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Sumário. Tribunal da Relação de Évora Processo nº 1308/20.4T8FAR.E1. Relator: MANUEL BARGADO Sessão: 23 Setembro 2021 Votação: UNANIMIDADE

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Tribunal da Relação de Évora Processo nº 1308/20.4T8FAR.E1 Relator: MANUEL BARGADO Sessão: 23 Setembro 2021 Votação: UNANIMIDADE

PROMOÇÃO E PROTECÇÃO DE CRIANÇAS REQUISITOS

MEDIDA TUTELAR SUPERIOR INTERESSE DA CRIANÇA

PROPORCIONALIDADE

Sumário

I - A escolha da medida de promoção dos direitos e proteção das crianças em perigo deve ser norteada, prioritariamente, pelos direitos e interesses da criança ou jovem, devendo ser aplicada a medida que, atendendo a esses interesses e direitos, se mostre mais adequada a remover a situação de perigo em que a criança ou jovem se encontra.

II - Na escolha da medida a aplicar deverá ainda ser dada prevalência àquelas que integrem a criança ou jovem na sua família, de forma a manter e

desenvolver os laços afetivos originais, promovendo e auxiliando, se

necessário, os progenitores a assumir e cumprir devidamente os seus deveres parentais, desde que essas medidas se mostrem adequadas a remover a

situação de perigo.

III – É totalmente injustificada a aplicação da medida de acolhimento

residencial a uma criança que, tendo embora atravessado um largo período de absentismo escolar, conseguiu no 3º período obter aproveitamento e transitar de ano, sabendo-se, ademais, que quando foi à escola revelou comportamento adequado, boa relação com os colegas de turma e com os professores.

IV – É desproporcionada a aplicação da referida medida a uma outra criança que, apesar de ter um elevado absentismo escolar, sofre de uma doença rara (síndrome de Klippel-Trenaunay), tendo a sua médica atestado que a criança não pode frequentar a escola por motivos de saúde, e pedido a realização de vários exames de imagiologia que se encontram em curso.

V – Em ambos as situações, a correção de alguns comportamentos dos

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progenitores, e seguramente um maior empenhamento da Segurança Social no apoio aos pais, nomeadamente na resolução dos problemas de saúde de que uma das crianças padece, procurando encontrar soluções que melhor se coadunem às suas necessidades, basta-se com a medida de apoio junto dos pais prevista na alínea a) do nº 1 do artigo 35º da LPCJP, sendo esta medida a que melhor prossegue os princípios orientadores da intervenção previstos no mencionado preceito, nomeadamente o interesse superior das crianças.

(sumário do relator)

Texto Integral

Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora I - RELATÓRIO

Em 08.06.2020 o Ministério Público instaurou o presente processo de

promoção e proteção a favor das crianças A…, nascido a 10 de dezembro de 2006, e D…, nascido a 24 de agosto de 2009, filhos de Na… e de C….

Em 06.07.2020 foi celebrado acordo de promoção e proteção, sendo aplicada a favor das crianças a medida de apoio junto dos pais.

Face à proposta da Segurança Social de alteração da medida para acolhimento residencial, foram os intervenientes notificados para apresentação de

alegações e prova.

Os progenitores apresentaram alegações e juntaram prova testemunhal e documental.

Foi realizado debate judicial com intervenção dos juízes sociais, após o que foi proferido acórdão com o seguinte dispositivo:

«Em face do exposto e ao abrigo do disposto nos arts. 35º/1 f), 49º e 50º/1 e 62º todos da LPCJP, procedendo à revisão da medida, decide-se alterar a medida de apoio junto dos pais, aplicando em sua substituição, a favor das crianças A… e D…, a medida de acolhimento residencial pelo prazo de um ano (sujeita a revisão semestral), devendo as crianças ser colocadas em instituição a indicar pela Segurança Social, devendo privilegiar-se instituição na zona do Algarve onde as crianças possam ser integradas conjuntamente, assegurando designadamente a frequência escolar e promovendo o acompanhamento da saúde física e psíquica das crianças.»

Inconformados com tal decisão, as crianças A… e D… e os progenitores Na… e C… interpuseram os respetivos recursos de apelação, cujas alegações

remataram com as seguintes conclusões (transcrição):

No recurso das crianças A… e D…:

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« I. Vem o presente recurso interposto do douto acórdão dos autos, proferido pelo Juiz 2- Juízo de Família e Menores de Faro, do Tribunal Judicial da

Comarca de Faro, com intervenção de um Juiz e dois Juízes Sociais, no âmbito do Processo de Promoção e Protecção n.º 1308/20.4T8FAR que, nos termos da fundamentação nele constante, decidiu aplicar aos menores A… e D…, a

medida de acolhimento residencial, nos termos do disposto no art.º 35.º, n.º 1, al. f), 49º e 50.º, n.º 1 e 62.º todos da Lei de Protecção de Crianças e Jovens em Perigo.

II. O presente acórdão recorrido foi proferido na sequência da instauração do processo de promoção e protecção a favor das mencionadas crianças, com base em absentismo escolar e negligência parental e que os progenitores incumpriram com o acordo celebrado em 06.07.2020.

III. Tendo, em face dos factos dados como provados, e da respectiva motivação, vindo o douto tribunal a quo a considerar que “tendo o tempo presente que tempo da criança não corresponde ao tempo do adulto entendemos que não podem os menores Dário e André continuar a ser negligenciados e à espera que os progenitores decidam assumir as suas responsabilidades enquanto pais. As crianças precisam de uma resposta que permita redes fazer de forma adequada às suas necessidades retirando as da situação de perigo em que se encontram (art. 3º/1 e 2 c) da LPCPJ). Nem esteira das outras alegações do Ministério Público em sede de debate judicial consideramos adequada por profissional em consonância com o interesse da criança a proposta da técnica da segurança social de substituição da medida de apoio junto dos pais pela medida de acolhimento residencial porquanto não existe resposta protetiva ao nível da família”

IV. Salvo mui douta e melhor opinião, o recorrente entende ter sido violado o disposto no artigo 69° da CRP e artigos 3°, n°1, 4°, alíneas a), h) e g) todos do LPCJP, dos n°s 5 e 6 do artigo 36°, o n° 1 do artigo 67°; e artigo 9° da

Convenção sobre os Direitos da Criança, em face da prova realizada em sede de debate judicial, impondo, assim, decisão diversa da recorrida.

IV. O Tribunal “a quo” considerou que, os progenitores não assegurem

cuidados essenciais aos filhos e que o registo dos progenitores é pautado pela desorganização pessoal, disfuncionalidade do agregado e falta de colaboração com as entidades…”

V. E que, a alteração da medida para apoio para junto da irmã Jéssica não salvaguardaria o interesse superior do A… e D…, simplesmente porque a mesma faz parte do agregado familiar e não contribuiu para a sua resolução nem facilitou os contactos com os progenitores quando tal lhe foi solicitado pela técnica da segurança social.

VI. Não foi explorada nem dado oportunidade a que a irmã Jéssica pudesse

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assumir a responsabilidade pela educação e saúde dos seus irmãos.

VII. Ora, ainda se admitindo que pudesse não estar ainda dominada a situação de absentismo escolar em que se encontravam os menores, resulta dos

relatórios e depoimentos revelados nos autos, que as execuções de atos materiais atinentes às entidades envolvidas poderão não ter sido de molde a esgotar e a sensibilizá-los para o papel mais adjuvante da sua intervenção, mais do que controlador, por forma a levá-los a aderir ao projecto global traçado.

XI. Nesta senda, entende-se que a medida de apoio junto aos pais se deveria manter ainda com carácter temporário ou a eventual alteração da medida para apoio junto da irmã Jéssica, por forma poder atender tais interesses e direitos das crianças.

XII. Mostrando-se ainda ser a única necessária e adequada à situação e perigo em que se encontram no momento da decisão.

XIII. Nesta senda, somos de crer, que deveria ser proferida diversa decisão, no sentido de ser mantido o apoio junto dos pais ou eventual alteração da medida para apoio junto da Irmã J…, prevendo obrigações para os serviços técnicos de acompanhamento e para os pais, que reforcem e melhor possam dotar os

progenitores em vista a uma futura medida na comunidade, auscultando e desbloqueando de forma cabal as dificuldades na compreensão, porque estas se parecem verificar, sobre as necessidades dos seus filhos.

XIV. Mostrando-se, assim, a medida de acolhimento residencial, ora aplicada, excessiva e desproporcional, em face dos princípios orientadores da

intervenção, previstos no art.º 4.º da Lei n.º 147/99, de 01/09, mormente o interesse superior das crianças, e os princípios basilares da intervenção mínima, da proporcionalidade e actualidade, da responsabilidade parental e da prevalência da família.

VIII. A intervenção pública na educação dos filhos é, em qualquer caso, subsidiária, não podendo contrariar o primado em matéria de educação e manutenção dos filhos conferido constitucionalmente aos pais ou o princípio segundo o qual os filhos não podem, à partida, ser separados dos pais.

IX. Surge assim como “ultima ratio”, uma decisão judicial que ordene a separação dos filhos dos pais.

X. Perante uma situação carecida de intervenção para promoção e proteção, a medida de “Apoio junto dos pais” não deverá ser desde logo descartada,

passando-se para medida de acolhimento institucional, quando, à data da decisão, seja manifesto um esforço continuado de reorganização por parte dos progenitores quanto à assiduidade escolar e saúde dos filhos.

XI. Os princípios a que obedece a intervenção para a promoção dos direitos e protecção da criança e do jovem em perigo, encontram-se previstos no art. 4º,

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destacando-se, em primeiro lugar, o interesse superior da criança e do jovem (cfr. a al.a)).

XII. Depois, entre outros, haverá que ter em consideração, por um lado, o princípio da proporcionalidade e actualidade, nos termos do qual a

intervenção deve ser a necessária e adequada à situação concreta de perigo no momento em que a decisão é tomada, só podendo interferir na vida da criança ou do jovem e na da sua família na medida do que for estritamente necessário a essa finalidade (cfr. a al.e)).

XIII. E, por outro lado, os princípios da responsabilidade parental e da

prevalência da família, segundo os quais a intervenção deve ser efectuada de modo que os pais assumam os seus deveres, devendo ser dada prevalência às medidas que integrem a criança ou o jovem na sua família (cfr. as als.f) e g)).

XIV. A tutela constitucional conferida nos arts. 67º e 68º da CRP ao

relacionamento entre pais e seus filhos e ao papel decisor que aqueles devem ter no desenvolvimento e educação destes impõe o reconhecimento de direitos e interesses juridicamente tutelados dos próprios pais no âmbito deste

relacionamento familiar.

XV. Uma decisão que interfira nesse relacionamento, retirando os filhos à guarda dos pais, excluindo ou limitando a supervisão destes sobre a educação e o desenvolvimento dos filhos, constitui afectação daqueles direitos

constitucionalmente tutelados, pelo que só se poderá revelar como legítima em circunstâncias excepcionais.

XVI. E a própria Constituição, no seu art. 69º, logo legitima tal tipo de

intervenções, designadamente quando se torne necessário proteger a própria criança contra todas as formas de abandono, de discriminação e de opressão e contra o exercício abusivo da autoridade na família e nas demais instituições.

XVII. É no desenvolvimento destes princípios que o art. 3º da Lei de Protecção de Crianças e Jovens em Perigo prevê a intervenção dos organismos

adequados da comunidade, nomeadamente os tribunais, sobre a dinâmica funcional da família “quando os pais (…) ponham em perigo a sua segurança, saúde, formação, educação ou desenvolvimento (…)”.

XVIII. A medida de protecção aplicada, de acolhimento dos menores junto de instituição adequada, revela-se precipitada e desproporcionada.

XIX. Não sendo a única medida adequada para afastar os riscos identificados sobre a educação e saúde dos menores nesta fase.

XX. O interesse da criança (ou jovem) constitui o parâmetro material básico de qualquer política de protecção de crianças e jovens.

XXI. Não se justifica a medida de promoção de protecção de acolhimento em instituição a menor (de 16 anos de idade) cuja educação, formação e

desenvolvimento não se encontram gravemente comprometidas, como é o caso

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dos autos.

XXII. O artigo 35º da Lei nº 147/99, de 1.9, deve ser lido de modo integrado, alternativo e no sentido crescente de gravidade, não sendo obviamente por mero acaso ou má leitura do legislador que a parentalidade – consanguínea ou adoptiva – assume o primeiro lugar entre as medidas – provisórias ou

definitivas – de promoção e protecção das crianças e jovens em risco.

XXIII. Conforme consagra o nº 1 do artigo 3º da Convenção sobre os Direitos da Criança – todas as decisões relativas a crianças, adoptadas por instituições públicas ou privadas de protecção social, por tribunais, autoridades

administrativas ou órgãos legislativos, terão primacialmente em conta o interesse superior da criança (cf. alínea a) do artigo 4º da Lei nº 147/99, de 1/9; e nº 2 do artigo 1978º do CC).

XXIV. E sabendo nós que o “superior interesse da criança”, enquanto conceito jurídico indeterminado, carece de preenchimento valorativo, cuja

concretização tem que acolher e respeitar o quadro constitucional que lhe confere um conjunto de direitos e vincula o Estado a protegê-lo, visando o seu desenvolvimento integral.

XXV. A institucionalização como ultima ratio das medidas de promoção e protecção só deve ser aplicada em casos extremos e quando nenhuma das outras é adequada à remoção do perigo e à salvaguarda dos direitos das crianças e que a aplicação da medida de apoio junto de outros familiares – ainda que irmã Jéssica– é muito mais saudável para as menores, desde que o tribunal encontre mecanismos preventivos à exposição das crianças a

qualquer conduta potencialmente perigosa.

XXVI. O meio familiar AINDA QUE PRÓXIMO tem virtualidades para o são e normal desenvolvimento das crianças que a melhor das instituições de

acolhimento não consegue dar.

XXVII. Em 16.07.2021, a progenitora dos ora recorrentes teve acesso à ficha informativa do menor A…, com a informação de que o menor transitou para o 7º ano de escolaridade.

XXVIII. O documento que ora se requer a junção é superveniente, tendo apenas sido emitido pelo equipamento socioeducativo em 09.07.2021 e entregue para conhecimento da mãe dos menores em 16.07.2021, após a leitura da sentença. (Doc. n, º 1.)

XXIX. Do teor do documento extrai-se que o menor transitou de ano letivo e que melhorou em termos de assiduidade e, deste modo conseguiu obter aproveitamento positivo.

XXX. Nestes termos, e nos mais de Direito, e porque se entende que ainda é possível a aplicação de uma medida que permita a prevalência na família, deverá ser alterada a medida para a medida de apoio junto da família natural

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destes menores, com reforço da intervenção junto dos pais, ou eventualmente a irmã Jéssica, continuando esta medida a servir as finalidades das Medidas de Promoção e Protecção, revogando-se a medida ora aplicada

XXXI. Porquanto a medida determinada no douto acórdão, deve ser revogada e substituída pela medida de apoio junto aos pais ou eventualmente da irmã Jéssica, assim protegendo e salvaguardando o desenvolvimento integral dos menores, e o seu superior interesse e deve ainda ser deferido a junção aos autos do documento superveniente, junto sob Doc.1, assim fará este

Venerando Tribunal a devida JUSTIÇA que se pede e espera!»

No recurso dos progenitores:

1ª – Vem o presente recurso interposto da douta decisão proferida nos autos que - procedendo à revisão da medida de promoção e proteção de apoio junto dos pais, ora recorrentes – aplicou em substituição da mesma, a favor de

ambos os menores, irmãos, a medida de acolhimento residencial pelo prazo de um ano.

2ª – Os progenitores não se conformam com esta decisão que consideram injusta e desadequada.

3ª – Os Recorrentes requerem a junção aos autos de um documento, ao abrigo do disposto nos artigos 651º, nº1 e 425º, ambos do CPC.

4ª – Trata-se de documento que não foi possível juntar antes, mas que entendem ser da maior relevância para a boa decisão da causa.

5ª – É, mais concretamente, a ficha informativa do 3º período, emitida pela Escola D. Afonso III, em Faro, respeitante ao menor A….

6ª – Contrariando a fundamentação da douta sentença sub judice, que afirma que a prorrogação da medida de apoio junto dos pais “apenas serviria para comprometer mais um ano escolar destas crianças”,

7ª – Este documento demonstra que o menor A… transitou de ano escolar, conseguiu obter aproveitamento positivo e recebeu os parabéns do Diretor de turma pela transição para o 7º ano de escolaridade.

8ª – Os fundamentos que alicerçaram a alteração da medida de apoio junto dos pais relativamente ao menor A… estavam incorretos e a medida de apoio junto dos pais não comprometeu o ano escolar do A….

9ª – Aliás, com o pouco apoio que tiveram, conseguiram que o A… transitasse de ano escolar e obtivesse os parabéns por isso.

10ª – Contata-se que o menor A… não se encontra em situação de perigo.

11ª – O outro fundamento da intervenção e da aplicação de uma medida de promoção e proteção em Julho de 2020 relativamente ao menor A… tinha sido a necessidade de promover o apoio psicológico necessário para que o mesmo se integrasse melhor na escola.

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12ª – Acontece que só na semana anterior ao debate judicial foi marcada uma consulta de Psicologia para o A….

13ª – O apoio psicológico prometido um ano antes nunca aconteceu.

14ª – Os Recorrentes não se conformam, desde logo, com o julgamento da matéria de facto.

15ª – Requerem que seja alterado o ponto 25) dos factos dados como provados face à prova documental produzida.

16ª – Devendo dar-se como provado o conteúdo da Ficha Informativa elaborada pela Escola que o menor frequenta, que é completamente divergente do que consta desse ponto da matéria dada como provada.

17ª – Requerem a alteração dos pontos 29) e 36) da matéria de facto dada como provada.

18ª – A prova dos factos constantes desses pontos sustentou-se nas declarações da Técnica da Segurança Social, Dra. V….

19ª – Não foram valoradas as declarações que a progenitora prestou relativamente a essa matéria e que justificavam a situação.

20ª – Aliás, não foi feita qualquer apreciação crítica ao seu depoimento, no qual refutou tais factos.

21ª – O depoimento da progenitora não foi devidamente valorado.

22ª – Igualmente, deviam ter sido dados por provados os factos resultantes do depoimento da progenitora quanto à compra dos óculos para os filhos, nessa parte refutando também as declarações da Técnica da Segurança Social.

23ª – Não foi valorado o depoimento da progenitora na matéria respeitante à marcação das consultas para o menor D… num Hospital Privado e, depois, no Hospital de Faro.

24ª – Nem que os progenitores trataram da marcação destas consultas

sozinhos e sem qualquer apoio ou intervenção da Segurança Social, apesar de isto lhes ter sido prometido.

25ª – Os documentos médicos juntos aos autos confirmam as declarações da progenitora.

26ª – Não foi valorado, nem sequer referido na decisão recorrida, um documento médico junto pelos progenitores nas suas alegações.

27ª – Trata-se de um atestado médico respeitante ao menor D…, comprovativo de que o mesmo estava a ser seguido clinicamente, que tem consultas médicas agendadas (pedidas pelos progenitores 4 meses antes!) e que,

28ª – Além disso, tem indicação médica para só regressar à escola depois de a situação de doença estar resolvida.

29ª - Não foi valorado o depoimento da assistente social do CAFAP de Faro, S…, na parte em que referiu que os pais estão cientes da importância da escola.

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30ª - Igualmente não foi valorado o depoimento de J…, primo dos menores, que atestou o bom ambiente familiar na casa dos menores, considerando a mãe “muito agarrada aos filhos”.

31ª - O mesmo aconteceu relativamente ao depoimento da testemunha T…, sobrinha dos progenitores e prima dos menores. Esta testemunha relatou que pais e filhos são muito unidos.

32ª - Igualmente não foi valorado o depoimento do progenitor, nomeadamente na parte em que refere que em casa há muito amor e respeito.

33ª - E que considera que a escola é importante para toda a gente e que quer que os filhos vão à escola.

34ª - Todos estes depoimentos deviam ter sido valorados e os factos dados como provados, por serem relevantes para a boa decisão da causa,

35ª - Nomeadamente para prova da existência de relações afetivas estruturantes de grande significado e de referência para o saudável desenvolvimento dos menores.

36ª - Os progenitores não se conformam, igualmente, com o julgamento da matéria de direito.

Com efeito,

37ª – Consideram que os menores não se encontram em situação de perigo.

38ª – E que não se encontra atualmente legitimada a intervenção para promoção e proteção destas crianças.

39ª – A medida de acolhimento residencial decretada fundamenta-se no facto de “as crianças estarem a ser gravemente negligenciadas na sua escolaridade e saúde”.

40ª – Que há falta de acompanhamento médico por culpa dos pais.

41ª – Que o menor A… apresenta grandes dificuldades de integração e socialização.

42ª – O Tribunal “a quo” valorou excessivamente as declarações da Técnica da Segurança Social, Dra. V…, quanto à questão da escola do A….

43ª – Acontece que as informações dadas pela escola quanto ao

aproveitamento do menor e ao seu comportamento infirmam as declarações da Técnica,

44ª – Que, no que a esta questão diz respeito, fez um mau trabalho e transmitiu ao Tribunal informações incorretas.

45ª – Também relativamente à saúde do A… nada existe nos autos que permita afirmar que o menor tem algum problema de saúde.

46ª – Nem os professores referem tal, nas informações juntas aos autos.

47ª - E, muito menos, que para resolver algum eventual problema que, diga- se, se desconhece, tenha que estar em acolhimento residencial, retirado aos seus pais e, numa idade tão jovem, a viver com pessoas que não conhece.

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48ª – O menor A… não se encontra em situação de perigo, pelo que a medida de promoção e proteção que lhe foi aplicada deverá, de imediato, ser extinta.

49ª – Relativamente ao menor D…, de 11 anos de idade: mal andou o Tribunal a quo ao retirar o menor do seu meio natural de vida, onde é amado e

acarinhado, para o colocar numa Instituição,

50ª – Sem cuidar de saber quais as consequências que esse choque emocional poderá ter na sua saúde,

51ª – Tendo em conta a doença rara de que padece.

52ª – Este menor também não está em perigo.

53ª – Os autos contêm atestados de dois médicos que referem que o menor só poderá frequentar a escola depois de ter a situação de saúde resolvida.

54ª – Também constam dos autos os documentos comprovativos de que o menor está a ser sujeito a diversos exames médicos e consultas que os pais marcaram (com dificuldade em ano de pandemia).

55ª – A Segurança Social nada fez relativamente à doença deste menor, doença que parece ignorar por completo.

56ª – Apenas marcaram uma consulta de psicologia, que nada tem a ver com a doença grave da criança.

57ª – O Tribunal “a quo” preferiu sustentar-se apenas no depoimento da Técnica da Segurança Social, que aparenta pouco trabalho ter feito, quer no que toca à investigação sobre a situação escolar do A…, quer no que toca às verdadeiras necessidades clínicas do D….

58ª – As informações dos professores dos menores quanto ao seu

comportamento e cumprimento das regras, aspeto cuidado, etc., foram totalmente desvalorizadas.

59ª – Os testemunhos dos familiares dos menores quanto aos laços de afetividade e respeito que ligam os membros do agregado, também.

60ª – O Estado acusa os pais de não terem cumprido o acordo de promoção e proteção.

61ª – O Estado também não o cumpriu na íntegra.

62ª – Não garantiu o apoio em contexto escolar.

63ª – Não articulou com o Centro de Saúde as consultas de que o Dário necessitava.

64º - Marcou para o menor A… uma consulta de psicologia passado um ano de se ter comprometido a disponibilizar acompanhamento psicológico no decurso da medida.

65º - Foi violado o princípio da prevalência dos menores na família.

66º - Foi violado o interesse superior dos menores, quando não se atendeu à continuidade das relações de afeto de qualidade e significativas, que os menores têm em casa, com os pais e irmã.

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67ª - Foi violado o princípio da proporcionalidade e atualidade: no momento em que a sentença foi proferida, a medida de acolhimento residencial não era minimamente adequada à situação dos menores.

68ª - Foi decidido afastá-los de casa para os levar para a escola em período de férias, quando é certo que o A… transitou de ano escolar, vivendo em casa, com a família.

69ª – O A… não tem qualquer problema de saúde que imponha a sua saída de casa dos pais para ir ao médico.

70ª - Em casa os menores não correm qualquer perigo.

71ª - O D… está em exames e consultas de diagnóstico agendados pelos pais.

72ª - E não foi à escola por indicação médica. Há dois atestados médicos nos autos que o confirmam.

73ª - Foi clamorosamente violado o princípio do “primado da continuidade das relações psicológicas profundas”.

74ª - A medida decretada não respeita o direito destes menores à preservação da relações afetivas estruturantes de grande significado e de referência para o seu saudável e harmónico desenvolvimento (os pais, a irmã mais velha com quem têm laços profundos e a família próxima – tios e primos).

75ª – Julgando como julgou, violou a Mma. Juiz a quo o disposto nos artigos 3º e 4º, alíneas a), e), g) e h) da Lei de Proteção de Crianças e Jovens em Perigo.

Nestes termos, nos demais de direito aplicáveis e sempre com o mui douto suprimento de Vossas Excelências,

Deverá ser concedido provimento ao recurso ora interposto e, em consequência, deverá:

a) Ser admitida a junção do documento junto;

b) Ser revogada a douta decisão recorrida, decretando-se a extinção da medida de promoção e proteção por não existir situação de perigo relativamente aos dois menores; ou

c) Ser revogada a douta decisão recorrida, substituindo-se por outra que

ordene a prorrogação da execução da medida de apoio junto dos pais, em meio natural de vida, até se encontrar terminado o processo hospitalar em curso (e marcado pelos pais) de diagnóstico e tratamento da doença do menor D….»

O Ministério Público contra-alegou, sustentando o bem fundado da decisão recorrida, sintetizando assim a sua resposta:

«a) - Não há dúvidas de que as crianças necessitam acompanhamento médico, devido a vários problemas de saúde.

b) - Tudo indica que esses problemas dificultam a deslocação à escola, e, eventualmente, podem justificar a falta às aulas.

c) - Também não há dúvida de que os pais são “superprotetores” no sentido de

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que gostam dos filhos e têm muito afeto.

d) - Todavia, tomaram uma atitude de não colaboração com os técnicos e escola, os quais apenas tentavam o melhor para as crianças.

e) - As crianças correm riscos quanto á sua saúde e educação devido à falta de apoios (consultas e ajuda escolar).

f) - Apenas com a marcação do debate, e proposta a medida de acolhimento, os pais se preocuparam em marcar consultas; a que os filhos frequentassem a escola, etc.

(…)

O objetivo do processo de promoção e proteção é, precisamente esse: ajudar a tomar medidas para o bem-estar e proteção das crianças.

(…)

No caso dos autos, quer as diligências da escola; quer na CPCJ, quer após a propositura da ação; quer após a aplicação da medida de apoio junto dos pais, 6-7-2020, a situação sempre se manteve essencialmente a mesma.

(…)

Por tudo o exposto, o tribunal deliberou conforme factos junto aos autos e de modo mais adequado a proteger o interesse superior das crianças.

(…)

Com a medida de acolhimento residencial, as crianças, certamente, terão assistência médica que venha a ser adequada bem como acompanhamento escolar (quer na escola, ou na instituição, conf for julgado mais adequado).»

Corridos os vistos, cumpre apreciar e decidir.

II – ÂMBITO DO RECURSO

Sendo o objeto do recurso delimitado pelas conclusões das alegações, e sem prejuízo do que seja de conhecimento oficioso (arts. 608º, nº 2, 635º, nº 4 e 639º, nº 1, do CPC), as questões a decidir consubstanciam-se em saber:

- se deve ser alterada a decisão sobre a matéria de facto;

- se deve ser revogada a medida de acolhimento residencial pelo prazo de um ano (sujeita a revisão semestral) decretada pelo Tribunal a quo.

III – FUNDAMENTAÇÃO FÁCTICO-JURÍDICA

Na 1ª instância foram dados como provados os seguintes factos:

1 - As crianças A… e D…, respetivamente, a 10 de dezembro de 2006 e 24 de agosto de 2009 e são filhas de Na… e C….

2 - As crianças foram sinalizadas à CPCJ em janeiro de 2018, por absentismo escolar e negligência parental.

3 - A criança D… apresentava problemas de saúde crónicos e estava a

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aumentar de peso (fls 16 do processo apenso da CPCJ).

4 - Em 7/3/2018 a escola do Montenegro informa que é muito preocupante a situação do A… e irmão, que foram integrados em anos escolares que não correspondem aos devidos, por insistência da encarregada de educação, a qual, apesar das insistências da escola desde o início do ano letivo, não traz os documentos das escolas anteriores que os alunos frequentaram e não

comparece na escola nem justifica as muitas faltas que os alunos têm (fls. 14 processo da CPCJ).

5 - O A…apresenta grandes dificuldades de integração e socialização.

6 - Desde o início do processo que a CPCJ não conseguia contactar a

progenitora, por esta não atender as chamadas telefónicas e não comparecer nos atendimentos marcados.

7 - O CAFAP tinha igualmente dificuldades de comunicar com os pais de devido à sua falta de colaboração, não conseguia realizar a avaliação diagnóstica, apenas conseguindo marcar o primeiro atendimento em 14/12/2018 (fls. 55-A do P. CPCJ).

8 - Em 8/1/2019 foi celebrado acordo de promoção e proteção, sendo aplicada a favor do A… a medida de apoio junto dos pais, comprometendo-se estes a acompanhar o percurso escolar do A…, assegurar ao filho os cuidados de saúde, comparecer às consultas de psicologia ou outras consideradas necessárias e comprometendo-se o jovem a frequentar a escola com assiduidade, pontualidade e aproveitamento e a comparecer às consultas nomeadamente de psicologia (fls 58 a 60 do P. CPCJ).

9 - A família foi encaminhada para o CAFAP, Ação Social da Câmara Municipal de Faro e GAP.

10 - Os progenitores mostraram-se muito resistentes à intervenção, faltando às marcações de atendimento do CAFAP e da Ação Social, alterando a morada sem informar e não atendiam o telefone.

11 - Em outubro de 2019 informa que os menores nunca compareceram à escola desde o início do ano letivo, sendo o seu paradeiro desconhecido, constando que teriam alterado a sua morada para Faro (fls. 76 e 77 do P.

CPCJ).

12 - Em 18/12/2019 o Agrupamento de Escolas D. Afonso III dá conta de que o aluno A… veio transferido da Escola EB 2,3 do Montenegro e nunca

compareceu na escola, estando a encarregada de educação incontactável (fls.

83/84 do P. CPCJ).

13 - Em 20/1/2020 a CPCJ informa que há cerca de um ano que a família continua a não colaborar, tendo sido ultrapassado o prazo para elaboração do plano integrado de apoio à família, pelo que irá proceder à cessação do

processo (fls. 44 do processo da CPCJ).

(14)

14 - A CPCJ remeteu o processo para Tribunal em 11/3/2020, devido à falta de colaboração e incumprimento dos progenitores, que inviabilizou a intervenção.

15 - Segundo informação dos pais, emigraram para a Suíça em 2009/2010, tendo as crianças frequentado a escola nesse país até 2017, sem problemas de adaptação nem dificuldades de aprendizagem e quando regressaram a

Portugal não se conseguiram adaptar à escola, alegando terem tido

dificuldades em integrá-los por problemas burocráticos, porque os menores não falavam português e apesar de terem tido aulas de apoio a português, os menores começaram a criar resistência em ir para a escola.

16 - A criança D… nasceu com um angioma, tendo sido submetido a várias cirurgias na Suíça, não podendo apanhar sol e devendo ser seguido na especialidade (dermatologia).

17 - A criança D… também tem problemas de visão e uma perna mais curta que a outra, o que lhe causa dores e dificuldades de locomoção.

18 - Em 6 de Julho de 2020 foi celebrado nos presentes autos acordo de promoção e proteção, sendo aplicada a medida de apoio junto dos pais,

mediante as seguintes obrigações a cargo do progenitores: manter a habitação limpa e organizada; assegurar a comparência dos menores no equipamento sócio educativo com assiduidade e pontualidade, acompanhando o seu percurso escolar e acatando as orientações dos professores, contactando a escola pelo menos uma vez por mês; garantir apoio ao estudo às crianças em contexto escolar; assegurar acompanhamento psicológico às crianças; zelar pela sua saúde, nomeadamente do Dário, devendo comparecer com o mesmo nas consultas agendadas; acompanhamento do agregado pelo CAFAP visando o apoio psicossocial da família; colaboração com todos os técnicos

intervenientes na execução da medida (cf. fls. 40).

19 - Em 21 de Julho de 2020 a Diretora da Escola Básica Afonso III – EB/J1 do Carmo do Agrupamento de Escolas D. Afonso III – Faro informa o tribunal de que, perante a fuga à escolaridade das crianças desde 18 de novembro de 2019, a encarregada de educação não prestara qualquer informação/resposta a diversos contactos efectuados pelos docentes (fls. 42).

20- A professora titular da turma do menor D… informou em 20/7/2020 que o aluno, matriculado no estabelecimento de ensino desde 18/11/2019, nunca comparecera na escola, nem a encarregada de educação levantara os manuais escolares nem atendera as chamadas telefónicas (fls. 44).

21 - O menor D… ficou retido no 3º ano de escolaridade, por fuga escolar (fls.

44 verso).

22 - Segundo a progenitora, o D… recusa ir à escola, chegando a ficar doente, fazendo febre, episódios de vómitos, revelando muita angústia e quando o deixa na escola, o mesmo chora agarrado à mãe.

(15)

23 - No ano letivo 2020/2021, embora o menor A… tenha frequentado a escola, manteve um elevado absentismo escolar, sem que a progenitora justificasse as faltas, alegando sempre motivo de doença e situação pandémica.

24 - Quando foi à escola o A… revelou comportamento adequado, boa relação com os colegas de turma e com os professores.

25 - Devido ao elevado absentismo, não conseguiu atingir os objetivos escolares, tendo classificação negativa a quase todas as disciplinas[1].

26 - À técnica da Segurança Social o menor D… disse que sabe que tem de ir à escola, mas tem medo de que apareça alguém e lhe faça mal, enquanto que o menor André declarou que gosta de ir à escola e dos seus colegas de turma, mas tem faltado porque tem tido dores de cabeça.

27 - Em 30 de Dezembro de 2020 a técnica do SAT conclui no relatório que

«apesar de ter sido muito difícil a aderência à intervenção das entidades de primeira linha, verifica-se nos últimos dois meses uma evolução lenta, mas positiva, no que respeita à aceitação por parte da família das orientações dadas e cumprimento das mesmas».

28 - Em 24 de Fevereiro de 2021 a técnica do SAT informa que os progenitores mantêm a postura de não colaboração, não levando os menores à escola, não justificando as faltas, nem estabelecendo contacto com a escola, não

cumprindo as orientações dadas pelos técnicos do CAFAP, que marcavam atendimentos para iniciarem intervenção, nunca compareceram, havendo sempre uma desculpa para desmarcação, quando avisavam (fs. 49 verso).

29 - Os pais faltaram à primeira consulta no Gasmi a 24/2/2021.

30 - Em fevereiro de 2021 os menores não estavam a assistir às aulas on line (impostas pela pandemia), porque não tinham o devido material.

31 - No ano letivo 2020/2021 os menores repetiram o mesmo ano escolar pela terceira vez.

32 - A irmã J…, que havia verbalizado disponibilidade para colaborar com os técnicos, nunca atendeu nem devolveu as chamadas telefónicas realizadas.

33 - No relatório de 24/2/2021 a técnica do SAT propõe a medida de acolhimento residencial.

34 - Em 14 de Maio de 2021 o diretor de turma do menor A… informa que o aluno revelou no 2º período um elevado grau de absentismo, tendo muitas faltas, a maior parte injustificadas; e quanto ao aproveitamento, apresenta bastantes dificuldades, pouco participativo, tendo sido elaborado um plano de suporte à aprendizagem e à inclusão, no 1º período, o qual não foi

concretizado, devido ao elevado absentismo do aluno; quanto ao comportamento, foi considerado bastante satisfatório (fls. 59).

35 - Em 13 de Maio de 2021 a professora titular do menor D… informa que o aluno está em situação de abandono escolar, contabilizando então 115 faltas

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injustificadas (cf. extrato de faltas de fls. 62 a 64); estando matriculado no 3º ano de escolaridade pela terceira vez, revelando dificuldades de aprendizagem em todas as disciplinas, demonstrando imensas dificuldades na escrita,

compreensão de conceitos e na leitura, não tendo sido avaliado no 1º e 2º períodos por excesso de faltas (fls. 61).

36 - Foi marcada para o D… uma consulta de acompanhamento psicológico no Gasmi para o dia 24/2/2021, à qual faltou sem que os pais apresentassem qualquer justificação[2].

37 - O A… retomou a frequência escolar no dia 10 de maio de 2021, tendo a progenitora ido falar com o professor a 28 de maio para justificar a situação.

38 - Em 13 de Abril de 2021 existiu um episódio de urgência no CHUA para os dois menores, tendo o D… sido encaminhado para a pediatria geral, tendo comparecido à consulta de 24/6/2021, e para a fisiatria pediátrica, com consulta marcada para dia 3/8/2021.

39 - O CAFAP fez encaminhamento do A… para o GAP para consulta de psicologia, tendo sido marcada uma consulta para o dia 23/6/2021, à qual o menor não compareceu, alegando que estava cansado (o que verbalizou junto da técnica do SAT em 25/6/2021), enquanto que a progenitora por contacto telefónico com o CAFAP disse que o jovem estava doente.

40 - Foi marcada nova consulta para o dia 7/7/2021.

41 - O D… frequentou intermitentemente terapia da fala através do CAFAP, sendo muito pouco assíduo.

42 - Em 25/6/2021 foi agendada visita domiciliária conjunta (SAT e CAFAP), mas a progenitora enviou mensagem ao CAFAP a desmarcar, alegando que estava doente e tinha de ir ao hospital.

43 - Os técnicos deslocaram-se ao domicílio do agregado e após muita

insistência a tocar à campainha, a porta do prédio foi aberta e ao entrarem no prédio, estava o menor A… a descer as escadas e a justificar que a mãe tinha ido ao hospital, e face à intenção dos técnicos em falar com a irmã J… (maior de idade), com quem o menor disse que se encontrava, o menor tocou

insistentemente à campainha, mas ninguém abria a porta, justificando o menor que a J… estava a dormir e o D… estaria com os auriculares nos ouvidos, acabando os técnicos por ir embora.

44 - Naquela ocasião o menor A… apresentava-se muito ansioso, com agitação motora e tiques.

45 - Segundo informação obtida pela técnica do SAT, a progenitora não esteve na urgência do hospital no dia 25/6/2021.

46 - Os técnicos do CAFAP consideram que os menores são negligenciados pelos pais e estes mantêm o mesmo padrão de não colaboração com os serviços, aceitam marcar, mas acabam por desmarcar ou faltar, o que

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inviabiliza a intervenção, mantendo um arrastar da situação, concordando com a proposta (do SAT, mantida no relatório de 28/6/2021) de alteração da medida para acolhimento residencial.

47 - O agregado familiar dos menores é composto pelos progenitores, as duas crianças, a irmã J… (maior de idade) e o companheiro desta.

48 - Em julho de 2020 o progenitor estava desempregado, fazendo biscates (constando que recebia €900 por mês), enquanto a progenitora fazia duas horas de limpeza por semana (auferindo €69 por mês).

49 - Atualmente, é o progenitor quem sustenta o agregado, encontrando-se desempregados quer a J…, quer o companheiro, enquanto que a progenitora faz algumas limpezas.

50 - Vivem em casa arrendada, sendo que em julho de 2020 a renda era €600 por mês, tendo três rendas em atraso, na sequência do que acordaram com o senhorio um plano de pagamento faseado.

51 - Em 3/6/2020 (data de visita domiciliária) a higiene da habitação era deficitária e a casa estava muito desorganizada (com muitas caixas,

brinquedos e roupas acumuladas), situação que foi justificada pelo facto de estarem a pensar regressar à Suíça e estarem há poucos meses nesta casa.

52 - Os progenitores beneficiaram de apoio para pagamento da renda de casa de €400 por mês durante quatro meses, o que veio a cessar devido à sua falta de colaboração.

53 - A médica M…, que consultou o menor D… uma vez, atestou em 24 de Julho de 2021 que o menor D… não pode frequentar a escola por motivos de saúde (doc. de fls. 76 verso).

54 - A referida médica pediu a realização dos seguintes exames de imagiologia: coluna (filme extralongo, duas incidências), ecografia do abdómen superior e ecografia renal, constando da informação clínica da requisição dos exames «síndrome de Klippel-Trenaunay-weber: hemagiomas planos do hemicorpo direito, ectasias venosas e hipertrofia do hemicorpo (doc.

de fls. 77 verso).

55 - Encontram-se marcadas as seguintes consultas no Hospital de Faro para o menor D…:

- consulta de pediatria para o dia 24/7/2021, pelas 14 horas (doc de fls. 74).

- consulta de fisiatria pediátrica para o dia 3 de Agosto de 2021, pelas 14 horas (fls. 74 verso).

- consulta de pediatria geral para o dia 23/9/2021, pelas 16 horas, com a Drª M….

56 - O menor D… foi atendida no serviço de urgência do Hospital de Faro em 9/6/2021, pelas 20 44 h, tendo tido alta no dia 10/6/2021 pelas 00 47 h, com destino à ARS-Centro de Saúde (doc. de fls. 75).

(18)

57 - A progenitora foi atendida no serviço de urgência do Hospital de Faro em 17/6/2021, pelas 19 35 h, tendo tido alta dia 18/6/2021 pelas 2 21h, com

destino exterior não referenciado (doc. de fls. 75 verso).

58 - Em 22/6/2021 a progenitora assinou contrato terapêutico com o Gabinete de Apoio Psicossocial (fs. 76).

59 - Em 29/6/2021 a progenitora esteve no Centro de Saúde de Faro por motivo de ir a consulta (doc. de fls. 78 verso).

60 – (…).[3]

61 - Na sua audição no debate, os menores justificaram as faltas às aulas invocando problemas de saúde, o D… devido às dores na perna e o A… porque tem dores de crescimento e, outras vezes, diarreia e dores de cabeça,

referindo o D… que gosta da escola e quer regressar às aulas, enquanto o A…

declarou que nesta idade ninguém gosta de ir à escola, embora saiba que tem de ir.

62 - Os menores demonstram grande afeto e cumplicidade entre si.

63 – No agregado familiar das crianças A… e D… existe muito amor e respeito.

64 – Os progenitores do A… e do D… estão conscientes da importância da escola e querem que os filhos a frequentem.[4]

E foram considerados não provados os seguintes factos[5]:

1 - Cerca de uma semana após o nascimento do D… o seu irmão A… (à data com 2 anos e meio de idade) foi internado quase à beira da morte devido a uma infeção por salmonela.

2 - Passaram-se algumas semanas até lhe ser feita a análise e o diagnóstico, pois os médicos não suspeitaram logo da causa da infeção.

3 - Assim, foram realizados vários exames no hospital – que nada mostravam - até que foi descoberta a causa efeito, finalmente o tratamento que o salvou.

4 - Entretanto, a mãe compreensivelmente devastada pelo sofrimento, estava impedida de ver o filho.

5 - Com efeito, o A… estava em isolamento e as visitas da mãe foram

desaconselhadas por ter acabado de dar “à luz” o D… e este ser ainda muito pequenino.

6 - O A…, com dois anos, não percebia a ausência da mãe, mas o pai (pedreiro de profissão) passava os dias e as noites no Hospital acompanhando o filho, sempre que os médicos e enfermeiros o permitiam.

7 - Na verdade, o pai só se ausentava do Hospital para ir a casa tomar banho, comer e trocar de roupa.

8 - Nessas pequenas ausências do pai, era a irmã J… (cerca de 10 anos mais velha) que permanecia ao lado do irmão A…, para que este não ficasse sozinho

(19)

e para que o pai pudesse ir a casa mais descansado.

9 - O pai foi uns meses mais cedo para a Suíça, arranjou trabalho.

10 - No dia 4 de abril de 2010 (quando o A… tinha 3 anos e o D… 8 meses, tendo a J… 13 anos.

11 - A mãe viajou para a Suíça, sozinha com os 3 filhos, para se juntar ao marido que aí se encontrava a trabalhar e que tinha arrendado uma casa e todas as condições para que aí pudessem viver.

12 - Pouco tempo depois da chegada, o D… iniciou os tratamentos com as cirurgias a laser, nomeadamente nas partes mais visíveis do corpo (face e braço esquerdo).

13 - Uma vez que o pai tinha que trabalhar, poucas vezes pôde acompanhar a mulher.

14 - Assim, normalmente, nos dias dos tratamentos a mãe seguia para Lausanne com o bebé, acompanhada pela filha J….

15 - Acordavam de madrugada, às 04:00H, para poderem apanhar o comboio às 05:30H para Lausanne.

16 - Aqui chegadas, apanhavam o metro e seguiam ambas, com o bebé e sem perceberem bem a língua francesa, até ao Hospital CHUVE de Lausanne.

17 - Todo este trajeto demorava cerca de 1h30m, sendo que o D… era

esperado no Hospital por volta das 07H30 / 07h45m para realizar os exames de rotina e dar início à anestesia geral e cirurgia a laser.

18 - Quando iniciou os tratamentos, o D… ainda não tinha completado um ano de idade, sendo que as cirurgias – embora sob indicação médica –

representavam um risco para a sua saúde.

19 - Durante a cirurgia e no pós-operatório a preocupação da família era enorme.

20 - Quando deixava o seu bebé na anestesia geral a mãe ficava sempre com a angústia e a dúvida sobre se o voltaria a ver com vida.

21 - Isto porque a tensão arterial do D… “disparava” e atingia – como ainda hoje – valores muito acima do normal.

22 - Após várias cirurgias, realizadas ao longo de vários anos, o D… teve que parar.

23 - Nessa altura as partes mais visíveis do angioma (cara e braço) tinham sido tratadas e os médicos aconselharam a paragem por causa da

pigmentação da pele.

24 - Em 2017, após 7 anos na Suíça, a família tomou a decisão de voltar ao país natal para aqui continuar a tratar da saúde do D…, sobretudo na parte ortopédica.

25 - Em Portugal os Colegas de escola tinham uma atitude diferente e o D…

sentiu-se “posto de lado”, ou seja, marginalizado.

(20)

26 - Começou, então, a demonstrar desinteresse pela escola (mas não em relação à aprendizagem, pois é uma criança bastante inteligente).

27 - As suas maiores dificuldades são a compreensão e expressão oral uma vez que ele domina melhor a língua francesa que a portuguesa.

28 - Também as suas limitações físicas dificultam a escrita com rapidez e precisão.

29 - Dário suplicava para não ir para a escola. Começava ao anoitecer até adormecer, acordando nas manhãs seguintes com febre e diarreia que o impossibilitavam muitas vezes de estar longe da casa-de-banho.

30 - Só se acalmava perto do meio-dia, começando a família perceber que era o efeito psicológico do pânico e ansiedade que o D… sentia e com que

adormecia por ter que ir para a escola no dia seguinte.

31 - Apesar de o D… ser uma criança muito reservada, que muito raramente fala espontaneamente sobre aquilo que o incomoda ou o magoa.

32 - Uma vez, em conversa com a irmã J…, em língua francesa, o D… referiu que não gostava da maneira como uma senhora da escola olhava e falava com ele.

33 - Que mesmo os outros colegas chamavam a atenção, de forma negativa, para as manchinhas de angioma que o D… tem na cara e que se tornam mais escuras com o calor e o frio.

34 - Gozavam-no também, por ele não falar corretamente o português.

35 - Num dos contactos a Dra. V… disse à mãe que a consulta no psicólogo através do centro de saúde demoraria muito tempo, sugerindo que a mãe dissesse à médica de família que não valia a pena marcar pois seria melhor fazê-lo através da instituição CAFAP.

36 - Numa das visitas feita de surpresa a casa da família, a Dra. V…,

acompanhada pela Dra. S… da CAFAP, informou a mãe de que a consulta afinal era marcada através do centro de saúde e que esta iria ser contactada para receber informações dessa mesma consulta com o psicólogo.

37 - Passado algum tempo após a visita surpresa à casa da família, a mãe foi contactada pela Dra. V…, que lhe perguntou se estava tudo a correr bem.

38 - A mãe respondeu que não, e demonstrou o seu desagrado com a situação, pois achava que a maior parte das ajudas que tinham sido propostas pela Técnica não passaram de promessas.

39 - Pouco tempo após essa conversa telefónica a Dra. V… voltou a contactar a mãe, para a informar de que a consulta para o psicólogo, através do Centro de Saúde, estava marcada, tendo-a informado do dia e da hora.

40 - Não mencionou, contudo, que embora a consulta fosse marcada pelo centro de saúde, não aconteceria nesse local.

41 - A mãe apresentou-se no Centro de Saúde, no dia e hora da consulta, com

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o D….

42 - Contudo, não havia qualquer consulta aí marcada para ele.

43 - Só depois a mãe ficou a saber pela Dra. S… da CAFAP que a consulta era noutro local, nem sequer muito próximo.

44 - A progenitora não tem automóvel e o D… tem dificuldades de locomoção, pelo que seria muito difícil deslocarem-se para a consulta noutro local.[6]

45 - Na mesma conversa a mãe pediu, então, que fosse novamente marcada a consulta. A Dra. S… informou-a de que naquele momento já não era possível agendar.

46 - Relativamente à terapia da fala, a vez em que o D… faltou seria por estar com dores na coluna, tendo dificuldade em deslocar-se.

47 - A antiga casa que a família arrendara, perto da Escola D. Afonso III, ficava distante do local da terapia.

48 - A nova casa, que arrendaram no final de fevereiro de 2021, fica mais próxima do local, sendo mais fácil a deslocação.

49 - Também por pouca sorte, a casa que tinham arrendado, onde pagavam uma renda de €800 por mês e onde ficaram a viver apenas 5 meses, tinha problemas gravíssimos infiltrações e humidades que tinham sido ocultados pela proprietária.

50 - As infiltrações e o excesso de humidade e bolor existentes na casa provocaram várias constipações nos menores D… e A….

51 - A médica de família confirmou que nessas condições era normal as crianças adoecerem mais frequentemente e terem dificuldade em recuperar.

Da impugnação da matéria de facto

Como resulta do artigo 662º, nº 1, do CPC, a decisão do tribunal de 1ª

instância sobre a matéria de facto pode ser alterada pela Relação se os factos tidos como assentes e a prova produzida impuserem decisão diversa.

Do processo constam os elementos em que se baseou a decisão do tribunal de primeira instância sobre a matéria de facto e, considerando o corpo das

alegações e as suas conclusões, pode dizer-se que os recorrentes cumpriram formalmente, ainda que parcialmente, como veremos infra, os ónus impostos pelo artigo 640º, nºs 1 e 2, do CPC, pelo que nada obsta ao conhecimento do objeto do recurso nesta parte.

No que respeita à questão da alteração da matéria de facto face à incorreta avaliação da prova produzida, cabe a esta Relação, ao abrigo dos poderes conferidos pelo art. 662º do CPC, e enquanto tribunal de 2ª instância, avaliar e valorar (de acordo com o princípio da livre convicção) toda a prova produzida nos autos em termos de formar a sua própria convicção relativamente aos concretos pontos da matéria de facto objeto de impugnação, modificando a

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decisão de facto se, relativamente aos mesmos, tiver formado uma convicção segura da existência de erro de julgamento da matéria de facto.

Foi auditado o suporte áudio e, concomitantemente, ponderada a convicção criada no espírito do Tribunal a quo, espelhada na fundamentação da decisão de facto vertida na decisão recorrida.

Infere-se das conclusões dos recorrentes/progenitores que estes estão em desacordo com a decisão sobre a matéria de facto relativa ao ponto 25 dos factos provados, requerendo a sua alteração no sentido de que seja dado como provado «o conteúdo da Ficha Informativa elaborada pela Escola que o menor frequenta, que é completamente divergente do que consta desse ponto da matéria dada como provada».

Os recorrentes estão igualmente em desacordo com a decisão sobre a factualidade vertida nos pontos 29 e 36 dos factos provados, referindo que devia ter sido valorado o depoimento da progenitora, no qual a mesma explica as razões porque não compareceu com o D… na consulta de psicologia em causa, e que esta foi a única consulta agendada pela Segurança Social.

Mais aduzem que deviam ter sido dados como provados «os factos resultantes do depoimento da progenitora quanto à compra dos óculos para os filhos», assim como «à marcação das consultas para o menor D… num Hospital

Privado e, depois, no Hospital de Faro», e ainda que os «progenitores trataram da marcação destas consultas sozinhos e sem qualquer apoio ou intervenção da Segurança Social, apesar de isto lhes ter sido prometido».

Sustentam também os recorrentes que os documentos médicos juntos aos autos confirmam as declarações da progenitora, e não foi valorado um

atestado médico referente ao D… junto pelos progenitores nas suas alegações,

«comprovativo de que o mesmo estava a ser seguido clinicamente, que tem consultas médicas agendadas (pedidas pelos progenitores 4 meses antes!)» e que, «[a]lém disso, tem indicação médica para só regressar à escola depois de a situação de doença estar resolvida.»

Defendem, por último, que não foi valorado o depoimento do progenitor, nomeadamente na parte em que refere que em casa há muito amor e respeito e que considera que a escola é importante para toda a gente e que quer que os filhos vão à escola, assim como não foram valorados os depoimentos de três testemunhas que identificam.

Vejamos, pois, se assiste razão aos recorrentes/progenitores.

No referido ponto 25 foi dado como provado que devido ao elevado absentismo, o A… não conseguiu atingir os objetivos escolares, tendo classificação negativa a quase todas as disciplinas.

Ora, este facto é infirmado pela Ficha Informativa[7] elaborada pela Escola que o André frequenta – Agrupamento de Escolas D. Afonso III de Faro -, da

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qual resulta que o A… não só baixou significativamente o absentismo no 3º período escolar, como obteve classificação positiva a quase todas as disciplinas do 6º ano do ensino básico (2º ciclo), sendo que os únicos aspetos dos

domínios da apreciação global que não satisfizeram foram o sentido de responsabilidade e o domínio da língua portuguesa.

Seja como for, o desempenho do A… naquele período escolar – o mais recente – mereceu por parte da Escola a seguinte avaliação global: «[o] aluno neste terceiro período, melhorou em termos de assiduidade, e deste modo,

conseguiu obter aproveitamento positivo. Muitos parabéns pela transição para o 7º ano de escolaridade».

Assim, o conteúdo do ponto 25 dos factos provados deve ser eliminado, passando aí a constar o seguinte:

«25 - O A… no 3º período escolar do ano letivo de 2020-2021 melhorou em termos de assiduidade, e deste modo, conseguiu obter aproveitamento positivo, tendo transitado para o 7º ano de escolaridade».

Os pontos 29 e 36 dos factos provados, também objeto de impugnação por parte dos recorrentes, reportam-se à mesma realidade, isto é, o facto de os progenitores terem faltado à primeira consulta de acompanhamento

psicológico do D… no Gasmi no dia 24.02.2021, acrescentando-se no ponto 36 que a criança faltou sem que os pais apresentassem qualquer justificação, pelo que bastaria a existência deste ponto para abarcar a realidade em causa, sem necessidade do ponto 29.

Esta matéria foi dada como provada com base na informação da técnica da Segurança Social, V…, não tendo sido valorada a explicação dada pela

progenitora a este respeito, sendo certo que não foi feita qualquer apreciação crítica de tal depoimento que levasse à sua desconsideração.

Na verdade, no depoimento que prestou, a progenitora explicou por que não compareceu na consulta do psicólogo com o D…, referindo que se dirigiu com o mesmo ao Centro de Saúde por ter ficado convencida de que era lá, quando assim não era, esclarecendo que a Segurança Social não lhe forneceu a

morada correta e que a referida consulta era a cerca de 30 minutos a pé do Centro de Saúde.

Ora, não se vislumbram razões objetivas para ignorar o depoimento da progenitora a este respeito e dar como provado, sem mais, que os pais não apresentaram qualquer justificação para a não comparência do D… à referida consulta de psicologia.

Assim, altera-se o ponto 36, que passa a ter a seguinte redação:

«36 - Foi marcada para o D… uma consulta de acompanhamento psicológico no Gasmi para o dia 24/2/2021, à qual faltou, tendo a progenitora justificado

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tal falta com o facto de ter comparecido no Centro de Saúde por se ter

convencido que era aí a consulta e que a Segurança Social não lhe indicou a morada correta, sendo a consulta a cerca de 30 minutos a pé do referido Centro».

Em razão desta alteração eliminam-se os pontos 41, 42, 43 e 44 dos factos não provados.

Defendem também os recorrentes/progenitores que, com base no depoimento da progenitora, devia ter sido dado como provado que essa consulta de

Psicologia foi a única que a Segurança Social agendou para o D… num ano inteiro de duração da medida de apoio junto dos pais, quando é certo que se comprometeu com os pais (ponto 5 do Acordo de Promoção e Proteção) a garantir às crianças o acompanhamento psicológico.

Entendemos, porém, que se trata de matéria que nada acrescenta à boa decisão da causa, até porque em momento algum se alegou terem sido agendadas outras consultas daquela especialidade, sendo as demais considerações relevantes apenas em sede de discussão jurídica.

Dizem os recorrentes/progenitores que também não foi valorado o depoimento da progenitora que explicou que, na sequência do solicitado pela Técnica da Segurança Social, arranjou 3 orçamentos de óculos para os filhos e entregou- os nos serviços da Segurança Social e que mais tarde estes serviços voltaram a pedir-lhe os orçamentos, tendo a progenitora optado por comprar, ela

própria, os óculos para os filhos.

Ora, trata-se de matéria não contemplada na decisão de facto e não se

vislumbra em que é que a mesma possa acrescentar algo de relevante à boa decisão da causa.

O mesmo se diga, aliás, quanto às declarações da progenitora quando referiu que «o Centro de Saúde não deu andamento às coisas», e por esse motivo - após o episódio da consulta do psicólogo em 24/02/2021 – teve que recorrer a um Hospital Privado (Lusíadas) e pagar 100,00 € de consulta ao médico que acompanhara o Dário antes de a família ter emigrado para a Suíça, sendo este médico que, em Março de 2021, encaminhou os progenitores com o D… para o Hospital Distrital de Faro, onde ele próprio dá consultas de pediatria.

O que é relevante para a boa decisão da causa - independentemente de saber se isso ocorreu na sequência do aconselhamento do referido médico - é que a progenitora marcou as consultas médicas e exames a que se alude nos pontos 54 e 55 dos factos provados, resultando dos respetivos documentos que a convocatória para tais consultas, agendadas para junho e agosto de 2021, foi remetida aos progenitores no início de abril de 2021, sendo por isso

(25)

desnecessário adicionar essa factualidade ao elenco dos factos provados.

Dizem os recorrentes/progenitores que «não foi valorado, nem sequer referido na decisão recorrida», o «Atestado Médico de Doença passado pela médica de família do D… em 27/04/2021, comprovativo de que nesse dia o D… foi visto em consulta por “dor musculo-esquelética do membro inferior esquerdo”», tendo o D… «já sido visto no Serviço de Urgência duas semanas antes, no dia 13.04.221 e “está a aguardar consulta de ortopedia”. Por esse motivo não estava a frequentar as aulas desde o dia 13.04.2021. “Deverá regressar assim que a situação se encontre resolvida”.»

Ora, não corresponde à verdade que tal documento não tenha sido referido na decisão recorrida, pois deu-se como provado no ponto 53 que «[a] médica M…, que consultou o menor Dário uma vez, atestou em 24 de Julho de 2021 que o menor D… não pode frequentar a escola por motivos de saúde (doc. de fls. 76 verso)».

É quanto basta, sendo que o demais que consta do documento não tem de ser autonomizado num outro ponto da matéria de facto, bastando ler o documento e retirar daí as devidas consequências em sede de discussão jurídica.

Afirmam ainda os recorrentes que não foram valorados os depoimentos da assistente social do CAFAP de Faro, S…, na parte em que referiu que os pais estão cientes da importância da escola; da testemunha J…, primo dos

menores, que atestou o bom ambiente familiar na casa dos mesmos,

considerando a mãe muito agarrada aos filhos; da testemunha T…, sobrinha dos progenitores e prima dos menores, que relatou que pais e filhos são muito unidos.

Relativamente a estas testemunhas os recorrentes limitaram-se a referir

“momentos de gravação”, não especificando com exatidão as passagens da gravação em que fundam o seu recurso, nem sequer procederam à transcrição dos excertos que consideram relevantes, deixando assim incumprido o ónus a que alude a alínea a) do nº 2 do artigo 640º do CPC, o que implica a imediata rejeição do recurso nesta parte.

Já quanto ao depoimento do progenitor, relativamente ao qual cumpriram os recorrentes o mencionado ónus, não se vê razão para não valorar o mesmo, nomeadamente na parte em que refere que em casa há muito amor e respeito e que os progenitores consideram que a escola é importante para toda a gente e que quer que os filhos vão à escola.

Adita-se, assim, ao elenco dos factos provados dois pontos com a seguinte redação:

«63 – No agregado familiar das crianças A… e D… existe muito amor e respeito.»

(26)

«64 – Os progenitores do A… e do D… estão conscientes da importância da escola e querem que os filhos a frequentem.»

Por último, deu-se como provado no ponto 60 que «[e]m sede de debate

judicial, os progenitores assumiram uma postura de desresponsabilização dos próprios e responsabilização dos serviços, revelando incapacidade para

perceber e atender às necessidades dos filhos ao nível escolar e de saúde».

Ora, esta matéria reveste feição eminentemente conclusiva, sem que se concretizem os factos que suportam tal conclusão.

Assim, elimina-se o ponto 60 dos factos provados.

Julga-se, pois, parcialmente procedente a impugnação da decisão sobre a matéria de facto pelos recorrentes/progenitores, alterando-se aquela decisão em conformidade com o acima exposto e assinalando-se as respetivas

alterações no local próprio (factos provados e não provados).

Da medida de acolhimento residencial

Em conformidade com o disposto no artigo 36º, nºs 5 e 6, da Constituição da República Portuguesa, os pais têm o direito e o dever de educação e

manutenção dos filhos, sendo que estes não podem ser separados dos pais, salvo quando estes não cumpram os seus deveres fundamentais para com eles e sempre mediante decisão judicial. O princípio constitucional aqui

consagrado de que os filhos não podem ser separados dos pais não é,

evidentemente, um princípio absoluto, na medida em que comporta – como não poderia deixar de ser – as exceções que se revelem necessárias para assegurar os direitos das crianças, quando os pais não cumprem os seus deveres fundamentais para com os filhos e, por via desse incumprimento, não asseguram a necessária proteção e satisfação daqueles direitos.

E é nesse quadro que tem aplicação a LPCJP[8], que tem por objeto a promoção dos direitos e a proteção das crianças em perigo, de forma a

garantir o seu bem-estar e desenvolvimento integral, nas situações em que os pais, o representante legal ou quem tenha a guarda de facto ponham em perigo a sua segurança, saúde, formação, educação ou desenvolvimento, ou quando esse perigo resulte de ação ou omissão de terceiros ou da própria criança ou do jovem a que aqueles não se oponham de modo adequado a removê-lo (cfr. arts. 1º e 3º, nº 1, da citada lei).

De acordo com o disposto no artigo 34º da LPCJP, as medidas de promoção e proteção visam afastar o perigo em que se encontra a criança ou o jovem;

proporcionar-lhe as condições que permitam proteger e promover a sua

segurança, saúde, formação, educação, bem-estar e desenvolvimento integral

(27)

e garantir a recuperação física e psicológica das crianças e jovens vítimas de qualquer forma de exploração.

As várias medidas de promoção e proteção aplicáveis estão enunciadas no artigo 35º, nº 1, e a sua aplicação deve ter em conta os princípios orientadores que estão consignados no artigo 4º, dos quais destacamos os seguintes:

- Interesse superior da criança e do jovem – a intervenção deve atender

prioritariamente aos interesses e direitos da criança e do jovem, sem prejuízo da consideração que for devida a outros interesses legítimos no âmbito da pluralidade dos interesses presentes no caso concreto;

- Proporcionalidade e atualidade – a intervenção deve ser a necessária e a adequada à situação de perigo em que a criança ou jovem se encontram no momento em que a decisão é tomada e só pode interferir na sua vida e na da sua família na medida do que for estritamente necessário a essa finalidade;

- Responsabilidade parental – a intervenção deve ser efetuada de modo que os pais assumam os seus deveres para com a criança ou jovem;

- Prevalência da família – na promoção de direitos e na proteção da criança e do jovem deve ser dada prevalência às medidas que os integrem na sua família ou que promovam a sua adoção.

Daqui resulta que a escolha da medida a aplicar deverá ser norteada,

prioritariamente, pelos direitos e interesses da criança ou jovem, devendo ser aplicada a medida que, atendendo a esses interesses e direitos, se mostre mais adequada a remover a situação de perigo em que a criança ou jovem se encontra.

Na escolha da medida a aplicar deverá ainda ser dada prevalência às medidas que integrem a criança ou jovem na sua família, de forma a manter e

desenvolver os laços afetivos originais, promovendo e auxiliando, se

necessário, os progenitores a assumir e cumprir devidamente os seus deveres parentais, desde que essas medidas se mostrem adequadas a remover a

situação de perigo.[9]

No caso em apreço foi aplicada às crianças A… e D… a medida prevista no citado artigo 35º, nº 1, alínea f): acolhimento residencial.

Como se consigna no artigo 49º, n.ºs 1 e 2, da LPCJ, consiste ela “na colocação da criança ou jovem aos cuidados de uma entidade que disponha de

instalações, equipamento de acolhimento e recursos humanos permanentes, devidamente dimensionados e habilitados, que lhes garantam os cuidados adequados” e tem “como finalidade contribuir para a criação de condições que garantam a adequada satisfação de necessidades físicas, psíquicas,

emocionais e sociais das crianças e jovens e o efetivo exercício dos seus direitos, favorecendo a sua integração em contexto sociofamiliar seguro e promovendo a sua educação, bem-estar e desenvolvimento integral”.

(28)

Resta, pois, saber se tal medida é ou não a adequada e se estão ou não

verificados os requisitos de que depende a sua aplicação, tendo em atenção os princípios orientadores acima explanados.

Ora, face à matéria de facto provada e tudo o mais que se viu aquando da discussão sobre a alteração da matéria de facto, afigura-se-nos não estarem reunidos os pressupostos para que possa ser decretada a medida em causa.

Senão vejamos.

No que ao A… diz respeito, é inegável que o fundamento que presidiu à aplicação da medida se mostra de todo desajustado, considerando que no 3º período do ano escolar de 2020/2021 houve uma clara inversão no seu

percurso escolar, tendo o A… melhorado em termos de assiduidade,

conseguindo desse modo obter aproveitamento positivo, que lhe permitiu transitar para o 7º ano de escolaridade.

E quando foi à escola o A… revelou comportamento adequado, boa relação com os colegas de turma e com os professores (cfr. ponto 24 dos factos provados).

Ademais, não há qualquer indicação de problemas de saúde do A…, não resultando dos autos que algum médico tenha indicado que necessitava de consultar um psicólogo, pelo que há que relativizar a não comparência a uma consulta de psicologia agendada para o dia 23.06.2021, na sequência do encaminhamento feito pelo CAFAP para o GAP (cfr. ponto 39 dos factos provados).

E, como fazem notar os recorrentes/progenitores, a medida de apoio junto dos pais já estava em vigor desde 06.07.2020, sendo que nenhuma consulta foi anteriormente agendada por parte da equipa que se comprometeu a isso por parte do Estado.

Em suma, o A… não é uma criança em perigo, não podendo por isso manter-se a medida de acolhimento residencial aplicada.

Relativamente ao D…, embora a sua situação não seja tão linear como a do A…, existem vários aspetos que apontam também no sentido da não aplicação da referida medida.

O D… nasceu com um angioma, tendo sido submetido a várias cirurgias na Suíça, não podendo apanhar sol e devendo ser seguido na especialidade

(dermatologia) e tem também problemas de visão e uma perna mais curta que a outra, o que lhe causa dores e dificuldades de locomoção (cfr. pontos 16 e 17 dos factos provados).

Por sua vez, a médica que consultou o D… uma vez, atestou em 24 de Julho de 2021, que o mesmo não pode frequentar a escola por motivos de saúde, tendo pedido a realização de vários exames de imagiologia, constando da informação clínica da requisição dos exames «síndrome de Klippel-Trenaunay-weber:

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