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Desenvolvimento histórico do processo de ensino e aprendizagem da leitura e da escrita

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Academic year: 2021

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Vamos iniciar nossa disciplina refletindo sobre o desenvolvimento his-tórico do processo de ensino e aprendizagem da leitura e da escrita, apon-tando-o como prática pedagógica essencial da escola moderna.

Essa reflexão toma como marco inicial a organização do trabalho pe-dagógico proposto por Comenius, que oferece a sistematização da apren-dizagem da leitura por meio da cartilha, método que perdurou no longo período de vigência do ensino tradicional.

Na escola atual, as mudanças tecnológicas dos meios e conteúdos da comunicação, produzidas no interior do processo de expansão e globali-zação das relações sociais capitalistas, exigem a inserção do alfabetizando nas práticas sociais de leitura e escrita, que chamamos de letramento, ul-trapassando a mera aquisição da técnica do ler e escrever.

A concepção de letramento como fundamento do ensino e da apren-dizagem da leitura e da escrita, por sua vez, demanda a adoção tanto de novos conteúdos como da metodologia de seu ensino.

Alfabetização: a cartilha desde Comenius

A produção social da necessidade de universalização do domínio da leitura e da escrita pela via do ensino escolar tem suas raízes na moder-nidade. Sua emergência se dá no contexto da expansão do comércio de mercadorias, produzidas em manufatura, sob a forma do trabalho cole-tivo e do desenvolvimento da nova ordem social burguesa, constituída pelas classes em ascensão: a burguesia empreendedora e os trabalhado-res manufatureiros.

Por seu turno, os reformadores protestantes, coerentemente com o es-pírito burguês, preconizavam, desde o século XVI, o aprendizado da leitu-ra, ainda que elementar, com a finalidade de conhecer o texto bíblico.

Desenvolvimento histórico do

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Nesse contexto de transformações sociais, coube a João Amós Coménio ou simplesmente Comenius, pastor protestante, considerado o pai da Pedagogia moderna, lançar, no século XVII, os fundamentos da escola que perdura até nossos dias, definindo a organização do trabalho pedagógico com base nos ele-mentos constituintes da produção manufatureira, já presentes na sociedade de seu tempo (ALVES, 2001).

Ao preconizar o princípio bem conhecido de ensinar tudo a todos, Comenius define em primeiro lugar o papel do professor. Nesta escola, não há mais lugar para o sábio, que inicia cada discípulo nas fontes do conhecimento aprofunda-do, mas o mestre capaz de promover a instrução sobre tudo pelo uso do método que generaliza o conhecimento necessário ao cidadão comum.

Tal como a manufatura, que abandona o artesão, conhecedor da arte de elaborar seu produto com maestria, e o substitui pelo trabalhador, que realiza tarefas parceladas no processo coletivo de trabalho, Comenius concebe a sim-plificação do trabalho do professor pelo emprego do manual didático como ins-trumento do ensino. O livro didático difere dos livros científicos ao apresentar o conhecimento não com a profundidade das fontes originais, mas compendiado em fórmulas e definições que introduzem o aprendiz nos primeiros passos da instrução científica.

Nessa perspectiva, Comenius propõe a cartilha de ensinar a ler, elaborada com a preocupação didática de iniciação à leitura, ilustrada com figuras ao lado das palavras, das sílabas e das letras do alfabeto. Nada mais parecido com as cartilhas que ainda perduram nas nossas escolas.

Outro aspecto da escola de Comenius que cabe mencionar é a instrução si-multânea, ou seja, a classe heterogênea, com os alunos realizando o aprendiza-do ao mesmo tempo, embora em graus e atividades diferenciadas. Trata-se da utilização do mesmo princípio do trabalho coletivo manufatureiro e sua conco-mitante divisão de tarefas, que viabiliza o aumento da produção. Na escola, o ensino simultâneo possibilita a realização do princípio do ensinar a todos, embora sua realização só tenha sido efetivamente alcançada por meio de difícil e lento esforço social, apresentando os primeiros resultados em meados do século XIX.

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pro-Alfabetização ou letramento?

A prática pedagógica do aprendizado da leitura e da escrita por meio da car-tilha perdurou durante o longo período que chamamos de ensino tradicional.

Esse método, centrado no domínio do código, revelou-se suficiente dadas as condições históricas próprias do aprendizado da leitura, tais como o uso privile-giado da escrita (as cartas, os bilhetes, os registros de compra etc.) dos recursos de comunicação entre interlocutores distantes e em razão da ausência de outros meios técnicos.

Entretanto, o processo crescente de expansão e globalização do capital, ao intensificar as relações sociais recíprocas de interdependência entre sujeitos de classes sociais, comunidades, regiões e países diversos, produziu também novos processos de comunicação quanto aos seus meios e conteúdos. Trata-se de um processo comunicacional dotado de tamanha rapidez, de tal simultanei-dade entre a produção e a recepção de um grande número de informações que passou a exigir novos patamares de leitura e de escrita, denominados pelos es-tudiosos de letramento.

Segundo Soares (2003, p. 20) “só recentemente passamos a enfrentar esta nova realidade social em que não basta apenas saber ler e escrever, é preciso também saber fazer uso do ler e escrever, saber responder às exigências de lei-tura e escrita que a sociedade faz continuamente”.

Para ampliar a concepção de letramento, recorremos às reflexões de Klein (2000, p.11), que assim explica:

Não há dúvida que o letramento é, hoje, uma das condições necessárias para a realização do cidadão: ela o insere num círculo extremamente rico de informações, sem as quais ele, inclusive, nem poderia exercer livre e conscientemente sua vontade […] o homem contemporâneo é afetado por outros homens, fatos e processos por vezes tão distantes de seu cotidiano que somente uma rede muito complexa de informações pode dar conta de situá-lo, minimamente, na teia de relações em que se encontra inserido. Neste universo, tão mais vasto e complexo, a escrita assume relevante função, registrando e colocando ao seu alcance as informações que podem esclarecê-lo melhor.

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Em primeiro lugar, do ponto de vista da complexidade da interlocução, faz--se necessário um leitor capaz de compreender o significado dos discursos, in-terpretando os elementos históricos, científicos e ideológicos que o constituem. Para isso, precisa dominar os elementos de textualidade que constroem o âmbito discursivo oral e escrito, como também os elementos materiais de sua codifi-cação (letras e sons). Por outro lado, cabe salientar que os meios tecnológicos, que viabilizam simultaneidade à comunicação, conferem menor função prática à escrita manual, dispensando o aprendizado de vários conteúdos relativos ao domínio específico do código, como se procedia no passado, no ensino sistema-tizado por meio das cartilhas. Em resumo, as mudanças apontadas implicam a adoção de novos conteúdos do ensino da leitura e da escrita, pois, enquanto os conteúdos relativos à textualidade se tornam cada vez mais relevantes, alguns aspectos pertinentes ao código perdem sua predominância (KLEIN, 2000).

Entretanto, no que se refere à alfabetização, como momento inicial do pro-cesso educativo do ensino e da aprendizagem da leitura e da escrita, cabe enfati-zar, ainda segundo Klein, que esta etapa se caracteriza pelo fato de desenvolver, junto com os conteúdos relativos à textualidade (coesão, coerência, unidade te-mática, clareza, concordância – que o modelo tradicional de alfabetização não levava em conta), também os conteúdos pertinentes à codificação/decodifica-ção (letras, sílabas, famílias silábicas, direcodificação/decodifica-ção da escrita, segmentacodificação/decodifica-ção etc.).

Por fim, como decorrência da adoção de novos conteúdos dos processos edu-cativos do ensino da leitura e da escrita, pressupõe-se também novos processos, metodologias e estratégias para seu ensino-aprendizagem.

Podemos concluir que, compreender o desenvolvimento e as mudanças do processo do ensino e da aprendizagem da leitura e da escrita, pressupõe refletir sobre os determinantes históricos que produziram formas diferenciadas de or-ganização do trabalho pedagógico em momentos distintos.

Também cabe examinar o processo social de comunicação, cujos avanços tecnológicos criam necessidades próprias de produção de um leitor e de um escritor capaz de se apropriar e de interpretar as informações que circulam na intensa rede de relações que se estabelece na sociedade.

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e do papel que a leitura e a escrita desempenham neste contexto é o ponto de partida para a formação do educador-alfabetizador, que pretende desempenhar sua função docente no desenvolvimento de processos educativos de ensino e aprendizagem, da leitura e da escrita.

Texto complementar

Cartilha de alfabetização e cultura escolar:

um pacto secular

(MORTATTI, 2000)

Necessidade apontada desde o final do século XIX no Brasil, o processo de nacionalização do livro didático – produzido por brasileiros e adequado à realidade brasileira – acompanha pari passu o anseio de organização republi-cana da instrução pública; e, simultaneamente, faz-se acompanhar do surgi-mento e da expansão do mercado editorial brasileiro, que na escola encontra espaço privilegiado de circulação e público consumidor de seus produtos.

No entrecruzamento desses anseios e iniciativas, o ensino inicial da leitu-ra é tomado como problema estleitu-ratégico, tornando-se um importante índice para medir a eficácia da escola em relação ao cumprimento da promessa com que acena às novas gerações e que a caracteriza e justifica: o acesso ao mundo público da cultura letrada.

Inicia-se, assim, um movimento de escolarização das práticas culturais de leitura e escrita e sua identificação com a questão dos métodos de ensino. Lugar de destaque, passam, então, a ocupar as tematizações, normatizações e concretizações sobre esse ensino e sobre um tipo particular de livro didáti-co, a cartilha, na qual se encontram o método a ser seguido e a matéria a ser ensinada, de acordo com certo programa oficial estabelecido previamente.

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nas primeiras décadas do século XX, quando se observa o engendramento de fenômenos correlatos: apoio de editores e especialização de editoras na publicação desse tipo de livro didático; surgimento de um tipo específico de escritor didático profissional – o professor; e processo de institucionalização da cartilha, mediante sua aprovação, adoção, compra e distribuição às esco-las públicas, por parte de órgãos dos governos estaduais.

Acompanhando o movimento histórico das tematizações, normatizações e concretizações sobre a questão dos métodos, as primeiras cartilhas brasi-leiras, produzidas, sobretudo por professores fluminenses e paulistas através de sua experiência didática, baseavam-se nos métodos de marcha sintética (processos de soletração e silabação).

Dever-se-ia, assim, iniciar o ensino da leitura com a apresentação das letras e seus nomes, de acordo com certa ordem crescente de dificuldade. Posteriormente, reunidas às letras em sílabas e conhecendo-se as famílias silábicas, ensinava-se a ler palavras formadas com essas sílabas e letras e, por fim, ensinavam-se frases isoladas ou agrupadas.

Quanto à escrita, esta restringia-se à caligrafia e seu ensino, à cópia, di-tados e formação de frases, enfatizando-se a ortografia e o desenho correto das letras.

2.ª lição va ve vi vo vu ve va vo vu vi vo vi va ve vu vai viu vou Vocábulos vo-vó a-ve a-vô o-vo vi-va vo-vo ou-ve u-va

ui-va vi-vi-a vi-ú-va Exercícios vo-vó viu a a-ve a a-ve vi-ve e vô-a

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As cartilhas produzidas, sobretudo no início do século XX, por sua vez, passaram a se basear programaticamente no método de marcha analítica (processos de palavração e sentenciação), a partir das contribuições da pe-dagogia norte-americana, divulgadas inicialmente no estado de São Paulo pelas reformas da instrução pública na década de 1890 e posteriormente disseminadas para outros estados brasileiros, por meio de missões de

profes-sores paulistas.

Atividades

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2. Que competências o contexto de interlocução próprio da sociedade atual propõe como exigências para a formação escolar do leitor?

3. A alfabetização – como momento inicial do processo do ensino e da aprendi-zagem da leitura e da escrita – comporta conteúdos relativos à textualidade e conteúdos pertinentes à codificação/decodificação, que são:

a) ensinados isoladamente.

b) vistos ao final do processo.

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Dica de estudo

Para ampliar a compreensão da origem da concepção de alfabetização, que herdamos do nascimento da escola moderna, recomendamos a seguinte leitura:

Referências

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