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AFRICANIDADES. Cuti, um dos mais significativos poetas de origem africana da atualidade,

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Academic year: 2021

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AFRICANIDADES

COMO VALORIZAR AS RAÍZES AFRO NAS PROPOSTAS PEDAGÓGICAS

Petronilha Beatriz Gonçalves e Silva1 Cuti, um dos mais significativos poetas de origem africana da atualidade, escreveu:

Quem conhece meus Nilos de dentro meus rios

raízes que regam felizes a carne do Brasil?

Pois é, quem conhece as raízes africanas da nossa cultura? Já perceberam que muitas pessoas valorizam como contribuições mais importantes para a cultura brasileira as de origem européia? Este é um julgamento que demonstra preconceito contra os índios, os primeiros habitantes deste país, e contra os africanos e seus descendentes. Mais ainda, demonstra ignorância profunda a respeito desses povos.

Quem pensa que somente na Europa e nos Estados Unidos são concebidas idéias, iniciativas, invenções importantes para a humanidade, que somente ali se desenvolvem civilizações, está redondamente enganado.

Quantos de nós sabem que:

a) o ancestral mais antigo de que a humanidade tem notícia é uma mulher africana, cuja ossada foi encontrada no Quênia?

b) Antes de os europeus começarem a escravizar africanos, eles mantinham amistosas relações comerciais com diferentes nações do continente africano?

Muito antes da chegada dos europeus, na África floresciam respeitáveis civilizações, como a do Reino do Zimbábue, a do Congo, a do Egito. É difícil lembrar que o a Egito é um país africano, quando imagens nos livros e no cinema representam os antigos egípcios com traços europeus.

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de pensamento, chamados na Europa de filosofia; complexas sociedades e formas de governo organizavam-se; avançadas criações tecnológicas eram postas em prática. Como, então, acreditar que pessoas oriundas daquele ambiente tenham esquecido tudo que sabiam, ao serem escravizadas, e que nada trouxeram para o Brasil?

Africanidades brasileiras

Ao dizer africanidades estamos nos referindo ao legado africano, à herança que mulheres e homens escravizados deixaram par nós, povo brasileiro.

Os africanos escravizados, afastados de suas nações , separados de suas famílias, vistos como objetos de uso e de dominação, desenraizados de suas culturas, viram-se provocados a reagir, para manterem-se vivos física e moralmente.

E reagir, neste caso, significou fugir, organizar os quilombos, criar todas as formas de resistência, inventar um jeito de ser africano, no Brasil, em meio à opressão e aos desprezo pelo que tinham de mais genuíno: a cor de sua pele e sua cultura.

Foi essencial reagir contra as ações e atitudes dos europeus brancos e cristãos que de tudo faziam para lhes impor a sua religião, sua visão do mundo, sua organização econômica e social, o contato entre o africano escravizado e o europeu seu senhor não foi uma experiência de trocas, mas de choque, de imposição, de destruição.

Os europeus formaram uma imagem negativa do escravizado e seus descendentes não esqueceram esta imagem, nem se importaram em verificar se correspondia, de fato, à realidade. E ficaram por aí, ainda em nossos dias continuam, dizendo que nós, negros, somos feios, pobres e incapazes de sair desta situação, incultos, porque não partilhamos de suas raízes culturais.

Talvez algumas pessoas, ainda se perguntem: - Mas, tudo isto não é

verdade? Evidente que não é.

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Sem dúvida, herdamos uma invejável capacidade de resistência, uma forte e esperançosa crença nas pessoas, em Deus, uma ação criadora capaz de enfrentar as continuadas tentativas de extermínio do povo negro. Vejamos alguns exemplos.

A religião, importante lugar de refúgio da identidade africana, encontra, em tradições de diferentes culturas africanas, elementos que levaram os escravizados a africanizar os cultos cristãos, criando as congadas, moçambiques, ensaios. Tais tradições também permitiram o reinventar das religiões nativas que, apesar das incessantes perseguições, impuseram-se e permaneceram nas expressões, por exemplo, do batuque, candomblé, macumba, tambor de minas, umbanda. Hoje, descendentes de africanos e, também, muitos de europeus se reúnem, nos terreiros. Ali, uns e outros, todos, não mais africanos nem europeus, mas brasileiros, vão tendo acesso ao sistema de conhecimentos próprio das religiões afro, através da experiência intensamente vivida. Só tem realmente sentido, ensina Helena Teodoro, o que for aprendido pela ação de cada um, informado e apoiado pelos mais experientes. Aprender, pois, implica trocas entre pessoas e construção de caminhos para aprender, trilhados por cada um. Em outras palavras, aprende-se realmente o que se vive, e muito pouco sobre o que unicamente se ouve falar.

Já pensaram a importância disso tudo para as propostas de educação que visam a atingir a população negra, de modo especial, e a população brasileira, de um modo geral?

E não ficamos nisso. No seio das religiões afro-brasileiras, os cantos e as danças são formas que permitem o relacionamento com Deus. Temos, no ritmo dos atabaques, das palavras (cantos), dos corpos, uma maneira de organizar e de tornar público os pensamentos, desejos, agradecimentos, as propostas, orações. E dizer que a nossa sociedade considera quase que exclusivamente as expressões de pensamento, feitas pelo raciocínio!

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formatos de engenhos concebidos em África, na construção de equipamentos para beneficiamento do açúcar. Sublinha a semelhança entre os procedimentos para extração do ouro, durante o período escravista, em África e Brasil. Salienta que a produção de instrumentos de ferro era feita por mestres, escravos africanos.

Como se vê, os escravizados não serviram apenas como força de trabalho manual, como insistentemente, até nossos dias, posições racistas fazem crer. Para cá trouxeram ciência e tecnologia, entre outros.

Como teria surgido Palmares, se os escravizados não soubessem mais do que realizar atividades braçais? E é evidente que todos temos consciência do significado de Palmares, não só para o povo negro, mas para toda a nação brasielira.

E por aí vão as africanidades brasileiras. Temos que aprender a conhecê-las, valoriza-las e a aplicá-las em favor do povo brasileiro.

Que proposta pedagógica podemos fazer?

Em parte, a solução fica em nossas mãos de educadores, estejamos nas escolas, nos centros comunitários, nas oficinas, em atividades formais e não-formais de educação.

Para tanto, é preciso que tenhamos permanente cuidado de aprender e ensinar a história do povo da África e da diáspora. Busquemos apoio em grupos do Movimento Negro, para identificar quais são os interesses do povo negro, seus traços culturais, sua contribuição na construção da nacionalidade brasileira. Busquemos também embasamento em estudiosos que se dedicam ao estudo do negro, sua cultura e sua história.

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Extermínio! Luta contra ele tem sido a luta do povo negro, há 500 anos no Brasil. Esta tem que ser uma luta fortemente assumida por todos os educadores, que acreditam ser papel seu o de lutar por justiça.

Aqui entram as africanidades brasileiras. Sua valorização e presença deliberada, não casual, em atividade educativas, de lazer, de divulgação de raízes culturais é forma contundente de lutar contra o extermínio, seja ele físico ou psicológico.

Esta presença não pode ser uma concessão, um gesto paternalista para o s coitadinhos, mas atitude convicta de cidadãos brasileiros que assumem pela raiz a situação trágica em que a sociedade lança o povo e, sentindo-se povo, a combate, contribuindo para construir uma nação realmente livre, ciosa de suas origens.

E como conseguir isto? Estudando, conversando, trabalhando, propondo, arriscando, corrigindo, recomeçando, aprendendo a conhecer outros pontos de vista que não os divulgados como únicos certos.

Trabalhar em propostas educativas de interesse dos afro-brasileiros implica combater os próprios preconceitos, os gestos de discriminação tão fortemente enraizados na personalidade dos brasileiros, desejo sincero de superar sua ignorância relativamente à história e à cultura deste povo.

Como vamos fazer? Há muito trabalho pela frente. Para quem ainda não o iniciou, começando por participar de eventos de resgate da cultura afro-brasileira, lendo sobre o assunto, discutindo-o, assumindo compromissos com a melhora do currículo escolar.

Em frente, pois. E um dia chegaremos a propostas educativas que se construam, levando em conta, também, a cultura afro-brasileira, para todos – negros e não-negros.

BIBLIOGRAFIA

Referências

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