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O PRINCÍPIO RESPONSABILIDADE: NOVO MODELO ÉTICO DO AGIR HUMANO EM RELAÇÃO À BIODIVERSIDADE

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XI Semana de Extensão, Pesquisa e Pós-Graduação - SEPesq Centro Universitário Ritter dos Reis

XI Semana de Extensão, Pesquisa e Pós-Graduação SEPesq – 19 a 23 de outubro de 2015

O PRINCÍPIO RESPONSABILIDADE: NOVO MODELO ÉTICO DO AGIR HUMANO EM RELAÇÃO À BIODIVERSIDADE

Helena Kugel Lazzarin Mestranda em Direito

Universidade do Vale do Rio dos Sinos – UNISINOS helena@lazzarinadvogados.com.br

Alexandra Vieira Lazzarin

Pós-graduanda em Direito e Processo do Trabalho

Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul – PUCRS alexandra@lazzarinadvogados.com.br

RESUMO: A natureza nem sempre foi objeto de responsabilidade humana ou de um comportamento ético. A ética tradicional dizia respeito somente às relações imediatas, de modo que ninguém seria julgado responsável pelos efeitos involuntários posteriores de um ato. A técnica moderna impõe à ética uma nova dimensão, nunca antes imaginada, de responsabilidade. Dessa forma, intenta-se para o estudo dos conceitos da ética contemporânea: a responsabilidade, através da análise da obra “O Princípio Responsabilidade: ensaio de uma ética para a civilização tecnológica”, de Hans Jonas, em razão da relevância do tema e da necessidade da mudança de paradigmas para desenvolvimento de um mundo digno para as próximas gerações.

Palavras-Chave: Novo Princípio. Responsabilidade. Ética. Meio Ambiente.

ABSTRACT: The nature has not always been the object of human responsibility or ethical behavior. The traditional ethics concerned only the immediate relationship, so that no one would be judged responsible for the subsequent unintended effects of an act. The modern technology requires ethics a new dimension never before imagined, of responsibility. Therefore, attempts to study the concepts of contemporary ethics: responsibility, through the analysis of the work "The Principle Responsibility: Ethics test for technological civilization" by Hans Jonas, given the importance of the topic and needs for paradigm shift for development of a world fit for future generations.

Keywords: New Principle. Responsibility. Ethics. Environment.

SUMÁRIO: 1 Introdução. 2 O Agir Humano na Antiguidade e a Ética Tradicional. 3 Novas Dimensões da Ética. 4 O Princípio Responsabilidade como conceito da Ética Ambiental Contemporânea. 5 Conclusão. Referências.

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1 Introdução

A natureza nem sempre foi objeto de responsabilidade humana ou de um comportamento ético. A ética tradicional dizia respeito somente às relações imediatas, podendo ser traduzida pela máxima “faça aos outros aquilo que gostaria que fizessem a ti”.

Ninguém, então, seria julgado responsável pelos efeitos involuntários posteriores de um ato.

Esta situação, no entanto, se modificou de forma decisiva. A técnica moderna criou ações de inédita grandeza, as quais a ética antiga não é capaz de enquadrar; o que importa, a partir de então, é o fazer coletivo, no qual o ator, ação e efeito não são mais os da esfera mais próxima. Isso impõe à ética, pela enormidade de suas forças, uma nova dimensão, nunca antes imaginada, de responsabilidade.

A primeira alteração nesse quadro diz respeito à vulnerabilidade da natureza provocada pela intervenção técnica do homem, conhecida a partir dos danos já produzidos.

Essa descoberta levou ao surgimento da ciência do meio ambiente e revelou que a natureza da ação humana foi modificada de fato, e que, a partir de então, a biosfera se tornou um objeto pelo qual somos responsáveis.

A natureza, como responsabilidade humana é, assim, um novo objeto, sobre o qual uma nova teoria ética deve ser pensada. O novo agir humano deve levar em conta a condição da natureza extra-humana, a biosfera como um todo, não somente pela causa humana, mas por causa própria e por seu próprio direito. Vale dizer, é preciso ampliar o reconhecimento dos “fins em si” para além da esfera do ser humano. Torna-se um dever do homem se solidarizar com a natureza e com as gerações vindouras.

O objetivo deste trabalho é, assim, apresentar um dos conceitos da ética contemporânea: a responsabilidade. Para tanto, far-se-á uma análise da obra “O Princípio Responsabilidade: ensaio de uma ética para a civilização tecnológica”, de Hans Jonas. A pesquisa é de cunho bibliográfico e se justifica pela atualidade e relevância do tema, pois é uma obrigação prática perante o futuro, a fim de possibilitar a existência de um mundo digno para as próximas gerações.

2 O Agir Humano na Antiguidade e a Ética Tradicional

Desde a antiguidade, existe a consciência de que, mesmo com toda a sua engenhosidade, o homem, quando confrontado com os elementos da natureza, continua pequeno. A vida do homem se desenvolveu, desde sempre, entre aquilo que permanecia e aquilo que mudava: o que permanecia era a natureza, e o que mudava eram suas próprias obras. O caráter de permanência das obras humanas, ou seja, das suas cidades, é artificial, pois estas não oferecem nenhuma garantia em longo prazo. Assim, nesse caso, em se

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tratando de seu próprio artefato, o controle do homem é pequeno e a natureza permanente acaba por se impor.1

A cidade de sua própria criação, nitidamente distinta do restante do ambiente, formava o domínio completo e único de responsabilidade humana. A natureza, assim, não era objeto de responsabilidade – ela cuidava de si mesma e tomava conta do homem também. Diante dela, eram úteis a inteligência e a inventividade, não a ética.2

Hans Jonas3 afirma que “toda a ética tradicional é antropocêntrica”, ao constatar que a antiga ética dizia respeito somente ao relacionamento direto entre os homens ou, até mesmo, entre cada homem consigo mesmo. Todo o trato com o mundo extra-humano era eticamente neutro, ou seja, a atuação entre os objetos não humanos não formava um domínio eticamente significativo.

Ainda nos dias de hoje, a palavra “ética” é geralmente traduzida como “ciência da conduta”,4 de modo que pode ser entendida como um “conhecimento científico, teórico, sobre o conhecimento prudencial”.5 Aristóteles,6 nesse sentido, entendia que ninguém optaria pela felicidade “como meio para qualquer outra coisa que seja salvo ela mesma”.

Ademais, afirmava que “o bem do ser humano é a felicidade (eudaimonia7), a realização da sua natureza”. Observa-se que a forma de realização da natureza do homem modifica-se com as circunstâncias, com o tempo e o espaço, de modo que “reconhecer essas formas é

1JONAS, Hans. O Princípio Responsabilidade: Ensaio de uma ética ara a civilização tecnológica. Tradução:

Marijane Lisboa, Luiz Barros Montez. Rio de Janeiro: Contraponto. 2006. p. 31-34.

2JONAS, Hans. O Princípio Responsabilidade: Ensaio de uma ética ara a civilização tecnológica. Tradução:

Marijane Lisboa, Luiz Barros Montez. Rio de Janeiro: Contraponto. 2006. p. 31-34.

3JONAS, Hans. O Princípio Responsabilidade: Ensaio de uma ética ara a civilização tecnológica. Tradução:

Marijane Lisboa, Luiz Barros Montez. Rio de Janeiro: Contraponto. 2006. p. 31-34.

4ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de filosofia. 3.ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998. p. 380.

5WALDMAN, Ricardo Libel. Ética Clássica, Ética Ambiental e Direitos Humanos. In: Revista da Faculdade de Direito Ritter dos Reis, v. 1, 2006. p. 74.

6ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. Tradução: Edson Bini, São Paulo: Edipro, 2002. p. 49.

7A eudaimonia não é definida subjetivamente, porque não pode consistir na negação da pessoa humana. Está é um ser concreto, individual, racional e social.

-ser concreto: existe de fato, na realidade, é, na sua concretude finito.

-ser individual: Somente como indivíduos as pessoas são.

-ser racional: é autônomo, pode decidir-se sobre sua própria vida, e pode conhecer a verdade, por si mesmo.

O ser humano é capaz de dar sentido a seus atos, ele não simplesmente reage a manifestações do mundo que o cerca, não é objeto dos instintos.

-ser social: o pleno desenvolvimento humano só pode ser alcançado em comunidade. Pense-se, por exemplo, na menor comunidade que é a que existe entre o homem e a mulher, ambos querem o bem dos dois (é o que as pessoas esperam nos relacionamentos ao menos), e fazem do bem do outro seu bem e o mesmo acontece com relação aos filhos. Aristóteles mencionava a necessidade do diálogo que decorre do caráter racional do homem. E ter esta experiência é algo necessário para uma vida completa. A vida sem o amor e a amizade não pode ser, realmente, feliz. (WALDMAN, Ricardo Libel. Ética Clássica, Ética Ambiental e Direitos Humanos. In:

Revista da Faculdade de Direito Ritter dos Reis, v. 1, p. 73-86, 2006).

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um conhecimento prudencial (conhecimento prático, que tem por objetivo o bem no caso concreto e adquire-se pela experiência) que Aristóteles chamou de ética”. 8

As características do agir humano são, nesse sentido, significativas para compreensão do conceito de ética. Realizando uma comparação entre aquelas características do agir humano no passado, com o estado atual, é possível verificar que todos os mandamentos e máximas da ética tradicional eram relacionados ao círculo imediato das relações. Toda a moralidade situava-se dentro da esfera das ações imediatas, podendo ser traduzida pela máxima “faça aos outros aquilo que gostaria que fizessem a ti”.9

Nesta linha de raciocínio, Kant10 afirmava:

Para saber o que (...) devo fazer para que minha vontade seja moral, para tanto não preciso de nenhuma perspicácia de longo alcance. Inexperiente a compreensão do percurso do mundo, incapaz de preparar-me para os incidentes sucessivos do mesmo, ainda assim posso saber como devo agir em conformidade com a lei moral.

Assim, o bem e o mal, com o qual o agir deveria se preocupar, era evidenciado na ação, em seu alcance imediato – jamais requeriam alcance a longo prazo.11 A ética tradicional estava relacionada com a imediaticidade; o longo trajeto das consequências ficava ao critério do acaso, do destino ou da providência.

3 Novas Dimensões da Ética

Nos moldes da ética tradicional, ninguém, então, seria julgado responsável pelos efeitos involuntários posteriores de um ato bem-intencionado, bem-refletido e bem- executado. A realização ou violação do bem humano ocorreria sempre no presente.12

Esta situação se modificou de forma decisiva. A técnica moderna criou ações de ordem de inédita grandeza, e a ética antiga, a partir de então, não conseguiu mais enquadrar essas questões nos seus moldes.13 Obviamente, as antigas prescrições da ética

8 WALDMAN, Ricardo Libel. Ética Clássica, Ética Ambiental e Direitos Humanos. In: Revista da Faculdade de Direito Ritter dos Reis, v. 1, 2006. p. 74.

9JONAS, Hans. O Princípio Responsabilidade: Ensaio de uma ética ara a civilização tecnológica. Tradução:

Marijane Lisboa, Luiz Barros Montez. Rio de Janeiro: Contraponto. 2006. p. 35-36.

10KANT, Immanuel. Fundamentação da Metafísica dos Costumes.Tradução: Paulo Quintela. Lisboa: 70 Textos Filosóficos, 2007. Prefácio.

11JONAS, Hans. O Princípio Responsabilidade: Ensaio de uma ética ara a civilização tecnológica. Tradução:

Marijane Lisboa, Luiz Barros Montez. Rio de Janeiro: Contraponto. 2006. p. 36-38.

12JONAS, Hans. O Princípio Responsabilidade: Ensaio de uma ética ara a civilização tecnológica. Tradução:

Marijane Lisboa, Luiz Barros Montez. Rio de Janeiro: Contraponto. 2006. p. 36-38.

13Sobre a revolução na ética, destaca-se o que dispõe James Rachels: O final do século XVIII e o século XIX produziram uma surpreendente série de transformações. O modelo estado-nação estava emergindo como consequência da Revolução Francesa e da queda do império napoleônico; as revoluções de 1848 mostraram

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“do próximo” ainda são válidas, em sua imediaticidade, para a esfera mais próxima, cotidiana, da interação humana. No entanto, esse conceito tem sido prejudicado pelo crescente domínio do fazer coletivo, no qual o ator, ação e efeito não são mais os da esfera mais próxima. Isso impõe à ética, pela enormidade de suas forças, uma nova dimensão, nunca antes imaginada, de responsabilidade.14

A primeira grande alteração nesse quadro diz respeito à vulnerabilidade da natureza provocada pela intervenção técnica do homem – uma vulnerabilidade que jamais fora pressentida antes de que ela se desse a conhecer pelos danos já produzidos. Essa descoberta levou ao surgimento da ciência do meio ambiente e revelou que a natureza foi modificada de fato pelas ações humanas. É neste momento que a biosfera do planeta passa a ser um objeto pelo qual os seres humanos são responsáveis, pois sobre ela detém poder.

A natureza como responsabilidade humana é, assim, um novo objeto, sobre o qual uma nova teoria ética deve ser pensada.15

Nas novas dimensões da ética, algumas orientações da tradicional são mantidas, mas existem muitas diferenças: desaparecem, por exemplo, as delimitações de proximidade e simultaneidade, rompidas pelo crescimento espacial e pelo prolongamento temporal das sequências de causa e efeito. Os efeitos do agir vão se somando, de modo que a situação para um agir e um existir posteriores não será mais a mesma da situação vivida pelo primeiro ator. O destino do homem é, assim, dependente da situação da natureza e é há um interesse moral dele na sua manutenção. Ressalta-se que esses novos atos de responsabilidade devem estar compreendidos na vontade do ato singular, e este deve ser moralmente responsável.16

Ainda, nas novas dimensões da ética, o saber torna-se um dever prioritário, possuindo a mesma magnitude do nosso agir – que ganha, ele próprio, o significado ético.

Nenhuma ética anterior considerava a condição global da vida humana e o futuro distante, inclusive a existência da espécie. O fato de que hoje eles estejam correndo riscos exige

o contínuo poder das novas idéias de “liberdade, igualdade e fraternidade”; na América, um novo país com uma nova forma de constituição era criado, e sua sangrenta guerra civil colocou um fim, finalmente, na escravidão existente na civilização Ocidental; ao mesmo tempo, a revolução industrial estava gerando uma completa reestruturação da sociedade. Não é surpresa que no meio de todas essas mudanças as pessoas pudessem começar a pensar de uma forma diferente sobre a ética. As velhas formas de pensar estavam soltas no ar, abertas a desafios. (RACHELS, James. Os Elementos da Filosofia da Moral. Tradução: Roberto Cavallari Filho. São Paulo: Manole, 2006. p. 92-93).

14JONAS, Hans. O Princípio Responsabilidade: Ensaio de uma ética ara a civilização tecnológica. Tradução:

Marijane Lisboa, Luiz Barros Montez. Rio de Janeiro: Contraponto. 2006. p. 39-40.

15JONAS, Hans. O Princípio Responsabilidade: Ensaio de uma ética ara a civilização tecnológica. Tradução:

Marijane Lisboa, Luiz Barros Montez. Rio de Janeiro: Contraponto. 2006. p. 39-40.

16JONAS, Hans. O Princípio Responsabilidade: Ensaio de uma ética ara a civilização tecnológica. Tradução:

Marijane Lisboa, Luiz Barros Montez. Rio de Janeiro: Contraponto. 2006. p. 39-40.

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uma nova concepção de direitos e deveres, para qual nenhuma ética antiga pode oferecer princípios.17

O novo agir do homem deve levar em conta mais do que o interesse “do homem”, pois a condição da natureza extra-humana, a biosfera como um todo, hoje subjugadas ao seu poder, não são “um bem confiado aos homens”. Possuem exigência moral – e não somente por causa da humanidade, mas por causa própria e por seu próprio direito. Isso requer alterações substanciais nos fundamentos da ética, pois se deve procurar não somente o bem humano, mas também o bem de tudo que é extra-humano. No entendimento de Hans Jonas,18 é preciso ampliar o reconhecimento de “fins em si” para além da esfera da humanidade.

A tecnologia, como esforço humano, ultrapassou os objetivos pragmaticamente delimitados dos tempos antigos. Vale dizer que, àquela época, a técnica era um tributo cobrado pela necessidade, e não um fim escolhido pela humanidade. Não importa, nesse contexto, quem são, especificamente, os atores. O ator é coletivo, os atos são coletivos.

Refere-se que o Princípio Responsabilidade é gerado mais pelo futuro indeterminado do que pelo espaço contemporâneo da ação.19

A nova ética traz a ideia de que a moralidade, assim, deve invadir a esfera do produzir, da qual ela se mantinha afastada anteriormente, e, conforme Hans Jonas,20 isso deve ser feito na forma de política pública. Pela primeira vez, a política pública lida com questões de tal abrangência e que demandam projeção temporal tão longa.

Essas questões devem ser trabalhadas, pois é uma obrigação prática perante um futuro distante – e como princípio de decisão na ação presente –, possibilitar a existência de um mundo digno para as próximas gerações. Desse modo, a presença do homem se tornou um dever – de conservar o mundo físico de modo que as condições para tal presença permaneçam intactas.21

O imperativo categórico de Kant dizia: “Aja de modo que tu também possas querer que tua máxima se torne lei geral.”. Supondo a existência de uma sociedade de atores humanos, a ação deve existir, sem contradição, como exercício geral da comunidade. Um imperativo adequado ao novo tipo de agir humano seria: “Aja de modo a que os efeitos da

17JONAS, Hans. O Princípio Responsabilidade: Ensaio de uma ética ara a civilização tecnológica. Tradução:

Marijane Lisboa, Luiz Barros Montez. Rio de Janeiro: Contraponto. 2006. p. 41-42.

18JONAS, Hans. O Princípio Responsabilidade: Ensaio de uma ética ara a civilização tecnológica. Tradução:

Marijane Lisboa, Luiz Barros Montez. Rio de Janeiro: Contraponto. 2006. p. 43-44.

19JONAS, Hans. O Princípio Responsabilidade: Ensaio de uma ética ara a civilização tecnológica. Tradução:

Marijane Lisboa, Luiz Barros Montez. Rio de Janeiro: Contraponto. 2006. p. 43-44.

20JONAS, Hans. O Princípio Responsabilidade: Ensaio de uma ética ara a civilização tecnológica. Tradução:

Marijane Lisboa, Luiz Barros Montez. Rio de Janeiro: Contraponto. 2006. p. 43-44.

21JONAS, Hans. O Princípio Responsabilidade: Ensaio de uma ética ara a civilização tecnológica. Tradução:

Marijane Lisboa, Luiz Barros Montez. Rio de Janeiro: Contraponto. 2006. p. 43-44.

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tua ação sejam compatíveis com a permanência de uma autentica vida humana sobre a terra”.22

O novo imperativo traz a ideia de que podemos sacrificar a nossa vida, mas não a da humanidade. Vale dizer: não temos o direito de colocar em risco as futuras gerações, em função da existência atual. É formado, assim, um dever diante daqueles que ainda não existem.23

O novo imperativo, ainda, volta-se muito mais à política pública do que à privada, diferente do imperativo categórico de Kant, que era voltado para o indivíduo, ou seja, tinha critério momentâneo. Hans Jonas24 esclarece que o Novo Princípio não é aquele da responsabilidade objetiva, e sim o da “constituição subjetiva da autodeterminação”, e que o que vale não é o ato consigo mesmo, mas sim os “efeitos finais para a continuidade da atividade humana no futuro”.

Não se discute, neste ponto, a validade das antigas formas de ética, e sim se estas são suficientes para as novas dimensões do agir humano. Os novos tipos e limites do agir exigem uma ética de previsão e responsabilidade compatível com esses limites, tão nova quanto às situações com que terá que lidar.25

Diferente da antiguidade – quando o “homem” significava constante e não se imaginava manusear ou manipular a essência dos seres humanos –, a atual técnica moderna tem o próprio homem como objeto. Hans Jonas26 exemplifica esse contexto com três situações atuais: o prolongamento da vida, questão que deve ser encarada de forma ética e baseada em princípios, e não em interesses, pois é preciso analisar até que ponto atuar sobre os processos bioquímicos de envelhecimento é desejável para os seres humanos; o controle de comportamento, ou seja, o controle psíquico por meio de agentes químicos ou pela intervenção direta no cérebro, que são intervenções que ultrapassam as antigas éticas e se relacionam de forma direta com a moral do homem – obviamente, representam um benefício aos doentes mentais, mas ensejam a questão do uso não medicinal, inclusive como forma de manipulação social; e, por fim, a manipulação genética, que gera a discussão sobre o direito moral de fazer o controle genético dos seres humanos futuros, ou de submetê-los a experimentos. O homem exercer o controle da sua própria evolução, modificar a sua espécie e as demais questões que cercam essa temática não são compatíveis com a ética anterior e dizem respeito à dignidade humana de forma direta.

22JONAS, Hans. O Princípio Responsabilidade: Ensaio de uma ética ara a civilização tecnológica. Tradução:

Marijane Lisboa, Luiz Barros Montez. Rio de Janeiro: Contraponto. 2006. p. 47-48.

23JONAS, Hans. O Princípio Responsabilidade: Ensaio de uma ética ara a civilização tecnológica. Tradução:

Marijane Lisboa, Luiz Barros Montez. Rio de Janeiro: Contraponto. 2006. p. 48-49.

24JONAS, Hans. O Princípio Responsabilidade: Ensaio de uma ética ara a civilização tecnológica. Tradução:

Marijane Lisboa, Luiz Barros Montez. Rio de Janeiro: Contraponto. 2006. p. 48-49.

25JONAS, Hans. O Princípio Responsabilidade: Ensaio de uma ética ara a civilização tecnológica. Tradução:

Marijane Lisboa, Luiz Barros Montez. Rio de Janeiro: Contraponto. 2006. p. 57-61.

26JONAS, Hans. O Princípio Responsabilidade: Ensaio de uma ética ara a civilização tecnológica. Tradução:

Marijane Lisboa, Luiz Barros Montez. Rio de Janeiro: Contraponto. 2006. p. 57-61.

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É necessária, assim, a existência de uma ética que possa controlar estes poderes extremos que o ser humano possui – os quais se vê obrigado a seguir conquistando e exercendo.27 A ética existe para regular as ações dos homens, bem como regular seus poderes de agir.

4 O Princípio Responsabilidade como Conceito da Ética Ambiental Contemporânea

É preciso ter ética de responsabilidade a longo alcance, respeito aos não nascidos, impotentes. A nova ética precisa encontrar sua teoria, na qual se fundamentam deveres e proibições. Para isso, deve-se pensar em qual o valor do futuro no presente.28

Os fundamentos da nova ética, suas perspectivas e as exigências do novo agir, são questões que pertencem à doutrina dos princípios da moral e à doutrina de sua aplicação. É fundamental a existência de um princípio inteligível, que gere influência sobre o bem e a necessidade próximos; no entanto, para que isso ocorra, é necessário “o saber real sobre a esfera dos fatos”.29 Vale dizer, é preciso conhecer a verdade relacionada a acontecimentos futuros extrapoláveis do homem e do mundo, avaliar as consequências certas, prováveis ou possíveis dos atos humanos. Há de se formar uma ciência de previsão hipotética, uma

“futurologia comparativa”, um saber prático relacionado à política – deve-se saber o que esperar, o que incentivar e o que evitar.

Nas palavras de Hans Jonas,30 é necessária, então, uma “ética de responsabilidade de longo prazo”, que traz o que desejamos preservar no conceito de homem. Além disso, o autor entende ser necessário estipular determinados tipos de ameaça à imagem humana, uma vez que, enquanto o perigo for desconhecido, não se saberá do que se proteger e por que devemos fazê-lo. O saber se origina daquilo contra o que devemos nos proteger. Obter uma projeção do futuro - imaginar os males que podem estar sendo causados - é um dever, ainda que introdutório, da nova ética almejada. O dever seguinte se dá pela disposição de se deixar afetar, se solidarizar, com as gerações vindouras.

Desse modo, “pensar” é um dever que nos impusemos, devido à complexidade das relações causais na ordem social e na biosfera, à imprevisibilidade, a incapacidade de prever as futuras invenções. O mencionado “saber”, que nos é exigido, sempre é um saber

27JONAS, Hans. O Princípio Responsabilidade: Ensaio de uma ética ara a civilização tecnológica. Tradução:

Marijane Lisboa, Luiz Barros Montez. Rio de Janeiro: Contraponto. 2006. p. 65-66.

28JONAS, Hans. O Princípio Responsabilidade: Ensaio de uma ética ara a civilização tecnológica. Tradução:

Marijane Lisboa, Luiz Barros Montez. Rio de Janeiro: Contraponto. 2006. p. 63-64.

29JONAS, Hans. O Princípio Responsabilidade: Ensaio de uma ética ara a civilização tecnológica. Tradução:

Marijane Lisboa, Luiz Barros Montez. Rio de Janeiro: Contraponto. 2006. p. 69-71.

30JONAS, Hans. O Princípio Responsabilidade: Ensaio de uma ética ara a civilização tecnológica. Tradução:

Marijane Lisboa, Luiz Barros Montez. Rio de Janeiro: Contraponto. 2006. p. 69-71.

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ainda não disponível e jamais disponível como conhecimento prévio. É um saber sobre possibilidades, certamente insuficiente para previsões – mas suficiente para a doutrina ética dos princípios.31

O principal problema da referida doutrina dos princípios não é a incerteza das projeções sobre o futuro, e sim no seu emprego prático-político, na medida em que é exigida uma considerável certeza de previsão que justifique a renúncia a um desejável efeito próximo em favor de um efeito distante, que de qualquer modo não nos atingirá.32 Vale dizer, a dificuldade está em as atuais gerações abrirem mão de práticas em respeito àqueles ainda não-nascidos.

Hans Jonas,33 sobre este aspecto, refere a “primazia do mau prognóstico sobre o bom”: a incerteza que ameaça tornar inoperante a perspectiva ética de uma responsabilidade em relação ao futuro deve funcionar como uma prescrição prática, ou seja, deve ser incluída na teoria ética e servir de motivo para o novo princípio. “Essa prescrição afirmaria, grosso modo, que é necessário dar mais ouvidos à profecia da desgraça do que à profecia da salvação”,34 ou seja, o princípio deve ser fundamentado nos males que podem ser causados a partir das condutas humanas, e não dos benefícios.

Existe um princípio ético fundamental, que aduz que a existência (ou a essência) do homem, em sua totalidade, nunca pode ser transformada em uma aposta do agir. Esse princípio nos obriga incondicionalmente, isto é, não é apenas um conselho de prudência moral, na medida em que assumimos a responsabilidade que virá. Sob essa responsabilidade, a prudência se torna cerne do nosso agir moral.35

O Princípio, ainda, não pode ser tido pela ideia tradicional de direitos e deveres, ou seja, pela ideia baseada em reciprocidade. Não há reciprocidade, bem como não há reivindicação de direitos, pois se trata de seres humanos futuros. No entanto, é possível partir do pressuposto de que toda vida reivindica vida, e isso talvez seja um direito a ser respeitado.36

A nova ética almejada lida exatamente com o que ainda não existe, e o seu princípio da responsabilidade tem de ser independente, tanto da ideia de um direito quanto da ideia de uma reciprocidade.

31JONAS, Hans. O Princípio Responsabilidade: Ensaio de uma ética ara a civilização tecnológica. Tradução:

Marijane Lisboa, Luiz Barros Montez. Rio de Janeiro: Contraponto. 2006. p. 73-74.

32JONAS, Hans. O Princípio Responsabilidade: Ensaio de uma ética ara a civilização tecnológica. Tradução:

Marijane Lisboa, Luiz Barros Montez. Rio de Janeiro: Contraponto. 2006. p. 74-75.

33JONAS, Hans. O Princípio Responsabilidade: Ensaio de uma ética ara a civilização tecnológica. Tradução:

Marijane Lisboa, Luiz Barros Montez. Rio de Janeiro: Contraponto. 2006. p. 77.

34JONAS, Hans. O Princípio Responsabilidade: Ensaio de uma ética ara a civilização tecnológica. Tradução:

Marijane Lisboa, Luiz Barros Montez. Rio de Janeiro: Contraponto. 2006. p. 77.

35JONAS, Hans. O Princípio Responsabilidade: Ensaio de uma ética ara a civilização tecnológica. Tradução:

Marijane Lisboa, Luiz Barros Montez. Rio de Janeiro: Contraponto. 2006. p. 86-87.

36JONAS, Hans. O Princípio Responsabilidade: Ensaio de uma ética ara a civilização tecnológica. Tradução:

Marijane Lisboa, Luiz Barros Montez. Rio de Janeiro: Contraponto. 2006. p. 89-90.

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Na visão de Vicente Barretto,37 ainda, a responsabilidade aborda questões de ordem filosófica, que ultrapassam as possibilidades da teoria jurídica. Trata-se de uma noção que extrapola o próprio direito, pois pressupõe a idéia de liberdade e suscita a questão da causalidade, que obriga, inelutavelmente, a consideração da problemática da justiça.

Ocorre, então, a evidência da necessária complementação entre a moral e o direito.

5 Conclusão

Em vista dos argumentos apresentados, é possível ressaltar que na antiguidade o domínio das habilidades do homem afetava superficialmente a natureza das coisas, isto é, suas habilidades eram eticamente neutras. Ademais, restou ressalvado que a ética tradicional é antropocêntrica e que a entidade “homem” e sua condição fundamental significava constante quanto a sua essência, não sendo ela própria objeto da arte reconfiguradora. Outrossim, o agir evidenciava-se na ação, seja na própria práxis ou em seu alcance imediato – jamais requeriam alcance a longo prazo.

Nesses termos, pode-se afirmar que na antiguidade a natureza não era objeto de responsabilidade humana. A ética tradicional dizia respeito somente às relações imediatas, de modo que a realização ou violação do bem humano ocorreria sempre no presente, isto é, ninguém seria julgado responsável pelos efeitos involuntários posteriores de um ato bem- intencionado, bem-refletido e bem-executado.

As mudanças tecnológicas e as transformações que o homem gerou na natureza, no entanto, trouxeram a necessidade da instauração de uma ética de responsabilidade a longo alcance, em respeito aos seres humanos não nascidos. Conclui-se que a nova ética precisa encontrar sua teoria, na qual se fundamentam deveres e proibições. Para isso, deve-se pensar em qual o valor do futuro no presente.

Ainda, verifica-se que os fundamentos da nova ética, suas perspectivas e as exigências do novo agir, são questões que pertencem à doutrina dos princípios da moral e à doutrina de sua aplicação. É fundamental a existência de um princípio inteligível, que gere influência sobre o bem e a necessidade próximos; no entanto, para que isso ocorra, é necessário conhecer a verdade relacionada a acontecimentos futuros extrapoláveis do homem e do mundo, avaliar as consequências certas, prováveis ou possíveis dos atos humanos.

Por fim, conclui-se que obter uma projeção do futuro (imaginar os males que podem estar sendo causados) é um dever, ainda que introdutório, da nova ética almejada. O dever seguinte se dá pela disposição de se deixar afetar, se solidarizar, com as gerações

37BARRETTO, Vicente de Paulo. O Fetiche dos Direitos Humanos e outros temas. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. p. 171-172.

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XI Semana de Extensão, Pesquisa e Pós-Graduação - SEPesq Centro Universitário Ritter dos Reis

XI Semana de Extensão, Pesquisa e Pós-Graduação SEPesq – 19 a 23 de outubro de 2015

vindouras. Esta é uma obrigação prática, perante a posteridade de um futuro, a fim de possibilitar a existência de um mundo digno para as próximas gerações. Para que isso ocorra, é necessária uma mudança paradigmática que atinja o padrão social de toda comunidade.

Referências

ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de filosofia. 3.ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998.

ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. Tradução: Edson Bini, São Paulo: Edipro, 2002.

BARRETTO, Vicente de Paulo. O Fetiche dos Direitos Humanos e outros temas. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010.

JONAS, Hans. O Princípio Responsabilidade: Ensaio de uma ética para a civilização tecnológica. Tradução: Marijane Lisboa, Luiz Barros Montez. Rio de Janeiro: Contraponto, 2006.

KANT, Immanuel. Fundamentação da Metafísica dos Costumes.Tradução: Paulo Quintela.

Lisboa: 70 Textos Filosóficos, 2007.

RACHELS, James. Os Elementos da Filosofia da Moral. Tradução: Roberto Cavallari Filho.

São Paulo: Manole, 2006.

WALDMAN, Ricardo Libel. Ética Clássica, Ética Ambiental e Direitos Humanos. In: Revista da Faculdade de Direito Ritter dos Reis, v. 1. p. 73-86, 2006.

Referências

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