ito m a s, ta m -b é m , so-b re o p roje to re volu cion á rio d e in stitu ir, a tra vé s d o su frá g io d os cid a -d ã os, o p o-d e r -d o p ovo sob e ra n o, e n fim , d e su b stitu ir a u su rp a çã o d e u m a m on a rq u ia a b solu ta . Aq u i, a “ re p re se on ta -tivid a d e ” d a s a sse m b lé ia s d e via se r a m a is p róxim a p ossíve l d a d ive rsid a d e ca ra cte rística d e tod o o con ju n to n a cion a l. Por ou tro la d o, u m a cion oçã o d e re -p re se n ta çã o q u e re -p ou sa va sob re o p ostu la d o d a e xistê n cia d e u m in te re sse com u m a o p ovo. N e ssa se g u n d a con -ce p çã o n ã o im p orta ta n to a “ e xa tid ã o” d a re p re se n ta çã o, m a s sim e n con tra r os h om e n s ca p a ze s d e ze la r p e lo in te re sse cole tivo. Em sín te se , o su frá g io re p re se n ta va p a ra ca d a n ovo cid a d ã o o sím b olo, p or e xce lê n cia , d a sob e ra n ia re cu -p e ra d a -p e lo -p ovo. Se u e xe rcício e sta va d e stin a d o a in sta u ra r u m a a u torid a d e p ú b lica q u e g a ra n tisse a tra n sp a rê n cia in d isp e n sá ve l à m a n u te n çã o d a sob e ra n ia p op u la r. M a s a fórm u la p a ra g a ra n -tir e ssa tra n sp a rê n cia d e via p a ssa r p e lo filtro d a re p re se n ta çã o, n o se u se g u n d o se n tid o. Isso p orq u e o e sp írito p ú b lico – a virtu d e – n ã o e stá in scrito n os costu -m e s, n e -m su rg e e sp on ta n e a -m e n te ; a o con trá rio, a d ivisã o d o tra b a lh o cria m u itos “ ig n ora n te s” q u e p re cisa m te r u m g ove rn o p or p rocu ra çã o: se r re p re -se n ta d os.

Essa con ce p çã o a ce rca d a form a çã o d e d e cisõe s, q u e re je ita va a id é ia d e id e n tifica r a von ta d e g e ra l n a a ritm é tica d os votos, e sta va m a rtica d a p e lo ra -cion a lism o d a é p oca . Ain d a q u e o ra

cio-n a lism o p u ro fosse a lh e io à Re volu çã o, a p a rticip a çã o ig u a litá ria e a e la b ora -çã o d e m ocrá tica d a le i fora m p rin cíp ios d a é p oca d ifíce is d e se re m con cilia d os com a n e ce ssid a d e , im p e ra tiva ta m b é m , d a form a çã o d e u m a “ von ta d e g e -ra l” q u e fosse o p rod u to d a s von ta d e s in d ivid u a is “ e scla re cid a s” m e d ia n te u m a “ d e lib e ra çã o ra cion a l” . Essa te n -sã o e n tre d u a s e xig ê n cia s con tra d itó-ria s – a d o “ n ú m e ro” e a d a “ ra zã o” – e ste ve n o cora çã o d os d e b a te s d a é p oca sob re o su frá g io. O s con stitu in te s te n ta -ria m , a tra vé s d a e la b ora çã o d e a lg u m a s m e d id a s (e le içã o in d ire ta e m d ois n íve is e re striçõe s im p osta s à e le g ib ilid a d e d os re p re se n ta n te s, p rin cip a lm e n te ), n e u tra liza r a in flu ê n cia d o n ú m e ro, d a q u a l, p or ou tra p a rte , n ã o p od ia m su b -tra ir-se .

(16)

Ao lon g o d o livro, G u e n iffe y d e se n volve e ssa te se d e form a u m ta n to d e -sord e n a d a . Ao m e sm o te m p o q u e re to-m a , re corre n te to-m e n te , e ssa lin h a d e a r-g u m e n ta çã o, o a u tor a b re u m le q u e d e q u e stõe s d ive rsa s e in te re ssa n te s q u e n e m se m p re sã o a m a rra d a s u m a s à s ou -tra s. Esse -tra ço, q u e re d u z a p ossib ilid a ilid e ilid e sin te tiza r o livro e m p ou cos p a -rá g ra fos se m in ju stiça r a riq u e za d a a n á lise d a s d ive rsa s q u e stõe s, é a o m e s-m o te s-m p o u s-m a d a s ca ra cte rística s s-m a is e stim u la n te s d a su a le itu ra .

Du a s d e ssa s q u e stõe s m e re ce m e sp e cia l m e n çã o: o sp rob le m a d a a b ste n -çã o e le itora l tra ta d o n os ca p ítu los 4, 5 e 6; e a re la çã o e n tre p olítica e e le içõe s n o â m b ito loca l (ca p ítu lo 9). Em re la çã o a o p rob le m a d a a b ste n çã o e le itora l, G u e n iffe y d e sm a n ch a e re b a te m in u -ciosa m e n te os a rg u m e n tos q u e situ a m a s ca u sa s d a p ou ca p a rticip a çã o “ cid a -d ã ” n a ig n orâ n cia ou n a fa lta -d e civim o d o e le itora d o. Assin a la , a n te s, a re s-p on sa b ilid a d e d o s-p rós-p rio e ss-p írito d o siste m a e le itora l q u e d issu a d e m u itos cid a d ã os d e fa ze r su a p a rte : b a sica m e n -te a e stru tu ra d e a sse m b lé ia s (re m in is-cê n cia d o p e ríod o p ré -re volu cion á rio), a se p a ra çã o e n tre e le içã o e d e lib e ra çã o, e a a u sê n cia d e u m a “ ofe rta ” p olítica . A a ce p çã o m od e rn a d e e le içã o q u e , a lé m d e se r u m p roce d im e n to p a ra a se le çã o d e d irig e n te s, p e rm ite a o e le itor – a tra -vé s d a op çã o e n tre d ive rsos ca n d id a tos – “ e xp re ssa r su a op in iã o” é a lh e ia à Re -volu çã o. N e sse se n tid o, n ã o é a a n á lise d os re su lta d os e le itora is d a é p oca o m e io a d e q u a d o p a ra re con stitu ir a s corre n te s d e op in iã o, m a s sim a corre la çã o e n -tre p a rticip a çã o e a b ste n çã o. Ab ste r-se d e vota r re p re se n tou , ta m b é m , u m a for-m a d e for-m a n ife sta r a von ta d e in d ivid u a l.

A a n á lise d a s re la çõe s e in te ra çõe s p olítica s n o p la n o loca l n o con te xto d o p e ríod o p ós-re volu cion á rio é o te m a ce n tra l d o ca p ítu lo 9 (“ Um a Aristocra

-cia In visíve l?” ). N oçõe s ca ra s à a n tro-p olog ia tro-p olítica ta is com o tro-p od e r loca l, fa cçõe s, clie n te la s e tc., sã o u sa d a s fe -cu n d a m e n te p or G u e n iffe y p a ra a b or-d a r o ce n á rio p olítico loca l or-d a é p oca . E m a is a in d a , p a ra a n a lisa r a m a n e ira com p le xa p e la q u a l e ssa s form a s “ p ré p olítica s” n ã o só con tin u a ra m coe xistin -d o com os in te n tos p a ra con stitu ir u m “ e sp a ço p olítico d e m ocrá tico n a cion a l” , m a s, e p a ra d oxa lm e n te , com o a s ca ra cte rística s d o siscte m a e le itora l re força -ra m a d im e n sã o loca l d a com p e tiçã o p olítica . As n ova s form a s, a p lica d a s a os “ ve lh os con te ú d os” , g e ra ra m u m a n ova lin g u a g e m e e sta b e le ce ra m ou tra s re g ra s d e jog o p a ra a s lu ta s e n tre p a re n te la s e clie n te la s loca is, a s q u a is p a ssa -ra m a se r a rb it-ra d a s p e lo su frá g io d os e le itore s.

(17)

LIM A, Antonio Carlos de Souza. 1995. Um Grande Cerco de Paz. Poder Tute-lar, Indianidade e Formação do Estado no Brasil. Petrópolis: Vozes. 335 pp.

M arcos Otavio Bezerra

Prof. d e Sociolog ia , UFF

A p a rtir d e d ocu m e n ta çã o in te rn a d o Se rviço d e Prote çã o a os Ín d ios e Loca -liza çã o d o Tra b a lh a d ore s N a cion a is (SPILTN ), An ton io C a rlos d e S. Lim a d e -se n volve , e m Um G ran d e Ce rco d e Paz , u m a a n á lise fin a d a org a n iza çã o e a çã o d o p rim e iro p od e r e sta ta l d irig id o à s p op u la çõe s con ce b id a s com o in d íg e n a s d istrib u íd a s p e lo te rritório h istorica -m e n te d e n o-m in a d o e i-m a g in a d o co-m o b ra sile iro. C ria d o e m 1910, o órg ã o é tra n sform a d o e m Se rviço d e Prote çã o a os Ín d ios e m 1918 e e xtin to e m 1967, se n d o su a s re sp on sa b ilid a d e s e a ce rvo tra n sfe rid os p a ra a Fu n d a çã o N a cion a l d o Ín d io (Fu n a i). C om u m a h istória m a rca d a p or con tin u id a d e s e d e scon ti-n u id a d e s e m te rm os d e org a ti-n iza çã o fu n cion a l, a trib u içõe s, p e so in stitu cio-n a l e com p osiçã o socia l, o órg ã o fe z p a rte d e d istin tos M in isté rios: d a Ag ri-cu ltu ra , In d ú stria e C om é rcio (M AIC , 1910/ 30); d o Tra b a lh o, In d ú stria e C o-m é rcio (M TIC , 1930/ 34); d a G u e rra (1934/ 39); e d a Ag ricu ltu ra (1939/ 67).

As “ d ife re n te s form a s d e re la cion a -m e n to e n tre p op u la çõe s in d íg e n a s e a p a re lh os d e p od e r oriu n d os d a in va sã o e u rop é ia n o con tin e n te ” (:61) tê m p a -d e ci-d o -d a a u sê n cia -d e in ve stig a çõe s con stru íd a s ta n to d o p on to d e vista d a h istoriog ra fia q u a n to d a s ciê n cia s socia is. N o q u e con ce rn e à s re la çõe s e n -tre e ssa s p op u la çõe s e o Esta d o b ra si-le iro, os e stu d os re a liza d os tê m sid o cla ssifica d os com u m e n te sob a s ru b rica s “ in d ig e n ism o” e “ p olítirica in d ig e n ista ” . A a n á lise d a s id é ia s e a çõe s im

-p le m e n ta d a s -p e lo S e rv iço a -p a rtir d e u m p a ra d ig m a q u e re ssa lta a su a d m e n sã o d e a p a re lh o e sta ta l e m a triz m i-lita r, o q u e le va a u m a re visã o d o q u e foi e la b ora d o e m te rm os d e “ in d ig e n is-m o” e “ p olítica in d ig e n ista ” , é u is-m a d a s g ra n d e s con trib u içõe s d o livro.

O e stu d o d a s a çõe s e sta ta is q u e in -cid e m sob re a s p op u la çõe s in d íg e n a s im p lica ta m b é m u m a ru p tu ra com a h is-tória oficia l, d om in a n te e re p rod u zid a a critica m e n te e m d istin tos d om ín ios so-cia is, a ce rca d a orig e m e a tu a çã o d o S e rv iço. C e n tra d a n a id é ia d a in icia tiva p e ssoa l d e Ron d on e n o ca rá te r h u m a -n itá rio d o e m p re e -n d im e -n to, a ve rsã o oficia l, q u e te ve e m Da rcy Rib e iro se u p rin cip a l p rop a g a d or, é tom a d a com o con stitu tiva d o p róp rio S e rv iço, ou se ja , in stru m e n to d e su a le g itim a çã o. Assim con sid e ra d a , e la d á lu g a r a u m a in te r-rog a çã o a ce rca d a orig e m , e stru tu ra e fu n cion a m e n to d o a p a re lh o, su a com -p osiçã o e m u d a n ça s, su a s orie n ta çõe s e se u lu g a r n a tota lid a d e d a a d m in istra çã o p ú b lica . C om o p a rte d e sta , é d e sta -ca d o o fa to d e o S e rv iço con trib u ir p a ra a cria çã o d e sig n ifica d os e a con stru çã o d e u m a com u n id a d e p olítica re p re se n -ta d a com o n a cion a l.

(18)

p op u la çõe s. O “ p od e r tu te la r” é con ce -b id o com o u m a form a re e la -b ora d a – com con tin u id a d e s lóg ica s e h istórica s – d a “ g u e rra d e con q u ista ” . En q u a n to m od e lo a n a lítico, d e fin e o a u tor, a “ con -q u ista ” é u m e m p re e n d im e n to com d tin ta s d im e n sõe s: fixa çã o d os con q u is-ta d ore s n a s te rra s con q u isis-ta d a s, re d e fin içã o d a s u fin id a d e s socia is cofin q u ista -d a s, p rom oçã o -d e fissõe s e a lia n ça s n o â m b ito d a s p op u la çõe s con q u ista d a s, ob je tivos e con ôm icos e e m p re sa cog n i-tiva .

A cria çã o d o SPI(LTN ) n o q u a d ro d a a d m in istra çã o p ú b lica é tra ta d a n a se -g u n d a p a rte d o livro. En tre ou tros a s-p e ctos, e sse m ovim e n to a n a lítico s-p e r-m ite p e rce b e r o q u a n to ce rta s p rop os-ta s, a çõe s e con tra te m p os e n fre n os-ta d os p e lo órg ã o d e corria m d e su a p osiçã o re -la cion a l n o con ju n to d a a d m in istra çã o p ú b lica . “ Tra ta se d e re tira r d a d im e n -sã o d e ’e m p re sa h e róica ’ o q u e se m p re foi p a rte d a b u rocra cia ” (:112). Pa ra com p re e n d e r com o o S e rv iço é con sti-tu íd o, Lim a a n a lisa a re d e d e re la çõe s q u e lig a Ron d on a o M AIC . N e sse se n ti-d o, sã o ti-d e sta ca ti-d os os vín cu los ti-d ire tos e in d ire tos d e Ron d on com p e ssoa s p osi-cion a d a s n o M AIC e n o M u se u N a cio-n a l, com m e m b ros d o a p ostola d o p ositivista , com m ilita re s e com sim p a tiza n -te s d a ca m p a n h a p re sid e n cia l d e H e r-m e s d a Fon se ca . A a p roxir-m a çã o d e ssa s re d e s ocorre e m torn o d e a lg u m a s id é ia s com o a d e p rote ção. En te n d id a com o d e fe sa física e m ora l d os ín d ios, a p rote ção d e via se r e xe rcid a ta n to ju n to à s p op u la çõe s in d íg e n a s q u a n to a os d e -m a is g ru p os h u -m a n os d isp e rsos p e lo te rritório n a cion a l. Pa ra ta n to, o S e rv iço re ivin d ica va o “ m on op ólio e u so d a vio-lê n cia le g ítim a e m p rol d a s p op u la çõe s n a tiva s” (:128).

Pon to d e p a rtid a d o e xe rcício d o p o-d e r tu te la r e a o m e sm o te m p o se u p ro-d u to, a s cla ssifica çõe s e la b ora ro-d a s p e lo

S e rv iço a ce rca d os ín d ios e stã o n a ori-g e m d e su a s a çõe s. C on ce b id os p e lo ór-g ã o com o se re s e m tra n siçã o, su a s a çõe s e sta va m volta d a s p a ra p rop orcin a r a iorcin corp ora çã o d os íorcin d ios à ca te g o-ria d e trab alh ad ore s ag rícolas.

(19)

q u a is n ã o e ra p ossíve l e sta b e le ce r a li-a n çli-a s.

De sta q u e se q u e a s in d ica çõe s a p re -se n ta d a s a ce rca d e com o a s a çõe s d o S e rv iço in trod u zira m m u d a n ça s n a s p op u la çõe s con ta ta d a s tê m u m a con se -q ü ê n cia im p orta n te , ou se ja , o fa to d e a s a n á lise s re a liza d a s sob re a s p op u la çõe s in d íg e n a s, ou a p a rtir d e la s, n e ce ssita -re m in corp ora r u m a -re fle xã o sob -re os e fe itos q u e tê m sob re e ssa s p op u la çõe s (sob re o se u m od o d e se a u tocon ce b e -re m , con ce b e -re m a o ou tro e se org a n i-za re m socia lm e n te ) a s a çõe s d os d ive r-sos p od e re s, e m p a rticu la r, o e sta ta l.

A ú ltim a p a rte d o livro te m com o fo-co d e a n á lise a e stru tu ra org a n iza cion a l d o órg ã o e a s ta re fa s d e se m p e n h a d a s d u ra n te su a in se rçã o n os d istin tos M i-n isté rios. A a rticu la çã o d o S e rv iço i-n os p la n os n a cion a l (su b d ire torias e se -çõe s), re g ion a l (in sp e torias) e loca l (p os-tos, p ov oaçõe s in d íg e n as, ce n tros ag rí-colas e d e le g acias) é d iscu tid a , a ssim com o su a s a trib u içõe s. Le va r e m con ta n a a n á lise d o S e rv iço su a in se rçã o d ife -re n cia d a n os M in isté rios, p e rm ite a o a u tor p e rce b e r su a s m u d a n ça s d e sta-tu s e orie n ta çõe s.

Prod u to d e u m con ju n to d e in ve sti-g a çõe s d e se n volvid a s a o lon sti-g o d e on ze a n os, o livro d e Lim a tra z à lu z p a rte d a h istória e sq u e cid a d a re la çã o e n tre p o-d e r e sta ta l e p op u la çõe s in o-d íg e n a s. H is-tória q u e a p e sa r d e n ã o se r ob je to d e re fle xõe s (a ca d ê m ica s ou a d m in istra ti-va s), e ta lve z g ra ça s, sob re tu d o, a isso, p e rm a n e ce p re se n te n a s op çõe s, p ro-p osta s e a çõe s im ro-p le m e n ta d a s ju n to à s p op u la çõe s in d íg e n a s. Lon g e d e com -p rom e te r o livro, la m e n ta -se , con tu d o, a fa lta d e u m a re visã o m a is cu id a d osa d o te xto. Em a lg u n s p e ríod os, p a la vra s e fra se s solta s tra ze m u m ce rto p re ju ízo à com p re e n sã o. En fim , se o le itor m e p e r-m ite , su g e riria q u e a le itu ra fosse in icia d a p e la s fotos re p rod u zid a s p e lo a u

-tor n o “ C a d e rn o Icon og rá fico” . Em b ora n ã o h a ja re fe rê n cia s a ca d a u m a d a s fo-tos, o fa to d e q u e q u a n to m a is se a va nça n a le itu ra d o livro m e lh or se com p re e n d e o q u e e stá e m jog o n a s im a -g e n s, p a re ce -m e in d ica tivo d a força d a a n á lise p rod u zid a p or Lim a .

M ICELI, Sergio. 1996. Imagens Nego-ciadas. Ret rat os da Elit e Brasileira (1920- 40). São Paulo: Companhia das Letras. 174 pp.

Gustavo Sorá

Dou tora n d o, PPG AS-M N -UFRJ

Em se u ú ltim o livro, M ice li e stu d a o p roce sso d e a u ton om iza çã o re la tiva d os ca m p os a rtístico e lite rá rio e m fa ce d o m u n d o d a p olítica e d os con su m os cu l-tu ra is d e d ife re n te s fra çõe s con stil-tu tiva s d o ca m p o d e p od e r e n tre a s d é ca d a s d e 20 e 40. Pa ra a a n á lise d e p rob le -m a s te óricos clá ssicos, o a u tor cria u -m a form a con cisa d e a b ord a g e m e m p írica : u m p on to d e a ta q u e q u e e xp e rim e n ta in d e fin id a m e n te a té o fin a l d o livro.

Ao p rop or u m a in te rp re ta çã o sociológ ica d a p rod u çã o re tra tística d e C â n d id o Portin a ri, e n foca u m a cla sse d e ob je tos q u e p e rm ite m u m a le itu ra p rivile -g ia d a d a re la çã o e n tre form a s le -g ítim a s d e p rod u çã o p lá stica e con su m os cu ltu ra is d istin tivos, d e stin a d os a p rove r b e -n e fícios d e a firm a çã o socia l à s e lite s. A form a fin a l d e ca d a u m d os re tra tos d e ve ta n to à com p e tê n cia e sté tica d o p in -tor, q u a n to à b u sca d e solid ifica çã o d e u m a im a g e m d e cla sse e n tre re p re se n -ta n te s d e d ive rsa s fra çõe s d om in a n te s: os re tra tos p od e m se r com p re e n d id os com o im a g e n s n e g ocia d a s.

Referências

Documentos relacionados

Dados comparativos extraídos no Laboratório de Fadiga e Integridade Estrutural de Cabos Condutores de Energia da UnB mostram que o cabo de alumínio liga 6201, em

Se as pesquisas sobre a história dos surdos, de sua língua e de sua educação não deixaram de abordar o papel desempenhado pelos próprios surdos, nas primeiras formas de

O principal resultado a ser utilizado pelos produtores foi ter-se verificado que, através da análise foliar, é possível estabelecer critério para identificar a deficiência de

deralismo de Estados livres. Para garantir um estado de paz, Kant sugere a formação de uma liga de povos, que não seria o mesmo que um Estado congregando povos, pois cada um tem

Então, libertos os procuradores municipais de peias legalistas, assumiram-se como mandatários investidos de poder deliberativo e produziram capítulos de sua lavra: tais são, pelo

De ses vingt et cinq maîtrises, les UV concernant les études françaises sont présentes dans le contexte de la licence en Ciências da Cultura, ayant des disciplines obligatoires