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Exportações de café e financiamento de indústrias no Brasil: uma análise comparativa

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Academic year: 2021

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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE CIÊNCIAS ECONÔMICAS

CURSO DE GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS ECONÔMICAS

LORENA LOPES CAFEZEIRO

EXPORTAÇÕES DE CAFÉ E FINANCIAMENTO DE INDÚSTRIAS NO BRASIL: UMA ANÁLISE COMPARATIVA

SALVADOR 2001

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LORENA LOPES CAFEZEIRO

EXPORTAÇÕES DE CAFÉ E FINANCIAMENTO DE INDÚSTRIAS NO BRASIL: UMA ANÁLISE COMPARATIVA

Trabalho de conclusão de curso apresentado no curso de graduação em Ciências Econômicas da Universidade Federal da Bahia como requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel em Ciências Econômicas

Orientador: Prof. Dr. Vítor de Athayde Couto

SALVADOR 2001

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A conclusão desse trabalho foi possível graças ao apoio e empenho do Prof. Vítor Couto que, ao longo desses dois semestres, mostrou-se solícito e paciente, sugerindo, opinando e contribuindo para o alcance dos resultados esperados.

Ao Sr. Antônio César Néri, ex-diretor do IBC, pela atenção dispensada e pela grande quantidade de informações disponibilizadas.

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O presente trabalho apresenta a análise da importância do café no surgimento da indústria no início do século XX e a atual situação da produção cafeeira e das exportações. A variável considerada na análise é o câmbio, utilizado de forma deliberada em ambos os períodos abordados. A função de financiador dos investimentos industriais já não é mais do café. Atualmente, essa função é exercida, principalmente, pelo BNDES.

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1 INTRODUÇÃO ... 6

2 O PANORAMA DA IMPORTÂNCIA DO CAFÉ NA ECONOMIA BRASILEIRA DO INÍCIO DO SÉCULO XX ATÉ A CRISE DE 29: EXPORTAÇÕES, POLÍTICA CAMBIAL, INVESTIMENTOS EXTERNOS E SURGIMENTO DA INDÚSTRIA ... 9

2. 1 PRODUÇÃO CAFEEIRA NO FINAL DO SÉCULO XIX ... 9

2. 2 A PRODUÇÃO CAFEEIRA NO INÍCIO DO SÉCULO XX ... 11

2. 3 O SURGIMENTO DA INDÚSTRIA ... 17

3 EXPORTAÇÕES DE CAFÉ E FINANCIAMENTO DE INDÚSTRIAS PÓS-PLANO REAL ... 22

3. 1 CONSIDERAÇÕES ACERCA DA CAFEICULTURA BRASILEIRA NO PERÍODO DE 1989 A 1993 ... 22

3. 2 PRINCIPAIS ASPECTOS DA POLÍTICA CAMBIAL NO PLANO REAL ... 25

3. 3 A PRODUÇÃO CAFEEIRA PÓS-PLANO REAL: VOLUME EXPORTADO, RECEITA CAMBIAL GERADA, PREÇOS E PARTICIPAÇÃO NAS EXPORTAÇÕES GLOBAIS ... 29

4 O FINANCIAMENTO DE INDÚSTRIAS PÓS-PLANO REAL: ORIGEM DOS RECURSOS ... 43

4. 1 CONSIDERAÇÕES ACERCA DO SETOR INDUSTRIAL APÓS A ABERTURA COMERCIAL E O PLANO REAL ... 43

4. 2 A POLÍTICA DE FINANCIAMENTO DOS INVESTIMENTOS ... 46

4. 2. 1 O papel do BNDES ... 46

4. 2. 2 A entrada de capitais estrangeiros ... 51

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 54

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1 INTRODUÇÃO

O presente trabalho monográfico contempla uma análise das exportações de café e da sua relação com a política cambial, a entrada de investimentos externos e o surgimento da indústria no Brasil no final do século XIX e início do século XX. Contemporaneamente, discute-se a situação das exportações de café e as divisas por ele geradas, a partir de 1994 (pós-Plano Real), analisando-se a composição atual do capital que financia os investimentos de indústrias nos diversos setores da economia brasileira.

Este trabalho tem como objetivo fazer uma análise comparativa entre as duas épocas acima referidas. O denominador comum é a política cambial, adotada de forma deliberada, e a entrada de capitais externos no país.

A primeira época analisada situa-se entre o final do século XIX e início do século XX. Nesse período, a produção de café proporciona a entrada de divisas, substancialmente importantes para o desenvolvimento do país. O Brasil era um país agrário-exportador, sendo o café o principal produto da pauta de exportação e, conseqüentemente, o grande gerador de divisas. Essas divisas impulsionam o surgimento de indústrias e a conseqüente substituição das importações. Os principais componentes do setor industrial eram, inicialmente, os têxteis e alimentícios (bens de consumo não duráveis ou de consumo imediato).

A substituição de importações torna-se significativa a partir do desenvolvimento da indústria têxtil. O final do século XIX (1895 – 1899) é assinalado como o primeiro impulso positivo significante para a produção industrial interna. O progresso da atividade têxtil deveu-se a uma substancial redução das importações. Dessa forma, no capítulo 2, faz-se um panorama das exportações de café no final do século XIX até a segunda década do século XX, abordando os aspectos mais relevantes da estrutura econômica da época. Analisam-se as medidas adotadas pelo governo com a finalidade de elevar o preço do café, dentre elas, a utilização do câmbio como recurso para evitar uma perda muito elevada dos produtores.

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Nesse mesmo período, verifica-se a transferência de recursos gerados pelo café para o surgimento das primeiras indústrias brasileiras. Observa-se também a entrada de capital estrangeiro, financiando, além da retenção do café, a infra-estrutura, imprescindível para a implantação da indústria, como por exemplo, a construção de estradas de ferro, a ampliação do comércio e das casas bancárias.

No capítulo 3, analisa-se a segunda época, caracterizada como período pós-Plano Real. A partir de julho de 1994, a economia brasileira deixa de ser inflacionária e instável para se transformar numa economia estável, com moeda forte, e uma grande reserva em dólares que permitiu a sobrevalorização do câmbio, utilizando-se a âncora cambial, que contribui para conter a inflação.

Nesse contexto de implementação do Plano Real e equilíbrio da economia, analisa-se a situação do café com relação à produção, exportações e divisas geradas. A análise desses dados permite afirmar que a estabilização da economia a partir de uma sobrevalorização cambial provoca, de início, uma explosão do consumo e, em seguida, uma recessão econômica generalizada. Todos os setores da economia (agricultura, indústria e serviços) sofrem o impacto negativo da adoção dessa política. A abertura da economia aliada ao Plano Real, mais especificamente, à política cambial, faz com que haja, após a euforia inicial, uma redução das exportações e do consumo, diminuição da produção e falência de indústrias.

Dessa forma, a sobrevalorização do Real e a manutenção de uma política cambial visando à estabilidade de preços favoreceu o aumento da demanda agregada, provocando o crescimento das importações com manutenção dos níveis de exportação (que ficam mais caras com o câmbio valorizado) que, dentre outros fatores, leva a um déficit na conta de transações correntes do Balanço de Pagamentos.

Partindo-se dos dados referentes às exportações e às divisas geradas pelo café, pode-se testar a primeira hipótese que afirma ainda existirem transferências de recursos do café para o financiamento de indústrias através da política cambial e de investimentos externos associados ao café.

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No capítulo 4, analisa-se a origem dos atuais recursos utilizados no financiamento dos investimentos industriais. Nesse capítulo, investiga-se a existência de recursos internos e externos no financiamento aos investimentos industriais. Dessa forma, é testada a segunda hipótese formulada, referente ao atual papel financiador das indústrias, se estão sendo utilizados recursos internos, externos ou, mais especificamente, recursos gerados pelo café, através das exportações favorecidas pelo câmbio valorizado. Ainda nesse capítulo, analisa-se o processo de reestruturação da indústria após um longo período analisa-sem investimentos em infra-estrutura e, principalmente, após o impacto sofrido pela abertura comercial.

No último capítulo, apresentam-se considerações finais a respeito da problematização levantada acerca do papel atual do café na economia, isto é, se ele ainda pode ser considerado de exportação, se ainda gera importantes divisas para o país e se há transferências de divisas geradas pelo café para o financiamento de indústrias.

Com relação à característica de ser considerado um produto agrícola de exportação, o café continua sendo um dos mais exportados, com uma participação de 3,5 % no total das exportações brasileiras. No que diz respeito ao financiamento de indústrias fica comprovado que o café, apesar de gerar importantes divisas para o país, não financia mais as indústrias. Este papel está sendo exercido, principalmente, pelo BNDES, que financia recursos para investimentos de longo prazo e pelo capital estrangeiro, caracterizado pelos investimentos diretos externos e pelas empresas transnacionais que fazem fusões e aquisições e pelo processo de privatização proporcionado pelo governo.

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2 PANORAMA DA IMPORTÂNCIA DO CAFÉ NA ECONOMIA BRASILEIRA

DO INÍCIO DO SÉCULO XX ATÉ A CRISE DE 29: EXPORTAÇÕES, POLÍTICA CAMBIAL, INVESTIMENTOS EXTERNOS E SURGIMENTO DA INDÚSTRIA

2. 1 PRODUÇÃO CAFEEIRA NO FINAL DO SÉCULO XIX

A produção de café no final do século XIX é estimulada por uma elevação muito rápida da população mundial e um crescimento acentuado no nível de rendimento. De 1850 a 1900, a população dos Estados Unidos triplicou e a da Europa aumentou 50% e, dentro desse contexto de aumento populacional, houve um enorme progresso material da economia do mundo na segunda metade de século XIX. São as taxas de aumento do rendimento per capita que explicam o alto dinamismo da procura de café, que passou de 5 milhões de sacas nos anos de 1850 a 14 milhões no fim do século.

A produção cafeeira no século XIX foi desenvolvida sobre a base do trabalho escravo. A empresa cafeeira utiliza intensivamente essa mão-de-obra e se caracteriza por custos monetários baixos. No entanto, após a independência de 1822, a Grã-Bretanha exigiu que o governo brasileiro interditasse o tráfico, de forma que a expansão da cultura cafeeira sobre a base do trabalho compulsório tornou-se muito limitada.

Com a abolição do trabalho escravo (1888), as possibilidades de encontrar a força de trabalho no Brasil tornaram-se reduzidas. Predominava aqui um sistema de produção apoiado no auto-consumo, no qual o agricultor familiar brasileiro devia assegurar sua própria subsistência, explorando por seus meios as terras que lhes eram concedidas pelo latifúndio. Portanto, esses trabalhadores não constituíram um mercado de trabalho para as plantações de café.

Os braços necessários ao desenvolvimento do café surgiram graças à imigração massiva de trabalhadores de origem européia, que começaram a formar e desenvolver o mercado de trabalho no Brasil.

A partir da década de 1870, o café torna-se o centro motor do desenvolvimento do capitalismo brasileiro. O rápido crescimento da produção se deu graças às mudanças ocorridas ao nível das relações de produção. Com o trabalho assalariado, a produção

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cafeeira conhece a mecanização. A construção de uma rede de estradas de ferro, o financiamento e a comercialização de uma produção implicam o desenvolvimento de um sistema comercial relativamente avançado, formado por casas de exportação e uma rede bancária.

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2. 2 A PRODUÇÃO CAFEEIRA NO INÍCIO DO SÉCULO XX

No início do século XX, o preço do café começou a cair, reduzindo o rendimento dos fazendeiros. O problema da superprodução de café apareceu desde o final do século XIX. Com a crise de 1893 nos EUA, principal consumidor de café brasileiro, os preços desse produto no mercado mundial caem rapidamente. Cria-se um problema que, segundo o governo, deveria ser resolvido pelo próprio mercado que se encarregaria de eliminar os produtores marginais. O relatório do ministério da Fazenda de 1899 dizia que:

“Convicto de que a intervenção oficial só poderia aumentar nossos males, o governo deixou que a produção do café se reduzisse por seleção natural, determinando-se assim a liquidação e a eliminação dos que não tinham condições de vida, ficando elas nas mãos dos mais fortes e dos mais bem organizados para a luta” (Murtinho apud Delfim Netto, 1979).

Quando a superprodução se efetivou, os preços internacionais caíram mais depressa do que o câmbio, e os preços em moeda nacional se reduziram rapidamente. Em 1906/07 a situação iria piorar muito mais, pois a safra se antecipou com uma florada de proporções até então desconhecidas e o Brasil tomou consciência de que se colheria, num só ano, mais café do que o mundo todo poderia beber. Começou-se, então, a pensar numa forma de intervenção que preservasse a lavoura cafeeira do desgaste.

O governo proibiu a plantação de cafeeiros em São Paulo pelo prazo de cinco anos, iniciando em 1902 e posteriormente prorrogado por igual período.

A recuperação lenta dos preços, em resposta à diminuição da produção do Brasil constitui um dos estimulantes mais poderosos para a comercialização do produto. Com o consumo se expandindo, devido aos baixos preços do café, a recuperação dos preços torna-se evidente.

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TABELA 1: Exportações, consumo e estoques mundiais

O problema parecia estar solucionado. No entanto, a safra de 1906/07 iria gerar um estoque estimado para o fim da safra de 13,6 milhões de sacas de café. Um estoque maior do que o estoque no início da safra, 9,6 milhões de sacas.

Em 1906 a grande burguesia cafeeira, visando conter a queda dos preços devido ao aumento dos estoques, reúne-se em Taubaté (SP) para definir uma nova política de defesa do café. Essa política de valorização tinha como principais objetivos a compra dos excedentes pelo governo a fim de restabelecer o equilíbrio entre a oferta e a demanda, o financiamento dessas compras por empréstimos de bancos estrangeiros, o pagamento do serviço desses empréstimos através de um novo imposto sobre a exportação de café e a adoção de medidas destinadas a desencorajar a expansão das plantações.

Esse acordo ficou conhecido como Convênio de Taubaté – “um convênio entre os Estados do Rio de Janeiro, Minas Gerais e São Paulo para o fim de valorizar o café, regular o comércio, promover o aumento do seu consumo e criar a ‘Caixa de Conversão’ para fixar o valor da moeda” (Doc. Parlamentar p.225 apud Delfim Netto). O convênio tratava de duas questões interdependentes, mas distintas: a valorização do café e a estabilização da taxa cambial.

Se a valorização tivesse bom êxito, ela pressionaria a taxa cambial para cima de duas maneiras: a venda das cambiais que aumentaria a oferta de divisas e a elevação dos preços do café melhoraria também a receita de divisas. Era possível, portanto, que o bom êxito do

Brasil Outros 1900/01 11,03 3,79 14,33 0,49 1901/02 15,27 3,65 15,52 3,4 1902/03 13,01 4,5 15,97 1,54 1903/04 11,05 4,63 16,13 -0,45 1904/05 10,22 3,92 16,16 -2,02 1905/06 10,96 3,95 16,74 -1,83 * Fonte: Delfim Netto, Antônio. Op.Cit.

Exportação

(em 1.000.000 de sacas de café)

Safras Consumo

Variação dos estoques

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plano destruísse as vantagens internas, pois a melhoria da taxa cambial poderia chegar a anular a repercussão dos aumentos dos preços internos.

Segundo Furtado(1998), a evolução do câmbio se explica por alterações no preço internacional do café, provocadas por modificações na demanda pelo produto. No entanto, fatores do lado da oferta passariam a influenciar o preço do café à medida que se configura uma situação de excesso de produção cafeeira em relação à demanda.

Diante de alguns problemas enfrentados pelos governos de Minas Gerais e do Rio de Janeiro em conseguir empréstimos que seriam utilizados para a compra do café (conforme acordado no Convênio de Taubaté), o Estado de São Paulo decidiu empreender, por sua conta própria, a valorização, obtendo financiamento do Brasilianische Bank für Deutschland, iniciando as compras dos estoques.

As compras se prolongaram até meados de junho de 1907, quando o governo do Estado de São Paulo, após ter retirado do mercado cerca de oito milhões de sacas, declarou que não mais compraria café e que conservaria os estoques em seu poder até conseguir preços compensadores.

O Estado de São Paulo poderia manter fora do mercado o estoque de café adquirido por muito mais tempo. No entanto, a situação melhorava pois o suprimento anual era inferior à procura e os preços melhoravam continuamente, tendo início a venda do estoque. O estoque inicial antes da venda era de 8.474.623 sacas e, quando o estoque atingiu 6.992.920 sacas, encerrou-se o que se pode chamar de a primeira fase da valorização: tinha sido retirado do mercado o excedente, e os preços, que haviam atingido o seu nível mais baixo no primeiro semestre de 1908, começavam a dar sinais de recuperação.

No entanto, a valorização do café sem a simultânea estabilização da taxa cambial não resolveria o problema do cafeicultor. A política de valorização do café proporciona aumento dos preços internos do produto. Estando o câmbio valorizado, o preço para o mercado externo torna-se mais caro, dificultando a exportação do produto. Dessa forma, a estabilização cambial é de fundamental importância para a resolução dos problemas dos cafeicultores.

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Antes mesmo que o estoque da primeira operação estivesse inteiramente liquidado, registrou-se nova intervenção governamental no mercado, devido às complicações internacionais surgidas com a I Guerra Mundial. Em 1917, com a entrada da safra e com a impossibilidade de exportação, o estoque nos portos nacionais assumiu proporções alarmantes, reduzindo o preço do café a patamares ínfimos.

Quando a guerra terminou (novembro 1918), os estoques do mundo haviam baixado, ao mesmo tempo em que a geada reduziu a oferta no Brasil. Isso fez com que os preços se elevassem. Com essa situação, o Estado de São Paulo dispôs de todo o seu estoque de café com lucros fabulosos.

No entanto, na safra de 1920/21 os cafezais se recuperaram, produzindo 16,2 milhões de sacas. Com isso, o estoque voltou a crescer, só que num momento de depressão, que se seguiu à prosperidade do pós-guerra nos Estados Unidos.

Esse significativo movimento de contração reduziu o nível de rendimento dos consumidores e, consequentemente, causou uma retração na procura, significando que, para manter-se o mesmo nível de consumo, teria sido preciso conceder diminuições importantes nos preços.

Nessa situação, a única maneira de sustentar o mesmo volume de negócios era por meio da redução dos preços. No entanto, contribuíram para a queda dos preços do café, dois movimentos: um deslocamento para baixo da curva de procura do café e um aumento da oferta.

As exportações, que em 1919 haviam atingido 13 milhões de sacas, reduziram-se a 11,5 milhões em 1920. Como a crise se caracterizava principalmente por uma redução dos preços, compreende-se que os operadores do mercado tivessem diminuído as suas compras ao mínimo, de maneira a transferir o risco da manutenção dos estoques, o que explica a redução do volume exportado.

Os preços foram subindo lentamente em 1922 e praticamente se estabilizaram em 1923. Quando as floradas da safra de 1923/24 mostraram que ela provavelmente atingiria 19 ou

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20 milhões de sacas, o governo federal construiu armazéns reguladores e represou a safra no interior, de maneira a sustentar os preços.

A partir de então, o desenvolvimento capitalista assegurado pela política de valorização é acompanhado por uma participação mais direta do capital estrangeiro. Este se torna dominante ao nível da comercialização do café e as filiais dos bancos estrangeiros se desenvolvem mais rapidamente. No entanto, o capital estrangeiro não domina inteiramente a comercialização do café e as atividades bancárias. Ao seu lado, desenvolvem-se os bancos e as casas de exportação pertencentes à burguesia nacional.

A recuperação dos preços do café durou pouco. O apogeu dos Estados Unidos no final da I Guerra acabou provocando a Grande depressão de 1929. Quando a Guerra terminou, os Estados Unidos haviam se tornado a maior potência capitalista do mundo, fortalecida por uma grande produção industrial. Quando a Guerra acabou, os Estados Unidos detinham metade do ouro mundial em seus cofres. Os países europeus, dentre outros, compravam produtos agrícolas e manufaturados dos Estados Unidos e por isso havia a necessidade de aumentar a produção. Para isso, houve uma grande mecanização na produção agrícola. Essa mecanização acabou gerando desemprego de um grande número de pessoas. Por não terem emprego nem dinheiro, essas pessoas passam a consumir menos. Nesse mesmo momento, a Europa começa a se recuperar da Guerra e passa a produzir. Com isso, a economia norte-americana começa a sofrer um golpe interno, em conseqüência do seu próprio desenvolvimento. As grandes fontes de consumo estavam diminuindo na mesma época em que as indústrias estavam produzindo muito. Ocorreu, então, uma crise gerada pela superprodução e pelo subconsumo, uma crise cíclica do capitalismo, a Grande Depressão.

O momento de apogeu da crise foi a queda da bolsa de valores de Nova Iorque. Essa crise mostrou a incapacidade do capitalismo de ser um sistema estável. Com a Depressão de 29 evidenciam-se as contradições do sistema capitalista: a superprodução de produtos em meio à miséria. É a Grande Crise de 1929, que provoca, nos EUA, uma depressão econômica que destruiu 25% do PIB, alijou do emprego 30% da mão-de-obra, levou à falência metade dos bancos comerciais e reduziu nas bolsas em 75% o valor de mercado das empresas.

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Segundo Peláez(1979), mesmo que não houvesse a Grande Depressão, a crise do café seria incontrolável. Nessa época a economia brasileira era essencialmente de exportação. Como a crise afetou o mundo inteiro, sendo o maior impacto nos Estados Unidos, principal comprador do café brasileiro, as relações de troca do Brasil decaíram, derrubando também o preço do café.

A produção cafeeira só conseguiu se estabilizar por volta de 1936/37, quando teve início uma nova política cafeeira para elevar as exportações físicas do Brasil.

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2. 3 O SURGIMENTO DA INDÚSTRIA

A valorização cafeeira faz com que o capital estrangeiro e o capital cafeeiro se tornem um fator determinante para o desenvolvimento do capitalismo no Brasil. A burguesia cafeeira é composta por homens que, além de grandes fazendeiros, são também banqueiros e exportadores. Assim, a grande burguesia cafeeira, proprietária dos bancos e das casas de exportação, pode reservar uma parte cada vez mais importante do lucro realizado a partir da produção do café.

Com isso, o café é considerado a base do crescimento industrial nacional porque proporciona o pré-requisito mais elementar e imprescindível para a implantação de um sistema industrial – a economia monetária.

Os bancos nacionais e estrangeiros, cujo capital em 1913 eleva-se a 3,23 bilhões de mil-reis, penetram em todos os setores da economia brasileira, financiando as atividades mais diversas: o comércio, a importação, a exportação, o açúcar, o café e também a indústria e, portanto, desempenhando um papel importante no desenvolvimento capitalista no Brasil.

Esse capital disponibilizado pelos bancos nacionais e estrangeiros foram imprescindíveis para o surgimento e posterior desenvolvimento da indústria. Em 1907 existiam 3.258 indústrias, passando para 13.336 em 1920, conforme quadro 1.

QUADRO 1: Número de indústrias no Brasil

Fonte: Le Brésil el sés richesses, vol. II, p. 373, e Rescenceamento de 1920, vol. V, pp. XXII e XXIII. In: Silva, Sérgio(1985).

A indústria tende a concentrar-se, desde o começo, na região do café, visto que as transformações econômicas e sociais ocorridas no país estão concentradas na região das

Ano Número de empresas Capital (contos) Produção (Contos) Força Motriz Número de operários 1907 3.258 653.555 731.292 109.284 149.018 1920 13.336 1.815.156 2.959.176 310.424 275.512

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grandes plantações de café, isto é, Estados do Rio de Janeiro, Minas Gerais e principalmente em São Paulo, que possuía a maior concentração de indústrias da época.

QUADRO 2: Indústria em São Paulo: 1907, 1920 E 1929

Fonte: Le Brésil et ses richesses, vol. II, p. 373 e Recenseamento de 1920, vol. V, pp. XXII e XXIII. In: Silva, Sérgio. Op. Cit.

* As fontes não indicam esse dado.

No centro das transformações econômicas ocorridas no Brasil, está a progressiva abolição do trabalho escravo forçado pela Grã-Bretanha logo após a independência do Brasil. A mão-de-obra escrava foi sendo suprida graças à imigração em massa ocorrida a partir de 1880 provocada pela expansão cafeeira e organizada pela grande burguesia cafeeira através do Estado. O rompimento com o trabalho escravo fez surgir transformações importantes associadas à passagem ao trabalho assalariado. Essas transformações incluem as estradas de ferro, os bancos, o grande comércio de exportação e importação e uma certa mecanização ao nível das operações de beneficiamento da produção. São essas transformações que fazem da economia cafeeira o centro de uma rápida acumulação de capital baseada no trabalho assalariado.

As primeiras fábricas foram beneficiadas pela transformação social operada pelo café, em particular pela presença de uma mão-de-obra afeita à necessidade de trabalho constante. Pode-se afirmar, portanto, que os progressos ocorridos nas décadas de 1880 e 1890 foram, indiscutivelmente, a causa da industrialização.

O setor industrial nascente é marginal dentro da economia orientada para a exportação. Tanto industriais quanto fazendeiros dependem dos preços do café para cobrir seus custos de produção. No entanto, ao associar expansão cafeeira e crescimento da indústria, deve-se observar que, apesar da agricultura no final do século XIX manter-se como a atividade dominante, as transformações das relações de produção determinam um novo período que

ANO NÚMERO DE CAPITAL (contos) FORÇA MOTRIZ NÚMERO DE OPERÁRIOS 1.907 326 127.702 84.301 24.186 1.920 4.145 537.817 94.099 83.998 1929 6.923 1.101.824 (*) 148.376

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está mais ligado à industrialização do que aos períodos anteriores, onde a acumulação se apoiava no trabalho escravo.

No desenvolvimento da própria indústria, deve-se fazer uma diferenciação entre unidades de produção como o artesanato, a manufatura e a fábrica. A manufatura e a fábrica se distinguem da empresa artesanal pelo número de trabalhadores que empregam. A fábrica se distingue da manufatura pela importância do capital que emprega. É na fábrica que há a separação do produtor direto (trabalhador) dos meios de produção – chave do sistema capitalista.

Durante o período de hegemonia cafeeira, a indústria caracteriza-se por pequenas empresas voltadas para reduzidos mercados locais. A importância da empresa com 100 ou mais operários, e não as pequenas empresas de tipo artesanal ou pequenas manufaturas, é que essas empresas dispersas por todo o país e destinadas a atender a um mercado local, caracterizam a indústria nascente no Brasil.

Ao associar o nascimento da indústria dentro das relações capitalistas no Brasil à economia cafeeira, deve-se observar que as relações entre economia cafeeira associada ao comércio externo e a indústria nascente implicam, ao mesmo tempo, a unidade e a contradição. A unidade está no fato de que o desenvolvimento capitalista baseado na expansão cafeeira provoca o nascimento e um certo desenvolvimento da indústria; a contradição está nos limites impostos ao desenvolvimento da indústria pela própria posição dominante da economia cafeeira na acumulação de capital. Essa questão é importante e durável, pois tem um conteúdo político e, porquanto, a grande propriedade rural permanecerá no centro dos interesses das elites brasileiras, intolerantes às reformas.

Relacionando-se o capital estrangeiro com a indústria nascente, observa-se a subordinação da economia brasileira à economia mundial. A própria economia cafeeira, a sua condição como centro motor do desenvolvimento do capitalismo no Brasil, não é senão a forma concreta de inserção do Brasil na economia mundial. (Silva, 1985)

O valor das exportações é um fator importante na determinação da evolução da taxa cambial, especialmente em um país exportador de bens primários como é o caso do Brasil

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na época. O preço do café tem um papel preponderante na oferta de divisas no período de 1860 à criação da Caixa de Conversão em 1906.

A participação do café nas receitas totais de exportação durante a segunda metade do século XIX era ascendente. Na década de 1860, cerca de 46% das receitas de exportação de mercadorias se originavam das exportações de café. Na década seguinte, subiu para 58% , atingindo 63% na década de 80.

Assim, a expansão cafeeira é a base de uma rápida acumulação de capital. Entretanto, os efeitos dessa acumulação no que se refere às transformações do modo de produção foram reduzidos. A tendência inicial é a de importar grande parte dos bens necessários à reprodução da força de trabalho e dos bens de consumo das outras camadas sociais. A produção local tende a especializar-se em produtos primários. Portando, às receitas em divisas, obtidas pelas exportações, coube satisfazer à procura por importações.

Por outro lado, a divisão internacional do trabalho, ao mesmo tempo em que permite uma rápida acumulação de capitais baseada na expansão cafeeira, limita os efeitos dessa acumulação sobre o modo de produção. A reprodução do capital impõe transformações necessárias à acumulação: o nascimento da indústria e a conseqüente elevação da produtividade tornam-se fundamentais para a expansão do excedente e o prosseguimento da acumulação.

A indústria surge, portanto, das contradições do desenvolvimento capitalista, cujo centro é a expansão cafeeira. A reprodução do capital industrial é determinada pela posição dominante do capital cafeeiro na economia brasileira e a posição subordinada da economia brasileira no seio da economia mundial.

A importância decisiva do comércio externo, em particular das políticas cambial e alfandegária, advém do fato de que, na prática capitalista, ele desempenha o papel de determinante da rentabilidade dos investimentos. A posição do comércio externo na economia brasileira só pode ser explicada pelas formas de produção determinadas pela dominação do capital cafeeiro e pela subordinação do Brasil à economia mundial.

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A industrialização pode levar a mudanças nas formas de subordinação associadas a transformações do capitalismo no Brasil. Essa subordinação pode ser comprovada fazendo-se uma análifazendo-se da composição da estrutura fazendo-setorial da indústria brasileira nascente. Percebe-se que o capital industrial no Brasil concentra-se nos setores de bens de consumo. Toda demanda de bens de produção, em particular dos bens de capital, é suprida pelos países industrializados, isto é, pelos países capitalistas avançados, notadamente a Grã-Bretanha.

O modo de inserção do Brasil na economia mundial assegura uma rápida acumulação do capital industrial, visto que, com as importações de equipamentos modernos, o capital industrial brasileiro pôde adotar técnicas avançadas e garantir uma rentabilidade elevada. Por outro lado, esse processo que, inicialmente, trouxe vantagens para a economia brasileira, no futuro, causará transtornos pela falta de um parque industrial de produção de bens de capital. O Estado, mais tarde, teve que arcar com o ônus de investir em indústrias de base para que o desenvolvimento do país pudesse ser garantido.

Assim surge a indústria no Brasil, lastreada pela acumulação de capital advinda da economia cafeeira e do capital estrangeiro e inserida numa economia mundial que selecionou em qual estrutura setorial a indústria brasileira iria se desenvolver, respeitando, única e exclusivamente, os interesses dos países capitalistas avançados.

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3 EXPORTAÇÕES DE CAFÉ E FINANCIAMENTO DE INDÚSTRIAS

PÓS-PLANO REAL

3. 1 CONSIDERAÇÕES ACERCA DA CAFEICULTURA BRASILEIRA NO PERÍODO DE 1989 A 1993.

Antes de se analisar o período pós Plano Real, é importante observar o período compreendido entre 1989 e 1993, quando os preços internacionais do café atingiram níveis extremamente deprimidos e os preços ao produtor nacional decaíram de forma ainda mais dramática, que levou a cafeicultura ao endividamento crescente, renda global decrescente e perda de produtividade.

TABELA 2: Exportações de café (em sacas de 60Kg) e Receita Cambial (em US$ 1.000)

Fonte: Anuário FEBEC. In: Cecafé (2001)

A tabela 1 apresenta os totais exportados e a receita cambial gerada no período de 1989 a 1993. Tomando-se como base o ano de 1988, quando as exportações brasileiras de café totalizaram 17,08 milhões de sacas gerando uma receita cambial de US$ 2,22 bilhões, percebe-se um aumento no volume exportado (exceto no ano de 1990). No entanto, houve redução da receita cambial, fato ocorrido devido à queda dos preços internacionais do café. Daí até 1993, a receita cambial manteve-se bem abaixo de US$ 2 bilhões.

O longo período de preços baixos (1991 a meados de 1994) que reduziu a produção e aumentou os gastos para a recuperação da lavoura, aliado ao crescimento dos custos de produção, provocou o alto endividamento do setor produtivo, que está entre os fatores que contribuíram para a perda da participação do Brasil no mercado internacional.

Ano Receita Cambial US$ 1.000 1989 1.780.860 1990 1.284.686 1991 1.575.994 1992 1.098.091 1993 1.215.722 18.823.701 17.846.167 Exportações totais (verde + solúvel) (em sacas de 60 KG) 18.288.616 16.986.000 21.141.918

(23)

Nessa época, algumas transformações afetaram o mercado internacional de café, causando reflexos sobre o segmento exportador do produto no Brasil. De um lado, as mudanças nas regras de mercado desde a suspensão do Acordo Internacional do Café (AIC)1 em 1989 e a criação da Associação dos Países Produtores de Café (APPC)2 em julho de 1993, tendo como objetivo definir políticas de reordenamento do mercado. De outro, a exigência de qualidade dos grãos importados, por parte dos consumidores, abalou a política cafeeira doméstica do extinto Instituto Brasileiro de Café (IBC) que privilegiava a quantidade exportada sem maiores preocupações com a qualidade dos grãos brasileiros. Diante dessa política equivocada, os exportadores de café perderam a oportunidade de iniciar o processo de conquista de mercados específicos com um produto de melhor qualidade.

A criação da Associação dos Países Produtores de Café (APPC) teve como principal medida adotada a retenção de estoques, que funcionou no primeiro ano. No entanto, essa política torna-se inviável por vários motivos: em primeiro lugar, porque alguns países membros não tinham instrumentos para implementá-la; segundo, porque não só não dispunham de mecanismo de controle interno como sequer tinham recursos para manter os estoques; em terceiro lugar, porque o setor privado não queria que isso acontecesse. Além disso, a retenção de estoque só é viável quando a sua composição, em termos de qualidade, corresponde ao que é demandado pelo mercado. “Com estoques de baixa qualidade, surge a situação paradoxal: a escassez de cafés na qualidade necessária à demanda, ao mesmo tempo em que são carregados estoques abundantes”. (Saes, 1999, p. 46)

Em 1993, as indústrias de café solúvel3 iniciam um processo de importação de café da África (mais barato e de qualidade inferior) para ser utilizado na produção de solúvel

1 Instituído na década de 60 com o objetivo de estabilizar os preços do café no mercado mundial. A extinção dos AIC’S deu lugar ao livre comércio. (Saes, 1999, p. 74)

2 Conta com a participação de 28 países produtores, responsáveis por cerca de 75% da oferta total. (Saes, 1999, p. 75)

3 As primeiras fábricas brasileiras de café solúvel voltadas para a exportação só surgiram no início da década de 60, pois a indústria existente só atendia ao mercado interno.

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(processo drawback)4. No entanto, segundo Antônio César Néri, ex-diretor do IBC, as partidas de importação de café africano foram inexpressivas, face a problemas fitossanitários.

A indústria do solúvel reivindica o mecanismo de drawback, pois os preços do robusta (café que é utilizado na fabricação do solúvel) estar mais barato no mercando internacional do que no Brasil

Esse mecanismo de drawback voltará a ser cogitado pelas indústrias de café solúvel em 1997, como será visto posteriormente.

(25)

3. 2 PRINCIPAIS ASPECTOS DA POLÍTICA CAMBIAL NO PLANO REAL

A elaboração do Plano Real está composta por três fases, identificadas a partir de duas correntes do pensamento econômico: a ortodoxa e a heterodoxa. A primeira fase do plano, ortodoxa, contempla um ajuste fiscal5, cujo objetivo é “responder ao problema do desequilíbrio orçamentário do Estado, em particular, a sua fragilidade de financiamento, considerando como um dos elementos cruciais a aceleração da inflação no Brasil” (Filgueiras, 2000, p.102). A segunda fase, heterodoxa, caracteriza-se pela tentativa de eliminar a inércia inflacionária sem haver, contudo, choques (expansão do crédito, aumento do consumo). A utilização da âncora cambial permitiu que o Real fosse atrelado ao dólar sem compromisso de conversibilidade paritária e fixa.

A política cambial adotada no Plano Real é, portanto, fundamentada na âncora cambial, que proporciona a equivalência entre Real e Dólar na proporção de R$ 1,00 para US$ 1,00. Antes de ser implantada a nova moeda, há a conversão de todos os valores da moeda antiga em uma unidade de valor (URV), equivalente ao dólar, à qual eram associados os preços de todos os produtos e serviços do país. Considera-se a utilização da URV como um processo operacional inovador, pois

“ela tornou desnecessário o congelamento, a pré-fixação, ou qualquer outro mecanismo coercitivo de intervenção nas decisões soberanas dos agentes econômicos. Ela ofereceu uma fecunda terceira via entre a heterodoxia e a ortodoxia.” (Franco apud Filgueiras, 2000, p. 108).

Em 1° de julho de 1994, estabelece-se, a conversão da URV, que valia CR$ 2.750,00, em Real. Com isso, o governo consegue transformar valores expressos em uma moeda inflacionada em valores baseados na moeda livre da cultura inflacionária – o Real. Assim, conclui-se a terceira fase do Plano.

5 É criado o IPMF (Imposto Provisório sobre Movimentação Financeira) e o FSE (Fundo Social de Emergência), correspondendo a uma diminuição das transferências da União para os Estados e Municípios, possibilitando um aumento dos recursos livres de que dispõe o governo federal. (Brito, 1998, p. 50).

(26)

Antes da análise dos principais aspectos da política cambial adotada no Plano Real, deve-se conceituar a política cambial. Trata-deve-se de um conjunto de medidas que visa regular a taxa de câmbio a fim de facilitar o intercâmbio do país em questão com o resto do mundo.

O Plano Real surge, portanto, de uma política cujo objetivo explícito e imediato é solucionar o problema da inflação no Brasil. O câmbio é o sustentáculo do plano. A utilização da âncora cambial6 assegura a paridade do Real com o Dólar, contribuindo para eliminar a inércia inflacionária, sendo este o grande êxito do Plano Real.

A sobrevalorização cambial7 visando à estabilidade de preços favorece o aumento da demanda agregada, provocando crescimento das importações, redução das exportações (que ficaram mais caras com o câmbio valorizado) e o conseqüente déficit na conta de transações correntes do Balanço de Pagamentos. O Real foi introduzido na economia com o estabelecimento de um teto para a cotação do dólar (real por dólar), o que, associado ao alto nível da taxa de câmbio real, reservas e juros, levaram a uma forte entrada de capitais e a uma apreciação da nova moeda. Segundo a equipe econômica, essa apreciação é desejável para assegurar o processo de estabilização.

No entanto, segundo Delfim Netto (Troster, 1997), a política cambial é o grande problema do Plano Real. Essa conclusão deve-se ao fato de o governo ter exagerado na valorização do câmbio, permitindo que atingisse o valor de 0,83 centavos de real por dólar. O câmbio é a relação entre preços internos e preços externos, entre preços de mercadorias transacionáveis e de mercadorias não-transacionáveis. Dessa forma, quando se promove estabilização, estabilizam-se instantaneamente os preços dos bens transacionáveis (produzidos internamente e exportáveis).

6

Uma taxa de câmbio ancorada indica que o preço da moeda é definido pelo Banco Central, mas pode ser alterado se as circunstâncias exigirem. (Sachs, 1995, p. 321)

7

“A sobrevalorização cambial é um expediente transitório, sustentável apenas enquanto o país conseguir angariar capitais externos para financiar o déficit em conta corrente do Balanço de Pagamentos” ( Simonsen, 1995, p. 561).

(27)

Com a sobrevalorização do câmbio, as exportações ficam comprometidas. As minidesvalorizações proporcionadas até o início de 95 não tinham como finalidade a promoção das exportações, mas sim impedir que em uma economia cronicamente inflacionária, as oscilações bruscas do valor da moeda nacional e a sua possível apreciação desestimulem as exportações. (IEDI, 2000).

Em 1995, com a crise do México, o governo estabelece o sistema de bandas formais de câmbio, provocando uma desvalorização da moeda em torno de 8 a 9%. Associada a essa medida ( que aliviou as pressões sobre o câmbio), houve a adoção de uma política de juros alta, visando estancar a perda de reservas. O sistema de bandas8 estabelece a paridade mínima e máxima para a intervenção do Banco Central no mercado, “dando a direção da cotação dentro da banda sem, contudo, se comprometer com nenhuma trajetória” (IEDI, 2000, p. 17).

O quadro 3 apresenta os limites superior e inferior das bandas, definidos pelo Banco Central, bem como as datas das alterações no sistema de bandas.

QUADRO 3: Limites das Bandas Cambiais

Fonte: Banco Central do Brasil

* Suspensão do Regime de Bandas Cambiais (Comunicado nr. 6.563) ** Extinção do Regime de Bandas Cambiais (Comunicado nr. 6.565)

8 A partir do final de 1995, o Banco Central passa a operar no mercado de câmbio com a intrabanda.

DAT A LIMITE SUPERIOR LIMITE INFERIOR 06-03-1995 0,86 0,90 10-03-1995 0,88 0,93 22-06-1995 0,91 0,99 30-01-1996 0,97 1,06 18-02-1997 1,05 1,14 20-01-1998 1,12 1,22 15-01-1999* - -18-01-1999** -

(28)

-Além disso, a política cambial adotada traz uma grande dependência de capitais externos na forma de aplicação financeira de curto prazo. Esse tipo de capital é volátil e pode ser retirado do país ao menor sinal de crise, gerando perdas nas reservas e conseqüente desvalorização da moeda.

Logo após a ampliação da banda cambial, ocorrida em 13/01/99, o primeiro impacto é uma desvalorização do Real da ordem de 8,96%. Esse impacto, associado à liberação cambial ocorrida em 18/01/99, resulta em um “aumento da cotação do dólar em 64% com relação ao valor do dia anterior à mudança da política cambial (R$ 1,21).” (IEDI, 2000, p. 20). Diante dessa desvalorização, a equipe econômica do governo adota uma política de altas taxas de juros com a finalidade de atrair capitais externos e, dessa forma, cobrir as perdas registradas nas reservas cambiais. A livre flutuação do câmbio é adotada como uma alternativa ao desgaste da imagem do governo na condução da política econômica. Essa flexibilidade torna-se necessária para evitar uma maior perda nas reservas cambiais, uma vez que, no câmbio fixo9, o Banco Central intervinha no mercado ativamente, isto é, vendendo dólares quando o limite superior é atingido e comprando dólares quando o limite inferior é alcançado. Dessa forma, toda vez que o Real atinge um dos limites da banda estabelecida, o Banco Central interfere no mercado trocando moeda nacional por estrangeira (ou vice-versa) para estabilizar a taxa de câmbio. Com o câmbio flexível, o Banco Central intervém no mercado quando há excesso de volatilidade ou falta de liquidez. A flutuação cambial adota a meta de inflação como referência da política monetária. Uma taxa de câmbio flutuante reflete as expectativas do mercado com relação à evolução futura da demanda e da oferta de dólares.

Após a liberação do câmbio, a cotação do dólar alcança o pico de R$ 2,16 no início de março/99. Em maio do mesmo ano, a cotação do dólar cai para R$ 1,65 e, em seguida, inicia um novo processo de alta, alcançando R$ 1,79 no final de dezembro.

9 O Banco Central compromete-se a comprar e vender a moeda estrangeira de referência a um preço fixo, expresso em moeda nacional. (Simonsen, 1995, p. 100)

(29)

3. 3 A PRODUÇÃO CAFEEIRA PÓS-PLANO REAL: VOLUME EXPORTADO, RECEITA CAMBIAL GERADA, PREÇOS E PARTICIPAÇÃO NAS EXPORTAÇÕES GLOBAIS

No período de implantação do Real, com a valorização do câmbio, as exportações de café brasileiras sofrem uma queda. O volume total exportado (verde + solúvel) em 1994 foi de 17,2 milhões de sacas, reduzindo-se para 14,5 milhões de sacas, totalizando uma redução de 15,73%.

Apesar da redução de 15,73% no volume exportado, a receita cambial gerada nesse período sofreu uma redução de 4,28%, passando de um total de US$ 2,5 bilhões para US$ 2,4 bilhões. Este valor da receita cambial é proporcionado pelo aumento no preço do café no período, conforme gráfico abaixo.

GRÁFICO 1: Evolução dos preços do café verde e solúvel Brasil: 1994 - 95

Fonte: Anuário Cecafé. In: Cecafé (2001)

O preço do café verde que era cotado a US$ 150,34 a saca de 60 Kg em 1994, passa para US$ 163,46 em 1995, representando um aumento de 1,09%. Para o café solúvel, o reajuste é um pouco maior, 1,42%. Esses aumentos nos preços do café verde e solúvel geram uma maior receita cambial para o Brasil, mesmo havendo uma redução das exportações totais de café. 150,34 163,46 128,54 182,7 0 50 100 150 200 1994 1995 Ano P re ç o s PREÇOVERDE PREÇOSOLÚVEL

(30)

Por outro lado, o Plano Real traz um aumento no poder de compra da população em geral, refletindo no aumento do consumo de café. O Brasil possui o primeiro lugar em produção de café do mundo, e é o segundo maior mercado consumidor, atrás somente dos Estados Unidos.

Entretanto, embora se possa imputar parte do crescimento ao efeito positivo sobre a renda10 após o Plano Real, o fator que mais contribui para o aumento do consumo de café internamente é a ação da ABIC11. A Associação Brasileira da Indústria do Café, com o programa de incentivo ao consumo, é a grande responsável pelo aumento do consumo e por uma melhoria na qualidade do café consumido no Brasil.

Diante da realidade de crise do consumo interno e da desvalorização do café, proporcionada, principalmente, pela má qualidade12 do café torrado e moído oferecido ao consumidor, a ABIC e o IBC propõem a criação de um Programa de Autofiscalização, no qual as próprias empresas têm o compromisso de garantir a pureza do café por meio da autofiscalização. Em agosto de 1989 é criado o Comitê Executivo de Autofiscalização, mais tarde denominado de Auto-regulamentação, e instituído o Regulamento/Acordo de Controle de Pureza do Café Torrado e Moído, que estabelece as regras para a obtenção do direito ao uso do “Selo de Pureza ABIC” 13.

10

Análises estatísticas demonstram que o efeito renda não é um fator essencial na explicação para o aumento no consumo de café, já que o produto possui baixa elasticidade renda. (ABIC, 1998).

11

Associação Brasileira da Indústria de Café congrega 540 empresas, representando 80% do total de café produzido no Brasil. (Saes, 1999, p. 86).

12 A má qualidade deve-se, em grande parte, à adulteração do produto através da mistura ao café de diversos tipos de impurezas como milho, cevada e cascas. (ABIC, 1998).

13 Para obter o selo de Pureza, a empresa torrefadora deve aderir ao Programa de Controle de pureza do Café, aceitando a regulamentação, inscrevendo as marcas que comercializam, pagando as contribuições necessárias ao Custeio do Programa. (ABIC, 1998).

(31)

Dessa forma, a partir de 1989, após a implantação do Programa de Autofiscalização, melhorando a qualidade do café, o consumo interno inicia uma recuperação lenta, porém constante. Esse crescimento no consumo é verificado até mesmo em períodos de aumentos reais nos preços do café no mercado doméstico. Em 1994, por exemplo, devido à quebra da safra, houve aumentos reais superiores a 50% no preço do café torrado e moído e, apesar disso, o consumo se eleva. (IPC-FIPE apud ABIC, 1998).

TABELA 3: Preço médio do café no mercado interno brasileiro (em US$)

* Até abril/2000

Fonte: Cooperativa de Cafeicultores da Zona de Varginha apud Anuário Coffee Business

Para o diretor de Qualidade da ABIC, Talmo Alves Pimenta, o controle de pureza do café realizado pela ABIC vem inibindo, com eficácia, a ação de empresas que adulteram seus produtos e enganam o consumidor.

Segundo um estudo feito pela ABIC, em 1998, o Brasil é o segundo maior consumidor mundial em volume de sacas, e o maior entre os países produtores de café. A importância do aumento do consumo pode ser sintetizada no fato de que esse consumo interno (crescente) torna o Brasil o maior comprador de sua própria produção, tornando o País menos sensível às flutuações do mercado internacional.

ANO PREÇO MÉDIO 1992 53,12 1993 70,73 1994 154,05 1995 150,74 1996 126,20 1997 100,93 1998 139,39 1999 100,52 2000* 109,05

(32)

TABELA 4: Evolução do consumo interno brasileiro de café Em milhões de sacas de 60Kg

*Estimado

Fonte: Anuário Coffee Business

O consumo interno de café, após um longo declínio (anterior a 1990), consegue inverter essa tendência, iniciando uma fase de crescimento. O resgate do prestígio do café nacional tem sido plenamente atingido, tendo o Selo de Pureza ABIC funcionado como elemento decisivo na recuperação da credibilidade e da imagem do café e do setor cafeeiro. A tabela 4 apresenta o crescimento do consumo interno de café no período de 1990 a 2000.

Após o período de depressão da economia cafeeira (1989-1993), houve, em 1996, um encontro promovido pela ABIC com a finalidade de se debater alguns pontos da ainda debilitada economia cafeeira. Dentre as principais metas propostas no encontro estão: (agroanalysis – nov/98)

 Ampliar a produção média brasileira para 35 milhões de sacas;

 Aumentar do consumo interno para 15 milhões de sacas a fim de adequar-se à proposta de ampliação da produção;

 Fazer com que as exportações brasileiras suprissem 28% do mercado mundial.

De todas essas metas previstas, uma é alcançada mais rapidamente. O Brasil, em 98/99, possui a estrutura produtiva capaz de assegurar safras médias de 35 milhões de sacas. Da produção dessa safra, 12,5 milhões de sacas foram absorvidas pelo mercado interno, 2,5 milhões pela indústria do solúvel e um valor entre 15 e 16 milhões pelas exportações.

A N O V O L U M E 1 9 9 0 8 , 2 1 9 9 1 8 , 5 1 9 9 2 8 , 9 1 9 9 3 9 , 1 1 9 9 4 9 , 3 1 9 9 5 1 0 , 1 1 9 9 6 1 1 , 0 1 9 9 7 1 1 , 5 1 9 9 8 1 2 , 2 1 9 9 9 1 2 , 7 2 0 0 0 * 1 3 , 0

(33)

TABELA 5: Produção brasileira de café (Anos-safra jul/jun) Em milhões de sacas de 60 Kg

Fonte: 90/91 a 95/96, USDA: Abecafé. A partir de 96/97 Horticultural and Tropical Products Division, FAZ/USDA Jun/2000 apud Coffee Business

O café verde é uma commodity agrícola e, por esse motivo, tem o preço como variável de concorrência, sendo que esse preço é dado pelo mercado mundial. Com o crescimento da oferta de café em países que possuem mão-de-obra e terras baratas e poucas alternativas econômicas, a concorrência no mercado de café aumentou. Diante desse fato, Sylvia Saes (1999) afirma que o Brasil deve, além de adotar estratégias de aumento de produtividade e redução de custos, buscar outras alternativas de competição que não o preço. Com isso, visando atingir esse objetivo, passa a haver um intenso lançamento de marcas de cafés solúveis brasileiras no mercado internacional.

No entanto, a inserção do produto brasileiro no mercado externo está sendo dificultada pelos altos preços da matéria-prima produzida no mercado nacional (conillon14 e arábica). Dado que a competitividade desse segmento é condicionada pela relação entre os preços do café robusta15 no mercado interno e externo, e a oferta desse tipo de café no mercado externo tem aumentado, a indústria do solúvel passa a reivindicar o direito de utilizar o mecanismo de drawback para a importação de matéria-prima.

14 Tipo de café que é equivalente ao robusta, sendo utilizado pela indústria de solúvel interna. 15Tipo de café utilizado pela indústria do solúvel no mercado externo.

A NO /S A F R A P R O D UÇ Ã O T O T A L 9 0/ 91 3 1, 00 9 1/ 92 2 8, 50 9 2/ 93 2 4, 00 9 3/ 94 2 8, 50 9 4/ 95 2 6, 00 9 5/ 96 1 6, 80 9 6/ 97 2 8, 00 9 7/ 98 2 3, 50 9 8/ 99 3 5, 60 9 9/ 00 2 7, 00

(34)

“Apesar de não existirem restrições formais, a importação de café tem sido dificultada por três motivos: (1) pressão do segmento produtor, que não quer deprimir os preços internos quando há escassez do produto; (2) a defesa da produção brasileira contra doenças e pragas de outros países produtores; (3) restrição burocrática por parte do governo federal e dos governos estaduais, que acabam obrigando os agentes interessados a utilizar a via judicial, extremamente onerosa e demorada”. (Saes, 1999, p. 65).

Com a desvalorização do real frente ao dólar, ocorrida em 99, o café torna-se mais competitivo no mercado internacional. Esse fato faz com que as exportações totais de café aumentem em 26% com relação ao ano de 98. Esse desempenho reflete a boa oferta durante a safra de 1998/99, cuja colheita totalizou mais de 35 milhões de sacas (meta prevista no encontro ocorrido em 96), conforme tabela 5.

TABELA 6: Volume exportado (em sacas de 60 Kg), Receita Cambial gerada (em US$ 1.000) e Preço Internacional médio (US$/saca de 60 Kg)

Fonte: Banco de Dados Febec. In: Cecafé (2001)

* Preços aproximados por haver uma defasagem de 2 meses entre as informações do volume de café exportado (jan a nov) e da receita cambial gerada (jan a set).

ANO CAFÉ VERDE CAFÉ SOLÚVEL TOTAL CAFÉ VERDE CAFÉ

SOLÚVEL TOTAL VERDE SOLÚVEL 1997 14.437.153 2.333.873 16.771.026 2.725.871 368.770 3.094.641 188,80 158,00 1998 16.561.324 1.661.836 18.223.160 2.336.741 259.375 2.596.116 141,09 156,07 1999 21.060.854 1.960.691 23.021.545 2.220.568 223.784 2.444.352 105,43 114,13 2000 16.008.655 2.066.216 18.074.871 1.559.662 215.713 1.775.375 97,42* 104,40*

VOLUME (em sacas de 60 Kg) RECEITA CAMBIAL US$ 1.000 PREÇO MÉDIO US$/saca de 60 Kg

(35)

GRÁFICO 2: Exportações de café: Volume total Brasil: 1997 - 00

Fonte: Idem

GRÁFICO 3: Exportações de café: Receita Cambial total Brasil: 1997 - 00

Fonte: Idem

TABELA 7: Produção mundial de café verde (em mil sacas de 60 Kg)

Fonte: Horticultural and Tropical Products Division, FAZ/USDA-jun/2000 apud Coffee Business 0 5.000.000 10.000.000 15.000.000 20.000.000 25.000.000 1997 1998 1999 2000 Ano V o lu m e ( sa ca s d e 6 0 K G ) VOLUM E TOTAL 0 500.000 1.000.000 1.500.000 2.000.000 2.500.000 3.000.000 3.500.000 1997 1998 1999 2000 Ano R e ce it a C a m b ia l U S $ 1 .0 0 0

RECEITA CAM BIAL TOTAL A NO /S A FR A V O LUME TO TA L 96/97 103.769 97/98 97.363 98/99 108.099 99/00 106.816

(36)

Como os preços externos do café ficaram em níveis muito baixos em 99, esse aumento da oferta não significou aumento na receita. Pelo contrário, as receitas cambiais com a exportação de café em 99 caíram 6%, atingindo US$ 2,44 bilhões, em relação aos US$ 2,59 bilhões de 98. A explicação para a queda dos preços em 99 está no aumento da produção mundial que passou de 97,36 milhões de sacas na safra 97/98 para 108,09 milhões de sacas na safra 98/99. O recorde obtido pelo setor foi em 1997, quando as exportações do produto totalizaram US$ 3,09 bilhões. Esse recorde foi alcançado, pois a safra interna em 96/97 representou 27% da produção mundial. Além disso, o preço da saca estava elevado no mercado externo, conforme tabelas 6 e 7. Segundo Jorge Esteves Jorge, presidente do Cecafé, o expressivo volume de café no mercado durante o primeiro semestre de 1999, aliado à desvalorização do real, contribuíram decisivamente para o aumento das exportações.

Na avaliação dos produtores, de acordo com Manoel Bertone, vice-presidente do Conselho Nacional do Café (CNC), a elevação das exportações está vinculada a um trabalho desenvolvido pela iniciativa privada em parceria com o governo federal.

O importante a observar, independentemente do fator que ocasionou o aumento das exportações, é que o país está recuperando o seu poder exportador, reduzido a níveis muito baixos no início do Plano Real devido a adoção de um câmbio valorizado. A desvalorização cambial proporciona uma retomada no crescimento das exportações e uma nova força propulsora que encoraja a ampliação do parque produtivo.

Por outro lado, além do aumento das exportações de café verde, as indústrias do café solúvel se tornaram grandes consumidoras desse café, contribuindo também para o escoamento da produção e, além disso, sendo a grande responsável pela abertura de mercados para o café verde no mundo. Essa indústria, além de agregar valor à matéria-prima e apropriar-se do excedente de renda e incrementar a receita cambial, ela introduziu uma nova imagem da economia no exterior. O Brasil passa a exportar um produto industrializado e com um maior valor agregado, além de continuar exportando o café em grãos.

(37)

TABELA 8: Principais países importadores de café verde e solúvel brasileiro (em sacas de 60 Kg)

Fonte: EUA e Itália: OIC; Alemanha e França: F. O. Licht; Japão: Complete Coffee Coverage apud Anuário Coffe Business

* As importações japonesas estão em percentual. ** As quantidades referem-se apenas ao café verde.

A tabela 8 apresenta os EUA, maior mercado consumidor de café do mundo, como principal importador do produto brasileiro, considerando-se o café verde e solúvel. No entanto, no que diz respeito apenas ao café verde, o Brasil vem perdendo uma fatia significativa do mercado norte-americano. O Brasil ocupou o primeiro lugar apenas em 99. Nos outros anos, ocupou a terceira posição, havendo variação na sua participação percentual. O menor percentual de participação do café brasileiro no mercado norte-americano é verificado no ano 2000, conforme tabela 9. Esta tabela apresenta os principais países fornecedores de café aos EUA. Os números são relativos aos valores pagos pelos EUA a seus fornecedores de grão/verde.

TABELA 9: EUA - importação de café em grão/verde (em US$ 1.000)

Fonte: US. Bureau of Statístics/USDA apud Coffee Business

O ano 2000 é marcado pela atuação do governo no setor cafeeiro. Repetindo a medida de retenção de parte da produção, feita também na época do Convênio de Taubaté, o governo pretende estancar a queda dos preços internacionais do café. Pode-se perceber duas diferenças básicas entre os dois programas de retenção: (1) o primeiro é definido entre Estados do Brasil; o segundo é definido entre países, isto é, pela APPC (Associação dos

ANO PAÍS EUA 2619,0 2989,0 5136,0 ALEMANHA** 2447,5 2272,2 3481,0 ITÁLIA 1435,0 1455,0 1532,0 FRANÇA** 948,0 881,3 1063,7 JAPÃO* 22,9 23,7 25,3 1997 1998 1999 PAÍSES 2000 % 1999 % 1998 % 1997 % México 385.132 18 364.241 16 401.458 15 545.814 17 Colômbia 381.975 18 435.192 19 565.511 21 656.539 20 Guatemala 295.212 14 296.432 13 286.719 10 393.688 12 Brazil 247.321 12 463.708 20 366.747 13 450.081 14 El Salvador 135.010 6 66.791 3 87.580 3 100.433 3

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Países Produtores de Café); (2) os recursos utilizados na compra do café, no primeiro caso, vêm de bancos estrangeiros (capital externo); já no segundo caso, os recursos são internos, vindos do Ministério da Agricultura e do Abastecimento. O objetivo é reter três milhões de sacas do produto no Brasil para recuperar os preços no mercado internacional.

Segundo especialistas, a perda de mercado americano pelo café brasileiro é atribuída à maior agressividade dos concorrentes, que vêm se aproveitando da queda na competitividade do café brasileiro no mercado internacional para crescer. Uma das razões para a perda de competitividade é justamente o plano de retenção. Pelo acordo assinado entre os membros da APPC, o Brasil se compromete a iniciar, sozinho, a retenção 20% de suas exportações. O exportador precisava comprar café do produtor, de qualidade exportável, conduzi-lo a um dos armazéns da Conab, a fim de obter um certificado de retenção que o permite exportar um determinado volume correspondente ao que retido. Os produtores que participassem da retenção utilizando recursos do Funcafé, só poderiam vender o café após a liberação da APPC, ou seja, quando os preços do mercado internacional atingissem 1,05 centavos de dólar por libra peso. Em nov/2000 o preço do café verde no mercado internacional alcança, aproximadamente, US$ 0,73 por libra-peso.

Dessa forma, tem-se que os preços do café no mercado internacional permanecem baixos. O primeiro fator que explica tal situação é que o Brasil criou a retenção quando todos os demais produtores já estavam com suas vendas concluídas, resultando na redução da participação brasileira no cenário mundial de café. Com isso, o exportador brasileiro viu crescer a concorrência internacional.

Atualmente, as dificuldades do produtor de café são inegáveis. A produção mundial é elevada. A competitividade internacional do café brasileiro encontra-se comprometida. As vendas elevadas dos outros países devem-se não só ao programa de retenção da APPC, mas também à política cambial brasileira que fez com que os custos de produção do café brasileiro ficassem elevados em dólares num momento de escassez que favorece o repasse desses custos aos preços.

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Apesar de todos os problemas enfrentados pela cafeicultura brasileira, o país é responsável por um quarto da produção mundial e continua ocupando o lugar de maior produtor mundial.

Nos últimos meses de 2000 cresce a competitividade brasileira no cenário mundial. Isto apesar da limitação provocada pelo programa de retenção, que além de elevar o custo para exportação também alija do mercado 20% de todo o volume embarcado. O principal sintoma desta recuperação é, sem dúvida, a melhora nos níveis de exportação de grão verde.

GRÁFICO 4: Exportações mensais de café verde Brasil: junho a dezembro/2000

Fonte: Cecafé (2001)

Após a implantação do plano de retenção, em junho de 2000, o volume exportado cai de 1,3 milhão de sacas em junho para 0,8 milhão em julho. A recuperação das exportações ocorre a partir de agosto, quando o volume exportado alcança 1,6 milhão de sacas. Em outubro, o volume das exportações é o mais alto desde a implantação do plano de retenção, alcançando 1,7 milhão de sacas.

Infere-se dessa análise que o plano de retenção, pelo menos no seu primeiro ano de existência, não pode ser considerado eficaz. Os preços do café no mercado internacional não subiram o suficiente e o volume exportado foi reduzido. Segundo o senador Moreira

0 200.000 400.000 600.000 800.000 1.000.000 1.200.000 1.400.000 1.600.000 1.800.000 Jun-00 Jul-00 Ago-00 Set-00 Out-00 Nov-00 Dez-00 Meses V o lu m e ( s a c a s d e 6 0 K G ) VOLUME CAFÉ VERDE

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Mendes (PFL-RO), o plano tem demonstrado sua total incapacidade de reversão do quadro de redução do preço internacional do café. Segundo ele, o maior produtor mundial foi o primeiro a colocar em prática a medida e continua a ser o único a acatá-la totalmente.

As tabelas 10 e 11 expõem uma visão global da participação do café no total das exportações e das receitas cambiais geradas nos dois períodos analisados anteriormente.

TABELA 10: Participação do café nas exportações globais e receita cambial global Brasil: final do século XIX e início do século XX

Fonte: Banco de Dados Febec. In: Cecafé (2001)

TABELA 11: Participação do café nas exportações globais e receita cambial global Brasil: 1994 - 00

Fonte: Idem

Fundamentando-se em toda a análise feita ao longo deste capítulo sobre o café após a implantação do Plano Real, percebe-se que o café continua sendo importante gerador de receita cambial para o país, contribuindo, ao lado das outras commodities agrícolas, para equilibrar a Balança Comercial. Comparando-se os dados fornecidos pelas tabelas acima, nota-se que, apesar da receita cambial dos dois períodos analisados ter aumentado consideravelmente, a participação do café nas divisas totais geradas reduziu

ANO PARTICIPAÇÃO % CAFÉ X GLOBAL

RECEITA CAMBIAL US$ 1.000

VOLUME EXPORTADO (em sacas

de 60 Kg de café verde) 1889/1899 65,74% - 6.910.273 1900/1910 52,12% 116.280 12.683.909 1911/1920 52,77% 155.119 12.050.200 1921/1930 68,54% 273.033 13.953.200 ANO PARTICIPAÇÃO % CAFÉ X G LOBAL RECEITA CAMBIAL US$ 1.000 VOLUME EXPORTADO (em sacas de 60 Kg de café

verde e sol úvel )

1994 5,80% 2.538.009 17.271.765 1995 5,20% 2.429.280 14.553.849 1996 4,40% 2.093.683 15.290.569 1997 5,80% 3.094.641 16.771.026 1998 5,20% 2.596.116 18.223.160 1999 5,10% 2.444.352 23.021.545 2000 3,90% 1.775.375 18.074.871

Referências

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