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ANAIS ELETRÔNICOS ISSN

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Universidade Federal de Campina Grande

Programa de Pós-Graduação em Linguagem e Ensino 1

O COMPORTAMENTO DOS PRONOMES RELATIVOS NA

ORGANIZAÇÃO SINTATICO-SEMANTICA DO TEXTO EM

REDAÇÕES DO ENEM

Paulo Ricardo Soares PEREIRA (UFCG) Orientadora : Maria Augusta Gonçalves de Macedo REINALDO (UFCG)

RESUMO

O reconhecimento e utilização adequada em um texto ou sequência textual, de retomadas e/ou continuidades linguístico-temáticas feitas por pronomes relativos avaliando a adequação da norma padrão ou não padrão desses pronomes, é fundamental para o produtor de texto que busca uma efetiva progressão/coesão textual – desde o nível semântico, linguístico até o contextual (GREGOLIN, 1993). Esse reconhecimento e adequação de uso se torna relevante principalmente, quando a articulação desses elementos é critério de avaliação em provas, processos seletivos, vestibulares, concursos e exames, como o Exame Nacional no Ensino Médio (ENEM). Este trabalho tem como objetivo descrever o comportamento dos pronomes relativos na organização sintático-semântica do texto em redações do ENEM. Fundamenta-se nos apontamentos teóricos de Bagno (2011) e Castilho (2012). O corpus é constituído de 21 redações de alunos recém-ingressos no Curso de Letras da Universidade Federal de Campina Grande (UFCG) em 2014. Foram analisadas as recorrências dos pronomes relativos, bem como, o uso desses pronomes na construção sintática-semântica do texto. No que se refere à recorrência no uso dos pronomes, identificamos: maior recorrência (predomínio) no uso do pronome relativo que; poucos/raros os casos de uso dos pronomes onde / em que / qual / quem (e suas variações); uso do pronome relativo cujo (e suas variações) inexistente. Os dados revelam que a tradição de descrever apenas a estrutura presente na norma padrão por si só não é mais suficiente. É necessário levar os alunos a refletirem sobre a língua em uso, o que contempla, também, os pronomes relativos.

Palavras-chave: Pronomes Relativos. Construção Sintático-semântica. Redações ENEM.

Graduando em Letras com habilitação em Língua e Literatura Portuguesa, pela Universidade Federal de

Campina Grande (UFCG). E-mail: pauloricardo_sp_@hotmail.com

Professora, Doutora da Unidade Acadêmica de Letras (UAL) da Universidade Federal de Campina

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INTRODUÇÃO

No contexto da sintaxe, toda oração adjetiva/relativa “se encaixa” por meio do pronome relativo. A utilização adequada em um texto ou sequência textual, de retomadas e/ou continuidades linguístico-temáticas feitas por pronomes relativos – elementos introdutórios das orações adjetivas/relativas – conforme a norma padrão ou não padrão desses pronomes, é fundamental para o aluno que busca uma efetiva coesão textual – nível linguístico (GREGOLIN, 1993). Principalmente, quando o uso/a articulação desses elementos – os pronomes relativos – é critério de avaliação em provas, processos seletivos, vestibulares, concursos e exames, como o Exame Nacional no Ensino Médio (ENEM).

No exame em questão, uma das competências avaliadas que o candidato deve demonstrar ao produzir sua redação é a de número 04 (quatro), qual seja a de

demonstrar conhecimento dos mecanismos linguísticos necessários para a construção da argumentação. Segundo as orientações para a redação do ENEM, contidas no Guia

do Participante, essa competência se propõe a avaliar se o aluno sabe construir um texto coeso utilizando corretamente os mecanismos de encadeamento textual disponíveis na Língua Portuguesa, tanto na estruturação dos parágrafos, como dos

períodos e na referenciação textual (BRASIL, 2013). Seguem abaixo as recomendações

do instituto organizador do Exame para os estudantes, sobre essa competência:

Resumindo: na elaboração da redação, você deve, pois, evitar:

 frases fragmentadas que comprometam a estrutura lógico-gramatical;

 sequência justaposta de ideias sem encaixamentos sintáticos, reproduzindo usos típicos da oralidade;

 frase com apenas oração subordinada, sem oração principal;  emprego equivocado do conector (preposição, conjunção,

pronome relativo, alguns advérbios e locuções adverbiais) que não estabeleça relação lógica entre dois trechos do texto e prejudique a compreensão da mensagem;

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obrigatória; e

 repetição ou substituição inadequada de palavras sem se valer dos recursos oferecidos pela língua (pronome, advérbio, artigo, sinônimo). (BRASIL, p. 20, grifo nosso).

Observamos claramente que os aspectos a serem avaliados nessa Competência remetem à estruturação lógica e formal entre as partes da redação, exigindo que as frases e os parágrafos estabeleçam entre si uma relação que garanta a sequenciação coerente do texto e a interdependência entre as ideias. E esse encadeamento poderá ser realizado dentre outros elementos pelos pronomes relativos.

A tradição de descrever apenas a estrutura presente na norma padrão por si só não é mais suficiente. É necessário levar os alunos a refletirem sobre a língua e sobre a língua em uso, o que contempla, obviamente, também, os pronomes relativos, sobre os quais discute Bagno (2011, p. 911):

A regra normativa de emprego dos pronomes relativos pertence ao que poderíamos chamar ‘gramática invisível’: um conjunto de regras prescritas pela tradição, mas que não fazem mais nenhum sentido para o processamento intuitivo da língua por parte dos falantes (...) Diante disso, o tratamento das sentenças adjetivas em sala de aula representa um grande desafio para a educação linguística.

Atualmente, além de percebermos com frequência que os alunos recorrem a estratégias não prestigiadas da língua, fugindo, muitas vezes, ao preconizado pela norma padrão, fica evidente também a necessidade de conciliarmos realmente o quê/ e como ministramos em sala de aula, uma vez que esses alunos são avaliados conforme o conhecimento normas e princípios tidos como “padrão”. Logo, é preciso reconhecer que se torna, no mínimo, inviável que o aluno continue a (re)produzir formas/modelos “desprestigiados” em contextos sociocomunicativos em que esses não serão aceitos, sob pena de receber notas baixas e até reprovação. Ao ponto que se torna necessário também, mas não menos importante, o reconhecimento por parte do

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para determinadas situações de utilização da língua e que são formas perfeitamente comuns/naturais do processo de mudança constante por qual passa a própria língua. Nesse sentido, este trabalho tem como objetivo descrever o comportamento dos pronomes relativos na organização sintático-semântica do texto em redações do ENEM. Este trabalho está divido em 05 (cinco) partes, a saber: esta breve introdução seguida da fundamentação teórica; posteriormente, temos a metodologia da pesquisa e a análise dos dados, encerrando com as considerações finais.

II O PRONOME RELATIVO: ELEMENTO FÓRICO E COESIVO

Tradicionalmente, os pronomes relativos, conforme Bechara (2009, p. 171), “são os que normalmente se referem a um termo anterior chamado antecedente”. Nesse sentido, Neves (2000, p. 366) acrescenta à discussão em torno dos pronomes relativos – propriamente ditos – o termo fóricos, já que esses se referem ao termo antecedente localizado na oração principal (“É este o homem QUE vê na obra de Eurípedes um perigo aos bons costumes!” – grifo do autor). Bechara (2009), então, elenca os seguintes pronomes relativos: qual, o qual (a qual, os quais, as quais), cujo (cuja, cujos, cujas), que, quanto (quanta, quantos, quantas), onde.

Assim,

Em A cidade a que nos dirigimos ainda está longe, o relativo que reintroduz na oração subordinada adjetiva a que nos dirigimos o substantivo cidade, e vale por nos dirigimos à cidade, em que o núcleo verbal dirigimos requer um termo argumental marcado pelo índice preposicional a, preposição que, portanto, não deve faltar anteposta ao relativo, que funciona como complemento relativo do núcleo verbal nos dirigimos: A cidade a que nos dirigimos ainda está longe. (BECHARA, 2009, p. 466)

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por pronomes relativos, que integram uma classe fechada, a saber, que, qual, cujo,

quanto, onde”.

Bagno (2011, p. 917) em sua Gramática Pedagógica do Português Brasileiro comenta que:

Os pronomes relativos, em seu emprego padronizado, estão em processo de extinção e coube à nossa geração presenciar esse desaparecimento. Tudo indica que, em breve eles vão se se juntar ao acervo de relíquias gramaticais que os falantes da língua vêm depositando ao longo dos séculos no arquivo morto da língua: - o índice de pessoa vós e seus possessivos; - a distinção entre mui e muito; [...]

Azeredo (2011, p. 317), continua:

[...] praticamente só se emprega forma que, que tende a perder a condição de forma substituta – pronome anafórico – de um antecedente em proveito da função puramente conectiva. Daí variações como O vestido que ela gostou/O vestido de que (do qual) ela gostou, Tenho um amigo que o pai (dele) é marceneiro/Tenho um amigo cujo pai é marceneiro, O caminho que eu vim é tranquilo/O caminho pelo qual (por onde) eu vim é tranquilo. Trata-se de um uso que já migrou definitivamente para a escrita menos formal [...]

Percebemos claramente que aquilo que está em uso real e constante na comunicação verbal – falada e escrita, isto é, a norma em uso do português brasileiro difere da daquilo que as gramáticas tradicionais prescrevem. Portanto, a importância do domínio por parte dos produtores de textos de uma série de estratégias de organização da informação e de estruturação textual, dentre esses mais especificamente – no nível linguístico – de variados recursos linguísticos que garantam as relações de continuidade/encadeamento essenciais à elaboração de um texto coeso, e por assim dizer, a necessidade do reconhecimento nos usos dos pronomes – dentre entres os relativos.

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formais na estrutura linguística e superficial do texto, e configurando-se também como linear, uma vez que se manifesta na construção sequencial do texto. Fato que não a caracteriza unicamente como sintática e gramatical apenas, mas também como semântica (SUASSUNA, 2004).

Portanto, para que um conjunto de palavras ou de frases se configure como texto, é preciso que esses grupos apresentem articulação/encadeamento (elos de ligação). Dessa articulação “resulta um fio que confere ao conjunto sequência, continuidade, unidade. Essa continuidade transparece já na superfície do texto. Podemos reconhecê-la, formalmente, em seus diferentes tipos de nexo.” (ANTUNES, 2010, p. 117). Dentre os tipos de nexos textuais provedores da articulação, encontramos os nexos de conexão ou sequenciação, elos costumeiramente denominados de conectivos e que se materializam, comumente, entre parágrafos, períodos ou orações (ANTUNES, p. 120). Antunes (2010) ressalta ainda, que os nexos e as cadeias de nexos (conjunto de elos textuais) figuram através de um conjunto de mecanismos/recursos linguísticos, lexicais e gramaticais.

Em meio aos recursos de constituição dos nexos textuais apontados por Antunes (2010), identificamos a formação desses elos a partir da substituição

pronominal – a substituição de uma expressão nominal por um pronome. Assim, no

encadeamento/continuidade textual, “uma expressão é, em princípio candidata a ser retomada mais tarde por uma expressão referencial pronominal” (p. 131), isto é, a

relação lógica entre dois trechos do texto em prol da compreensão da mensagem

(BRASIL, 2013), entenda-se a textualidade em seu nível linguístico (GREGOLIN, 1993) – a clareza de um texto – percorre a continuidade referencial que se configura através das conexões, dos elos (nexos) textuais pronominais que vão se estabelecendo. Antunes (2010) destaca nesse sentido, a função de todos os tipos de pronomes – compreendamos assim, os pronomes relativos – como provedores das cadeias de referenciação, que, por conseguinte, promovem a articulação e unidade textual.

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de expressões referenciais, ou seja, de mecanismos pelos quais nós podemos nos referir às coisas e às pessoas. Logo, são recursos por meio dos quais é possível voltar a referir ou a predicar um referente, destacando-se, pois, a função textual dos pronomes: “funcionar como elementos de substituição, como elementos que asseguram a cadeia referencial do texto” (p. 86). A esse procedimento coesivo, a autora denomina de recurso por substituição gramatical – entendamos substituição

pronominal (ANTUNES, 2010).

Destacamos que o recurso de substituição gramatical/pronominal configura-se como uma relação textual de reiteração, justamente por nessa relação, os elementos textuais serem de alguma forma retomados, construindo-se, portanto, um movimento recorrente de volta aos segmentos prévios. Tal retomada é a relação que permite ao texto a necessária continuidade de seu fluxo (ANTUNES, 2005). Logo, entende-se que cada vez que trocamos um termo/palavra por um pronome, por exemplo, estamos

reiterando; estamos possibilitando a continuidade, a sequenciação, o encadeamento a

coesão textual.

Antunes (2005, p. 92) completa:

Evidentemente , não apenas os pronomes pessoais podem entrar em nexos coesivos com seus antecedentes. Outros tipos de pronomes – como os demonstrativos, os possessivos, os relativos, os indefinidos – também cumprem a mesma função, retomando ou antecipando

referências anteriores ou subsequentes. Garantem assim a ligação

entre subpartes diferentes do texto. (grifo nosso)

Como aponta a autora, percebemos que a substituição de uma palavra por um pronome, dentre eles os pronomes relativos, constitui sim, um mecanismo de coesão textual. O pronome relativo torna-se, portanto, um recurso reiterativo que possibilita a retomada de referenciais já feitas no texto, promovendo nesse caso, a continuidade referencial, por conseguinte, o encadeamento textual.

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Para alcançarmos o objetivo desta pesquisa, analisamos 21 (vinte e uma) redações coletadas com alunos recém-ingressos no curso de Letras pela Universidade Federal de Campina Grande (UFCG) em 20141, ou seja, alunos que se submeteram ao ENEM 2013. Feita a leitura de todo o material, separamos alguns testos que constituem um corpus representativo, sem nos preocuparmos com problemas de ordem puramente gramatical (ortografia, pontuação, concordância etc). Só então, iniciamos a seleção necessária para o estudo a que nos propomos, destacando os excertos que satisfaziam o objetivo desta pesquisa.

Após a coleta dos dados, seguimos o seguinte critério de análise:

 Recorrência dos conectivos (que, quando, quanto, cujo, onde) e forma empregada (sequencial ou referencial);

IV ANÁLISE DOS DADOS

Nas 21 redações selecionadas, o relativo “que” foi o mais recorrente nas construções oracionais adjetivas/relativas, totalizando 90 (noventa) ocorrências. No uso de outros pronomes relativos, encontramos um quantitativo bem menor quando comparado ao “que”, dos quais destacamos: 08 (oito) construções com o relativo “quem”; 05 (cinco) construções com a forma “onde”; e apenas 03 (três) com o relativo “qual” (e suas variações).

O levantamento dessas construções oracionais mostrou que nenhuma das 21 (vinte e uma) redações observadas apresentou o uso do pronome relativo “cujo”. Esse

1 Para a coleta dos dados, realizamos inicialmente um contato face-a-face com os alunos universitários recém-ingressos no Curso de Letras1 da Universidade Federal de Campina Grande (UFCG), ou seja, graduandos do 1° (primeiro) período que se submeteram ao ENEM 2013 (períodos 2014.1 e 2014.2). Nessa ocasião, foi-lhes apresentada a presente pesquisa, seguida de seus respectivos objetivos, um termo de compromisso do pesquisador e um termo de consentimento livre e esclarecido (Apêndice A) dos graduandos pesquisados. Feitas as devidas apresentações e esclarecimentos, caso aceitassem participar, foi solicitado aos estudantes que nos enviassem, via e-mail, o espelho de correção de suas redações referente à participação no ENEM 2013, respectivamente.

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extinção) dos pronomes relativos em seu emprego padronizado (mesmo no padrão culto), em se tratando do português brasileiro (BAGNO, 2011; CASTILHO, 2012).

Como consequência desse levantamento inicial, identificamos os seguintes resultados:

 Predomínio no uso universal do pronome relativo que.

Vejamos o exemplo a seguir:

(1) “Jovens que perdem suas vidas, crianças que perdem seus pais; pessoas

que caem no desespero quando recebem a notícia que um ente querido se foi.

Esse é o retrato real que acontece logo após uma noite que cheirava à felicidade e descontração e queA, em sua maioria, à vida se mostra dura frente a esses atos inconsequentes.” (Redação 17)

No segmento textual acima constituído de dois períodos, no que se refere ao uso do “que”, percebemos que o produtor do texto utiliza – unicamente – tal relativo como elemento de retomada de vários sintagmas nominais já mencionados na frase, “jovens”, “crianças”, “pessoas”, “retrato” e “noite”, respectivamente. Esse uso universal do “que” tanto no trecho em questão, quanto nos dados de maneira geral, nos faz lembrar das palavras de Bastos (2002) ao dizer que não é nova a constatação de que o usuário recorre às estratégias de estruturação das relativas, contrariando a norma padrão: via de regra generaliza o que como um relativo universal.

Castilho (2012), comenta que “Na língua falada, que é uma espécie de pronome relativo universal, que está ocupando os espaços dos outros.” (p. 366). Parece que tal universalização atingiu também a modalidade escrita, se considarmos no trecho em questão e nas redações como um todo, a ocorrência predominante de usos do “que”, pois como bem aponta Bechara (2009), o “relativo universal que, desfazendo uma

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prático” (p. 201).

Ressaltamos também que, muitas vezes, o uso excessivo do conectivo “que” – caso de queísmo – compromete a interação comunicativa. Por exemplo, ainda com relação ao fragmento (1), existe uma curiosa relação de ambiguidade na sentença encaixada (A), pois não se sabe a quem ou a quê efetivamente o relativo “que” faz referência (“noite?”). O mau uso desse conectivo compromete a interação comunicativa, apresentando problemas de referenciação e sequenciação, por assim dizer de coesão.

Tratando-se ainda, do mau uso dos pronomes relativos, destacamos também:

(2) "A Polícia Rodoviária com o seu excelente trabalho nas rodovias, alertando motoristas e passageiros sobre o que o álcool pode causar e também fazendo o teste do bafômetro que é o principal órgão para o combate não somente de acidentes no trânsito, mas também para a conscientização da população.” (Redação 19)

Mais uma vez, identificamos problemas de referenciação. No trecho (2), o pronome “que” retoma o sintagma nominal “o teste do bafômetro”, porém, ao introduzir a oração adjetiva/relativa com função de sujeito percebemos a presença da predicação “é o principal órgão”. É claro que não há equivalência semântica entre os sintagmas. Acreditamos que o produtor escrevera “principal órgão” como uma referência à expressão “A Polícia Rodoviária” no início do período, porém, não atentando a presença do sintagma nominal “o teste do bafômetro” anterior ao pronome relativo “que”.

Rarefação nos casos de uso dos pronomes onde / quem / qual (e suas variações).

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“onde”:

(3) “Medida extremamente necessária no Brasil, onde o número de acidentes causados pela combinação de álcool e volante [...].” (Redação 10)

(4) “Sabendo dessa situação, muitos estabelecimentos onde é permitido o consumo do álcool tem oferecido transportes para deixarem os consumidores em seus devidos lares” (Redação 18)

(5) “Uma maneira para diminuir esses altos índices dependerá de um governo e uma sociedade, onde desde cedo se aprenda, se concientize, se eduque e se adeque [...].” (Redação 15)

(6) “ ‘Se beber não dirija’, esta frase já é popularmente muito conhecida, onde encontramos nos rótulos de bebidas [...]” (Redação 06)

(7) “Portanto, esses pontos merecem ainda mais a atenção dos senhores da lei. O rigor da mesma, torna-se necessário, onde precisamos, sem dúvida, de um modelo de punição e uma maior conscientização da população [...]” (Redação 17)

Nos excertos (3) e (4), os pronomes "onde" possuem entecedente e indicam lugar, "no Brasil" e "estabelecimentos", respectivamente. Situações essas perfeitas comuns dentro das características típicas do pronomes relativos "onde" que funcionam em ambos os casos, como adjunto/complemento adverbial de lugar. Entretanto, quando observamos os trechos (5), (6) e (7), notamos que os pronomes relativos não compactuam das mesmas características dos trechos anteriores, (3) e (4). Destacamos no fragmento (5), que o pronome relativo "onde" apresenta antecedente, porém, esse não é de natureza física (de lugar), retomando expressões como "governo" e "sociedade". Nesse sentido, Neves (2000) destaca que muitas vezes, o pronome relativo "onde" é utilizado com valor de "em que" – como no trecho (5) – mas sem valor locativo (espacial ou temporal), fato que para a autora não tem

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pronome relativo onde em substituição ao pronome relativo preposicionado (entenda-se “em que” / “na qual” e suas variações), ressaltando que es(entenda-se pronome relativo apresenta a mesma chance de ocorrência quando o antecedente representa a noção de lugar ou tempo, situações nas quais não se enquadram o uso pronominal do “onde” referentes ao trecho (5).

Com relação aos trechos (6) e (7) é nítido que os pronomes relativos "onde", foram utilizados sem quaisquer referentes, "quebrando" assim o seu papel de elemento retomador anafórico, bem como de transpositor de uma oração encaixada adjetiva/relativa. Bechara (2009) discorre sobre os pronomes relativos sem antecedente, dentre eles o "onde". O autor inicialmente comenta que o pronome relativo "onde" pode ser empregado de modo absoluto, ou seja, sem referência a antecedentes – Moro onde mais me agrada (p.172). Em seguida, aponta que nessas situações, subentende-se um antecedente adaptável ao contexto, no caso do pronome relativo "onde", esse interpretado e substituível por "o lugar em que". Acreditamos no entanto, que essa possibilidade de substuição não sirvam aos usos dos pronomes relativos "onde" apontados em (6) e (7), logo, consideramos tais usos como inadequados, prejudicando assim, a referenciação/sequenciação textual, por assim dizer, o encadeamento textual – a coesão textual (GREGOLIN, 1993).

No tocante ao uso do pronome “qual” (e suas variações), encontramos os seguintes exemplares:

(8) “A mudança pela qual passou a lei seca, esta, atualmente não permite nenhum índice de álcoo no resultado do bafômetro [...]”. (Redação 21)

(9) “Com adoção da Lei Seca o Brasil colocou-se entre os países com as leis de trânsito mais rígidas. A qual, associada à outras formas de conscientização, fez diminuir as taxas de acidentes e mortes no trânsito.” (Redação 16)

(10) “Uma implementação de uma central de atendimento na qual possa esclarecer dúvidas, pode ser uma alternativa, além de palestras, debates,

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governamentais [...]”. (Redação 21)

Inicialmente destacamos a baixa utilização – apenas 03 (três) – da forma relativa “qual” (e variações), constada como podemos observar em apenas 02 (duas) redações, uma vez que, dessas ocorrências, 02 (duas) foram em uma mesma redação (21). Como já apontado, acreditamos que tal fato é reflexo do universal do pronome relativo “que” em substituição a outras formas relativas, a exemplo do “qual”. No fragmento (8), identificamos a adequada utilização da construção relativa “pela qual”, a qual faz referência ao sintagma “mudança”, ou seja, “a lei seca passou por uma

mudança (...).” No trecho (9), também encontramos um uso adequado do relativo

“qual” ao retomar o antecedente “adoção da Lei Seca”. Destacamos que a adequada utilização desses pronomes favorece e possibilita a efetiva continuidade referencial e predicativa (ANTUNES, 2010).

No trecho (10), notamos uma variação de uso da forma relativa "qual", utilizando-se "na qual". Por se tratar de uma estrutura adverbial locativa, espera-se que a construção pronominal "na qual" retome elementos de valor locativo (espacial ou temporal), assim como outros pronomes já mencionados, a saber: onde e em que. A partir disso, observando o fragmento em questão, notamos por essa definição, que a forma pronominal "na qual" retoma o sintagma adverbial "central de atendimento", em uma referência de lugar. Assim, depreendemos que deveria existir "uma central de atendimento para que nela se possam esclarecer dúvidas".

Quanto ao uso do pronome relativo "quem", observamos as seguintes ocorrências :

(11) “Agora quem bebe e precisa voltar para casa sem infrigir a lei ou leva uma

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começaram a surgir no Brasil, junto aos avanços tecnológicos também evoluiu este meio de transporte que hoje é essencial para a locomoção de milhares de brasileiros, que fazem dele desde um objeto de trabalho até um instrumento de diversão e laser, diversão esta muitas vezes regada a muita bebida alcóolica e irresponsabilidade de quem está ao volante sobre os efeitos delas.” (Redação 05)

(13) “A negligência de quem está no trânsito nestas condições é evidente, acidentes e muitas vezes mortes de queM guia o carro ou até mesmo de pessoas que atravessam um rua desatento, são fatos que ocorrem todos os dias.” (Redação 05)

(14) “No entanto, há quem desrespeite as normas e dirija alcoolizado.” (Redação 09)

(15) “Portanto, para continuarmos com a certeza que não haverá mais alcoolizados ao volante, o governo deve continuar punindo quem infringir essa lei [...] (Redação 10)

(16) “A responsabilidade no volante indiretamente torna a ser obrigação de

quem dirige, e para ele próprio.” (Redação 14)

(17) “Considerando toda problemática que envolve o uso do álcool por motoristas, é imprescindível a ação governamental por meio de investimentos nos transportes públicos, como também a realização de denúncias feitas pela população para quem não respeitar as leis como a Lei Seca." (Redação 18)

Na ocorrência dos pronomes relativos "quem", destacamos que todas as formações verificadas acima se contrõem sob a forma de Pronomes Relativos Sem

Antecedente (Bechara, 2009), uma vez que, o pronome relativo – "quem" – aparece

sendo utilizado em sua forma absoluta, sem referência a antecedentes – assim como citado em relação ao caso dos pronomes ralativos "onde" nos fragmentos (6) e (7) analisados anteriromente. Bechara (2009) comenta que em função do

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compreende-se "quem" em lugar de "a pessoa que". Tal construção corrobora ao que Castilho (2012) denomina de Adjetivas Livres. Estruturas nas quais – como nos trechos de (11) até (17) – se consideram o pronome “quem” como tendo um antecedente uma expressão oculta de traço humano, sendo, portanto, parafraseável por [aquele ]. Logo, entendemos as orações relativas dos trechos em questão – "encabeçadas" pelos pronomes relativos “quem” – como Adjetivas Livres, sendo possível, portanto, a substituição de “quem” por aquele que/a pessoa que. Tomando como exemplo o trecho (11), teríamos: “Agora quem [aquele que/a pessoa que] bebe e precisa voltar para casa sem infrigir a lei ou leva uma terceira pessoa para que possa dirigir ou toma um táxi."

Analisadas as principais ocorrências de pronomes relativos nas redações do ENEM de alunos recém-ingressos em no Curso de Letras no ano de 2014, torna-se necessário e urgente reconhecer em função dessa variedades de usos e principalmente "funções" desses pronomes presentes nos textos desses alunos, como essas elementos linguísticos variam e servem como mecanismo de construção coesiva e argumentativa.

V CONSIDERAÇÕES FINAIS

Propusemo-nos a analisar, neste trabalho, a descrever a ocorrência o comportamento dos pronomes relativos na organização sintático-semântica do texto em redações do ENEM. Dessa forma, no que diz respeito aos resultados quantitativos dos dados, comprovamos dois postulados teóricos acerca do tema. O primeiro sobre o uso quase que genérico do pronome relativo que, segundo Castilho (2012), em detrimento dos demais pronomes que, normalmente, são pouco empregados e, quando o são, são usados de modo inadequado. Nessa mesma linha, chegamos à segunda conclusão: o pronome cujo caiu em desuso no Português Brasileiro, conforme apontou Bagno (2011). Mesmo não sendo utilizado habitualmente em contexto de

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exigido.

Percebemos assim que os modos de uso dos pronomes relativos podem variar. Ressaltamos que o uso dos pronomes relativos inspira atenção, principalmente quando o uso desses conectivos proporciona uma mescla de coesão referencial, ao retomar um termo que se encontra na oração anterior, e sequencial, ao introduzir a oração adjetiva/relativa.

REFERÊNCIAS

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______, I. Análise de Textos: fundamentos e práticas. – São Paulo : Parábola Editorial, 2010.

AZEREDO, J. C. Gramática Houaiss da Língua Portuguesa. – São Paulo : Publifolha, 2011.

BAGNO, M. Gramática pedagógica do português brasileiro. São Paulo: Parábola Editorial, 2011.

BASTOS, W. A. Ordem de constituintes em relativas. Estudos lingüísticos XXXI, São Paulo:v.31, 2002.

BECHARA, E. Moderna gramática portuguesa. 37.ed.rev.,ampl. e atual. Conforme o novo Acordo Ortográfico. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2009.

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CASTILHO, A. Nova gramática do português brasileiro. São Paulo: Contexto, 2012. GREGOLIN, M. R. V. Linguística Textual e Ensino de Língua : Constuindo a textualidade na escola. Alfa, São Paulo, 37:23-31, 1993.

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Referências

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