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Informativo comentado: Informativo 634-STJ

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Informativo comentado:

Informativo 634-STJ

Márcio André Lopes Cavalcante

ÍNDICE

DIREITO ADMINISTRATIVO

RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO

 União não tem o dever de indenizar indústrias nacionais prejudicadas com a redução das alíquotas do imposto de

importação. DIREITO EDUCACIONAL

 Aluno que conclui as matérias do ensino médio em escola técnica tem direito ao certificado de conclusão do ensino

médio ainda que opte por não fazer o estágio profissionalizante.

DIREITO CIVIL

DIREITO DE IMAGEM

 Lucro da intervenção e caso Giovanna Antonelli.

UNIÃO ESTÁVEL

 Ao fim de um casamento ou união estável, é possível que o juiz reconheça o direito de visita a animal de estimação

adquirido durante a constância do relacionamento. ALIMENTOS

 Não cabe embargos de terceiro para rediscutir sentença de exoneração de alimentos que não garante à ex-esposa

o direito de acrescer.

DIREITO DO CONSUMIDOR

PROTEÇÃO CONTRATUAL

 É válida a cláusula que autoriza o desconto em conta-corrente para pagamento das prestações do contrato de

empréstimo, ainda que se trate de conta utilizada para recebimento de salário. INCORPORAÇÃO IMOBILIÁRIA

 Termo inicial do prazo prescricional da pretensão de restituição de comissão de corretagem.

SERVIÇOS PÚBLICOS

 É possível o corte da energia elétrica por fraude no medidor, desde que cumpridos alguns requisitos.

DIREITO EMPRESARIAL

SOCIEDADES

 Não se aplica o critério do balancete mensal (Súmula 371 do STJ) para os contratos de participação financeira

celebrados na modalidade PCT. RECUPERAÇÃO JUDICIAL

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Informativo

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DIREITO PROCESSUAL CIVIL

EXECUÇÃO

 Possibilidade de o juízo da execução cível determinar penhora no rosto dos autos de crédito da execução trabalhista

caso o reclamante tenha falecido. MANDADO DE SEGURANÇA

 Nas hipóteses de MS no STJ envolvendo anistia política, só é possível a inclusão de juros e correção monetária na

fase executiva quando houver decisão expressa nesse sentido. ARROLAMENTO SUMÁRIO

 A prova de quitação dos tributos relacionados com a transmissão patrimonial aos sucessores não é condição

necessária para a entrega dos formais de partilha ou da carta de adjudicação.

DIREITO PROCESSUAL PENAL

PROVAS

 É possível que a Receita Federal compartilhe, com a Polícia e o MP, os dados bancários que ela obteve em

procedimento administrativo fiscal, para fins de instrução processual penal.

DIREITO PREVIDENCIÁRIO

ADICIONAL DE 25% (GRANDE INVALIDEZ)

 O acréscimo de 25% previsto no art. 45 da Lei 8.213/91 para a aposentadoria por invalidez pode ser estendido para

todas as demais espécies de aposentadoria pagas pelo INSS.

DIREITO ADMINISTRATIVO

RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO

União não tem o dever de indenizar indústrias nacionais prejudicadas

com a redução das alíquotas do imposto de importação

Importante!!!

O Ministério da Fazenda editou a Portaria nº 492/1994, reduzindo de 30% para 20% a alíquota do imposto de importação dos brinquedos em geral. Com a redução da alíquota, houve a entrada de um enorme volume de brinquedos importados no Brasil, oriundos especialmente da China, sendo estes bem mais baratos que os nacionais. Como resultado, várias indústrias de brinquedos no Brasil foram à falência e, mesmo as que permaneceram, sofreram grandes prejuízos. Uma famosa indústria de brinquedos ingressou com ação contra a União afirmando que a Portaria, apesar de ser um ato lícito, gerou prejuízos e que, portanto, o Poder Público deveria ser condenado a indenizá-la. O STJ não concordou com o pedido. Não se verifica o dever do Estado de indenizar eventuais prejuízos financeiros do setor privado decorrentes da alteração de política econômico-tributária no caso de o ente público não ter se comprometido, formal e previamente, por meio de determinado planejamento específico.

A referida Portaria tinha finalidade extrafiscal e a possibilidade de alteração das alíquotas do imposto de importação decorre do próprio ordenamento jurídico, não havendo que se falar em quebra do princípio da confiança.

O impacto econômico-financeiro sobre a produção e a comercialização de mercadorias pelas sociedades empresárias causado pela alteração da alíquota de tributos decorre do risco da atividade próprio da álea econômica de cada ramo produtivo.

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Não havia direito subjetivo da indústria quanto à manutenção da alíquota do imposto de importação.

STJ. 1ª Turma. REsp 1.492.832-DF, Rel. Min. Gurgel de Faria, julgado em 04/09/2018 (Info 634).

Imagine a seguinte situação:

Em 1994, o Ministério da Fazenda editou a Portaria nº 492/1994, reduzindo de 30% para 20% a alíquota do imposto de importação de uma série de produtos, entre os quais os brinquedos em geral.

Vale recordar que o imposto de importação é uma exceção ao princípio da legalidade. Isso porque as suas alíquotas podem ser aumentadas ou diminuídas por meio de atos infralegais editados pelo Poder Executivo (Decreto do Presidente da República ou Portarias do Ministério da Fazenda). A única exigência é que tais atos respeitem os parâmetros legais que preveem alíquotas máximas (teto) e mínimas (piso). É o que prevê o art. 153, § 1º, da CF/88:

Art. 153. Compete à União instituir impostos sobre: I - importação de produtos estrangeiros;

(...)

§ 1º É facultado ao Poder Executivo, atendidas as condições e os limites estabelecidos em lei, alterar as alíquotas dos impostos enumerados nos incisos I, II, IV e V.

Voltando ao nosso caso concreto:

Com a redução da alíquota do imposto, houve a entrada de um enorme volume de brinquedos importados no Brasil, oriundos especialmente da China, sendo estes bem mais baratos que os nacionais.

Como resultado, várias indústrias de brinquedos no Brasil foram à falência e, mesmo as que permaneceram, sofreram grandes prejuízos.

Esta situação só foi corrigida em dezembro de 1996, quando foi editada uma nova Portaria impondo algumas salvaguardas para proteger a indústria nacional.

A resposta do Governo brasileiro, contudo, foi tarde e a indústria nacional de brinquedos já havia sofrido perdas irreparáveis.

Diante desse cenário, a indústria de brinquedos “Estrela”, que já foi uma das maiores do país, ingressou com ação de indenização contra a União.

Alegou que a Portaria nº 492/1994, apesar de lícita, causou enormes prejuízos à autora.

O STJ concordou com o pedido da autora? Há o dever de indenizar? NÃO.

Alteração de política econômico-tributária não gera dever de indenizar

O Estado tem o dever de indenizar na hipótese de seus atos ocasionarem prejuízos (art. 37, § 6º da CF/88 e art. 43 do Código Civil). É a responsabilidade objetiva decorrente do risco administrativo.

Todavia, não existe dever do Estado de indenizar o setor privado por eventuais prejuízos financeiros decorrentes da alteração de política econômico-tributária, salvo se o Poder Público tivesse se comprometido com este setor econômico, formal e previamente, por meio de planejamento específico, ou seja, se o Estado tivesse combinado uma determinada ação econômica que não foi cumprida.

Alteração de alíquotas de tributos

A alteração de alíquotas de tributos é uma decisão política condicionada aos requisitos constitucionais e a finalidade desse ato estatal é variável, conforme o interesse perseguido pelo Estado em determinado momento histórico.

A Portaria MF n. 492/1994 tinha nitidamente uma finalidade extrafiscal.

A extrafiscalidade “consiste no emprego de instrumentos tributários para o atingimento de finalidades não arrecadatórias, mas, sim, incentivadoras ou inibitórias de comportamentos, com vista à realização de

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outros valores, constitucionalmente contemplados.” (COSTA, Regina Helena. Curso de Direito Tributário:

Constituição e Código de Direito Tributário Nacional. 2ª ed., São Paulo: Saraiva, 2012).

Não houve quebra da confiança

A autora (indústria de brinquedos) não pode alegar que a referida Portaria significou quebra do princípio da confiança por dois motivos:

1) o ordenamento jurídico prevê expressamente a possibilidade de redução ou de aumento das alíquotas de imposto de importação para incentivar ou conter determinados setores da economia;

2) o Estado não havia se comprometido com essa indústria de manter as alíquotas em determinado patamar.

Em tese, somente nos casos em que o Estado se compromete, por ato formal, a incentivar, no campo fiscal, determinado ramo do setor privado por certo período, é que se poderia invocar a quebra da confiança na modificação de política fiscal.

A fabricante de brinquedos não tinha direito subjetivo de que o Governo brasileiro mantivesse o mesmo tratamento tributário para o setor. A alteração das alíquotas, além de uma previsão normativa, representa opção política decorrente da soberania do Estado.

Mesma política foi adotada com outros setores da economia

Na época da alteração da alíquota, ou seja, em 1994, o Brasil utilizou-se de diversos mecanismos para a abertura do mercado ao comércio exterior. Assim, não foi apenas a indústria de brinquedos que sofreu e teve que se adaptar à concorrência estrangeira.

Outros setores empresariais também sofreram com a concorrência dos produtos importados.

Vale ressaltar, no entanto, que a falta de investimentos ou de competitividade do setor privado não é culpa do Estado: ainda que este tenha mecanismos para incentivá-los, a implementação não é obrigatória, cabendo ao empresário a decisão.

Risco do negócio

O impacto econômico-financeiro sobre a produção e a comercialização de mercadorias pelas sociedades empresárias causado pela alteração da alíquota de tributos decorre do risco da atividade próprio da álea econômica de cada ramo produtivo.

Salvaguardas de 1996

A aplicação de medidas de salvaguardas em favor da indústria nacional em 1996 não revela confissão do Estado de que sua política fiscal, por si, foi equivocada e trouxe prejuízos ao mercado.

Trata-se tão somente de ato de regulação e defesa do mercado que pode ser feito a qualquer momento, quando preenchidos os requisitos para tanto, não revelando, por isso, ilicitude ou abuso de direito na alteração das alíquotas do imposto de importação.

Em suma:

Não se verifica o dever do Estado de indenizar eventuais prejuízos financeiros do setor privado decorrentes da alteração de política econômico-tributária no caso de o ente público não ter se comprometido, formal e previamente, por meio de determinado planejamento específico.

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DIREITO EDUCACIONAL

Aluno que conclui as matérias do ensino médio em escola técnica tem direito ao certificado de

conclusão do ensino médio, ainda que opte por não fazer o estágio profissionalizante

A emissão do certificado de conclusão do ensino médio, realizado de forma integrada com o técnico, ao estudante aprovado nas disciplinas regulares independe do estágio profissionalizante.

Caso concreto: João fez o ensino médio em instituto federal de educação. Ocorre que optou por não concluir o estágio profissionalizante. A única consequência negativa para ele vai ser não ter direito ao certificado técnico-profissional. No entanto, não há nada que o impeça de ter direito ao certificado de conclusão do ensino médio, considerando que efetivamente estudou e foi aprovado nas respectivas matérias.

STJ. 1ª Turma. REsp 1.681.607-PE, Rel. Min. Regina Helena Costa, julgado em 20/09/2018 (Info 634).

Imagine a seguinte situação hipotética:

João fez os três anos do ensino médio no Instituto Federal de Educação de Pernambuco. No Instituto Federal de Educação, o aluno estuda:

• toda a grade curricular de formação geral (ensino médio) e, além disso, • tem que fazer também o estágio profissionalizante.

João concluiu todas as disciplinas teóricas (ensino médio), mas faltava ainda terminar o estágio profissionalizante.

Foi aí que surgiu o Vestibular para a UFPE.

João prestou o exame e foi aprovado para o curso de Engenharia.

Ocorre que João estava impedido de se matricular na UFPE porque o Instituto Federal de Educação negou fornecer a ele o diploma de conclusão do ensino médio, sob o argumento de que ainda restava cursar o estágio profissionalizante.

Diante disso, João impetrou mandado de segurança na Justiça Federal contra o Diretor do Instituto pedindo que ele fosse obrigado a fornecer o diploma de conclusão do ensino médio.

João possui direito líquido e certo? Deverá ser concedido a ele o referido diploma?

SIM. O Instituto de Educação deverá emitir em favor de João o Certificado de Conclusão do Ensino Médio, independentemente da conclusão do estágio profissionalizante.

É possível conceder a emissão de certificado de conclusão do nível médio ao aluno que concluiu os créditos relativos ao ensino médio, permanecendo pendência apenas quanto ao ensino profissionalizante. A educação profissional técnica de nível médio (geralmente prestado pelas chamadas “escolas técnicas”) é uma opção a mais oferecida ao estudante a fim de qualificá-lo para o mercado de trabalho, sendo realizada de forma articulada com o ensino médio ou independente, para aqueles que já tenham concluído o ciclo básico da educação.

Assim, o ensino técnico, que é regulamentado pelos arts. 36-A, 36-B e 36-C da Lei nº 9.394/96, constitui um adicional na educação do estudante, cuja obtenção da habilitação profissional pressupõe a conclusão do estágio profissionalizante, ou seja, a atividade laborativa só poderá ser exercida com a conclusão da grade curricular e da respectiva prática supervisionada.

Por outro lado, não se mostra razoável vincular a emissão de certificado de conclusão do ensino médio ao estudante que, aprovado nas disciplinas regulares e no vestibular, opta por não obter o certificado profissional, ao deixar de cursar o estágio profissionalizante.

Com efeito, o princípio da razoabilidade preconiza que as exigências administrativas devem ser aptas a cumprir os fins a que se destinam.

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consequência negativa para ele vai ser não ter direito ao certificado técnico-profissional. No entanto, não há nada que o impeça de ter direito ao certificado de conclusão do ensino médio, considerando que efetivamente estudou e foi aprovado nas respectivas matérias.

Dessa forma, o cumprimento da grade disciplinar do curso técnico realizado de forma integrada com o ensino médio autoriza o estudante a obter o certificado de conclusão do curso, embora não o autorize a obter o certificado para exercício profissional.

Em suma:

A emissão do certificado de conclusão do ensino médio, realizado de forma integrada com o técnico, ao estudante aprovado nas disciplinas regulares independe do estágio profissionalizante.

STJ. 1ª Turma. REsp 1.681.607-PE, Rel. Min. Regina Helena Costa, julgado em 20/09/2018 (Info 634).

DIREITO CIVIL

DIREITO DE IMAGEM

Lucro da intervenção e caso Giovanna Antonelli

Importante!!!

Determinada “farmácia de manipulação” utilizou o nome e a imagem da atriz Giovanna Antonelli, sem a sua autorização, em propagandas de um remédio para emagrecer.

O STJ afirmou que, além da indenização por danos morais e materiais, a atriz também tinha direito à restituição de todos os benefícios econômicos que a ré obteve na venda de seus produtos (restituição do “lucro da intervenção”).

Lucro da intervenção é uma vantagem patrimonial obtida indevidamente com base na exploração ou aproveitamento, de forma não autorizada, de um direito alheio.

Dever de restituição do lucro da intervenção é o dever que o indivíduo possui de pagar aquilo que foi auferido mediante indevida interferência nos direitos ou bens jurídicos de outra pessoa.

A obrigação de restituir o lucro da intervenção é baseada na vedação do enriquecimento sem causa (art. 884 do CC).

A ação de enriquecimento sem causa é subsidiária. Apesar disso, nada impede que a pessoa prejudicada ingresse com ação cumulando os pedidos de reparação dos danos (responsabilidade civil) e de restituição do indevidamente auferido (lucro da intervenção). Para a configuração do enriquecimento sem causa por intervenção, não se faz imprescindível a existência de deslocamento patrimonial, com o empobrecimento do titular do direito violado, bastando a demonstração de que houve enriquecimento do interventor.

O critério mais adequado para se fazer a quantificação do lucro da intervenção é o do enriquecimento patrimonial (lucro patrimonial).

A quantificação do lucro da intervenção deverá ser feita por meio de perícia realizada na fase de liquidação de sentença, devendo o perito observar os seguintes critérios:

a) apuração do quantum debeatur com base no denominado lucro patrimonial;

b) delimitação do cálculo ao período no qual se verificou a indevida intervenção no direito de imagem da autora;

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d) distribuição do lucro obtido com a intervenção proporcionalmente à contribuição de cada partícipe da relação jurídica.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.698.701-RJ, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 02/10/2018 (Info 634).

Imagine a seguinte situação:

Determinada “farmácia de manipulação” utilizou o nome e a imagem da atriz Giovanna Antonelli (a eterna “Jade”, de “O Clone”), indevidamente e sem a sua autorização, em propagandas de um remédio para emagrecer chamado “Detox”.

Essas propagandas foram divulgadas em sites na internet e nelas aparece a foto da atriz com uma frase embaixo entre aspas dizendo que ela teria utilizado o remédio para perder peso depois da gravidez. Ocorre que Giovanna nunca tinha ouvido falar no produto e não autorizou a propaganda.

Diante disso, a atriz ajuizou ação de indenização contra a empresa responsável. Na ação, a autora pediu:

a) a indenização por danos morais; b) a indenização por danos materiais; e

c) a restituição de todos os benefícios econômicos que a ré obteve na venda de seus produtos (restituição do “lucro da intervenção”).

Os pedidos da autora foram acolhidos?

SIM. Vamos entender com calma porque se trata de um assunto novo e muito interessante.

No caso concreto, houve violação ao direito de imagem da atriz? Ela precisará provar que sofreu um prejuízo para ser indenizada?

Houve violação e ela não precisa provar o prejuízo. Sobre o tema, devemos relembrar o seguinte enunciado do STJ:

Súmula 403-STJ: Independe de prova do prejuízo a indenização pela publicação não autorizada da imagem de pessoa com fins econômicos ou comerciais.

“O dano é a própria utilização indevida da imagem, não sendo necessária a demonstração do prejuízo material ou moral” (STJ. 4ª Turma. REsp 267.529/RJ, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, julgado em 3/10/2000).

O direito de imagem é protegido pelo art. 5º, X, da CF/88 e pelo art. 20 do Código Civil: Art. 5º (...)

X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;

Art. 20. Salvo se autorizadas, ou se necessárias à administração da justiça ou à manutenção da ordem pública, a divulgação de escritos, a transmissão da palavra, ou a publicação, a exposição ou a utilização da imagem de uma pessoa poderão ser proibidas, a seu requerimento e sem prejuízo da indenização que couber, se lhe atingirem a honra, a boa fama ou a respeitabilidade, ou se se destinarem a fins comerciais.

Assim, uma vez constatado o uso não autorizado do nome e da imagem de uma pessoa (seja ela famosa ou não), em campanha publicitária veiculada com fins eminentemente comerciais, é devida a reparação integral dos danos morais e patrimoniais daí decorrentes.

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Além do dever de reparação dos danos morais e materiais causados pela utilização não autorizada da imagem de pessoa com fins econômicos ou comerciais, nos termos da Súmula 403-STJ, o titular do bem jurídico violado tem também o direito de exigir do violador a restituição do lucro que este obteve às custas daquele.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.698.701-RJ, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 02/10/2018 (Info 634).

O que é o “lucro da intervenção”?

O lucro da intervenção, segundo Sérgio Savi, é o

“lucro obtido por aquele que, sem autorização, interfere nos direitos ou bens jurídicos de outra pessoa e que decorre justamente desta intervenção” (Responsabilidade civil e enriquecimento sem causa: o lucro da intervenção. São Paulo: Atlas, 2012, p. 7).

Trata-se, portanto, de uma vantagem patrimonial obtida indevidamente com base na exploração ou aproveitamento, de forma não autorizada, de um direito alheio (KONDER, Carlos Nelson. Dificuldades de uma abordagem unitária do lucro da intervenção. Revista de Direito Civil Contemporâneo. Vol. 13., ano 4, p. 231-248. São Paulo: RT, out-dez 2017).

Um exemplo didático, citado por Carlos Nelson Konder, é o caso de um jóquei que subtrai um cavalo, contra as ordens do dono, para participar de uma corrida, e acaba saindo vencedor.

O jóquei recebe um valioso prêmio pela conquista, e retorna o cavalo ileso à baia.

O dono do cavalo não experimentou dano, pois o cavalo não estava destinado àquela corrida e, de todo modo, o animal retornou ileso.

O jóquei, por outro lado, lucrou significativamente com a prática do ato ilícito.

Ainda que se considerasse que o dono teria experimentado um dano correspondente ao aluguel do cavalo, mesmo assim o lucro obtido pelo jóquei seria muito mais significativo do que o dano causado. Esse lucro, ou essa diferença entre o lucro e o dano, é o que se denomina lucro da intervenção.

Dever de restituição do lucro da intervenção

A doutrina denomina de “dever de restituição do lucro da intervenção” o dever que o indivíduo possui de pagar aquilo que foi auferido mediante indevida interferência nos direitos ou bens jurídicos de outra pessoa.

Em palavras mais simples, é o dever de restituir (pagar) aquilo que foi indevidamente auferido (lucrado) às custas de outrem.

Lucro da intervenção x princípio da reparação integral

Um dos eixos da responsabilidade civil é o princípio da reparação integral do dano.

O princípio da reparação do dano, contudo, ao contrário do que muita gente pensa, não protege apenas a vítima, mas também o autor do ilícito. Isso porque o princípio da reparação integral significa “reparar todo o dano, mas não mais que o dano”, ou seja, nem menos nem além do prejuízo.

“A plena reparação do dano deve corresponder à totalidade dos prejuízos efetivamente sofridos pela vítima do evento danoso (função compensatória), não podendo, entretanto, ultrapassá-los para evitar que a responsabilidade civil seja causa para o enriquecimento injustificado do prejudicado (...)” (SANSEVERINO, Paulo de Tarso. Princípio da reparação integral: indenização no

Código Civil. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 58)

Nesse ponto, surge um aparente conflito entre o lucro da intervenção e o princípio da reparação integral do dano. Isso porque o princípio da reparação integral está previsto no art. 944 do Código Civil, nos seguintes termos:

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Ao se aplicar o instituto do lucro da intervenção, em determinadas hipóteses, a vantagem patrimonial obtida pela vítima superará o próprio prejuízo sofrido.

Como a doutrina resolve isso?

Alguns doutrinadores superam esse “conflito” com o princípio da reparação integral dizendo o seguinte: o dever de restituição do lucro da intervenção não é um instituto de responsabilidade civil, ou seja, ele não está submetido às regras de responsabilidade civil (dentre elas o princípio da reparação integral). Esse dever de restituição do lucro da intervenção existe no ordenamento jurídico com fundamento na proibição do enriquecimento sem causa, previsto no art. 884 do Código Civil:

Art. 884. Aquele que, sem justa causa, se enriquecer à custa de outrem, será obrigado a restituir o indevidamente auferido, feita a atualização dos valores monetários.

Se o indivíduo que praticou o lucro da intervenção, não indenizar a vítima apenas pelos prejuízos que esta sofreu, é capaz de ele ainda sair no “lucro”. Vai ter valido “a pena” violar o direito de outrem.

Por outro lado, se a vítima receber mais do que teve de prejuízo, estará sendo violado o princípio da reparação integral.

Logo, é preferível a vítima receber mais sim e justificar essa solução no princípio que veda o enriquecimento sem causa. Isso porque se o indivíduo não pagar tudo que lucrou, ele terá obtido um ganho imerecido (sem causa).

Veja como Sérgio Savi explica o tema:

“Já quando os lucros obtidos forem superiores aos danos causados, mesmo após indenizar a vítima, o ofensor estará em uma situação melhor do que estava antes da prática do ato não tutelado pelo ordenamento jurídico. Afinal, como a indenização é medida pela extensão do dano (CC, art. 944), nas hipóteses de lucros superiores aos danos causados, o saldo positivo entre lucros obtidos e prejuízo indenizado permanecerá em definitivo no patrimônio do interventor. Tal situação poderia servir de estímulo para a violação a institutos fundamentais para a vida em sociedade, como a propriedade, o contrato e os direitos da personalidade.

Diante da ineficácia das tradicionais regras da responsabilidade civil para lidar com o problema do lucro da intervenção, buscou-se no ordenamento jurídico brasileiro uma solução alternativa. Em razão de suas características e funções, concluiu-se que o lucro da intervenção deve ser dogmaticamente enquadrado no enriquecimento sem causa.

(...)

E isso porque, como visto, ao contrário da responsabilidade civil, o enriquecimento sem causa tem por função específica remover o enriquecimento. A reação do ordenamento jurídico é contra o aumento injustificado do patrimônio do enriquecido e não contra os possíveis prejuízos sofridos pelo titular do direito (o 'empobrecido').

(...)

Assim, quando o interventor lucrar com a ingerência não autorizada nos bens ou direitos alheios, o titular do direito terá uma pretensão de enriquecimento sem causa, fundada na cláusula geral do art. 884 do Código Civil, para obrigar o interventor a entregar-lhe a vantagem patrimonial assim obtida. A restituição daqueles benefícios pelo interventor deverá ocorrer sempre que, de acordo com a repartição dos bens efetuada pela ordem jurídica, os mesmos sejam considerados como pertencentes ao titular do direito." (ob. cit., p. 92-95)

Essa mesma conclusão (e enquadramento) foi manifestada pela doutrina na VIII Jornada de Direito Civil do CJF/STJ:

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Enunciado nº 620 – Art. 884: A obrigação de restituir o lucro da intervenção, entendido como a vantagem patrimonial auferida a partir da exploração não autorizada de bem ou direito alheio, fundamenta-se na vedação do enriquecimento sem causa.

É aquilo que a doutrina alemã chama de enriquecimento por intervenção (Eingriffskondiktion).

De acordo com a maioria da doutrina, o dever de restituição do denominado lucro da intervenção encontra fundamento no instituto do enriquecimento sem causa, atualmente positivado no art. 884 do Código Civil.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.698.701-RJ, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 02/10/2018 (Info 634).

Desse modo, o dever de restituição do lucro da intervenção surge não só como um meio de preservar a livre disposição de direitos, mas também como uma forma de inibir a prática de atos contrários ao ordenamento jurídico naquelas hipóteses em que a reparação dos danos causados, ainda que integral, não se mostra adequada a tal propósito.

Assim, o dever de restituição do lucro da intervenção serve para dois propósitos:

• preserva a livre disposição de direitos (no caso, a atriz não queria que sua imagem fosse vinculada a esse produto sem a sua autorização); e

• atua como meio dissuasório (meio de desestimular) que a pessoa usurpe direitos de outrem e ainda saia no lucro mesmo se condenado a indenizar.

O dever de restituição daquilo que é auferido mediante indevida interferência nos direitos ou bens jurídicos de outra pessoa tem a função de preservar a livre disposição de direitos, nos quais estão inseridos os direitos da personalidade, e de inibir a prática de atos contrários ao ordenamento jurídico.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.698.701-RJ, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 02/10/2018 (Info 634).

Cumulação de pedidos: ressarcimento e vedação ao enriquecimento sem causa

A ação de restituição por enriquecimento sem causa tem caráter subsidiário, ou seja, só deve ser manejada se a lei não prever outro meio. É o que diz o CC:

Art. 886. Não caberá a restituição por enriquecimento, se a lei conferir ao lesado outros meios para se ressarcir do prejuízo sofrido.

No caso da restituição do lucro da intervenção, como já dito, não existe outro meio, considerando que a mera ação de indenização esbarraria no limite do princípio da reparação integral do dano. Logo, a parte, para obter a restituição do lucro da intervenção obrigatoriamente terá que formular pedido de restituição por enriquecimento sem causa.

Diante disso, o STJ afirmou o seguinte: em tais casos, a vítima deverá fazer a cumulação de ações (cumulação de pedidos). Assim, ela proporá uma ação com dois pedidos distintos:

• pedido de reparação dos danos pela aplicação das regras da responsabilidade civil. Neste caso, a indenização ficará limitada ao efetivo prejuízo suportado pela vítima; e

• pedido de restituição do lucro da intervenção (restituição do ganho indevidamente auferido). Este segundo pedido será baseado na vedação ao enriquecimento sem causa e pode ultrapassar o montante do prejuízo da vítima, já que não estará vinculado ao princípio da reparação integral.

Assim, a conjugação dos dois institutos (reparação dos danos morais e materiais + restituição do que o réu lucrou ao associar a imagem da autora ao produto) é plenamente admitida, não sendo obstada pela subsidiariedade da ação de enriquecimento sem causa. Isso porque a responsabilidade civil não tutela nada além dos prejuízos efetivamente sofridos pela vítima do evento danoso, enquanto que o

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enriquecimento ilícito se encarrega apenas de devolver o lucro obtido em decorrência da indevida intervenção no direito de imagem de outrem ao seu verdadeiro titular.

A subsidiariedade da ação de enriquecimento sem causa não impede que se promova a cumulação de ações, cada qual disciplinada por um instituto específico do Direito Civil, sendo perfeitamente plausível a formulação de pedido de reparação dos danos mediante a aplicação das regras próprias da responsabilidade civil, limitado ao efetivo prejuízo suportado pela vítima, cumulado com o pleito de restituição do indevidamente auferido, sem justa causa, às custas do demandante.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.698.701-RJ, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 02/10/2018 (Info 634).

Para ter direito de receber a quantia por enriquecimento sem causa, é necessário que a vítima prove que sofreu um dano? É necessária a existência de deslocamento patrimonial (dinheiro saiu da vítima e foi para o autor)?

NÃO. Para a configuração do enriquecimento sem causa por intervenção, não se faz imprescindível a existência de deslocamento patrimonial, com o empobrecimento do titular do direito violado.

Em nosso exemplo, a atriz terá direito à restituição do lucro da intervenção mesmo sem prova de que teve algum prejuízo.

Basta a demonstração de que houve enriquecimento indevido do interventor/violador.

Nesse sentido:

Enunciado 35 da I Jornada de Direito Civil: A expressão “se enriquecer à custa de outrem” do art. 886 do novo Código Civil não significa, necessariamente, que deverá haver empobrecimento.

Para a configuração do enriquecimento sem causa por intervenção, não se faz imprescindível a existência de deslocamento patrimonial, com o empobrecimento do titular do direito violado, bastando a demonstração de que houve enriquecimento do interventor.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.698.701-RJ, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 02/10/2018 (Info 634).

Como é feita a quantificação do lucro da intervenção? Como definir o quanto deverá ser “devolvido” (pago) ao titular do direito violado?

Existem dois critérios que poderiam ser utilizados:

a) Lucro real (enriquecimento real): é o valor do uso do bem ou do direito que foi violado. Ex: valor que a Giovanna Antonelli cobraria para aparecer em uma campanha publicitária como essa.

b) Lucro patrimonial (enriquecimento patrimonial): compara-se o patrimônio do violador antes e depois. O que aumentou com a violação é o lucro da intervenção.

Para a maioria da doutrina, o critério mais adequado é o do enriquecimento patrimonial, considerando que ele é o que melhor permite acabar, de forma específica, com o enriquecimento obtido pelo violador.

Como se calcular o “lucro patrimonial”?

A quantificação do lucro da intervenção deverá ser feita por meio de perícia realizada na fase de liquidação de sentença, devendo o perito observar os seguintes critérios:

a) apuração do quantum debeatur com base no denominado lucro patrimonial;

b) delimitação do cálculo ao período no qual se verificou a indevida intervenção no direito de imagem da autora;

c) aferição do grau de contribuição de cada uma das partes e

d) distribuição do lucro obtido com a intervenção proporcionalmente à contribuição de cada partícipe da relação jurídica.

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UNIÃO ESTÁVEL

Ao fim de um casamento ou união estável, é possível que o juiz reconheça o direito de visita

a animal de estimação adquirido durante a constância do relacionamento

Importante!!!

Na dissolução de entidade familiar, é possível o reconhecimento do direito de visita a animal de estimação adquirido na constância da união, demonstrada a relação de afeto com o animal. Na dissolução da entidade familiar em que haja algum conflito em relação ao animal de estimação, independentemente da qualificação jurídica a ser adotada, a resolução deverá buscar atender, sempre a depender do caso em concreto, aos fins sociais, atentando para a própria evolução da sociedade, com a proteção do ser humano e do seu vínculo afetivo com o animal.

STJ. 4ª Turma. REsp 1.713.167-SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 19/06/2018 (Info 634).

Imagine a seguinte situação hipotética:

Após namorarem um tempo, em 2010, Vinícius e Letícia decidiram morar juntos e passaram a viver em união estável.

Em 2015, ou seja, quando já tinham cinco anos de relacionamento, decidiram adquirir uma cadela da raça yorkshire e a ela deram o nome de Frida.

Em 2018, o casal percebeu que o amor entre eles havia acabado. Decidiram, então, por um fim à relação. Vinícius foi morar em um outro apartamento e Letícia continuou no antigo lar do, agora, ex-casal.

Frida ficou morando com Letícia.

Por meio de uma escritura pública de reconhecimento e dissolução de união estável, Vinícius e Letícia dividiram os bens adquiridos onerosamente durante a constância do relacionamento. Vale ressaltar que não mencionaram nada a respeito da cadela nesta escritura.

Depois de um mês separado, Vinícius percebeu que havia feito uma besteira e que não conseguiria ficar longe de... Frida.

Ele procurou, então, Letícia e pediu para ficar visitando a cadela toda semana.

Letícia rejeitou a proposta e afirmou que o fato de Vinícius ficar frequentando constantemente a sua casa não seria emocionalmente saudável para eles e que precisavam seguir caminhos separados, até para poderem encontrar novos parceiros.

Vinícius não se conformou e ajuizou ação contra Letícia pedindo a regulamentação de visitas ao animal de estimação (Frida).

Na ação, o autor alegou que, com o passar do tempo, houve intenso apego ao animal, surgindo “verdadeiro laço afetivo entre eles”.

Na contestação, Letícia apresentou comprovante de que ela foi a compradora da cadela, conforme registro do canil onde nasceu Frida, que possui “pedigree” emitido por clube especializado.

A questão chegou até o STJ. É possível que, ao fim de um casamento ou união estável, seja reconhecido o direito de visita a animal de estimação adquirido durante a constância do relacionamento? É possível haver regulamentação de visitas a animal de estimação após o fim de relacionamento conjugal ou de união estável?

SIM. Vamos entender com calma todas as nuances do tema.

Natureza jurídica dos animais segundo o Código Civil

Segundo o Código Civil, os animais possuem natureza jurídica de “coisas”.

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Art. 82. São móveis os bens suscetíveis de movimento próprio, ou de remoção por força alheia, sem alteração da substância ou da destinação econômico-social.

Assim, a Lei não atribuiu aos animais a qualidade de pessoas, não sendo eles dotados de personalidade jurídica, não podendo ser considerados, segundo a ótica do Código Civil, como sujeitos de direitos. Ao contrário, os animais, para o Código Civil, são objeto de relações jurídicas. Nesse sentido, podemos citar alguns exemplos de dispositivos que conferem a eles esse tratamento jurídico: arts. 82, 445, § 2º, 936, 1.444, 1.445 e 1.446.

Necessidade de se rediscutir essa categorização

Apesar dessa categorização legal, cresce a cada dia a ideia de que os animais de companhia (“animais de estimação”) não devem ser considerados como simples coisas (inanimadas).

Ao contrário, eles merecem tratamento peculiar diante da atual conjectura do conceito de família e sua função social.

É notório o crescimento, em todo o mundo, do número de animais de estimação no âmbito das famílias e, cada vez mais, são tratados como verdadeiros membros destas.

Diante dessa realidade social, os Tribunais do país têm-se deparado com situações de divórcio e dissolução de uniões estáveis em que a única divergência está justamente na definição da custódia do animal.

Projeto de lei

Vale destacar que existe projeto de lei que tramita no Congresso Nacional que tem como objetivo justamente dispor sobre a guarda dos animais de estimação nos casos de dissolução litigiosa da sociedade e do vínculo conjugal.

Direito comparado

Importante também registrar que a legislação de alguns países europeus já avançou na proteção dos animais de companhia retirando a natureza jurídica de “coisas”.

Nesse sentido:

• Áustria, Alemanha e Suíça indicam expressamente que os animais não são coisas.

• França, Nova Zelândia e Portugal vão além e preveem que os animais são seres sencientes (seres dotados de sensibilidade).

Correntes na doutrina brasileira

É possível encontrar na doutrina brasileira três correntes principais sobre o tema: 1ª) Animais possuem status de pessoa.

Biologicamente, o ser humano é animal, ser vivo com capacidade de locomação e de resposta a estímulos, inclusive em relação aos grandes símios que, com base no DNA, seriam parentes muito próximos dos humanos.

Em razão disso, ao animal deveria ser atribuído direitos da personalidade, o próprio titular do direito vindicado, sob pena de a diferença de tratamento caracterizar odiosa discriminação.

2ª) Animais não são pessoas, mas são sujeitos de direitos.

Para essa corrente, o melhor é separar o conceito de “pessoa” e o de “sujeito de direito”, possibilitando a proteção dos animais na qualidade de sujeito de direito sem personalidade.

Assim, os animais estariam protegidos não como objeto de direito (patrimônio do seu proprietário), mas sim pelo fato de ser animal (sujeito de direito).

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3ª) Animais devem continuar como semoventes (objeto de direito).

Segundo essa terceira corrente, os animais de companhia devem permancer dentro de sua natureza jurídica tradicional, ou seja, como semoventes (coisa) e, portanto, mero objeto de direito das relações jurídicas titularizadas pelas pessoas.

Não é possível aplicar o instituto da guarda para animais de estimação

A guarda, instituto de direito de família, não pode ser simples e diretamente aplicado para animais de estimação. Isso porque a guarda envolve não apenas direitos, mas também deveres do guardião para a pessoa sob guarda.

Logo, considerar que é possível falar em guarda de animais, seria o mesmo que reconhecer que eles são sujeitos de direito.

Assim, não é possível equiparar a posse de animais com a guarda de filhos. Os animais, mesmo com todo afeto merecido, continuarão sendo “não humanos” e, por conseguinte, portadores de demandas diferentes das nossas.

A guarda propriamente dita - inerente ao poder familiar - instituto, por essência, de direito de família, não pode ser simples e fielmente subvertida para definir o direito dos consortes, por meio do enquadramento de seus animais de estimação, notadamente porque é um munus exercido no interesse tanto dos pais quanto do filho.

STJ. 4ª Turma. REsp 1.713.167-SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 19/06/2018 (Info 634).

Necessidade de se encontrar uma solução para as disputas envolvendo os animais ao fim das relações conjugais

Estudos vêm demonstrando uma série de ocorrências que indicam que os animais de companhia ganharam o status de verdadeiros membros da família.

Vale ressaltar, no entanto, que o simples fato de o animal ser tido como de estimação, recebendo o afeto da entidade familiar, não tem a força de alterar a sua substância, a ponto de converter a sua natureza jurídica de coisa para sujeito de direitos.

Por outro lado, está mais do que claro que o regramento jurídico dos “bens” não é suficiente para resolver, satisfatoriamente, as disputas familiares envolvendo animais de estimação nos dias atuais.

Os animais de companhia possuem valor subjetivo único e peculiar, aflorando sentimentos bastante íntimos em seus donos, totalmente diversos de qualquer outro tipo de propriedade privada. Por conta disso, o regramento jurídico dos bens não se vem mostrando suficiente para resolver, de forma satisfatória, a disputa familiar envolvendo os pets, visto que não se trata de simples discussão atinente à posse e à propriedade.

STJ. 4ª Turma. REsp 1.713.167-SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 19/06/2018 (Info 634).

Em outras palavras, resolver os conflitos envolvendo animais de estimação segundo as regras tradicionais de posse e propriedade não é a solução mais adequada.

Desprezar a relação do homem com seu animal é violar a dignidade da pessoa humana

A ordem jurídica não pode, simplesmente, desprezar o relevo, a importância, da relação do homem com seu animal de estimação, sobretudo nos tempos atuais.

Assim, o Direito deve ter como norte o fato, cultural e da pós-modernidade, de que há uma disputa dentro da entidade familiar em que prepondera o afeto de ambos os cônjuges pelo animal.

Portanto, a solução deve buscar a preservação e a garantia dos direitos da pessoa humana, mais precisamente o âmago de sua dignidade.

Desse modo, negar o contato do indivíduo com o animal de estimação em razão do fim do relacionamento viola a dignidade da pessoa humana.

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Os animais de companhia são seres que, inevitavelmente, possuem natureza especial e, como ser senciente - dotados de sensibilidade, sentindo as mesmas dores e necessidades biopsicológicas dos animais racionais -, também devem ter o seu bem-estar considerado.

STJ. 4ª Turma. REsp 1.713.167-SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 19/06/2018 (Info 634).

Em conclusão:

Na dissolução de entidade familiar, é possível o reconhecimento do direito de visita a animal de estimação adquirido na constância da união, demonstrada a relação de afeto com o animal.

Na dissolução da entidade familiar em que haja algum conflito em relação ao animal de estimação, independentemente da qualificação jurídica a ser adotada, a resolução deverá buscar atender, sempre a depender do caso em concreto, aos fins sociais, atentando para a própria evolução da sociedade, com a proteção do ser humano e do seu vínculo afetivo com o animal.

STJ. 4ª Turma. REsp 1.713.167-SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 19/06/2018 (Info 634).

Polêmica

Vale ressaltar que o julgado foi por maioria, com dois votos contrários vencidos. Além disso, o Min. Marco Buzzi acompanhou o Relator, mas o fez por fundamentação diversa, afirmando que os dois ex-consortes teriam direitos sobre a cadela com base no instituto da copropriedade, não havendo que se falar em “direito de visitas”.

Dessa forma, pode ser que, em um futuro próximo, o tema ainda venha a ser rediscutido.

ALIMENTOS

Não cabe embargos de terceiro para rediscutir sentença de exoneração de alimentos

que não garante à ex-esposa o direito de acrescer

Os embargos de terceiro não são cabíveis para o fim de declarar, em sede de ação de exoneração de alimentos, a natureza familiar da prestação alimentícia, de forma a alterar a relação jurídica posta e discutida na demanda principal.

Ex: João e Maria, ao se divorciarem, firmaram um acordo por meio do qual João iria pagar 30% de seu salário, a título de alimentos, para Maria e o filho do casal (Vitor). Quando Vitor completou a maioridade, João propôs ação de exoneração de alimentos contra ele. O juiz deferiu o pedido e determinou que os descontos fossem reduzidos pela metade (15%), já que Vitor não seria mais credor de alimentos. Maria opôs embargos de terceiro contra essa decisão, tendo o STJ considerado um instrumento jurídico inadequado.

STJ. 4ª Turma. REsp 1.560.093-SP, Rel. Min. Marco Buzzi, julgado em 18/09/2018 (Info 634).

Imagine a seguinte situação hipotética: João e Maria, casados, tiveram um filho (Vitor). Após anos, o relacionamento chegou ao fim.

No divórcio, foi feito um acordo a respeito dos alimentos.

Ficou combinado que João pagaria, a título de alimentos à Maria e ao Vitor (16 anos), a quantia correspondente a 30% de seus vencimentos líquidos.

Ação de exoneração

Quando Vitor concluiu a faculdade, João ajuizou ação de exoneração contra ele pedindo para deixar de pagar a pensão alimentícia ao filho.

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O juiz proferiu sentença deferindo o pedido. O magistrado entendeu que metade do que João pagava (15%) pertencia a Vitor e a outra metade (15%) era de Maria. Assim, o juiz determinou que a empresa onde João trabalha passe a descontar agora apenas 15% dos vencimentos (referentes à pensão de Maria).

Embargos de terceiro

Maria apresentou embargos de terceiro contra essa decisão.

Alegou que deveria ter sido citada para essa ação de exoneração proposta por João. Isso porque, segundo argumentou, o acordo celebrado no passado teria fixado uma verba alimentícia única para a entidade familiar, tendo em vista que não houve a indicação precisa dos respectivos quinhões.

Em outras palavras, ela disse que no acordo não havia a indicação de que 15% era de Vitor e os outros 15% de Maria. Isso foi uma criação do juiz, sem respaldo no acordo.

Logo, Maria defendeu, nos embargos de terceiro, que ela teria direito de acrescer, ou seja, teria direito de passar a receber a parte de Vitor. Assim, pediu para que esse direito fosse reconhecido.

Esses embargos de terceiro tiveram êxito? Cabem embargos de terceiro nesta hipótese? NÃO.

Os embargos de terceiro não são cabíveis para o fim de declarar, em sede de ação de exoneração de alimentos, a natureza familiar da prestação alimentícia, de forma a alterar a relação jurídica posta e discutida na demanda principal.

STJ. 4ª Turma. REsp 1.560.093-SP, Rel. Min. Marco Buzzi, julgado em 18/09/2018 (Info 634).

Embargos de terceiro

Os embargos de terceiro são... - uma ação de conhecimento - com rito especial,

- por meio da qual uma pessoa objetiva livrar um bem do qual tenha posse (como senhor/proprietário ou possuidor),

- bem este que está sofrendo ou na iminência de sofrer

- uma constrição judicial (exs: penhora, arresto, sequestro etc.)

Previsão legal

Atualmente, os embargos de terceiro estão previstos no art. 674 do CPC:

Art. 674. Quem, não sendo parte no processo, sofrer constrição ou ameaça de constrição sobre bens que possua ou sobre os quais tenha direito incompatível com o ato constritivo, poderá requerer seu desfazimento ou sua inibição por meio de embargos de terceiro.

Não cabe para rediscutir a lide do processo principal

Nos embargos de terceiro não se permite discutir a lide do processo principal.

O escopo dos embargos de terceiro é tão somente o de liberar bens de terceiros que estão sendo ilegitimamente objeto de ações alheias.

No caso concreto, a embargante procurou rediscutir a sentença de exoneração de alimentos como se os embargos de terceiro fossem um recurso, pedindo para que se declarasse a natureza familiar e indivisível dos alimentos.

Vale ressaltar que a sentença proferida não afeta o direito da autora (ex-esposa) de continuar a perceber alimentos. Assim, fica evidente que, na verdade, o que ela pretendia com os embargos era rediscutir algo que não foi declarado à época da lide principal: a natureza familiar da obrigação alimentar.

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DIREITO DO CONSUMIDOR

PROTEÇÃO CONTRATUAL

É válida a cláusula que autoriza o desconto em conta-corrente para pagamento das prestações

do contrato de empréstimo, ainda que se trate de conta utilizada para recebimento de salário

É lícito o desconto em conta-corrente bancária comum, ainda que usada para recebimento de salário, das prestações de contrato de empréstimo bancário livremente pactuado, sem que o correntista, posteriormente, tenha revogado a ordem.

STJ. 2ª Seção. REsp 1.555.722-SP, Rel. Min. Lázaro Guimarães (Desembargador Convocado do TRF 5ª Região), julgado em 22/08/2018 (Info 634).

Imagine a seguinte situação hipotética: João é correntista do Banco Santander.

Ele fez contrato de mútuo feneratício com o banco, tendo tomado emprestado R$ 40 mil.

Segundo restou combinado no contrato, as prestações do empréstimo seriam descontadas diretamente de sua conta bancária.

Vale ressaltar que a conta bancária que João mantém na instituição financeira é uma conta-corrente “comum”, na qual ele realiza movimentações diversas e, além disso, recebe sua remuneração. Não se trata, portanto, de “conta-salário” constituída exclusivamente para receber vencimentos.

A conta de João estava sem dinheiro e, por isso, o banco, durante dois meses, não conseguiu fazer o desconto das parcelas.

Foi então que João recebeu uma quantia que estava aguardando de seu pai e, quando o numerário “caiu” na conta, o banco descontou os dois meses em atraso do empréstimo.

João ajuizou ação questionando essa medida e afirmando que o desconto foi indevido e que afrontou a Súmula 603 do STJ, cuja redação era a seguinte:

Súmula 603-STJ: É vedado ao banco mutuante reter, em qualquer extensão, os salários, vencimentos e/ou proventos de correntista para adimplir o mútuo (comum) contraído, ainda que haja cláusula contratual autorizativa, excluído o empréstimo garantido por margem salarial consignável, com desconto em folha de pagamento, que possui regramento legal específico e admite a retenção de percentual.

O banco poderia ter feito isso? Esse desconto é válido? É válida a cláusula que autoriza o desconto em corrente para pagamento de prestações do contrato de empréstimo, ainda que se trate de conta-corrente comum, mas utilizada para recebimento de salário?

SIM. É possível que haja pactuação para que, em conta-corrente comum (sem se tratar de conta-salário) haja a celebração de mútuo em condições especiais para permitir o débito direto na conta das parcelas contratadas. Nesse sentido:

É válida a cláusula que autoriza o desconto em conta-corrente para pagamento das prestações do contrato de empréstimo, ainda que se trate de conta utilizada para recebimento de salário.

STJ. 3ª Turma. AgInt no AgInt no REsp 1.627.176/RS, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, DJe de 18/12/2017.

Revogação da autorização

Vale ressaltar que o correntista pode, a qualquer momento, revogar a autorização para o débito em conta, desde que não decorram de obrigações referentes a operações de crédito contratadas com a própria instituição financeira, conforme preveem o art. 3º, § 2º e o art. 4º, da Resolução CMN 3.695/2009:

Art. 3º É vedada às instituições financeiras a realização de débitos em contas de depósitos e em contas de pagamento sem prévia autorização do cliente.

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§ 1º A autorização referida no caput deve ser fornecida por escrito ou por meio eletrônico, com estipulação de prazo de validade, que poderá ser indeterminado, admitida a sua previsão no próprio instrumento contratual de abertura da conta de depósitos.

§ 2º O cancelamento da autorização referida no caput deve surtir efeito a partir da data definida pelo cliente ou, na sua falta, a partir da data do recebimento pela instituição financeira do pedido pertinente.

Art. 4º Ficam as instituições financeiras obrigadas a acatar as solicitações de cancelamento da autorização de débitos automáticos em conta de depósitos à vista, apresentadas pelos clientes desde que não decorram de obrigações referentes a operações de crédito contratadas com a própria instituição financeira.

Situação acima é diferente de desconto irretratável e irrevogável em folha

Vale ressaltar que o contrato feito por João não se trata de consignação em folha de pagamento.

Na consignação em folha de pagamento, antes mesmo de a pessoa receber sua remuneração/proventos, já há o desconto da quantia, o que é efetuado pelo próprio órgão ou entidade pagadora. Em outras palavras, há um desconto direto no salário, remuneração ou aposentadoria, com a participação do empregador/órgão público.

Aqui a situação é diferente. A remuneração é integralmente depositada na conta-corrente e, em seguida, são efetuados os descontos das parcelas da prestação por força de previsão contratual.

Vale ressaltar que no empréstimo consignado em folha de pagamento, se é depositada na conta do devedor uma quantia referente a outra fonte de renda (ex: um “bico” feito pelo mutuário) ou a doação de amigo, tal quantia não entrará no desconto. Por outro lado, se foi um mútuo com autorização para desconto na conta-corrente, tais valores poderão ser utilizados para abater o empréstimo.

Veja, por fim, uma terceira distinção: ao contrário do que sucede com o crédito consignado, no caso do débito em conta-corrente autorizado pelo cliente, o empregado/aposentado poderia, em tese, solicitar do empregador o pagamento do salário/aposentadoria em outro banco, arcando com as consequências do inadimplemento. Em outras palavras, em tese, João poderia pedir ao órgão pagador que depositasse sua aposentadoria no banco Itaú. Neste caso, o valor seria depositado integralmente e o banco Santander teria que ingressar com uma execução, por exemplo, contra o devedor. No caso do empréstimo consignado, todavia, essa possibilidade não está ao alcance do mutuário.

Cancelamento da Súmula 603 do STJ

Neste julgado, o STJ decidiu cancelar a Súmula 603/STJ.

O STJ entendeu que a redação dada à súmula não foi a mais adequada e que ela estava gerando interpretações equivocadas por partes dos juízes e Tribunais.

O que a Súmula 603 desejou proibir foi que, existindo o débito, ainda que o correntista tivesse autorizado, o Banco pudesse fazer o cálculo do que é devido e, sem autorização judicial, invadisse o patrimônio bancário do consumidor e satisfizesse o seu crédito.

Apesar disso, os Juízes e Tribunais de Justiça estavam entendendo que a súmula proibia todo e qualquer desconto relacionado com um contrato de mútuo bancário.

Em suma:

É lícito o desconto em conta-corrente bancária comum, ainda que usada para recebimento de salário, das prestações de contrato de empréstimo bancário livremente pactuado, sem que o correntista, posteriormente, tenha revogado a ordem.

STJ. 2ª Seção. REsp 1.555.722-SP, Rel. Min. Lázaro Guimarães (Desembargador Convocado do TRF 5ª Região), julgado em 22/08/2018 (Info 634).

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INCORPORAÇÃO IMOBILIÁRIA

Termo inicial do prazo prescricional da pretensão

de restituição de comissão de corretagem

É abusiva a cláusula prevista em promessa de compra e venda que transfira para o promitente-comprador a responsabilidade pelo pagamento da comissão de corretagem? NÃO. Segundo decidiu o STJ, é válida a cláusula contratual que transfere ao promitente-comprador a obrigação de pagar a comissão de corretagem nos contratos de promessa de compra e venda de unidade autônoma em regime de incorporação imobiliária, desde que previamente informado o preço total da aquisição da unidade autônoma, com o destaque do valor da comissão de corretagem (STJ. 2ª Seção. REsp 1.599.511-SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 24/8/2016).

Imagine, no entanto, que o adquirente não foi informado previamente que ele teria a obrigação de pagar a comissão de corretagem, ou seja, houve falha no dever de informar. Neste caso, ele poderá ajuizar ação pedindo a restituição dos valores pagos. Qual é o prazo prescricional? 3 anos (art. 206, § 3º, IV, do Código Civil).

Qual é o termo inicial deste prazo prescricional? A data do efetivo pagamento. E se o pagamento foi parcelado?

Se o pagamento da comissão de corretagem foi parcelado, o prazo prescricional é contado da última parcela paga, ou seja, da data em que o adquirente terminou de pagar (data do desembolso total).

O termo inicial da prescrição da pretensão de restituição dos valores pagos parceladamente a título de comissão de corretagem é a data do efetivo pagamento (desembolso total).

STJ. 3ª Turma. REsp 1.724.544-SP, Rel. Min. Moura Ribeiro, julgado em 02/10/2018 (Info 634).

O que é um contrato de corretagem?

Pelo contrato de corretagem, o corretor obriga-se a obter para uma pessoa que o contrata (denominada “cliente” ou “comitente”) um ou mais negócios, conforme as instruções recebidas.

O contrato de corretagem está previsto, de forma genérica, nos arts. 722 a 729 do CC.

Quando se fala neste contrato, normalmente as pessoas só se lembram da corretagem de imóveis. No entanto, existem outras espécies de corretagem, como é o caso do corretor de ações na Bolsa de Valores ou o corretor de mercadorias (bens móveis).

No caso do corretor de imóveis, a profissão está regulamentada pela Lei n. 6.530/78 e pelo Decreto n. 81.871/78. Para exercer a profissão de corretor de imóveis, exige-se a aprovação em curso técnico de Transações Imobiliárias ou curso superior em Gestão Imobiliária, com registro no Conselho Regional de Corretores de Imóveis (CRECI).

Comissão de corretagem

Como remuneração pelo serviço prestado, o corretor receberá o pagamento de uma quantia, que é chamada de “comissão de corretagem”.

A remuneração é devida ao corretor uma vez que tenha conseguido o resultado previsto no contrato de mediação, ou ainda que este não se efetive em virtude de arrependimento das partes (art. 725).

Qual é o valor da comissão de corretagem?

O valor da comissão de corretagem deverá estar previsto na lei ou no contrato firmado entre as partes.

E se não estiver previsto na lei nem no contrato?

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Não há lei estipulando o valor da comissão de corretagem na venda de imóveis. Aplica-se, portanto, os usos e costumes. No dia-a-dia imobiliário, quando não há previsão contratual, deverá ser pago ao corretor 6% sobre o valor do imóvel urbano vendido, conforme prevê a tabela do CRECI.

Incorporação imobiliária

É a atividade desenvolvida por um incorporador (pessoa física ou jurídica) por meio da qual ele planeja a construção de um condomínio com unidades autônomas (ex: um prédio com vários apartamentos) e, antes mesmo de iniciar a edificação, já aliena as unidades para os interessados e, com os recursos obtidos, vai construindo o projeto.

Nas palavras do Min. Luis Felipe Salomão, "a expressão incorporação imobiliária designa a iniciativa do empreendedor que, com a venda antecipada das unidades autônomas, obtém capital necessário para construção de edifício de apartamentos, sob o regime condominial" (REsp 1.399.024-RJ).

Normalmente, a pessoa que adquire unidade autônoma em regime de incorporação imobiliária, o faz de forma parcelada, por meio de um contrato de promessa de compra e venda.

O que é uma promessa de compra e venda?

A promessa de compra e venda (ou compromisso de compra e venda) é... - uma espécie de contrato preliminar

- por meio do qual uma pessoa (promitente vendedor) se compromete a vender o seu bem - ao promissário comprador, após este pagar integralmente o preço que foi ajustado.

Pagamento da comissão de corretagem na incorporação imobiliária

Na prática, é extremamente comum que os contratos de promessa de compra e venda de incorporação imobiliária contenham uma cláusula prevendo que o promitente-comprador (“consumidor”) será o responsável pelo pagamento da comissão do corretor.

Exemplo

João, ao parar seu carro no semáforo, recebeu um panfleto de um novo edifício de apartamentos que estava sendo lançado “na planta”. Foi até o estande de vendas, sendo atendido por Luciana, corretora de imóveis. Decidiu na hora que iria comprar uma unidade.

Foi, então, apresentado a ele um contrato de promessa de compra e venda com a imobiliária.

Por meio do contrato, a imobiliária (promitente vendedora) comprometeu-se a vender a João a unidade 1502, da Torre B, do Edifício “Morar Bem”.

Em contrapartida, João obrigou-se a pagar o valor de R$ 1 milhão, parcelado em 60 meses.

Além disso, havia uma cláusula (8.1) no contrato prevendo que João teria que pagar 6% do valor do imóvel para Luciana, a título de comissão de corretagem.

Algum tempo depois, João ingressou com ação judicial pedindo que esta cláusula 8.1 fosse declarada nula de pleno direito porque seria abusiva, já que ele, como consumidor, não poderia ser obrigado a pagar a corretora, a qual presta serviços no interesse da incorporadora, razão pela qual a empresa deveria arcar com este custo.

A tese de João é aceita pelo STJ? É abusiva a cláusula prevista em promessa de compra e venda que transfira para o promitente-comprador a responsabilidade pelo pagamento da comissão de corretagem? NÃO. Esta cláusula, em regra, não é abusiva. No entanto, é necessário que o promitente-vendedor, na fase pré-negocial, explique ao consumidor, de forma clara e precisa, que ele (adquirente) irá pagar a quantia, informando o valor exato.

Esse tema foi definido pelo STJ em recurso repetitivo, sendo fixada a seguinte tese:

É válida a cláusula contratual que transfere ao promitente-comprador a obrigação de pagar a comissão de corretagem nos contratos de promessa de compra e venda de unidade autônoma em regime de

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incorporação imobiliária, desde que previamente informado o preço total da aquisição da unidade autônoma, com o destaque do valor da comissão de corretagem.

STJ. 2ª Seção. REsp 1.599.511-SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 24/8/2016 (recurso repetitivo) (Info 589).

Se a incorporadora não informar previamente

Uma reclamação constante dos consumidores é a de que as incorporadoras não informam previamente os clientes de que eles são responsáveis pelo pagamento da comissão de corretagem.

Os consumidores alegam que, somente após celebrado o contrato, com o pagamento do sinal, é que são informados sobre este custo adicional.

Essa prática de não explicar previamente viola os deveres de informação e de transparência que devem pautar as relações de consumo.

Se isso acontecer, o consumidor poderá recusar-se a pagar a comissão de corretagem, exigindo o cumprimento da proposta pelo preço ofertado.

Toda informação ou publicidade suficientemente precisa vincula o fornecedor, conforme expresso no CDC: Art. 30. Toda informação ou publicidade, suficientemente precisa, veiculada por qualquer forma ou meio de comunicação com relação a produtos e serviços oferecidos ou apresentados, obriga o fornecedor que a fizer veicular ou dela se utilizar e integra o contrato que vier a ser celebrado.

Desse modo, a cláusula que transfere a obrigação de pagar a comissão para o consumidor é, a princípio, lícita, mas o promitente-vendedor, na fase pré-negocial, deverá informar, de forma clara e precisa, que haverá esta transferência.

Discussão judicial sobre a abusividade da comissão de corretagem

Vimos acima que, na prática, muitas incorporadoras exigem que o promitente-comprador pague a comissão de corretagem.

Inúmeros consumidores não se conformam com essa cobrança e a questionam no Poder Judiciário. Os consumidores ajuízam ações pedindo que seja declarada a abusividade de tais cláusulas e que, como consequência, a eles sejam restituídos (recebam de volta) os valores pagos a título de comissão de corretagem.

Indago: contra quem essa ação deverá ser proposta? Contra o corretor (pessoa física que recebeu efetivamente os valores) ou contra a incorporadora (que vendeu o imóvel)?

Contra a incorporadora.

A incorporadora, na condição de promitente-vendedora, tem legitimidade passiva “ad causam” para responder a demanda em que é pleiteada pelo promitente-comprador a restituição dos valores pagos a título de comissão de corretagem e de taxa de assessoria técnico-imobiliária, alegando-se prática abusiva na transferência desses encargos ao consumidor.

STJ. 2ª Seção. REsp 1.551.968-SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 24/8/2016 (recurso repetitivo) (Info 589).

Qual é o prazo prescricional para essa ação? 3 anos.

Prescreve em 3 anos a pretensão de restituição dos valores pagos a título de comissão de corretagem. STJ. 2ª Seção. REsp 1.551.956-SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 24/8/2016 (recurso repetitivo) (Info 589).

Para o STJ, trata-se de uma ação de ressarcimento com fundamento na vedação ao enriquecimento sem causa, devendo, portanto, ser aplicado o art. 206, § 3º, IV, do Código Civil:

Referências

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