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LUSO-BRASILlDADE EM CARLOS REVERBEL

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LUSO-BRASILlDADE

EM CARLOS REVERBEL

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LUIZ HENRIQUE TORRES'

RESUMO

Em sintonia com a posição de autores ligados à tendência historiográfica

luso-brasileira, Carlos Reverbel desenvolveu uma narração centralizada na

diretriz portuguesa e brasileira na formação histórica do Rio Grande do Sul.

Em seu ensaio

ONMLKJIHGFEDCBA

R a f a e l P in t o B a n d e ir a - h is t ó r ia p o p u la r d e u m f r o n t e ir a ,

Reverbel enfatizou o discurso do antagonismo entre as experiências

históricas luso-brasileira e platino-missioneira nas décadas de 1940-50,

período caracterizado pelo enfrentamento intelectual destas tendências

historiográficas. A interpretação desenvolvida pelo autor é a de que o Rio

Grande do Sul foi uma t e r r a d e n in g u é m incorporada à civilização pelas

emanações da organização político-administrativa luso-brasileira.

PALAVRAS-CHAVES: Historiografia; Rio Grande do Sul; luso-brasilidade.

1 -

A TENDÊNCIA HISTORIOGRÁFICA LUSO-BRASILEIRA

A tendência historiográfica luso-brasileira foi fundamentada por diversos autores a partir da década de 1920. De acordo com essa interpretação, a formação histórica sul-rio-grandense não foi marcada por influências de origem espanhola ou extralusitanas e seu enfoque básico é justificar que o Rio Grande do Sul, desde os primórdios, teve uma formação exclusivamente portuguesa, bem como os seus habitantes sempre estiveram em antagonismo com os interesses castelhanos. Mesmo com abordagens diferenciadas, em linhas gerais, o índio missioneiro esteve associado aos interesses espanhóis e antilusitanos, assim como as Missões eram consideradas como um corpo estranho ao contexto histórico rio-grandense.

Conforme Jorge Sallis Goulart1, a formação da sociedade

sul-rio-grandense caracterizou-se por uma luta contínua contra os jesuítas das Missões, no que foi acompanhado e referendado por Moysés

• Professor do Dep. de Bibliografia e História - FURG. Doutor em História do Brasil.

1 GOULART, Jorge Sallis. A f o r m a ç ã o d o R io G r a n d e d o S u l. Porto Alegre: Globo, 1927;

. H is t ó r ia d a m in h a t e r r a . Pelotas: Globo: Barcelos, Bertaso & Cia, 1928;

==.

Aspectos da formação rio-grandense. In: CONGRESSO DE HISTÓRIA E

GEOGRAFIA SUL-RIO-GRANDENSE, 2. A n a is . . . Porto Alegre: Globo, 1937.

v.3.

(2)

Velíinho", Othelo Rosa, Guilhermino Cesar e outros intelectuais. O enfoque luso-brasileiro também está contido nos escritos de João Pinto da Silva3

que considerava o domínio dos inacianos como lusófobo e marcadament~ espanholizante. Segundo João Borges Fortes, os jesuítas representavam interesses adversos

à

nacionalidade portuguesa, daí buscar legitimar a atuação dos bandeirantes, que teriam atuado por interesses "nacionalistas" não permitindo a presença espanhola no território rio-grandense. Assim' enquanto os bandeirantes representaram o espírito português, o nacionalismo, o amor

à

pátria e a defesa do Brasil, as Missões Orientais significaram o predomínio do espírito jesuítico, alardeando a simpatia

à

Espanha e promovendo o ódio para com Portugal.

A recorrência da busca da identidade nacional foi encaminhada pela historiografia do Rio Grande do Sul numa perspectiva diferenciada nas décadas de 1920-30. Esta perspectiva foi a da inserção do regional frente ao projeto nacional em andamento. A afirmação da brasilidade do rio-grandense está ligada

à

elaboração do conceito de "gaúcho brasileiro" entre intelectuais ligados

à

tendência historiográfica luso-brasileira, buscando, dessa forma, unificar o múltiplo, negar o conflito e construir a harmonia frente

à

formação histórica do Rio Grande do Sul. A partir de Jorge Sallis Goulart, e referendado pela tendência luso-brasileira, constata-se que afirmar nacionalmente os interesses regionais significa definir a nacionalidade do rio-grandense - o "gaúcho brasileiro" - que se contrapõe

à

belicosidade, ao expansionismo e

à

desordem caudilhesca do "gaúcho platino". O Rio Grande do Sul é o espaço da ordem e da disciplina, da conquista e manutenção de fronteiras para o Brasil. Conforme Souza Docca, João Borges Fortes, Othelo Rosa, Carlos Dante de Moraes, Moysés Vellinho e Guilhermino Cesar, o espírito da brasilidade chegou com os bandeirantes e prosseguiu com os lagunenses e açorianos. A história rio-grandense é repensada em direção

à

centralização político-administrativa

2 VELLlNHO, Moysés. Alguns traços sobre a evolução literária do Rio Grande do Sul. ln:

COUTO E SILVA, Morency do; PIRES, Arthur Porto; SCHIDROWITZ, Léo Jerônimo (orgs.).

ONMLKJIHGFEDCBA

R io

G r a n d e d o S u l: imagem da terra gaúcha. Porto Alegre: Cosmos, 1942; oApresentação. P r o v í n c ia d e S ã o P e d r o , Porto Alegre, Globo, n. 13, mar. 1949; o Gaúchos e beduínos

(resenha). P r o v í n c ia d e S ã o P e d r o , Porto Alegre, Globo, n. 13, mar. 1949; oO gaúcha

rio-grandense e o gaúcho platina. In: F u n d a m e n t o s d a c u lt u r a r io - g r a n d e n s e , Porto Alegre,

Faculdade de Filosofia da Universidade do Rio Grande do Sul, 1957. V. 2; oOs jesuítas

no Rio Grande do Sul. In: F u n d a m e n t o s d a c u lt u r a r io - g r a n d e n s e , Porto Alegre, Faculdade de

Filosofia da Universidade do Rio Grande do Sul, 1960. V. 4; o C a p it a n ia d 'E I R e i:

aspectos polêmicos da formação rio-grandense. Porto Alegre: Globo, 1964a; _.

Formação histórica do gaúcho rio-grandense. In: T e r r a e p o v o . Porto Alegre: Globo, 1964b;

___ o F r o n t e ir a . Porto Alegre: Globo, 1975.

3 PINTO DA SILVA, João. H is t ó r ia lit e r á r ia d o R io G r a n d e d o S u l. Porto Alegre: Globo, 1924,

___ oA P r o v í n c ia d e S. P e d r o : interpretação da história do Rio Grande. Porto Alegre: Globo,

1930a; oH is t ó r ia lit e r á r ia d o R io G r a n d e d o S u l. 2.ed. Porto Alegre: Globo, 1930b.

~5

BIBlOS, Rio Grande. 13:1 5 1 - 1 5 8 . 2 0 0 1 ,

brasileira. Nessa direção, os indígenas são curiosidades culturais e biológicas numa "terra de ninguém", e o contexto platino-missioneiro recebe uma abordagem enquanto "corpo estranho e antagônico

à

formação gaúcha". A descontinuidade histórica das populações indígenas e das Missões segue um ritual de passagem destituído de historicidade até a consolidação de uma continuidade histórica vinculada

à

formação luso-brasileira.

Numa interpretação da tendência luso-brasileira, constata-se que a constituição de uma identidade a partir da exclusão de outras identidades possíveis alia-se a uma narrativa historiográfica de recurso conjuntural e sincrônico. O passado, após sua remodelação, passa a ser um referencial de comportamento para o presente com base numa visão teleológica, ou seja, uma história já está definida, onde os agentes históricos são guiados por princípios inconscientes de brasilidade. Esta visão, em que homens e fatos singulares dominam o horizonte do historiador, harmonizando-se na confluência luso-brasileira, recorre a uma exposição fatual e voltada

à

exaltação de personalidades que se destacaram na consolidação deste universo. Se no plano teleológico esboça-se uma longa duração do processo histórico - colônia, império e república - que encontra sentido unificador na brasilidade, no plano histórico do acontecer percebe-se o recurso ao conjuntural e

à

curta duração dos atos heróicos que se eternizam enquanto síntese de modelo de ação a ser seguido por aqueles personagens cujo nome a história não registrou.

O acirramento do debate indicou que o "exclusivismo luso-brasileiro" estava sendo duramente questionado mesmo que em nível do personalismo, como a defesa de Sepé e dos mártires, e não de uma crítica mais ampla do processo histórico brasileiro e platino. A interpretação está direcionada ao "telurismo indígena" que sintetiza o amor

à

terra em que se vive, motivação não ligada

à

nacionalidade e sim a fatores psicossociais. Persiste o exercício de exclusão e de inclusão de elementos missioneiros e platinos na formação histórica do Rio Grande do Sul, quase sempre exemplificando com personagens ligados ou não a concepções de nacionalidade e persistindo como exemplo para gerações no presente.

Os enfoques discriminando a história missioneira da história rio-grandense, com polêmicas sobre a edificação de monumentos e o uso do nome de personagens definidos como inimigos do universo lusitano, expressam uma visão preconceituosa, muitas vezes racista, e a necessidade doutrinária de definir os limites investigativos e cercear outras explicações históricas. A ênfase na lusitanidade e brasilidade acaba sendo a fonte promotora de concepções reducionistas que recorrem a uma idéia estática de nacionalidade e um pressuposto teleológico no qual a natureza física e as ações psicossociais estão voltadas ao desenrolar de determinado acontecer histórico, numa realização do sobrenatural. Até a década de

BIBLOS, Rio Grande. 13:1 5 1 - 1 5 8 , 2 0 0 1 .

(3)

1970, concepções de história ligadas à reconstituição dos fatos isolados, dos exemplos individuais voltados à atuação nacionalista e patriótica, dos fatos irrepetíveis e singulares direcionados à realização de uma visão definida do acontecer histórico, persistem dominantes na historiografia rio-grandense. Uma abertura preferencial aos aspectos coletivos, sociais e cíclicos, os enfoques ligados à história econômica e demográfica, mentalidades coletivas e estruturas, estavam à margem do paradigma historiográfico tradicional que, frente à emergência de novas metodologias e concepções de história, promoveu a crise das explicações unicausais do passado histórico, fundadas no tempo linear e no progresso irrestrito, inerente à tendência luso-brasileira.

Ao longo da pesquisa comprovou-se a carência de estudos voltados a uma análise da fundamentação epistemológica da historiografia rio-grandense, um campo que exige uma reflexão sistemática dos pesquisadores. Várias questões inter-relacionadas com a problemática do lugar das Missões na historiografia do Rio Grande do Sul surgiram e foram abordadas com brevidade, exigindo novos estudos ligados aos campos da Antropologia, Sociologia e Teoria do Conhecimento. Como exemplo estão problemas relacionados à concepção de nacionalismo no ãmbito da teoria da história; a interpretação do positivismo e da escola metódica entre os intelectuais; os conceitos de raça e de inferioridade cultural no pensamento europeu e sua adaptação à formação histórica do Rio Grande do Sul; as novas abordagens e interpretações da história rio-grandense e missioneira a partir dos novos objetos e abordagens encaminhados na produção historiográfica posterior a 1975.

2 -

CARLOS REVERBEL E A LUSO-BRASILlDADE

o

jornalista Carlos Macedo Reverbel (1912-1997) exerceu o

jornalismo desde a década de 1930, trabalhando na revista

ONMLKJIHGFEDCBA

P r o v í n c ia d e S ã o P e d r o e no jornal C o r r e io d o P o v o . Publicou livros e dezenas de artigos

em jornais, com enfoques na formação territorial e política do Rio Grande do Sul.

Em

suas pesquisas voltadas à imprensa, Reverbel "empreendeu um passo significativo para a construção historiográfica da imprensa sul-rio-grandense".4

Reverbel não ficou alheio aos debates referentes às proximidades de experiências histórico-culturais com o Prata e às dificuldades de integração ao contexto brasileiro. A construção da identidade gaúcha, permeada por especificidades regionais, é inserida no projeto da brasilidade. Como redator

4AL VES, Francisco das Neves. A contribuição de Carlos Reverbel àconstrução historiográfiCa

acerca da imprensa sul-rio-grandense. R e v is t a d o I n s t it u t o H is t ó r ic o e G e o g r á f ic o d o R io G r a n d e d o S u l. Porto Alegre: IHGRS, n. 133, p. 116, 1998.

154

BIBlOS, Rio Grande, 13: 151·158, 2001.

da revista P r o v í n c ia d e S ã o P e d r o , publicação que entre 1945 e 1957, canalizou debates sobre a formação rio-qrandense," Reverbel foi participante nos debates entre o regional e o nacional. O lugar do Prata e das Missões jesuítico-guaranis expressam tematicamente situações de relativo confronto intelectual na edificação de visões de mundo legitimadoras de um processo civilizatório no passado e num projeto de integração nacional no presente.

No ensaio R a f a e l P in t o B a n d e ir a - h is t ó r ia p o p u la r d e u m f r o n t e ir o , Carlos Reverbel assume posições historiográficas típicas de um período de debates intelectuais que acarretou alguns enfrentamentos intelectuais em defesa de projetos para explicar a formação histórica rio-grandense.

Conforme o autor, Rafael Pinto Bandeira foi a figura mais representativa do drama de fixação da fronteira luso-brasileira: "ele bem representa o marco zero da formação brasileira no continente de São Pedro"s. Este símbolo da expansão lusitana merece, conforme o autor, o título de o p r im e ir o c a u d ilh o r io - g r a n d e n s e , subtraindo de Se pé Tiaraju essa titulação. Para Reverbel, que critica a posição de Manoelito de Ornelias e Mansueto Bernardi, favoráveis a Sepé Tiaraju, o índio missioneiro é um fenômeno isolado que sempre esteve "a serviço de interesses limitadíssimos e estranhos ao p r o c e s s u s luso-brasileiro". Sepé é identificado a uma figura solta na paisagem rio-grandense, pois não "atuava em função do processo tipicamente gaúcho, ou seja, do Rio Grande do Sul. Foi uma carga de lança frustrada, foi uma bandeira que se perdeu na retirada castelhana". Já Rafael Pinto Bandeira "representa o nosso lado nessa questão","

O antagonismo está expresso na polêmica do chefe missioneiro Sepé Tiaraju, na forma excludente do n o s s o la d o e o la d o d e le s . Reverbel, ao heroicizar as atuações militares de Rafael Pinto Bandeira, refere-se aos "gaúchos do campo", que são os soldados que seguem o caudilho, "é a eles que mais se deve a nossa reintegração no sistema colonial lusitano. Já era o Rio Grande exercitando os seus primeiros passos no sentido da unidade brasileira, vocação a que jamais traiu". O personagem é associado ao esforço de integração ao Brasil, representando a concretização desta aspiração' inerente aos rio-grandenses. Segundo Reverbel, quando Rafael Pinto Bandeira morreu, "foi-se o herói, mas ganhamos a unidade para sempre".

Desta forma, a identidade rio-grandense está ligada à formação histórica luso-brasileira, e os elementos espanhóis e missioneiros são corpos estranhos:

5 TORRES, Luiz Henrique. B r a s ilid a d e e a n t a g o n is m o : a tendência historiográfica

luso-brasileira (1927-1957). Rio Grande: Fundação Universidade do Rio Grande, 1998. p. 97-126.

6 REVERBEL, Carlos. Rafael Pinto Bandeira - história popular de um fronteiro. P r o v í n c ia d e S ã o P e d r a . Porto Alegre: Globo, n° 4, p. 141, 1946.

7Idem, p. 144.

8Idem, p. 148.

BIBlOS, Rio Grande, 13: 151·158,2001.

(4)

o

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Rio Grande não se formou do sul para o norte, ao sopro de influências platinas. Qualquer afirmativa neste sentido seria um desvio insustentável, seria rematado erro de apreciação. Os fatos são por demais evidentes, falam por si mesmos. E nos indicam justamente o contrário. O processo de nossa fixação apresenta um desenvolvimento de certa maneira equivalente ao das bandeiras. Sua marcha foi regulada pelo mesmo espírito de penetração lusitana. Não há como armar os fatos de outra forma. Armá-Ios de outra maneira seria estabelecer a política do recuo em face das afirmações castelhanas, seria a negação da própria verdade histórica e de tudo quanto hoje representamos, nos limites de um processo cultural e étnico característico e mercante."

No livro O

ONMLKJIHGFEDCBA

g a ú c h o , publicado quarenta anos após, o autor retoma a discussão referente à formação histórica do Rio Grande do Sul. Reverbel remete a Othelo Rosa e o conceito de "drama de fronteira'"" como viés explicativo para caracterizar a disputa entre Portugal e Espanha pelo território rio-grandense. A tardia integração ao Brasil está ligada aos interesses coloniais das duas potências ibéricas, onde o limite é um fato jurídico e a fronteira é um fato político. "No final das contas, os nossos limites, traçados no papel, tiveram de ceder lugar às nossas fronteiras, estabelecidas pelos primeiros povoadores com respaldo das armas luso-brasileiras, a cujos interesses políticos elas serviam"."

O surgimento da vida político-administrativa orientada à consolidação de um processo civilizatório estável está associado às ações do Conselho Ultramarino português e à expansão luso-brasileira do século XVIII.

[...] nosso primeiro sinal de vida administrativa, o início da nossa organização política, o começo da nossa atividade econômica, a nossa entrada efetiva no cenário colonial tiveram lugar em 1737, quando foi fundado o Presídio de Jesus Maria José, no local onde se encontra hoje a velha cidade de Rio Grande, nossa primeira Capital e sede da Comandância [ ... ] E sendo uma Comandância, caso singular no sistema administrativo do Brasil Colônia, o Rio Grande nascia sob um regime armado e passaria a viver numa atmosfera militar. A partir desse momento histórico [ ... ] nosso destino ficou condicionado

àsorte das armas, numa fronteira em movimento, sujeita a avanços e recuos, até sua configuração definitiva.'2

O povoamento a partir do Presídio do Rio Grande, uma t e r r a d e n in g u é m situada entre Laguna e a Colônia do Sacramento, configura o tripé da expansão luso-brasileira em direção ao Rio da Prata. Este espaço

9Idem, p. 141.

10ROSA, Othelo. Formação do Rio Grande do Sul. In: F u n d a m e n t o s d a c u lt u r a r io - g r a n d e n s e .

Porto Alegre: Faculdade de Filosofia/Universidade do Rio Grande do Sul, 1957. v. 2. p. 16.

11REVERBEL, Carlos. Og a ú c h o : aspectos de sua formação no Rio Grande e no Prata. Porto Alegre: L&PM, 1986. p. 52.

12Idem, p. 53.

156 BIBLOS. Rio Grande. 13: 151·158.2001.

geográfico, "além de despovoado, seria disputado mais tarde a ferro e fogo, por dois imperialismos igualmente agressivos, montando-se assim o d r a m a d e f r o n t e ir a de que surgiria o Rio Grande de São Pedro para o mundo luso-brasileiro"."

A linha interpretativa está ligada à tendência historiográfica luso-brasileira, com referências a Othelo Rosa e também a Moysés Vellinho e seu enfoque sobre a t e r r a d e n in g u é m que legitima a intervenção luso-brasileira. Essa presença também é perceptível na necessidade em diferenciar o gaúcho rio-grandense do gaúcho platino. Esse tema foi fundamental em publicações de Jorge Sallis Goulart, Othelo Rosa e Moysés Vellinho, sempre ressaltando que o acontecer histórico no Prata diferenciou-se do Rio G r a n d e do Sul. Nesta interpretação, a influência cultural entre os dois tipos sociais de gaúcho é restrita ou nula, e a construção civilizatória lusitana ruma para a ordem e não para os distúrbios e ao caudilhismo uruguaio ou argentino. A dicotomia campo/cidade não faz parte da realidade rio-grandense, assim como a aproximação entre os dois gaúchos fica restrita às atividades de pastoreio. Desta forma, o Rio Grande do Sul está desvinculado do espaço platino convergindo para a formação histórica brasileira com nuances de construção regionalista que lhe dotam de identidade e diferença sem distanciar-se da brasilidade.

Reverbel orienta-se pela concepção historiográfica luso-brasileira, sem partir para a historiografia do antagonismo luso-espanhol. Na década de 1980, os debates intelectuais não estão presos ao maniqueísmo inclusão/exclusão das Missões jesuítico-guaranis ou aversão ao Prata. A diversificação de estudos de história regional, especialmente pela grande produção dos cursos de pós-graduação, abre um leque multifacetado de objetos e problemas que transcendem uma das principais questões de filosofia da história rio-grandense: o lugar das Missões na formação histórica rio-grandense. Novos tempos e ares, permitindo que mesmo seguindo a cartilha de Moysés Vellinho o autor pudesse afirmar que a c iv iliz a ç ã o m is s io n e ir a manteve vínculos políticos e administrativos com a Coroa Espanhola, não podendo ignorar a sua "presença secular dentro dos atuais limites rio-grandenses, assim como não se pode expulsar as influências ainda palpitantes e as profundas raízes por ela deixadas entre nós". E o não-pronunciável porém óbvio agora pode ser dito a respeito da ocupação jesuítico-guarani de caráter espanhol ainda no século XVII: "Isto significa que houve uma civilização nesta estremadura, politicamente vinculada à coroa espanhola, antes da efetiva e afinal definitiva ocupação lusitana"."

As quatro décadas que separam os dois escritos demarcam

13

14Idem, p. 54. Idem, p. 30.

BIBLOS. Rio Grande, 13: 151-158,2001.

(5)

momentos diferenciados da historiografia rio-grandense, momentos que Reverbel viveu. A construção da identidade

é

um processo inesgotável desta fronteira entre o Brasil e o Prata, entre o centralismo e o federalismo entre o regional e o nacional. São polêmicas não esgotadas e que cad~ geração as recoloca para a crítica intelectual e os interesses políticos. Confrontos mais acirrados ou enfrentamentos mornos, a identidade sistematicamente emerge como uma representação fugaz e fascinante.

BIBLOS, Rio Grande, 13: 151-158,2001,

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