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Percepções do público surdo sobre a acessibilidade no cinema

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Academic year: 2021

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JULIANA VALERIA DE MELO

PERCEPÇÕES DO PÚBLICO SURDO SOBRE A ACESSIBILIDADE NO CINEMA CAMPINAS 2015

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS Faculdade de Ciências Médicas

JULIANA VALERIA DE MELO

PERCEPÇÕES DO PÚBLICO SURDO SOBRE A ACESSIBILIDADE NO CINEMA

Dissertação de Mestrado apresentada à Pós-Graduação da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP para obtenção de título de Mestra em Saúde, Interdisciplinaridade e Reabilitação, área de concentração Interdisciplinaridade e Reabilitação.

ORIENTADOR(A) PROF.ª DR.ª IVANI RODRIGUES SILVA ESTE EXEMPLAR CORRESPONDE À VERSÃO

FINAL DA DISSERTAÇÃO DEFENDIDA POR JULIANA VALERIA DE MELO, E ORIENTADA PELA PROF.ª DR.ª IVANI RODRIGUES SILVA.

_______________________________________ Assinatura do(a) Orientador(a)

CAMPINAS 2015

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RESUMO

Introdução: O cinema enquanto objeto social pode contribuir para a ampliação do repertório cultural e para a construção de significados sobre o cotidiano das pessoas. Porém as obras fílmicas são, em sua maioria, voltadas ao público ouvinte, o que pode se constituir em uma barreira para o público surdo. Os surdos são um grupo de minoria linguística e cultural, usuários, principalmente, da Libras e que a cada dia conquistam mais espaços na sociedade. Esta pesquisa visa descrever as percepções de um grupo de surdos sobre a acessibilidade no cinema e discutir as tecnologias de acessibilidade – legendas descritivas em português, legendas closed caption, e legendas visuais – que buscam incluir o surdo nesse espaço. Metodologia: Trata-se de uma pesquisa de natureza aplicada, com abordagem qualitativa. Este trabalho foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa – CEP e está inscrito no CAAE sob nº 19094213.8.0000.5404. Participaram da pesquisa seis alunos surdos do Ensino Médio de uma escola regular inclusiva em uma cidade do interior de São Paulo, que foram entrevistados e assistiram a dois longas-metragens: A Dona da História (2004) com legenda closed caption; Medianeras (2011) com legenda descritiva em português, e um curta-metragem intitulado Cotidiano (2012) editado com legenda visual – janela de Libras. Resultados e discussão: Observou-se que todos os participantes são usuários do cinema, mas não haviam assistido, até a data da pesquisa, nenhum filme brasileiro. Na entrevista, três alunos consideraram que para melhorar o acesso aos conteúdos fílmicos a legenda visual seria a melhor opção. No segundo momento da pesquisa, após a visualização dos três objetos fílmicos com legendas diferentes, a opinião dos surdos variou e todos elencaram a legenda descritiva em português como a solução para os problemas de acessibilidade. Considerações finais: Políticas Públicas tem sido pautadas com foco na inclusão da pessoa surda aos espaços sociais, entendendo a legenda oculta (legenda closed caption) e a projeção do intérprete de Libras (legenda visual) como uma solução para as barreiras de acessibilidade. Esta pesquisa mostra, portanto, que a janela visual

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deve ser problematizada no contexto do cinema, pois, esse recurso causa competição visual entre a obra e a tradução. Segundo a opinião de um grupo de seis alunos do Ensino Médio, ter o recurso como está previsto em Lei, não garante o acesso aos conteúdos fílmicos. Sugere-se que novos estudos sejam desenvolvidos de modo a elucidar, com base na avaliação das pessoas surdas, a eficácia e a eficiência das legendas desenvolvidas para o seu uso no cinema, fortalecendo a participação dos surdos no desenvolvimento de soluções que tenham sentido para esse grupo cultural. Sugere-se também fortalecer as ações de criação de novos artefatos fílmicos por cineastas surdos, o que levaria a uma reconfiguração das técnicas de filmagem, iluminação, enquadramento e movimento de câmera, configurando-se assim, um campo vasto para pesquisas futuras.

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ABSTRACT

Introduction: The movies as a social object may contribute for the enlargement of the cultural repertoire and for the construction of meanings about people’s daily life. Nevertheless, filmic works are mostly directed to the hearing audience and this may constitute a barrier to the deaf audience. The Deaf are a linguistic and cultural minority group, who use mainly the LIBRAS (Brazilian Sign Language) and who conquer increasingly more space in society. This research aims at describing the perceptions of a group of deaf persons regarding accessibility in movies and at discussing the accessibility technologies – descriptive caption in Portuguese, closed caption, and visual caption – that seek to include the Deaf in this space. Methodology: This is an applied qualitative research; it has been approved by the Comitê de Ética em Pesquisa – CEP (Research Ethics Committee) and it is inscribed at the Certificado de Apresentação para Apreciação Ética – CAAE (Certificate of Presentation for Ethical Consideration) under nr. 19094213.8.0000.5404. Six deaf students of an inclusive secondary school located in a medium-size town in the state of São Paulo took part in the research. They were interviewed and watched two feature films: A Dona da História (2004) with closed caption; Medianeras (2011) with descriptive caption in Portuguese; and one short film: Cotidiano (2012) edited with visual caption – LIBRAS window. Results and discussion: It was observed that all participants watch movies regularly but until the date of the research they had never watched a Brazilian film. At the interview, three students considered that the best solution to improve the access to the filmic contents would be the visual caption. At the second moment of the research, after viewing the three filmic objects with different captioning, the opinion of the deaf students varied and all of them specified the descriptive caption in Portuguese as the best solution for the problems of accessibility. Final considerations: Public Policies have been made with focus on the inclusion of deaf persons in social spaces based on the understanding that the closed caption and the visual caption (the projection of a LIBRAS interpreter) are a solution for the

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accessibility barriers. This research demonstrates, therefore, that the visual window should be problematized in the context of the movies, because this resource causes a visual competition between the film work and the translation. According to the opinion of the group of six secondary school students, having the resource as specified in the law does not guarantee the access to the filmic contents. It is suggested that new studies should be carried out to elucidate, based on the evaluation of deaf persons, the effectiveness and efficiency of the captioning developed for their use in movies, thus strengthening the participation of the Deaf in the development of solutions that make sense for this cultural group. It is also suggested to strengthen the actions of filmic artifacts creation by deaf filmmakers, which would lead to a reconfiguration of filming, lighting, framing, and camera movement techniques, thus shaping a vast field for future researches.

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SUMÁRIO

AGRADECIMENTOS ... xv

BASTIDORES... ... xvii

LISTA DE FIGURAS E TABELAS ... xix

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS ... xxi

LISTAS DE SÍMBOLOS ... xxiii

1 INTRODUÇÃO ... 1

1.1 INQUIETAÇÕES QUE MOTIVARAM A PESQUISA ... 1

1.2 JUSTIFICATIVA ... 2

1.3 HIPÓTESE E PERGUNTAS DE PESQUISA ... 2

1.4 OBJETIVOS ... 3 1.4.1 Objetivo Geral ... 3 1.4.2 Objetivos Específicos ... 3 1.5 ORGANIZAÇÃO DA DISSERTAÇÃO ... 3 2 REFERENCIAL TEÓRICO ... 5 2.1 CINEMA ... 5 2.1.1 Cinema e Representação ... 5 2.1.2 Cinema e linguagem ... 5

2.1.3 A construção de sentido no texto fílmico ... 8

2.1.4 Legendagem e Tradução ... 10

2.1.5 Evolução do mercado ... 14

2.2 O PÚBLICO SURDO ... 17

2.2.1 Identidade e Diferença ... 17

2.2.2 A comunicação dos surdos ... 20

2.2.3 O cinema e o público surdo ... 24

3 MATERIAL E MÉTODOS ... 28

3.1 TIPO DA PESQUISA ... 28

3.2 CONTEXTO DE PESQUISA ... 28

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3.3 PROCEDIMENTOS DE COLETA DE DADOS ... 29

3.3.1 Teste do instrumento de coleta de dados ... 29

3.3.2 Questionário semiestruturado ... 30

3.3.2.1 As respostas dos alunos ... 31

3.3.3 Os vídeos ... 32

3.3.4 Fechamento do grupo ... 33

3.4 PARÂMETROS PARA A ESCOLHA DOS FILMES ... 33

3.5 NOTAS DE CAMPO ... 37

3.6 PROCEDIMENTOS DE ANÁLISE DE DADOS ... 38

4 RESULTADOS E DISCUSSÃO ... 39

4.1 DOS QUESTIONÁRIOS ... 39

4.1.1 Os sujeitos de pesquisa ... 39

4.1.2 Quanto à preferência por gênero ... 41

4.1.3 Quanto à preferência sobre legendas ... 43

4.1.4 Sobre a acessibilidade no cinema ... 47

4.2 AS SESSÕES DE FILMES ... 51

4.3 FECHAMENTO DO GRUPO: RELATO SOBRE A PREFERÊNCIA DE LEGENDA ... 53

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 55

REFERÊNCIAS ... 59

FILMOGRAFIA ... 65

APÊNDICE 1: TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO... 66

APÊNDICE 2: QUESTIONÁRIO SEMIESTRUTURADO ... 68

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DEDICATÓRIA

Dedico essa dissertação àqueles que me ensinaram a perceber o mundo com outros olhos...

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AGRADECIMENTOS

Agradeço a Deus por ter me dado força, coragem e por estar sempre comigo.

Este trabalho não poderia ter sido realizado sem a colaboração, carinho e amizade de muitas pessoas. De modo especial agradeço:

Aos meus pais Jurandir e Dulce pelo apoio incondicional;

Ao meu esposo, amigo e grande incentivador Carlos Alexandre; À professora Dra. Ivani Rodrigues Silva pela orientação;

À professora Rose pelo auxílio na interpretação dos vídeos;

À escola, professores e alunos surdos, que me possibilitaram realizar esse estudo e que me acolheram com tanto carinho;

Às professoras Dra. Lucia Reily e Dra. Carmem Zink, pela leitura e sugestões feitas na participação da banca de qualificação do projeto e pela participação na defesa;

Ao professor Dr. José Mário de Martino, pela leitura criteriosa e sugestões pontuais;

Às professoras Zelia Bittencourt e Wilma Favorito, por fazerem parte da banca examinadora deste trabalho;

Aos colegas envolvidos no Projeto Novos Talentos e Ciência e Arte nas Férias da UNICAMP, que contribuíram com suas experiências durante as minhas reflexões sobre o surdo, a Libras e o cinema. Um agradecimento especial à Daniela Rocha;

À Fabiana Bubniak, pela gentileza em compartilhar informações preciosas para este trabalho;

Às colegas da turma de mestrado pelos bons momentos;

A todos os participantes surdos e ouvintes que me permitiram realizar esta pesquisa, muito obrigada!

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BASTIDORES...

Na verdade, eu nunca vi filme brasileiro porque todo mundo fala que é muito ruim... eu adorei! (MEL – 16 anos)

Esse filme tem na internet? ... queria ver de novo... muito legal!!! (ANA – 19 anos)

Eu não sabia que tinha filme brasileiro e de outro país... (BRU – 17 anos)

Por que você pergunta de cinema surdo? É normal!!! (BIA – 18 anos)

Precisa ter cinema surdo... (LÉO – 17 anos)

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LISTA DE FIGURAS E TABELAS

Figura 1: Cena do filme “A Invenção de Hugo Cabret, 2011” ... 5

Figura 2: Cenas extraídas do filme "A Invenção de Hugo Cabret, 2011", representando as versões preto e branca e colorida de "Viagem à lua" ... 6

Figura 3 - Comparativo de público - em milhões ... 16

Figura 4 - Ranking nacional 2000-2013 ... 16

Figura 5: Exemplos de janela de Libras com a técnica chroma key. ... 27

Figura 6: Primeira seleção dos filmes brasileiros com legenda closed caption ... 34

Figura 7: Ilustração do vídeo editado com legenda visual. ... 37

Figura 8: Gêneros de filmes preferidos pelos surdos ... 41

Figura 9: Sobre o uso das legendas nos filmes... 43

Figura 10: Legenda Visual sem Fundo. ... 44

Figura 11: Legenda Visual com Fundo. ... 44

Figura 12:Legenda Branca sem Fundo Preto... 44

Figura 13: Legenda Closed Caption. ... 44

Figura 14: Legenda Amarela – Fundo Preto. ... 44

Figura 15: Legenda Amarela sem Fundo Preto. Fonte: Google Imagens ... 44

Figura 16: Demonstração de vídeo acessível da TV INES. ... 46

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

LIBRAS – Língua Brasileira de Sinais L2 – Segunda Língua

ARPEF – Associação de Reabilitação e Pesquisa Fonoaudiológica CPL – Centro de Produção de Legendas

CCBB – Centro Cultural do Banco do Brasil

IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística EM – Ensino Médio

TCLE – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido ABNT – Associação Brasileira de Normas Técnicas INES – Instituto Nacional de Educação dos Surdos ASL – American Sign Language

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LISTAS DE SÍMBOLOS

“Aspas e fonte itálica” – texto escrito em português pelos alunos

“Aspas e fonte itálica e em negrito” – respostas em Libras dos alunos, interpretadas por uma professora ouvinte sinalizante.

“Aspas, com fonte normal e em negrito” – respostas em Libras dos alunos nos diálogos com a pesquisadora, e registros do caderno de campo.

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1 INTRODUÇÃO

1.1 INQUIETAÇÕES QUE MOTIVARAM A PESQUISA

Durante a graduação em Terapia Ocupacional tive a oportunidade de conhecer a Língua Brasileira de Sinais - Libras e um pouco sobre a comunidade surda. Então, me perguntei como o terapeuta ocupacional poderia trabalhar com surdos, e em que minha profissão poderia contribuir para esse grupo.

Para buscar respostas, dediquei-me a fazer cursos de Libras e a conviver com surdos. Angustiou-me perceber que, para que eu entendesse o que a pessoa surda me narrava, era necessário pedir para voltar, fazer novamente o sinal, usar de apontamentos ou de datilologia para que eu entendesse. Percebi o quão rica é a sua forma de comunicar e que é possível sim entender e se fazer entender num diálogo, mas, isso depende do interesse de ambos os lados, pois são duas línguas, duas formas de ver e perceber o mundo.

Daí surgiram questionamentos, pois, da mesma que eu senti dificuldade em entender a Libras, o surdo poderia ter dificuldades em me entender (enquanto falante do português), e, possivelmente, não são todas as pessoas e situações que estão sempre dispostas a quebrar barreiras.

Enquanto terapeuta ocupacional entendo que a participação social adiciona significado à vida e pode interferir nas escolhas, nas ações, nas decisões e até nas condições de saúde (1) dos sujeitos. Comecei, portanto, a pensar nas situações e/ou atividades que geralmente são feitas em grupos ou em momentos de lazer, para entender as lacunas de acessibilidade existentes. Como atualmente a mídia passou a fazer parte da vida cotidiana das pessoas e o cinema ocupa um espaço importante nas opções de entretenimento, cultura e lazer, optei por pesquisar como o surdo acessa as obras fílmicas nacionais ou dubladas, que não possuem legenda, e se essa barreira de acesso interfere em sua participação social nesse ambiente.

O cinema é um campo rico de estudos e traz ao surdo muito daquilo que lhe é peculiar - a imagem. Nesta pesquisa lança-se um olhar para a acessibilidade do público surdo ao cinema, especialmente ao que se refere às legendas,

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considerando que estas podem ser um estímulo à leitura do português para os surdos e ao aumento de seu repertório linguístico, respeitando sua língua (Libras) e sua singularidade cultural.

Esse é um desafio que necessita de trabalhos interdisciplinares, e a Terapia Ocupacional pode contribuir no sentido de proporcionar experiências à pessoa surda que problematizem sua realidade, favoreçam espaços de discussão e reflexão que estimulem seu potencial criativo.

1.2 JUSTIFICATIVA

O cinema é uma produção cultural que permite múltiplas interpretações e construção de significados. Por meio dessa arte, o pensamento, as sensações e a criatividade podem ser estimulados. O cinema ocupa um papel social importante de proporcionar lazer para as pessoas, mas, sem o público, essa arte nada significa. A indústria cinematográfica serve, predominantemente, à maioria ouvinte, estando o surdo à margem devido a ausência de legendas em filmes dublados e em filmes brasileiros.

Considerando a surdez como diferença cultural e histórica e com igualdade de direitos no acesso aos objetos fílmicos, brasileiros ou estrangeiros, cabe discutir como esse público consome as obras cinematográficas e se as barreiras de comunicação existentes dificultam o acesso a estas pelo surdo.

1.3 HIPÓTESE E PERGUNTAS DE PESQUISA

A partir da hipótese de que a oferta, nas salas de cinema, de filmes estrangeiros dublados e nacionais sem legenda, pode interferir no consumo destes pelo surdo, surgiu a pergunta de pesquisa – Como o surdo se relaciona com o cinema?

Este trabalho visa, portanto, descrever as percepções de um grupo de surdos sobre a acessibilidade no cinema e discutir as tecnologias de

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acessibilidade – legendas descritivas em português, legendas closed caption, e legendas visuais – que buscam incluir o surdo nesse espaço.

1.4 OBJETIVOS 1.4.1 Objetivo Geral

Descrever as percepções de um grupo de surdos sobre a acessibilidade no cinema.

1.4.2 Objetivos Específicos

a) investigar de quais formas o público surdo acessa o cinema;

b) verificar qual tipo de legenda é preferida pelo grupo, de acordo com seu repertório;

c) verificar qual tipo de legenda é preferida pelo grupo, a partir da apresentação dos diferentes tipos de legendas;

d) verificar a opinião dos surdos com relação à acessibilidade no cinema.

1.5 ORGANIZAÇÃO DA DISSERTAÇÃO

Esta dissertação está dividida em cinco capítulos. O primeiro traz a introdução, elencando as inquietações e justificativa que motivaram o estudo bem como a hipótese e os objetivos que nortearam as ações de trabalho.

O segundo capítulo inicia-se com as considerações sobre o Primeiro Cinema com base no texto de Costa (2006), até as concepções de multimodalidade e multiletramento atuais. Discute sobre a construção do sentido do texto fílmico a partir do referencial teórico de Bakhtin (2003), Gorovitz (2006), Reily (2012), Leffa e Irala (2012) e MonteMór (2010). Destaca trabalhos sobre legendagem e tradução realizados por Brito (2012), Nascimento (2013) e Chaves (2009), e encerra com a evolução do mercado cinematográfico que se mostra como uma opção de entretenimento, cultura e lazer importante.

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Em seguida, apresenta reflexões sobre a cultura surda e as dificuldades históricas enfrentadas por esse grupo cultural. Conceitos de identidade, diferença, estigma também foram contemplados neste trabalho com base em Hall (2000), Silva (2000) e Gofmman (1988). A comunicação dos surdos foi discutida com base nos estudos de Costa (2009) e Thoma (2002). Maher (2002) e Silva (2008) contribuíram com discussões sobre o bilinguismo de minorias e a escrita dos surdos, importantes para a construção desta pesquisa. Ao final do referencial teórico, faz-se uma ponte entre o artefato “cinema” com o público surdo, elencando as políticas públicas e iniciativas existentes no mercado que visam incluir o surdo nesse espaço.

O capítulo três apresenta a abordagem metodológica utilizada para responder à pergunta: “Como o surdo se relaciona com o cinema?”, que motivou o desenvolvimento deste trabalho. Os sujeitos de pesquisa foram seis alunos surdos do Ensino Médio de uma escola regular inclusiva em uma cidade do interior de São Paulo, que foram entrevistados e assistiram a dois longas-metragens: A Dona da História (2004) com legenda closed caption; Medianeras (2011) com legenda descritiva em português, e um curta-metragem intitulado Cotidiano (2012) editado com legenda visual – janela de Libras.

Os resultados foram apresentados e discutidos no capítulo quatro, elencando as diferentes opiniões sobre as legendas com base nas percepções do grupo e, no capítulo cinco, essa dissertação traz as considerações finais e discorre a plausibilidade desta pesquisa no campo social e da ciência, bem como as limitações do estudo, que merecem ser tratadas em estudos futuros.

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2 REFERENCIAL TEÓRICO

2.1 CINEMA

2.1.1 Cinema e Representação

A experiência de assistir um filme possibilita um olhar atualizado sobre as práticas de quem o consome em seus aspectos sociais, laborais, de lazer e de vida diária. Uma mensagem fílmica pode contribuir na construção de significados das pessoas sobre o seu cotidiano, de acordo com suas vivências e de sua cultura.

2.1.2 Cinema e linguagem

Em 1885, os irmãos Lumière haviam inventado o cinema e, por meio de imagens animadas, viajavam nos circos e apresentavam suas produções com o auxílio de instrumentistas para compor o fundo do filme que era mudo. Um dos primeiros filmes apresentado publicamente foi: “Um trem chega à estação” (2). Este filme não representava nada além de um trem chegando, mas o movimento da imagem do trem em direção à tela causou espanto na plateia, pois nunca ninguém havia visto nada como aquilo. A Figura 1 apresenta uma cena do filme “A Invenção de Hugo Cabret, 2011” que ilustra esse momento histórico.

Figura 1: Cena do filme “A Invenção de Hugo Cabret, 2011” Um trem chega à estação.

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A partir dessa ideia, os cineastas perceberam que podiam usar essa nova mídia para contar histórias. George Meliès, um grande pioneiro do cinema, foi um dos primeiros a perceber que os filmes tinham o poder de reproduzir sonhos e, em 1902 lançou o primeiro filme de ficção intitulado: “Viagem à Lua". Esse filme foi lançado em duas versões: uma em preto e branco e outra versão colorida, pintada quadro a quadro por Meliès (2), conforme demonstrado na Figura 2.

Figura 2: Cenas extraídas do filme "A Invenção de Hugo Cabret, 2011", representando as versões preto e branca e colorida de "Viagem à lua"

George Meliès foi dado como morto após a Grande Guerra e grande parte das centenas de suas produções foi perdida. René Tabard foi um cineasta que trabalhou no resgate das obras remanescentes e conseguiu restaurar cerca de 80 filmes de Meliès, que são grandes marcos do cinema mudo (2).

No percurso de desenvolvimento do cinema o som passou a ocupar um lugar de destaque, assim como a própria imagem (3). Por muito tempo, som e imagem dominaram os recursos audiovisuais apresentando uma lógica de planos sequenciados com começo, meio e fim, numa narrativa linear.

Durante o desenvolvimento da linguagem cinematográfica, houve grandes mudanças exercidas sobre ela em momentos diferentes. Griffith e outros cineastas estabeleceram os códigos do discurso cinematográfico, que prevaleceriam no transcorrer da consolidação dessa indústria. Posteriormente, as diversas produções no mundo começaram a utilizar novas abordagens que se

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apresentavam como narrativa, e viriam a estabelecer a linguagem do cinema moderno (4).

A situação atual da indústria do audiovisual contemporânea está marcada pelo hibridismo, aqui entendido como a mistura da linguagem das imagens, dos movimentos, das expressões, dos sons, dos silêncios, entre outros, para atender a um público que já se apropriou da obra fílmica e se torna, a cada dia, mais exigente na experiência estética causada pelo cinema. Segundo Felinto (5) a imagem por si só já não é suficiente e na experiência total de um "cinema expandido", ela se faz acompanhar por várias outras formas de sensorialidade, por exemplo:

Em salas experimentais, como o Cinematrix Smart Theater, em Israel, o espectador é envolvido por imagens tridimensionais, às quais assiste acomodado em poltronas equipadas com controles interativos digitais, capazes de mover-se e de emitir odores e jatos de água, e com alto-falantes próprios. É o chamado "cinema em quatro dimensões" (4-D cinema: ver, ouvir, sentir, pilotar), que hoje ainda se configura eminentemente como instrumento educativo - mas que provável e rapidamente irá ser apropriado pela indústria do entretenimento (5).

A transformação atual do cinema afeta todos os aspectos de sua manifestação, da imagem aos modos de produção e distribuição, o que marca o cinema por uma diversidade de materiais e procedimentos para dar sentido ao conceito de arte e movimento contemporâneo. O cinema lentamente se torna eletrônico, mas ao mesmo tempo, o vídeo e a televisão também se deixam contaminar pela tradição de qualidade que o cinema traz consigo. Muitos filmes que hoje podem ser vistos nas salas de cinema, foram, na realidade, pensados e produzidos em virtude de sua funcionalidade na tela da televisão (6).

De acordo com Machado (6), todas as formas de audiovisuais existentes podem ser descritas em termos de fenômeno cultural, como decorrência de “um certo estágio de desenvolvimento das técnicas e dos meios de expressão, das pressões de natureza socioeconômica e também das demandas imaginárias, subjetivas, ou, se preferirem, estéticas de uma época ou lugar”. Assim, o cinema

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moderno incorporou características estéticas fundamentadas nos aspectos tecnológicos que vão além das salas de cinema como estratégia de mercado para atingir novas formas de consumo.

Independente do formato ou do suporte pelo qual essas obras são veiculadas, seus discursos, linguagens, procedimentos de criação, características poéticas, estéticas e formas expressivas são aspectos importantes que caracterizam essa arte. Partindo desse pressuposto, pode-se considerar o cinema como uma forma de multiletramento, pois esse conceito está relacionado, segundo Jesus e Gattolin (7), à influência das novas tecnologias da comunicação na construção de sentidos que valorizam também a diversidade linguística e cultural constitutiva das sociedades. Para Quintana (8), o cinema é um meio de comunicação multimodal, pois “remete à coocorrência de diversos modos semióticos de representação e/ou comunicação que, dentro de um determinado texto, contribuem para a construção de sentido”.

2.1.3 A construção de sentido no texto fílmico

Como tratado anteriormente, o texto fílmico possui uma linguagem repleta de elementos e veicula mensagens que podem induzir o exercício do pensar e do criar nos espectadores. As várias linguagens presentes no discurso fílmico possibilitam ao espectador sensações diversas, marcadas por algo maior impregnado na cultura, e o pensamento cria um mundo comum a todos os homens, pois nossos enunciados estão inseridos numa cadeia de significação social da qual fazem parte os enunciados de outros, que contribuem com sua própria expressividade (9).

Gorovitz (10) chama de apropriação o processo de interpretação, em que a mensagem é carregada para dentro de um espaço particular e se transforma em patrimônio pessoal, sendo atualizada a partir de sua assimilação e transporte para um novo espaço, um novo tempo. No caso específico do cinema, tal expressão artística formou uma nova referência cultural por meio da experiência individual,

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psicológica e estética, na qual o espectador está em constante reação, adaptação ou acomodação, e essa experiência é compartilhada por milhões de pessoas.

Essa experiência compartilhada possibilita ao espectador participar da produção de sentido da obra por meio de sua imaginação e subjetividade, onde:

... o homem usa suas faculdades mentais para participar ativamente do jogo e para preencher essas “lacunas” por meio de investimentos intelectuais e emocionais. Essa combinação cumpre a condição para que a experiência cinematográfica se inscreva na esfera do estético. Assim como a literatura, o cinema estabelece uma comunicação descontínua com o espectador. Para além desses “vazios”, uma estrutura subjacente orienta a interpretação, isso significa que, apesar de tudo, a compreensão não é aleatória (10).

As imagens, em especial, possuem uma gramática própria com subtextos particulares e, a capacidade de interpretação, depende das inferências e do repertório cultural de quem as recebe. De acordo com Reily (11), a imagem visual é um veículo sígnico da mesma forma que a escrita, a música ou a linguagem oral, no qual a chave da significação está no movimento de síntese e de interpretação. Ler a imagem obedece à lógica da percepção visual onde o observador fixa os itens de maior interesse e, devido às múltiplas possibilidades de interpretação que tais linguagens oferecem, o entrosamento do leitor com a obra pode diferir das intenções do artista.

Ao contrário da imagem fixa, para Leffa e Irala (12), a imagem em movimento só existe pelas múltiplas conexões que são feitas, envolvendo o autor, o observador e o próprio artefato (o vídeo), sendo o movimento “uma ilusão de ótica, resultado das conexões feitas pelo observador, a partir de imagens rigorosamente estáticas”, que são relacionadas e conectadas por ele, dando a ilusão de uma continuidade narrativa única, sem cortes e interrupções, pois,

... o sentido não está nos elementos isolados, seja a palavra na frase ou a tomada em um filme, mas nas associações que se fazem entre um elemento e outro. Assim como a soma dos quadros de uma tomada dá ao espectador algo que os

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quadros não têm – o movimento – assim também as tomadas dão ao espectador o sentido – algo que elas também não possuem (12).

As experiências estéticas estão relacionadas à composição dos elementos dentro do vídeo (imagens, sons, movimentos, por exemplo). A composição do texto por meio da fala ou da legenda é um trabalho desafiador e primordial na manipulação dos sentidos que a narrativa pretende produzir. No campo imagético para Bakhtin, segundo dos estudos de MonteMór (13), os sentidos das imagens são construídos socialmente. As imagens são interpretadas pelos sujeitos, mas são resultantes dessa construção social, ou seja, daquilo que nos ensinaram a ver e, nesse sentido, quando as consumimos, somente atualizamos esse constructo.

Pode-se supor, a partir desses estudos, que os sentidos no texto fílmico se constroem de acordo com as relações que são estabelecidas com seu observador e sua interpretação, portanto, se realiza no ato da recepção, num processo mental não linear que envolve atenção, memória, imaginação e emoção (10), a partir do desempenho perceptivo sensorial, cognitivo e cultural. Um objeto que faz a mediação entre a obra e o público é a legenda, que será tratada a seguir.

2.1.4 Legendagem e Tradução

Historicamente, os espectadores brasileiros foram habituados a consumir filmes legendados, primeiro devido à má qualidade do som, e segundo porque as produções exibidas no Brasil eram importadas, necessitando de legenda na Língua Portuguesa (3).

Nos textos em outra língua os significados estão inacessíveis para quem não a domina, sendo a tradução uma possibilidade de aproximar o espectador ao enredo fílmico. A legendagem, portanto, é a tradução de uma linguagem oral para um texto escrito ou para um texto visual. Nos filmes estrangeiros o espectador que está isolado do sentido dos diálogos tem acesso a este intermediado pela tradução. Porém esse tradutor não participou da criação a obra, uma vez que, geralmente, a legendagem é um serviço terceirizado que visa proporcionar uma

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leitura suplementar por meio da mensagem escrita e, no decorrer da captação, o receptor acomoda sua percepção ao vai-e-vem visual, disponibilizando uma maior concentração para se apropriar da mensagem da obra (10).

A tradução por meio de legendas é a interpretação condensada ou não das falas de um filme e atualmente é muito utilizada no Brasil nos diferentes meios de comunicação. Quanto ao aspecto técnico as legendas podem ser abertas ou fechadas. De acordo com Araújo (14), a legenda aberta é aquela sobreposta à imagem antes da transmissão ou exibição, ou seja, é parte integral do audiovisual e não pode ser removida pelo espectador. Pode ser “virtual”, no caso de transmissão por satélite, “queimada” a ácido (nos filmes em película para exibição em cinema) ou gravada eletronicamente (nos filmes para distribuição em vídeo). Pode ser de cor amarela ou branca, podendo aparecer na tela centralizada e alinhada à esquerda ou direita.

A legenda fechada (closed caption) é escrita em letras brancas, em caixa alta ou baixa, sobre tarja preta. O acesso ficará a critério do telespectador através de um decodificador de legenda (tecla closed caption) localizado (quando disponível) no controle remoto do aparelho de televisão. Essas legendas são convertidas em códigos eletrônicos e inseridas na linha 21 do intervalo vertical em branco do sinal da TV. Pode ser de 2 tipos: rotativo (roll-up) ou Pop-on e, como são produzidas a partir do texto dublado, a quantidade de condensação, algumas vezes, é menor do que a da legenda aberta (14).

De modo a classificar as legendas textuais, Teixidor (2008), segundo interpretação de Brito (15), descreve parâmetros a legendagem são: linguísticos, pragmáticos e técnicos. Os parâmetros linguísticos referem-se à tradução ocorrida na legendagem, podendo ser em relação à língua em si (interlinguístico ou intralinguístico) ou em relação à densidade do conteúdo que foi trabalhada no processo de tradução: se reduzido ou se foi mantido o conteúdo integral. Os parâmetros pragmáticos identificam aspectos da legendagem referentes a seu público alvo, à intenção da legendagem, ao tempo de sua produção e à autoria. E os parâmetros técnicos estão associados à opcionalidade da legenda (se a mesma pode ser desativada, como no caso das legendas fechadas), a sua forma

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de difusão (projetada, como no cinema, ou emitida, como na televisão), às cores (se poli ou monocromática), a sua incorporação (se a legenda aparece de forma estática ou dinâmica, com rolagem) e a seu arquivamento (se a legenda pode ser armazenada de forma independente do conteúdo) (15).

Além da conversação nas obras fílmicas, o texto sonoro está repleto de pontos de indeterminação (10), como se fossem vazios nas cenas não esmiuçados por meio da fala, que por sua vez, escapam da tradução escrita e interferem na assimilação do diálogo original. Dessa forma, o espectador assimila aos poucos o contexto geral do filme, extraindo de seu repertório ferramentas que o auxiliem na apropriação da mensagem.

Um aspecto relevante da legenda fechada (Closed caption), utilizada em algumas produções fílmicas em DVD é a inclusão da identificação do falante, dos efeitos sonoros e alguns sinais paralinguísticos. Esses efeitos muitas vezes contêm elementos que só podem ser compreendidos através de determinado som, como no clássico exemplo da porta que bate, cuja imagem não aparece (16).

A tradução de filmes levanta questões específicas que a diferenciam da tradução literária, pois se trata de uma transformação do texto falado em um texto escrito e, nesse processo, todas as características de cada meio devem ser respeitadas.

Além dos textos falados, nos filmes a música possui um caráter semântico facilmente entendido pelos ouvintes. A compreensão do enredo pelo espectador surdo pode ficar prejudicada sem acessar esse elemento textual. Um estudo desenvolvido na Universidade Estadual do Ceará aborda um tipo de tradução que interessa a esta pesquisa, e trabalha com a tradução e legendagem baseada em corpus1, e descreve músicas e efeitos sonoros presentes em filmes para os surdos, pois, à medida que tais componentes acústicos não verbais são elementos significadores no texto audiovisual, a tradução é necessária para a construção de

1

A técnica de tradução baseada em corpus analisa e descreve nas legendas para surdos (16) (59): A) densidade lexical - o número de palavras por minuto; B) o nível de condensação – percentual de fala reduzido; C) a segmentação – marcação do início e do final das legendas; D) as adições – palavras acrescentadas e E) as reduções - palavras e expressões que são excluídas ou transformadas. Esses critérios são fundamentais na tradução dos efeitos sonoros de uma obra audiovisual.

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13

sentido do espectador. Da mesma forma, se determinada ação for visível e compreendida por meio da imagem, a legenda perde o sentido (16).

Fica evidente, portanto, que a oralidade e demais elementos acústicos comportam uma quantidade de dados intransponíveis para o discurso escrito. Para Govovitz (10), em seus estudos sobre legendagem e tradução, existem marcações temporais que marcam a narrativa, pois...

... a fala é acompanhada de uma pluralidade de elementos, de ordem formal e de conteúdo, que podem ser apreendidos pelo público ao assistir o filme legendado (inflexões, entoações, gestualidade, expressões faciais e uma certa melodia). No entanto, não tem acesso a uma série de elementos, como jogos de palavras, variações dialetais, pressupostos e subentendidos, elementos culturalmente marcados e portadores de sentidos específicos de uma cultura e de uma dada língua (10).

O tradutor precisa, portanto, ter uma capacidade de reduzir elementos e sintetizar ao máximo a conversação, tentando reproduzir a mensagem de forma curta, clara e ajustada ao sentido da narrativa. Para além dessa dificuldade, existe uma série de normas relativas à legendagem. Na NBR 15.290/2005 (17), por exemplo, as diretrizes para a legenda oculta em texto que são produzidas por sistema de transcrição eletrônica, devem obedecer a critérios de abreviaturas, acertos, alinhamentos, caracteres, fundo/tarja, número de linhas, posicionamento, sinais e símbolos e sincronia, que interferem significativamente na qualidade da tradução produzida. Além disso, essas regras não consideram a variedade do público que consome esse tipo de produção.

É preciso que a tradução se estabeleça em adequação ao contexto geral do filme e mantenha com ele uma relação contínua, para que haja uma compreensão estrutural da obra. Para Gorovitz (10), “o ato tradutório transcende os aspectos específicos e estabelece-se como agente de transculturação, projetando no presente elementos do passado e combinando temporalidades”, ou seja, a complexidade da tradução cria uma possibilidade de construção e reconstrução de

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significados da diferença e do outro e que necessita atender a proposta da mensagem fílmica.

A evolução do mercado e a acessibilidade dos filmes por meio de legendas será abordada posteriormente, mas cabe discutir que, nos contextos das salas de cinema do Brasil existe a opção de filmes estrangeiros legendados, filmes estrangeiros dublados e de filmes brasileiros. Nos filmes estrangeiros, o espectador pode escolher qual opção lhe agrada mais (com ou sem legenda). Já nos filmes brasileiros não há, nas salas de cinema, a opção de legendagem. Entre essas opções, entende-se que a pessoa surda tem um acesso limitado, restringindo-se aos filmes legendados.

2.1.5 Evolução do mercado

Historicamente, os produtores cinematográficos brasileiros ofereciam filmes com elementos que os estrangeiros não pudessem apresentar, ou tentavam fazer produtos semelhantes ao estrangeiro. A segunda tendência prevaleceu entre os produtores no Brasil, que escolheram como modelo a comédia erótica italiana, que fez desenrolar várias tramas que envolviam o sexo, a sexualidade e a sedução. Com o passar do tempo, foi proposta uma produção voltada ao público crítico universitário com uma sofisticação na comédia - evidenciando o sexo -pois esse tipo de produção alcançava um público numeroso de pessoas consideradas de baixo nível cultural (3).

Essa vertente, a partir do lançamento de A estrela, alcançou o público verticalmente, ou seja, juntou o sucesso das bilheterias com uma aceitação razoável de público com cultura universitária, considerado de bom gosto. Para não provocar a ira dos mais críticos, as produções começaram a ganhar uma originalidade especial, e a questão da vulgaridade deixou de ser um ponto decisivo dos filmes brasileiros, pois entrou em jogo também a linearidade das narrativas, as performances dos atores, a estética, e um estilo que passaram a oferecer uma imagem cultural mais refinada (3).

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Atualmente, de acordo com os dados acumulados de público e renda da ANCINE, em 2013, 81,4% dos títulos exibidos foram estrangeiros e 18,6% foram brasileiros (18). Comparado aos anos anteriores, o Brasil vem ampliando seu repertório de produção fílmica, porém ainda é um número tímido frente aos outros países.

Frente à maciça presença do produto estrangeiro nas salas de cinema, a Cota de Tela, promulgada pelo Decreto nº 7.874/2012 (19), determina o número de dias e a diversidade mínima de títulos brasileiros a serem apresentados no Brasil. Os filmes estrangeiros não cumprem cota, pois esta é um mecanismo estabelecido para defender a indústria nacional. Em 2013 foi estabelecido que, dependendo do número de salas de exibição do complexo, os cinemas deveriam cumprir uma Cota de Tela mínima de exibição de filmes nacionais. Para complexos de 6 e 7 salas, por exemplo, a obrigação foi de 63 dias por cada sala e no mínimo 8 e 9 títulos no complexo.

Atualmente, com a lei 12.485/2011 (20), que dispõe sobre a comunicação audiovisual de acesso condicionado e obriga os canais a cabo a exibir, semanalmente, produções brasileiras em horário nobre, existe a possibilidade de uma ampliação expressiva do mercado audiovisual, e esse pode ser um importante passo para uma maior apreciação do cinema nacional pelos espectadores.

De acordo com o portal Filme B (21), observa-se que a variação ao longo do ano do número de espectadores em 2013 foi maior, com maior pico em julho, que coincide com a época de férias escolares. A variação em 2014 foi menor ao longo do ano e não foi verificado pico em julho (Figura 3), que pode estar relacionado com os eventos da Copa do Mundo realizados no Brasil nos meses de junho e julho, respectivamente.

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Figura 3 - Comparativo de público - em milhões

E, no cenário brasileiro, percebe-se uma variação de público, conforme demonstrado na Figura 4, com pico de público no filme de ação “Tropa de Elite 2”, gênero preferido pela maioria do público e ainda pouco produzido no Brasil.

Figura 4 - Ranking nacional 2000-2013 Fonte: FilmeB (21)

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Longe de querer trazer à luz as minúcias da trajetória dos filmes brasileiros, o fato é que o cinema é uma possibilidade de enriquecimento cultural, social e linguístico, pois o filme pode criar uma nova perspectiva de explorar conteúdos, contextualizar fatos cotidianos e de proporcionar prazer dentro de um ambiente social. Esse sistema dinâmico do cinema alcança um espaço singular dentro do imaginário, onde as mensagens são compartilhadas, assimiladas e vividas, num quadro de interação entre o sujeito e a obra para que o sentido seja construído por cada sujeito, de acordo com sua subjetividade e sua cultura.

Todas as pessoas têm o direito de acessar essa arte, sendo elas ouvintes ou não. A valorização das diferenças das pessoas e o estímulo do consumo do cinema enquanto um veículo de comunicação, arte e entretenimento, é um ato de valorização do direito da igualdade de oportunidades de acesso aos ambientes sociais – o que não difere para as pessoas surdas – e que favorece a preparação para a vida na sociedade contemporânea.

Posteriormente, serão abordadas questões como: identidade e diferença, relativas ao surdo, e as possibilidades atuais de recepção das obras fílmicas por esse público.

2.2 O PÚBLICO SURDO 2.2.1 Identidade e Diferença

Os conceitos de identidade e diferença são ativamente modificados no mundo cultural e social, devido ao contato do eu com o outro, possibilitando sempre a atualização de novas identidades. Na perspectiva da diversidade proposta por Silva (22), a diferença e a identidade tendem a ser naturalizadas, cristalizadas, essencializadas. Ambas ligam sujeitos por traços em comum (cor, raça, credo, por exemplo), caracterizando-os como originais. Mas as identidades também se fundem num processo de hibridação no qual esses traços continuam visíveis, porém marcados pela diferença, numa relação de estreita dependência.

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Para Bakhtin (9), as identidades são construídas por meio da alteridade2, momento em que os sujeitos negociam novos papéis na relação com o outro. O contato dialógico entre os sujeitos não é necessariamente um lugar de harmonia, nem um lugar em que alguns sujeitos simplesmente dominam outros, mas um espaço em que há tensões e negociações de identidade, o que é uma tarefa interminável.

Segundo Hall (23) a identidade se configura como um processo de mudança e transformação e se relaciona com as marcações da diferença e da exclusão que tem a ver com questões de ser e estar no mundo, oriundas da subjetividade que levam em conta os processos psíquicos inconscientes e da relação com o outro, construídas junto às práticas discursivas. Para Silva (22) identidade e diferença são atos de criação linguística e que precisam ser nomeados. É por meio do discurso que as instituímos em nossa cultura e em nosso simbolismo, mostrando traços de relações de poder.

Para contextualizar as marcações de identidade das pessoas surdas, Skliar (24) afirma, com base em estatísticas internacionais, que cerca de 95% das crianças surdas são filhas de pais ouvintes que, em sua maioria, desconhecem ou rejeitam a língua de sinais. Portanto, a situação vivida pelas crianças surdas filhas de pais ouvintes geralmente é marcada pela opressão. Para Lane (25), o grupo de sujeitos surdos é “estigmatizado3” pela sua cultura, à qual é impossível transmitir, da forma habitual, um certo sentido da sua identidade enquanto membro de uma minoria. A negação dessa diferença por parte dos pais pode influenciar negativamente na construção das identidades dessa criança, ao passo que, a aceitação de ser surdo como herança cultural pode enriquecer a sua própria vida e também a dos pais. O sujeito estigmatizado sofre um profundo descrédito devido sua diferença atribuída pela sociedade, conforme o relato de Anater (26):

2

A alteridade está presente nos diálogos e nos discursos do ser humano, e contribui para a constituição da identidade

3 O termo “estigma” é de origem grega e se referia, segundo Goffman (27), a sinais corporais que

evidenciavam alguma coisa de extraordinário ou mau sobre o status moral de quem os apresentava. Atualmente o termo estigma é aplicado mais à própria diferença do que à evidência corporal.

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O surdo muitas vezes é entendido como um estrangeiro. Não se confunda com um intruso, mas se esclareça como alguém que é diferente social, cultural e linguisticamente e passível de auto e inter-constituição através das relações que estabelece. Essas rotulações, esses estigmas, bem sabemos, fazem parte de toda cultura que se vê ameaçada com a presença do outro, como forma de distanciamento; quando os objetivos se fundem, sejam pela educação, pelo trabalho, em favor do conhecimento através das línguas etc (26).

Nessa mesma direção, Goffman (27) cita que a visibilidade de um estigma deve ser dissociada de certas contingências, ou seja, de ideias pré-concebidas de acordo com a primeira impressão no encontro com o outro. Os símbolos de estigma caracterizam-se por estarem continuamente expostos à percepção e tudo aquilo que foge à normalidade, à maioria, traz estranheza. Dessa forma, a pessoa ouvinte com o olhar acostumado à norma, à maioria linguística, pode desqualificar a pessoa surda antes mesmo de experimentar as possibilidades de comunicação entre esses dois universos.

Atualmente utiliza-se mais o conceito ‘identidades’ em virtude das múltiplas funções acumuladas pelos sujeitos nos âmbitos sociais, laborais e até mesmo virtuais. Dentro dessa perspectiva, a identidade cultural ou identidade surda é o ponto de partida para identificar as outras identidades. Entretanto, retomando os conceitos de identidade e diferença, vale ressaltar que ambos não estão fixos, pois “como a cultura não é só pensada, mas também vivida, as significações são continuamente avaliadas e transformadas pela ação humana” (28). Portanto, pretende-se aqui ressaltar que a expressão “ser surdo” abrange uma experiência de ser e estar no mundo, que é vivida no coletivo, mas sentida de maneiras particulares (29). Dessa forma, os conceitos excludentes de “deficiência” serão descartados neste trabalho, respeitando a subjetividade e a diversidade das pessoas surdas, que compõem um grupo cultural de minoria linguística em constante movimento.

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20 2.2.2 A comunicação dos surdos

Na comunicação das pessoas ouvintes, de acordo com Lane (25), a fala é privilegiada, enquanto a gesticulação já não é. Para a cultura ouvinte a surdez representa a falta de algo. O mesmo autor traz que, historicamente a falta sempre fez parte da realidade dos sujeitos surdos, pois estes ocupavam a posição de não humano, não falante, incapaz de aprender, sem possibilidade de desenvolvimento moral e intelectual.

Com o início de sua educação, em meados do século XVI, houve um deslocamento nessa posição marcada pela incapacidade, pela não-humanidade que os definia. O sujeito surdo começa, portanto, a ser olhado como apto à linguagem, capaz de comunicar-se, de pensar, de expressar sentimentos, um ser de moral, não é mais considerado um ser rudimentar e a posição do sujeito surdo é tornada humana (30).

A forma de comunicação é o principal eixo nas discussões das transições históricas ligadas à posição ocupada pelo sujeito surdo e pela sua representação, em que a falta da linguagem oral passa a ser percebida como diferença cultural, conforme o relato de Thoma (31).

Em cada tempo, a partir da hipótese de que há uma força operacional nos conceitos, os/as surdos/as são apresentados (e representados) como deficientes auditivos, surdos-mudos ou simplesmente surdos. Para a comunidade surda brasileira e para os profissionais da área que participam das discussões propostas pelas instituições representativas (clubes e associações de surdos; escolas especiais e federações), a mais recente defesa é para a adoção do termo “surdo” referindo-se a um grupo de sujeitos pertencentes a uma comunidade cultural e linguisticamente distinta (31).

A língua é uma das maiores manifestações da condição humana e, a língua natural dos surdos brasileiros é a Língua Brasileira de Sinais – Libras, que em 2002 foi promulgada por meio da Lei nº 10.436 (32) e regulamentada em 2005, por meio do Decreto nº 5.626 (33). Essa perspectiva política traz a concepção de

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que a pessoa surda é potencialmente bilíngue porque tem o direito de usar a sua língua natural para se comunicar e o direito a aprender sua segunda língua, como forma de garantir o direito do exercício de cidadania:

...Art. 15. Para complementar o currículo da base nacional comum, o ensino de Libras e o ensino da modalidade escrita da Língua Portuguesa, como segunda língua para alunos surdos, devem ser ministrados em uma perspectiva dialógica, funcional e instrumental (33).

Pode-se afirmar que a regulamentação da Libras como segunda língua oficial brasileira e a primeira língua das pessoas surdas foi um passo importante ao prestigiar sua fluidez e completude e, principalmente, ao reconhecer legalmente a identidade cultural surda. Além disso, a Libras é considerada como parte do patrimônio cultural imaterial da Nação, juntamente com outras 210 línguas não oficiais faladas em comunidades linguísticas no Brasil, como o Guarani, por exemplo, que recolocam de forma mais democrática a “discussão sobre cidadania e pluralidade cultural, necessária para equacionar os novos papéis do Estado frente à comunidade nacional no século XXI” (34).

A Libras é uma língua plena, com estrutura própria e perfeitamente adequada para atender as demandas comunicativas das pessoas surdas. O que a caracteriza é sua modalidade viso-espacial representada por sinais. Enquanto para as pessoas ouvintes a língua oral se realiza por meio da fala, a língua dos surdos é visual, em que os surdos usam do corpo (sinais) e do espaço para formularem um discurso.

Como qualquer língua, a Libras precisa ser aprendida, e esse processo ocorre em período análogo à aquisição (da fala) de crianças ouvintes (35). Por isso, quanto mais precocemente a criança surda tiver contato com sua língua natural, maior sua atividade intelectual e seu repertório comunicativo. Para Bakhtin (9), a criança é membro ativo da comunidade linguística a que pertence e adquire a linguagem desde que nasce participando do fluxo dinâmico do processo de comunicação verbal e do contexto social imediato e, à medida que a criança atribui sentido ao mundo, passa a conhecê-lo.

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22

Esse fluxo dinâmico está diretamente relacionado com as experiências linguísticas nas suas mais variadas formas (relação entre pares, contação de histórias, narrativas fílmicas, entre outros) e, o envolvimento familiar no processo de aquisição da Libras é de fundamental importância para o desenvolvimento emocional e cognitivo da criança surda. De acordo com os estudos de Silva (36), sobre o uso de categorias gramaticais pelo surdo, crianças surdas filhas de pais também surdos tem melhor performance linguística se comparado aos filhos surdos de pais ouvintes. Um bom narrador em ambientes sociais é aquele que apreendeu desde a mais tenra infância, formas de explorar todas as categorias envolvidas no discurso narrativo, primeiro na forma oral (visual) e, depois, na forma escrita via escola.

Mas a aceitação dos pais ouvintes quanto à diferença do filho surdo pode sofrer resistências principalmente devido ao jogo de poder no qual as línguas de prestígio prevalecem em relação às demais. Segundo Maher (28), existe uma tentativa de supressão da língua minoritária, primeiro por se pensar que “a língua minoritária vai dificultar, ou mesmo impedir, a aquisição da língua de prestígio” e, além disso, existe o “temor de que a convivência de duas línguas representaria sobrecarga ao cérebro, provocando confusão mental e dificuldade de comunicação”, porém ambas as afirmações são baseadas em crença infundadas, que visam desvalorizar as línguas minoritárias.

Mesmo quando aceita, a falta de conhecimento da Libras faz com que os pais ouvintes se comuniquem com seus filhos surdos de maneira singular. Essa questão é discutida por Gesser (37) e Silva (38), que defendem o uso caseiro dos sinais enquanto uma forma de comunicação em sua plenitude, e que faz gerar uma variedade de sinais dentro da Libras, porém, essas afirmações são geralmente contestadas por surdos já escolarizados, na tentativa de se uniformizar a sua língua.

Para Maher (28), é necessário sair do casulo social e linguístico para se compreender que as identidades culturais não são fixas nem uniformes. Pode-se pensar com essa afirmação que tanto a Libras quanto o português são sistemas dinâmicos e são aprendidas pelos sujeitos surdos de maneiras diferentes. Além

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23

disso, a “competência comunicativa de um sujeito bilíngue só pode ser compreendida e avaliada de fato, tendo referência às funções que ambas as línguas de seu repertório verbal tem para ele” (28).

Portanto, o português deve ser considerado uma segunda língua - L2, que envolve alfabetização e letramento. O ensino do português parte das habilidades interativas e comunicativas já adquiridas pelas crianças surdas com sua língua natural que atua como mediadora para a produção da escrita de sua L2. Dessa forma, a escrita em português pelo surdo segue a estrutura visual da Libras, o que dá margem ao aparecimento de estruturas sintáticas que não seguem as regras gramáticas convencionais do português. Segundo Silva (36),

É preciso deixar claro para os alunos surdos que no discurso oral (ou gestual) o interlocutor, presente fisicamente, é ativo. Os participantes da interlocução dividem um contexto temporal e espacial que lhes permite indicar ou reorganizar a exposição. Há então a possibilidade de pedir esclarecimentos ou mesmo voltar a um tópico que fora abandonado anteriormente [...]. Já a escrita, por não dispor dos dados do contexto e da situação de interação em que audiência e produtor estão presentes, necessita suprir a falta de tais elementos extratextuais de forma a garantir a inteligibilidade do texto. O texto escrito deverá permitir a sua leitura e por isso deve ser claro, objetivo e coerente para que sirva a esse propósito (36).

Dessa forma, os elementos coesivos próprios da estrutura gramatical do português que podem vir a faltar num texto escrito pelo surdo, são plenamente preenchidos pela estrutura narrativa no seu discurso oral por meio da Libras. O português escrito pelo surdo é conceituado por Silva (38) como “português surdo4”, para mostrar que há diferenças na escrita entre surdos e ouvintes, potencializada pelo uso de Libras.

Isso posto, percebe-se a necessidade de ampliar as formas de participação dos surdos na sociedade, por estarem, a leitura e a escrita do português

4 O termo “português surdo” foi criado pela autora para fazer uma analogia com o termo cunhado

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fortemente enraizadas nos contextos sociais, culturais e de lazer. Sem ampliar a participação dos surdos, a Libras continuará causando estranheza seja na escola, no cinema, e em outros espaços sociais. Para que os surdos acessem o cinema, por exemplo, é de fundamental importância que esse grupo de minoria linguística tenha oportunidade de aprender a se comunicar funcionalmente em sua segunda língua, sem se distanciar daquilo que se é (usuário da Libras em todas as suas formas). Ademais, espera-se que a sociedade se torne cada vez mais acessível, respeitando a riqueza da diversidade que se tem (pluralidade linguística),

2.2.3 O cinema e o público surdo

No Brasil, políticas inclusivas foram desenvolvidas para assegurar o direito de acesso do surdo à mídia televisiva em todas as classes sociais. A Lei de Acessibilidade nº 10.098 (39), os Decretos nº 5.626/2005 (33) e nº 5.296/2004 (40), NBR 15.599 (41), NBR 15.290 (17) e a NBR 9.050 (42), tratam sobre a acessibilidade em todos os meios de comunicação, incluindo o cinema, seja por meio da eliminação de barreiras arquitetônicas, seja por meio de legendagem, no qual...

... as salas de espetáculo deverão dispor de sistema de sonorização assistida para pessoas portadoras de deficiência auditiva, de meios eletrônicos que permitam o acompanhamento por meio de legendas em tempo real ou de disposições especiais para a presença física de intérprete de Libras e de guias-intérpretes, com a projeção em tela da imagem do intérprete de Libras sempre que a distância não permitir sua visualização (40).

Está em tramitação, por meio de Ação Civil Pública, o Projeto de Lei nº 1078/2007 (43), que dispõe sobre a adoção de legendas descritivas em língua portuguesa em filmes brasileiros, para garantir o cumprimento do dever constitucional de inclusão das pessoas surdas, oferecendo condições de acesso à cultura, com base em princípios e outras leis.

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Cabe ressaltar que as produções cinematográficas brasileiras não possuem legendas nas salas de cinema e mesmo nos filmes estrangeiros com legenda em português, pode haver dificuldade de acesso para o surdo que tem domínio do português escrito, pois muitos sons não são representados na escrita como, por exemplo: o som de suspense, som de um tiro, e o som de uma sirene, ficando o surdo na dependência de que um ouvinte sinalize o que está acontecendo, ou simplesmente fique sem entender o contexto da narrativa fílmica.

As Ajudas Técnicas têm um papel importante no desenvolvimento de recursos e serviços para mediar as barreiras de comunicação, como a falta de legendas, por exemplo. As Ajudas Técnicas estão previstas no Capítulo VII do Decreto 5.296 de 2004 (40), consideradas no Art. 61 como “técnicas, produtos, instrumentos, equipamentos ou tecnologia adaptados ou especialmente projetados para melhorar a funcionalidade da pessoa com deficiência [...]”.

Novas tecnologias de acessibilidade têm sido desenvolvidas para facilitar a participação social dos surdos nos contextos sociais e de lazer, mas ainda são poucos os filmes brasileiros que possuem legendas descritivas em português.

De acordo com o cineasta e pesquisador surdo, Castro (44), a compreensão entre a linguagem cinematográfica (LC) e a língua de sinais (LS) criam possibilidades educacionais que podem contribuir para o desenvolvimento cognitivo dos surdos. Castro trabalha com o movimento da câmera (panning, tilting, raccord, zoom in e zoom out), com os efeitos do cinema (câmera rápida, câmera lenta, piscando, morphing e fade away) e com a edição das cenas gravadas (edição paralela, edição diálogo e cut), de modo a proporcionar que os efeitos imagéticos sejam focados na ação e na imagem, dando menor ênfase no uso de certas preposições, interjeições e conectivos da língua portuguesa.

Existem algumas produções comerciais em DVD que traduzem os efeitos sonoros como os filmes: Irmãos de Fé (2004), O Signo da Cidade (2008) e Nosso Lar (2010) (16). Outro exemplo de produção é o projeto Videoteca – Cinema Nacional Legendado, desenvolvido pela Associação de Reabilitação e Pesquisa Fonoaudiológica – ARPEF, em parceria com o Centro de Produção de Legendas (CPL) e realização do Centro Cultural do Banco do Brasil – CCBB. O Projeto

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Videoteca visa traduzir o cinema nacional ao público surdo por meio de legendas closed caption. Porém, tais produções não são comerciais e estão disponíveis em algumas instituições que trabalham com surdos, limitando o acesso daqueles que não fazem parte de tais espaços (45).

Outro trabalho relevante apoiado pelo CCBB é o “Projeto Assim Vivemos” que oferece filmes gratuitos e espaços para debates sobre os temas, com tradução simultânea para Libras e todas as sessões fílmicas tem legendagem especial para surdos.

Um tipo de legenda que pode interessar o público surdo é a legenda visual ou a janela de Libras. Esta envolve um processo de tradução simultânea da mensagem oral para um texto visual, bastante complexo, pois exige que o intérprete tenha proficiência em Português e em Libras, e também capacidade de raciocínio, de compreensão de textos e compromisso ético na transmissão sem interferir no conteúdo da mensagem original da obra.

Ao intérprete da Libras, cabe a responsabilidade de transmitir a mensagem dita. Para tanto, não precisa manter a mesma forma gramatical apresentada na língua fonte, mas deverá garantir que o conteúdo chegue aos surdos (que naturalmente são os receptores desta língua) na mesma proporção qualitativa que chega aos que ouvem o que é proferido. Porém, para realizar tal feito o intérprete deve fazer escolhas lexicais adequadas, estruturar a língua alvo respeitando sua organização gramatical, bem como desenvolver técnicas de recepção-emissão simultâneas, ou seja, sua agilidade em ouvir deve ser relevante para não perder informações mencionadas no discurso falado (46).

O texto fílmico legendado por meio da janela de Libras tem sido utilizado, em geral, na tradução de histórias infantis, músicas, contos, e alguns estão disponíveis gratuitamente na internet. Na composição dos vídeos, geralmente é utilizada a técnica do chroma key na filmagem da tradução, ou seja, o intérprete é inserido no filme original sem um plano de fundo, para impactar o menos possível a narrativa conforme exemplos nas Figura 6.

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Figura 5: Exemplos de janela de Libras com a técnica chroma key. Fonte: filmesquevoam.com

Faz-se necessário um esforço interdisciplinar para desenvolver soluções de acessibilidade que atendam o público surdo. Pode-se dizer que para esse grupo a demanda por novas tecnologias é crescente e, qualquer que seja a solução adotada há de se analisar quais realmente são funcionais, pois, segundo Cambra et al (47), um dos principais problemas para a pessoa surda em relação à integração social são as barreiras de comunicação que se encontram no mundo da audiência.

Referências

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