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IMPOSSIBILIDADE DE AFASTAMENTO DA INCIDÊNCIA DE NORMAS INFRACONSTITUCIONAIS NOS TRIBUNAIS SEM DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ

FACULDADE DE DIREITO

CURSO DE DIREITO

CAIO RODRIGUES GONÇALVES

IMPOSSIBILIDADE DE AFASTAMENTO DA INCIDÊNCIA DE NORMAS INFRACONSTITUCIONAIS NOS TRIBUNAIS SEM DECLARAÇÃO DE

INCONSTITUCIONALIDADE

FORTALEZA

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IMPOSSIBILIDADE DE AFASTAMENTO DA INCIDÊNCIA DE NORMAS INFRACONSTITUCIONAIS NOS TRIBUNAIS SEM DECLARAÇÃO DE

INCONSTITUCIONALIDADE

Monografia submetida à Coordenação do Curso de Graduação em Direito da Universidade Federal do Ceará, como requisito parcial para obtenção do grau de bacharel em Direito.

Área de concentração: Direito Público

Orientadora: Profa. Dra. Juliana Cristine Diniz Campos

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IMPOSSIBILIDADE DE AFASTAMENTO DA INCIDÊNCIA DE NORMAS INFRACONSTITUCIONAIS NOS TRIBUNAIS SEM DECLARAÇÃO DE

INCONSTITUCIONALIDADE

Monografia submetida à Coordenação do Curso de Graduação em Direito da Universidade Federal do Ceará, como requisito parcial para obtenção do grau de bacharel em Direito.

Área de concentração: Direito Público

Orientadora: Profa. Dra. Juliana Cristine Diniz Campos

Aprovada em __/__/____.

BANCA EXAMINADORA

_______________________________________________ Profa. Dra. Juliana Cristine Diniz Campos

Universidade Federal do Ceará (UFC)

________________________________________________ Prof. Msc. Emanuel de Melo Ferreira

Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (UERN)

__________________________________________________ Prof. Dr. George Marmelstein Lima

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Primeiramente, agradeço, como não poderia deixar de ser, a Deus. Fiel em suas promessas e na guarda de minha ainda curta vida. Além disso, ao mesmo tempo em que agradeço, peço que continue a me guiar para que eu possa ser merecedor da sabedoria divina, guiada por seus ensinamentos.

Aos meus pais, Roney e Luciana, fontes inspiradoras nos dias mais difíceis, expressões do mais singelo e verdadeiro amor que pude desfrutar em vida. Aos meus irmãos, Renata e Felipe, bases de sustentação da família, contrapontos necessários às atitudes por vezes um tanto exageradas deste outro filho, e para os quais desejo mais sucesso do que o por mim venha a ser experimentado.

Ao restante da minha família, avôs e avó que já cumpriram suas missões em vida; avó Socorro, verdadeiro exemplo de mulher impositiva e à frente do seu tempo; tias e tios, primas e primos, que estiveram presentes na incansável caminhada de realização deste sonho que hoje começa a se concretizar.

À minha namorada, Jéssica Castelo, pela compreensão nas ausências, pelo apoio na vicissitude natural da minha breve carreira acadêmica, e pelo amor incondicional sempre demonstrado e duplamente retribuído.

Aos meus amigos de Tauá, ainda presentes, sem os quais muitas histórias memoráveis deixariam de ser contadas nos, hoje, esporádicos encontros. Desde o berço, a verdadeira amizade se construiu e, certamente, perdurará enquanto vivos estivermos.

Aos meus amigos do Colégio 7 de Setembro, da Faculdade de Direito e todos os demais que de alguma forma estiveram presentes desde o ano de 2010, contribuindo cada um à sua maneira para a formação de uma personalidade inacabada e em constante aperfeiçoamento.

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acadêmica, notadamente no Escritório Dantas Advogados & Consultores, no R. Amaral Advogados e na Defensoria Pública Geral do Ceará.

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Justitia est constans et perpetua voluntas jus suum cuique tribuendi” (D.,

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A garantia da supremacia constitucional pressupõe meios de proteção à normatização superior, notadamente o controle de constitucionalidade de leis e atos normativos do Poder Público. Sabendo da existência dos controles difuso e concentrado no sistema jurídico brasileiro, deter-se-á ao estudo do modelo difuso no âmbito dos tribunais. Nestes, há um regramento específico para a declaração de inconstitucionalidade, oriundo da jurisprudência norte-americana, a chamada regra do full bench ou cláusula de reserva de

plenário, o qual deve ser aplicado, inclusive, quando houver afastamento parcial da incidência de normas infraconstitucionais. Demonstrar-se-á os prejuízos teóricos e práticos da não observância do incidente obrigatório por meio da análise da doutrina constitucionalista moderna, bem como da jurisprudência das cortes pátrias, especificamente no caso das transferências universitárias compulsórias.

Palavras-chave: Controle de constitucionalidade. Tribunais. Full Bench. Supremacia

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The guarantee of constitucional supremacy presupposes means of protection to the superior normatization, notably the judicial review of laws and normative acts of Public Power. Knowing the existence of diffuse and concentrated controls in the brazilian legal system, will be concentrated the study of the diffuse model in the scope of the courts. In these, there is a specific rule for unconstitutionality declaration, from United States jurisprudence, the full bench rule or reserve clause, wich must be applied, even when there is a partial removal from the incidence of infraconstitutional norms. The theoretical and practical impairments of noncompliance with the mandatory incident will be demonstrated through the analysis of modern constitutionalist doctrine as well as the jurisprudence of the country courts, specifically in the case of compulsory university transfers.

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1 INTRODUÇÃO ... 12

2 NORMAS CONSTITUCIONAIS ... 15

2.1 Conceito e natureza jurídica ... 17

2.2 Efetividade das normas constitucionais ... 19

2.3 Eficácias plena, contida e limitada ... 23

2.4 Hans Kelsen: o modelo piramidal de validade das normas ... 26

3 DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE DAS NORMAS INFRACONSTITUCIONAIS ... 31

3.1 Controles difuso e concentrado de constitucionalidade ... 34

3.2 Procedimento especial na declaração de inconstitucionalidade nos tribunais: cláusula de reserva de plenário ... 37

3.3 Diferenciação entre técnica hermenêutica e ativismo judicial no afastamento de incidência das normas infraconstitucionais ... 43

4 ESTUDO DE CASO: TRANSFERÊNCIAS UNIVERSITÁRIAS COMPULSÓRIAS ... 48

4.1 Afastamento da incidência da Lei nº 9.536/97 por suposta afronta a axiomas constitucionais, sem declaração expressa de inconstitucionalidade ... 48

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 53

REFERÊNCIAS ... 56

ANEXO A – LEI Nº 9.536/97 ... 59

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1. INTRODUÇÃO

Com o advento do constitucionalismo moderno, fruto de uma nova influência histórica do juspositivismo, a ideia de controle de constitucionalidade ficou intrinsecamente relacionada ao sistema de constituições rígidas, nas quais há uma clara distinção hierárquica entre poder constituinte e poder constituído. Nas palavras de Paulo Bonavides, “disso resulta a superioridade da lei constitucional, obra do poder constituinte, sobre a lei ordinária, simples ato do poder constituído, um poder inferior, de competência limitada pela Constituição mesma.”1

Sabendo de tal rigidez, bem como da superioridade hierárquica da normatização constitucional, diversos meios e modos de controlar a atividade do Poder Público de forma geral, quando eventualmente confrontante com o texto constitucional, foram normatizados na Constituição Federal de 1988, desde o controle abstrato das leis e atos normativos, influenciado pela doutrina de Hans Kelsen, ao controle difuso em qualquer grau de jurisdição, notadamente advindo do sistema jurídico norte-americano.

Todavia, a declaração de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público tem de ser vista com cautela, ao passo que a presunção de constitucionalidade tem de ser forte o suficiente para que somente seja mitigada quando não restar qualquer dúvida razoável de afronta direta aos preceitos superiores da República.2 Não é por outro motivo que existem procedimentos específicos e mais rigorosos para tal invalidação normativa, notadamente no âmbito dos tribunais colegiados, reduzindo-se a possibilidade de cometimento de decisões arbitrárias, as quais poderiam infringir a própria ideia de supremacia constitucional.

Em se verificando eventual descumprimento processual-constitucional nos tribunais, o desencadeamento de prejuízos das mais diversas ordens são inevitáveis, principalmente no que tange à legitimidade da atuação jurisdicional, à segurança jurídica e à proteção especial à normatização constitucional, conforme será cabalmente demonstrado em tópico específico.

1 BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional. 28ª ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2013,

p.307.

2 Cf. MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e aplicação do direito. Rio de Janeiro: Forense, 2007,

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O presente trabalho monográfico versará sobre a necessidade de observação dos procedimentos específicos para declaração de inconstitucionalidade no âmbito dos tribunais brasileiros, sejam eles os Tribunais de Justiça, sejam os Tribunais Regionais Federais ou Cortes Superiores3, na medida em que atuem originariamente ou em sede recursal.

Para tanto, faz-se necessário um breve aprofundamento acerca da formação do constitucionalismo moderno, com toda a influência juspositivista que lhe é peculiar, bem como perpassar pela ideia de constitucionalismo no estado social em detrimento daquele no estado liberal anteriormente perseguido.

No primeiro capítulo, será conceituada norma constitucional, momento no qual será delimitada sua abrangência e natureza jurídica, além de verificada sua efetividade social, não sem antes passar por uma sintética explanação acerca do sentido de constituição que será utilizado como paradigma para o desenvolvimento argumentativo.

Ademais, demonstrar-se-á que todas as normas constitucionais, sejam elas de eficácia plena, contida ou limitada têm aplicação jurisdicional obrigatória, cada uma ao seu modo. O objetivo é desmistificar a ideia de que princípios programáticos e normas gerais pendentes de regulamentação específica restariam configurados como mero aconselhamento ao poder constituído, sem força normativo-constitucional.

Por fim, verificar-se-á de onde surgiu a própria ideia de escalonamento normativo, importante para o entendimento da rigidez constitucional e do controle de constitucionalidade abstrato, fruto indubitável da doutrina kelseniana, na medida em que enunciou a teoria de validade das normas, segundo a qual aquelas inferiores obrigatoriamente encontram como fundamento de validade as superiores.

No segundo capítulo, adentrar-se-á minuciosamente à ideia de controle de constitucionalidade, desde logo restringindo a análise ao âmbito dos tribunais, tendo em vista que estes possuem competências originárias e recursais. Sem embargo, a obrigatória diferenciação entre os modos de controle será sucintamente realizada, com o fito de justificar a atuação do aplicador do direito quando da declaração de inconstitucionalidade.

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Ponto fundamental desse capítulo e ideia central deste estudo é o subtópico do procedimento específico para declaração de inconstitucionalidade nos tribunais, a chamada cláusula de reserva de plenário ou regra do full bench. Esta, hodiernamente em

manifesto desuso e verdadeiro desprezo, é a causa de problemas jurisdicionais dos mais diversos quando inobservada, na medida em que é o remédio constitucional adequado para a solução de vícios infraconstitucionais analisados na via difusa.

Seu descumprimento se dá, primordialmente, sob a alegação de que ao se restringir ou estender a incidência de uma norma infraconstitucional não se está por declarar uma inconstitucionalidade, mas somente estar-se-ia diante de uma técnica hermenêutica de interpretação conforme a constituição. A natural solução dessa controvérsia se dá pela diferenciação entre técnica hermenêutica e verdadeiro ativismo judicial, ao passo que, ao final, chega-se à conclusão de que não se confundem e, ao se modificar uma incidência normativa, deve-se obrigatoriamente ser verificada a regra especial de reserva de plenário.

Por fim, no terceiro capítulo, passadas as formulações teóricas pertinentes, faz-se uma análise prática do prejuízo do descumprimento da regra do full bench pelos

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2. NORMAS CONSTITUCIONAIS

Para a efetiva compreensão do objeto deste trabalho monográfico, faz-se necessária uma breve explanação acerca da delimitação do conceito de norma constitucional apta a instruir todo o restante do ordenamento jurídico, bem como controla-lo em virtude da sua força normativa superior.

De início, cabe salientar que a referida delimitação passa, obrigatoriamente, por uma análise anterior do sentido atribuído à própria constituição no sistema jurídico objeto deste estudo. Sem embargo, tratar-se-á tão somente da Constituição Federal de 1988, por mais que adendos sejam realizados utilizando perspectivas do direito comparado.

Nessa ordem de ideias, sabe-se que, ao longo da evolução do constitucionalismo, notadamente no espaço temporal concernente à mudança do estado liberal para o estado de bem-estar social, diversas correntes de pensamento surgiram para tentar atribuir um sentido inerente às constituições, fossem elas positivadas ou não. Destacaram-se, sobremaneira, as concepções de constituição sociológica, política e jurídica ou normativa pura.

A primeira delas, diz respeito à exacerbação da influência da realidade social e política, concebendo a constituição como fato, antes que como norma.4 Nessa perspectiva, tem-se que a constituição é uma forma de ser, e não de dever-ser. Segundo a definição de Lassale, constituição de um país é, em essência, a soma dos fatores reais do poder que regem nesse país5, conceito bastante semelhante ao atribuído àquelas em sentido político enunciadas por Carl Schmitt.

Por outro lado, os defensores de tal concepção política de constituição diferem do sociologismo jurídico no tocante à existência da chamada decisão política fundamental, concreta de conjunto sobre o modo e forma de existência da unidade política. Nesse sentido, mister é a diferenciação entre constituição e leis constitucionais realizada por Carl Schmitt, segundo o qual aquela seria formada apenas pelos dispositivos

4 SILVA. José Afonso da. Aplicabilidade das normas constitucionais. 6ª ed. São Paulo: Malheiros

Editores, 2002, p. 22.

5 LASSALE, Ferdinand. Que es una constitución? Trad. de W. Roces. Buenos Aires: Ediciones Siglo

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que contêm a chamada decisão política fundamental, ou seja, as normas que organizam o Estado e consagram os direitos individuais dos cidadãos, bem como todas as demais que possuam manifesta relevância social, sem as quais não poderia haver o pleno funcionamento da máquina estatal, e esta pelo restante de normas constantes no corpo do texto constitucional, relativas e secundárias diante daquelas6, inscritas tão somente para ficarem ao abrigo de modificações pelas leis ordinárias.7

De outro modo, a concepção jurídica, mais difundida na doutrina pátria e nos sistemas jurídicos ocidentais hodiernos, afirma que a constituição se apresenta essencialmente como norma jurídica, lei fundamental de organização do Estado e da vida jurídica de um país.8 Tem-se que se trata de um sistema de normas,9 no qual é estabelecida a organização estatal, suas funções, além de todos os dispositivos aptos a garanti-lo e realiza-lo no contexto social em que se insere.

Expoente dessa corrente, Hans Kelsen radicalizou sua conceituação ao ponto de excluir as influências sociológicas, políticas e filosóficas sobre o direito, sendo este, segundo ele, um puro dever-ser, com sua máxima expressão na norma pura da constituição, e esta decorrente de uma norma hipotética fundamental, conforme será mais adiante demonstrado.10

Adotar-se-á no presente trabalho monográfico a mesma posição seguida por José Afonso da Silva, segundo o qual a constituição tem de ser entendida em sentido formal, como um corpo de normas de igual validade – em diferenciação ao conceito material, na medida em que este somente considera como constitucionalmente válidas as normas fundamentais do Estado –, bem como precursora de direitos fundamentais e normas essenciais que necessitam estar presentes no corpo das constituições para haver maior proteção sobre o poder legiferante do constituinte derivado. Além disso, considera-se constituição formal como correspondente ao conceito de constituição escrita e

6 Em suma, tem-se a divisão, segundo a teoria enunciada por Carl Schmitt, entre normas constitucionais em

sentido material e normas constitucionais em sentido formal. Cf. SCHMITT, Carl. Teoría de la constitución. Reimpressão. Madri, Editorial Revista de Derecho Privado, s/d e s/ indicação de tradutor.

7 SILVA. José Afonso da. Aplicabilidade das normas constitucionais. 6ª ed. São Paulo: Malheiros

Editores, 2002, pp. 28 e 29.

8Ibid.

9Cf. García-Pelayo, Derecho constitucional comparado, p. 34.

10 Diz-se norma constitucional pura exatamente por estar dissociada de fatores sociológicos, políticos e

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rígida.11Assemelha-se aos sistemas jurídico e político anteriormente mencionados, podendo ser considerado doutrinariamente como misto.

Ademais, por mais que se considere o sentido constitucional como meramente formal, não se exclui da análise do Direito Constitucional todas as demais normas materialmente constitucionais não escritas na Carta Magna, mas a estas não se pode atribuir o status de norma constitucional de fato, em virtude da sua não aderência expressa

ao texto do constituinte originário ou reformador12. Ainda, não se vislumbra qualquer impossibilidade de atribuição de caráter normativo-constitucional aos princípios implícitos na Constituição Federal, tendo em vista que são decorrentes de normas positivadas e expressas, e não de mera faculdade interpretativa do operador do Direito.

Feitas tais considerações, e sabendo a partir de qual interpretação do sentido constitucional será desenvolvido o presente estudo, passar-se-á à análise do conceito e natureza jurídica já iniciados da norma constitucional, para que se possa atestar sua superioridade em relação aos demais dispositivos legais e, por consequência, a necessidade de maior proteção dentro do nosso ordenamento jurídico.

2.1 Conceito e natureza jurídica

Na acepção já esposada de constituição, tem-se como decorrência natural a conceituação de norma constitucional como aquela integrante da constituição rígida, importando tão somente seu conceito formal, nada interessando seu conteúdo efetivo, tendo em vista que só ela constitui fundamento de validade do ordenamento jurídico.13

Nesse contexto, incluem-se também como normas constitucionais aquelas meramente programáticas, sem aplicabilidade direta, mas tão somente indutoras de um comportamento social e legiferante, desde que positivadas no corpo da constituição rígida ou dela decorrente e por ela albergada de maior relevância em detrimento da legislação ordinária, visto que é errôneo pretender que certas disposições constitucionais, só pelo

11op. cit., pp. 40 e 41.

12 Ressalta-se que o texto dos tratados internacionais com força de norma constitucional adere à

Constituição, já que sua incorporação se dá por ordem explícita do constituinte.

13 SILVA. José Afonso da. Aplicabilidade das normas constitucionais. 6ª ed. São Paulo: Malheiros

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fato de não terem eficácia positiva direta e imediata, não sejam normas jurídicas, e normas jurídicas constitucionais.14

A relevância de tal conceituação, nos moldes delineados, diz respeito à futura análise do controle de constitucionalidade das normas infraconstitucionais, as quais possuem como parâmetro de validade estas que ora são definidas. De nada valeria saber que incide um controle sobre determinada legislação se não dispuséssemos da ampla ciência acerca da normatização controladora.

De outro modo, não basta a mera incidência da norma num determinado texto escrito dotado de relevância superior para que se configure como válida, devendo, ainda, ser observado se foi seguido o devido processo legislativo para sua instituição, se elaborada pelo poder constituinte reformador competente, bem como se está vigente em seu sentido técnico-formal.

Não se pretende abordar, em profundo, o processo legislativo inerente à formulação da norma constitucional, apenas salientar a importância de sua observação para a validade de qualquer lei em sentido estrito, bem como ainda mais relevante para a legislação constitucional, visto que esta, por versar sobre matérias as quais, em tese, merecem maior proteção estatal, não pode ser instituída sem sua devida observância, sob pena de se afastar do próprio pressuposto da rigidez constitucional.

Ainda, quanto à vigência em seu sentido técnico-formal, diz respeito à sua efetiva entrada em vigor em data determinada, por meio da promulgação e publicação da norma, fazendo com que esta se torne de observância obrigatória, ou seja, sendo exigível sob certas condições.

Nos termos expostos por Luís Roberto Barroso:

“se estiverem presentes os elementos agente, forma e objeto, suficientes à incidência da lei, o ato será existente. Se, além disto, estiverem presentes os requisitos competência, forma adequada e licitude-possibilidade, o ato, que já existe, será também válido”.15

Logo, sendo a norma oriunda de um devido processo legislativo, no qual sejam observados os critérios de maior rigidez na sua elaboração, bem como sendo vigente e exigível após a promulgação e publicação, além de estar inscrita no corpo do

14Ibid, p. 51.

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texto constitucional ou dele derivado, tem-se como configurada uma norma constitucional nos termos aqui defendidos.

2.2. Efetividade das normas constitucionais

Passado o estudo da conceituação de norma constitucional, cabe realizar um adendo para analisar sua real efetividade na realidade social na qual está inserida, apta a gerar efeitos, fato que hoje tem na doutrina a intitulação de verificação da efetividade das normas constitucionais. A importância deste estudo no presente trabalho monográfico diz respeito à uma possível faculdade atribuída ao aplicador do direito de afastar a incidência de preceito constitucional sob a alegação de dissociação da realidade fática com a imposição normativa, sendo esta supostamente mera projeção utópica, ocasionada por um

charlatanismo constitucional.16

Nesse sentido, atribui-se tal problemática de ineficiência das normas jurídicas constitucionais ao amplo espectro de direitos e garantias fundamentais positivados nas constituições modernas, o qual, muitas vezes, mais preceitua do que efetiva. Tem-se uma cultura constitucional de utopia social, fazendo com que diuturnamente seja o texto superior infringido por manifesta impossibilidade de aplicação. Tal fato ocasiona, sobremaneira, a desvalorização e até a ilegitimidade do texto posto.

A Constituição Federal de 1988 não é diferente nesse tocante, tendo em vista que é composta de extensa normatização, com exacerbada positivação de garantias individuais e sociais, muitas das quais inaplicáveis na realidade fática brasileira, ocasionando sua mera ineficácia social, ou inefetividade jurídica. Não que tais normas não possam figurar como programáticas, também com caráter de regra, já que nas lições de Rui Barbosa “não há, em uma Constituição, cláusula a que se deva atribuir meramente valor moral de conselhos, avisos ou lições. Todas têm a força imperativa de regras, ditadas pela soberania nacional ou popular de seus órgãos”17, mas a estas, na prática, é dispensado somente o desprezo do limbo constitucional.

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Tendo em vista isso, Luís Roberto Barroso estabeleceu uma nova classificação das normas constitucionais, com o fito de, segundo o autor, “reduzir a discricionariedade dos poderes públicos na aplicação da Lei fundamental e propiciar um critério mais científico à interpretação constitucional pelo Judiciário”.18Estariam estas divididas em normas determinadoras da estrutura do Estado, instituidoras dos Poderes e definidoras de suas competências (Normas Constitucionais de Organização); normas fixadoras de direitos; e normas delineadoras de um fim a ser alcançado ou de um princípio a ser observado, sem especificar condutas a serem seguidas (Normas Constitucionais Programáticas).

As primeiras dizem respeitos à organização e funcionamento do Estado, típicas de todas as constituições democráticas hodiernas, obrigatórias para estipular os limites atribuídos à cada entidade e órgão estatal. Diferenciam-se das demais normas de conduta ao passo que estas se estruturam de forma binada19, ou seja, preceituam uma hipótese que, se ocorrer no mundo dos fatos, gerará um dispositivo, produzindo os efeitos jurídicos a elas inerentes. Aquelas, em verdade, não disciplinam comportamentos propriamente ditos, mas organizam a estrutura estatal com suas respectivas regras de funcionamento.

As segundas, por mais controversas que possam ser as definições de direito assumidas pelo próprio autor, foram delimitadas à conceituação de direito subjetivo, segundo o qual, em breves linhas, o beneficiário da norma pode requerer uma prestação positiva ou negativa por parte do Estado. Ainda, sustenta o autor que:

“direito é direito e, ao ângulo subjetivo, ele designa uma específica posição jurídica. Não pode o Poder Judiciário negar-lhe a tutela, quando requerida, sob

o fundamento de ser um direito não exigível. Juridicamente, isso não existe”.20

Logo, sem adentrar aos infortúnios das imprecisões terminológicas, acabou por descrever normas que atingem exatamente ao binômio hipótese-dispositivo anteriormente mencionado.

Por fim, as terceiras estão situadas no campo da conceituação de normas programáticas, aquelas que definem fins e preceitos a serem seguidos pelo Estado e, notadamente, pela administração pública de forma geral. Segundo José Afonso da Silva,

18Op. cit., p.8.

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“tais normas estabelecem apenas uma finalidade, um princípio, mas não impõe propriamente ao legislador a tarefa de atuá-la, mas requer uma política pertinente à satisfação dos fins positivos nela indicados”.21Nesse sentido, não atribuem direitos subjetivos aos cidadãos, ao passo que não se pode tutelar uma prestação positiva ou negativa do Estado, mas pode-se requerer, com base nelas, a anulação de ato ou norma do poder público que vá de encontro aos comportamentos finalísticos preceituados, por manifesto vício de inconstitucionalidade.

Percebe-se, diante das três classificações da norma jurídica constitucional supramencionadas, que nenhuma delas deixa ao arbítrio do aplicador do direito sua aplicação, mas, em contrário, são todas de observação obrigatória, afastando qualquer entendimento no sentido de que determinada norma positivada no texto constitucional ou a ele aderente possa ser desprezada sob a alegação de generalidade ou de falta de prestação objetiva a ser realizada.

Ainda assim, a mera constatação de observância obrigatória dos preceitos normativos expostos no texto constitucional não faz com que se mude a realidade fático-jurídica brasileira, tendo em vista que é dificílima a aplicação de normas programáticas ou de eficácia contida, e demanda uma atuação criteriosa por parte dos operadores do direito, na medida em que não se pode dissociar o contexto social do direito posto. A título exemplificativo, a norma insculpida no art. 5º, XXIII, da Constituição Federal, preceitua que a propriedade atenderá a sua função social, estendendo sua finalidade a todos os setores da atividade estatal. Esta imposição dirige-se a todos os poderes da República. No Legislativo, para que se elaborem e se discutam projetos de lei no sentido de redistribuição igualitária de terras, suprimindo aquelas improdutivas. No Executivo, para que sejam fiscalizadas tais terras, bem como sejam adotadas políticas públicas no sentido de dar produtividade às que não a tem, além de fomentar a realização da famigerada reforma agrária. Já no Judiciário, cabe verificar a legalidade dos atos produzidos pelos outros poderes, e, na medida do possível, anular aqueles que vão de encontro à referida norma. Todavia, na realidade, não é tão simples assim sua concretização. Primeiro porque o Legislativo encontra-se em severa crise de representatividade, sendo este Poder dominado por aqueles para os quais a concretização

21 SILVA. José Afonso da. Aplicabilidade das normas constitucionais. 6ª ed. São Paulo: Malheiros

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do mandamento constitucional não interessa. Do mesmo modo o Executivo, que, além do problema representativo já mencionado, padece de meios eficientes para efetivar a reforma agrária e dar à propriedade a sua devida função. Por último, o Judiciário que se encontra com amarras impossíveis de serem desfeitas pelo próprio Poder, tendo em vista a possibilidade de adentrar na tortuosa atuação ativista.

Nos moldes delineados pelo próprio Luís Roberto Barroso, a solução remete essencialmente à atenção de dois caminhos: o participativo e o jurídico. O primeiro tem como premissa fundamental a participação popular na efetivação da norma constitucional, por meio de uma articulação de indivíduos, uma mobilização de um ou vários setores da sociedade para realização de um objetivo político imediato.22Já o segundo enfatiza um aspecto mais técnico, ligado à interpretação e aplicação do direito. Nele, é depreendido o verdadeiro alcance da norma constitucional na realidade fática, bem como proporciona a realização dos comandos constitucionais ante a omissão dos demais órgãos do Poder Público.23

Em suma, tem-se que a normatização constitucional, por completo, tem eficácia jurídica24, mas a ela tem de ser atribuída a devida eficácia social, por meio da efetividade da norma jurídica. Para sua obtenção, mesmo com a omissão do poder legiferante, cabe ao juiz formular a regra concreta para a espécie. Mais especificamente, o Judiciário, como Poder encarregado de interpretar a Constituição, deve tutelar os direitos expostos nas normas constitucionais, sejam eles de aplicação imediata ou de caráter programático.

Todavia, aqui não se traz uma faculdade legislativa ao aplicador do direito, notadamente o magistrado. Em verdade, a norma já está posta, faltando tão somente sua concretização na realidade social. Desse modo, por ser ele integrante do Poder responsável por interpretar a Constituição, deve assim fazer, na omissão dos demais poderes, conforme o contexto social verificado, já que, conforme amplamente demonstrado, não há faculdade na aplicação dos preceitos constitucionais, mas, sim, obrigatoriedade.

22 BARROSO, Luís Roberto. A efetividade das normas constitucionais revisitada, p. 20. 23Ibid., p. 21.

24 A respeito do tema, o próximo tópico cuidará de conceituar eficácia e diferenciar a jurídica da social,

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Não cabe tal possibilidade interpretativa ante a omissão do poder competente caso o legislador ordinário já tenha disposto sobre a matéria, mesmo que de forma geral, a não ser que se declare a contrariedade do ato legislado à constituição.

Fato é que, hodiernamente, tem-se verificado uma tendência jurisdicional de afastamento da incidência de normas infraconstitucionais sob a alegação do suposto dever do Judiciário de dar aplicabilidade aos axiomas expostos na Constituição Federal, nem que para isso seja necessário desprezar a atividade do Legislativo. Em princípio, ter-se-ia a ideia de controle de constitucionalidade, mas, na prática, assim não acontece, visto que o afastamento da incidência se dá sem o processo mais rigoroso de declaração de inconstitucionalidade, conforme será visto mais adiante, afrontando a própria ideia de superioridade da norma constitucional. Ou seja, configura um vício jurisdicional contraditório, já que para dar suposta efetividade à normatização constitucional, expressão maior do direito, esta é reduzida ao caráter de mera legislação ordinária, tendo em vista o menor rigor jurisdicional aplicado.25

2.3 Eficácias plena, contida e limitada

Tomando como parâmetro o conceito supracitado de norma constitucional, com todas as suas nuances para a efetiva validade, cabe analisar sua eficácia jurídica, com o fito de saber se é de caráter pleno, contido ou limitado. Tal análise tem um único objetivo ao final: saber se pode o aplicador do direito, mais especificamente o magistrado, à luz de um caso concreto, deixar de aplicar uma norma constitucional em virtude da sua inexatidão como norma cogente, ou, ainda mais relevante, se se pode afastar a incidência de uma norma infraconstitucional tomando como parâmetro outra constitucional que não expressa um comportamento específico.

A princípio, pode-se haver uma subdivisão em eficácia social e eficácia jurídica. A primeira diz respeito ao “fato real de que ela é efetivamente aplicada e seguida, da circunstância de uma conduta humana conforme à norma se verificar na ordem dos

25 Mais à frente, será demonstrada a necessidade de processo mais rigoroso na declaração de

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fatos”.26É o que se chama de efetividade normativa, já tratada no tópico anterior27. Nestes termos, muito mais se adequa a análise segundo o sociologismo jurídico, por meio do qual é verificada a adequação da norma à realidade social para a qual está imposta. A segunda diz respeito à capacidade de atingir os objetivos nela traduzidos, que vêm a ser, em última análise, realizar os ditames jurídicos objetivados pelo legislador.28Diz-se que designa “a qualidade de produzir, em maior ou menor grau, efeitos jurídicos, ao regular, desde logo, as situações, relações e comportamentos de que cogita”.29Nesse sentido, é a aptidão da norma em ocasionar efeitos para determinada relação jurídica, seja de forma imediata ou mediata. É esta, portanto, a que interessa para o prosseguimento do estudo.

Percebe-se, pois, que pode uma norma ter eficácia jurídica e não ter a social, na medida em que é capaz de atingir objetivos previamente fixados como metas30, mas não ser socialmente efetivada. Logo, resta mais evidente a dicotomia entre efetividade jurídica da norma constitucional e eficácia jurídica propriamente dita.

José Afonso da Silva, após críticas diversas aos modelos sugeridos nos quais era desprezada a imperatividade das normas programáticas, notadamente quando analisa a doutrina norte-americana de subdivisão das normas em self-executing e not self-executing,31 subdivide a eficácia jurídica em três âmbitos: as normas de eficácia plena e

aplicabilidade direta, imediata e integral; as normas de eficácia contida e aplicabilidade direta e imediata, mas possivelmente não integral; e as normas de eficácia limitada, estas subdivididas em declaratórias de princípios institutivos ou organizativos e declaratórias de princípios programáticos.

As normas de eficácia plena são conceituadas como aquelas que, desde a entrada em vigor da constituição, produzem, ou têm possibilidade de produzir, todos os efeitos essenciais, relativamente aos interesses, comportamentos e situações, que o legislador constituinte, direta e normativamente, quis regular.32Configuram-se, pois, como de aplicabilidade imediata, ao passo que não necessitam de qualquer norma

26 KELSEN, Hans. Teoria pura do Direito. 2ª ed., trad. do Dr. João Baptista Machado, Coimbra, Armênio

Amado-Editor Sucessor, 1962, p. 19.

27Cf. BARROSO, Luís Roberto. O Direito Constitucional e a efetividade de suas normas, pp. 78 e ss. 28 SILVA. José Afonso da. Aplicabilidade das normas constitucionais. 6ª ed. São Paulo: Malheiros

Editores, 2002, p. 66.

29 MEIRELLES TEIXEIRA, José Horácio. Curso de direito constitucional brasileiro. Rio de Janeiro,

Forense Universitária, 1958, p. 289.

30 SILVA, op. cit., p. 66. 31Ibid. p. 73.

(25)

posterior que venha a dar exigibilidade direta aos seus preceitos. Como exemplos, têm-se os arts. 45 e 46 da Constituição Federal,33 os quais tratam de parte da organização do Poder Legislativo.

De outro modo, as normas de eficácia contida dizem respeito àquelas em que o legislador constituinte regulou suficientemente os interesses relativos à determinada matéria, mas deixou margem à atuação restritiva por parte da competência discricionária do Poder Público, nos termos que a lei estabelecer ou nos termos de conceitos gerais nelas enunciados.34Ressalta-se, pois, sua aplicabilidade também imediata, visto que não necessita de norma ulterior para produção dos efeitos nela estabelecidos, mas tão somente abre-se uma possibilidade de restrição tendo em vista critérios também nela estabelecidos, que podem ou não ser a lei em sentido estrito.

Essa espécie de eficácia é bastante controversa, na medida em que é necessária uma avaliação criteriosa da norma para verificar se se trata de caráter contido ou caráter limitado, já que é tênue a linha divisória das duas definições. Não se exclui, ademais, a possibilidade de verificação das duas espécies de eficácia em uma mesma norma35, já que o critério-base diferenciador é a possibilidade de obtenção dos efeitos preceituados na norma sem necessidade de legislação complementar36. Logo, uma norma com preceitos distintos, um apto a gerar efeitos imediatamente, e outro necessitante de legislação complementar, configura-se como híbrida (contida-limitada), sem óbice ao cumprimento da parte plenamente aplicável.

Por fim, no que tange às normas constitucionais de eficácia limitada, na subdivisão supracitada, tem-se que as de princípio institutivo são aquelas através das quais o legislador constituinte traça esquemas gerais de estruturação e atribuições de órgãos, entidades ou institutos, para que o legislador ordinário os estruture em definitivo, mediante lei.37Já as normas constitucionais de princípio programático são aquelas através das quais o constituinte, em vez de regular, direta e imediatamente, determinados

33 Art. 45. A Câmara dos Deputados compõe-se de representantes do povo, eleitos, pelo sistema

proporcional, em cada Estado, em cada Território e no Distrito Federal.

Art. 46. O Senado Federal compõe-se de representantes dos Estados e do Distrito Federal, eleitos segundo o princípio majoritário.

34 SILVA, op. cit., p. 116.

35 Vide art. 37, I, da Constituição Federal de 1988.

36 Aqui não se trata de lei complementar, mas de legislação oriunda do poder constituinte derivado para dar

eficácia à norma estabelecida pelo poder constituinte originário.

37 SILVA. José Afonso da. Aplicabilidade das normas constitucionais. 6ª ed. São Paulo: Malheiros

(26)

interesses, limitou-se a traçar-lhes os princípios para serem cumpridos pelos seus órgãos, como programas das respectivas atividades, visando à realização dos fins sociais do Estado.38

Nesse sentido, por mais que eventualmente a normatização constitucional não tenha aplicabilidade imediata, tendo em vista se tratar de norma com eficácia limitada, não se configura, em momento algum, sua inexigibilidade, já que até mesmo aquela sem aplicação direta serve como diretiva para a atuação estatal em todos os seus órgãos, não gerando um direito jurisdicional subjetivo aos cidadãos, mas uma proteção contra eventual ato nocivo do Poder Público que vá de encontro à teleologia da norma programática aplicável ao caso.

Desse modo, em relação aos questionamentos iniciais deste tópico, tem-se que não se pode deixar de aplicar uma norma constitucional em virtude da sua inexatidão como norma cogente, desde que sejam identificados elementos aptos a ensejar sua aplicabilidade sem legislação complementar. De outro modo, pode-se afastar, sem dúvidas, a incidência de norma infraconstitucional utilizando como parâmetro outra que não expressa um comportamento específico, mas um fim a ser observado por todos os órgãos da atuação estatal. Com tais mensurações, será visto mais adiante que não se tenta combater no presente trabalho a atuação jurisdicional de aplicação de normas de caráter contido ou limitado, mas, sim, proteger a rigidez da norma constitucional dos arbítrios diuturnos da interpretação do direito.

2.3 Hans Kelsen: o modelo piramidal de validade das normas

Neste tópico argumentativo, não há o objetivo de defender o juspositivismo trazido por Hans Kelsen, tampouco adentrar às minucias da Teoria Pura do Direito, tendo em vista suas diversas contradições ao longo de suas reformulações temporais, mas, tão somente, retirar desta obra parte da doutrina aproveitável do autor.

Ao comentar a Teoria Pura do Direito, Arnaldo Vasconcelos ressalta que esta “não conseguiu transformar em realidade seu objetivo maior, qual seja, a recuperação da

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doutrina positivista, em profunda crise na virada do século XIX, com vistas a sua utilização pela ciência jurídica dos tempos contemporâneos”.39Todavia, não despreza toda a obra exposta por Kelsen, na medida em que “a dedicação de toda uma vida a uma causa intelectual nobre, qual seja, a criação de um rigorosa e autêntica ciência do Direito, há de ser, acima de tudo, reconhecida como ato de grandeza”.40

Desse modo, pretende-se analisar o porquê da necessidade de proteção da norma constitucional frente às demais ordinárias, para, ao final, perceber que a mera dispensa das formalidades necessárias para declaração de inconstitucionalidade configura-se como afronta direta à supremacia da Constituição.

O que se pode depreender da doutrina de Kelsen é que, para uma norma ser válida, esta tem de estar obrigatoriamente vinculada à uma norma superior. Peca o autor na medida em que estabelece que esta vinculação não tende ao infinito, mas tem termo final em uma norma hipotética fundamental, não escrita e mutável. Cai por terra, então, toda a sua tentativa de desvinculação completa do direito natural e, notadamente, do jusnaturalismo.

De outro modo, entende-se como o modelo jurídico adotado no Brasil atualmente aquele em que as normas infraconstitucionais encontram fundamento na Constituição, e, na medida em que há uma contradição normativa, prevalecente o disposto no Texto Maior. Não se pode negar, portanto, a influência do escalonamento normativo trazido à tona novamente por Kelsen.

Segundo o autor:

“como a estrutura da ordem jurídica é uma construção escalonada de normas

supra e infra-ordenadas umas às outras, em que uma norma do escalão superior determina a criação da norma do escalão inferior, o problema do conflito de normas dentro de uma ordem jurídica põe-se de forma diferente conforme se trata de um conflito entre normas do mesmo escalão e de um conflito entre

uma norma de escalão superior e uma norma do escalão inferior”.41

Desse modo, após explicitada a diferença de contradições entre escalonamentos iguais e divergentes, conclui o autor acerca da segunda espécie no sentido de que entre uma norma do escalão superior e uma norma do escalão inferior, quer dizer,

39 VASCONCELOS, Arnaldo. Teoria pura do direito: repasse crítico de seus principais fundamentos.

Rio de Janeiro: Forense, 2003, p. 210.

40Ibid.

41 KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. trad: João Baptista Machado. 7ª ed. São Paulo: Martins Fontes,

(28)

entre uma norma que determina a criação de uma outra e essa outra, não pode existir qualquer conflito, pois a norma do escalão inferior tem o seu fundamento de validade na norma do escalão superior.42

Assumia-se que uma norma inferior que se contrapusesse à uma norma superior sequer existiria no mundo jurídico, pois seria plenamente inválida.43 Nesse sentido, aperfeiçoada tal doutrina, tem-se que o entendimento hodierno brasileiro traz similitude incontroversa, visto que uma norma infraconstitucional que contrarie preceitos da Constituição poderá ser declarada inconstitucional, fato que, traçando um paralelo com a doutrina kelseniana, seria como a declaração de invalidade da norma ou ato normativo. Tal compreensão se dá porque a Constituição representa o escalão de Direito positivo mais elevado, exatamente por ser nela que estão expostas as definições basilares do Estado. Ademais, por mais que Kelsen diferencie constituição formal de constituição material,44 ele assevera que o simples fato de a norma estar positivada no texto constitucional já caracteriza sua superioridade jurídica, por meio de maior rigidez, em relação às demais.

Portanto, a normatização infraconstitucional encontra fundamento de validade na normatização constitucional e a esta deve estar coadunada, tendo em vista a autoridade da norma superior45, sob pena de eventual invalidação daquela controvertida, por meio da declaração de inconstitucionalidade.

De outro modo, pode-se questionar se poderia o aplicador do direito, na medida em que também é criador de normas jurídicas (p. ex. sentenças judiciais), afastar-se do disposto na legislação infraconstitucional sob o argumento de que estaria observando preceito superior, notadamente exposto na Constituição Federal. A resposta no modelo kelseniano certamente seria negativa, já que inexistiria contradição entre uma norma inferior válida em relação à uma norma superior também válida, já que uma tem como fundamento de validade a outra, e, se quebrado tal pressuposto, inexistente seria a

42Ibid., p. 232. 43Ibid.

44 Tal diferenciação não é utilizada neste trabalho, tendo em vista que todas as normas escritas e

depreendidas do texto constitucional, independentemente dos preceitos formulados, são formal e materialmente iguais, cabendo a todas a mesma proteção jurídica, conforme já amplamente esposado no tópico inicial deste capítulo.

45 A relação entre um escalão superior e um escalão inferior da ordem jurídica, nas palavras de Kelsen,

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norma contraditória inferior. Todavia, a doutrina e jurisprudência brasileiras assumiram a posição referente à pressuposição de validade da norma até que seja declarada sua eventual inconstitucionalidade, fato que autorizaria seu afastamento de incidência em virtude de norma superior que dispõe em contrário, desde que observadas as formalidades mais rígidas aplicadas à espécie.

Nessa ordem de ideias, pode-se vislumbrar uma semelhança entre a doutrina de Kelsen e a realidade jurídica brasileira no que se refere às decisões judiciais que aplicam norma imprecisa, plurívoca ou sem predeterminação, no sentido de que o aplicador do Direito criaria norma jurídica por meio de precedentes, ou seja, vinculação para casos idênticos. Nesse sentido, expõe o supracitado autor que:

“uma decisão judicial pode ter um tal caráter de precedente quando a norma

individual por ela estabelecida não é predeterminada, quanto ao seu conteúdo, por uma norma geral criada por via legislativa ou consuetudinária, ou quando essa determinação não é unívoca e, por isso, permite diferentes possibilidades de interpretação. No primeiro caso, o tribunal cria, com a sua decisão dotada de força de precedente, Direito material novo; no segundo caso, a interpretação

contida na decisão assume o caráter de uma norma geral”.46

Percebe-se, pois, que tal possibilidade somente diz respeito à aplicação de eventual normatização imprecisa ou com ampla possibilidade interpretativa, impossibilitando interpretação diversa de norma com predeterminação por norma geral unívoca.

Ainda na seara interpretativa, a doutrina kelseniana explicita que, em casos de indeterminação normativa, o ato jurídico que efetiva ou executa a norma pode ser conformado por maneira a corresponder a uma ou outra das várias significações verbais da mesma norma.47É o que se chama de moldura interpretativa, a qual nada mais tem como objetivo senão o suprimento da lacuna legal por meio da atribuição de uma das possíveis vontades legislativas. Não alberga, portanto, a possibilidade de interpretação diversa da norma posta, mas, sim, sua necessária adequação à facticidade normativamente não prevista, mas almejada.

A título exemplificativo, uma sentença judicial, a qual é hierarquicamente inferior à lei, pode adequar a norma jurídica ao caso concreto, por meio de uma interpretação que esteja dentro dos limites normativos estabelecidos pelo poder

46 KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. trad: João Baptista Machado. 7ª ed. São Paulo: Martins Fontes,

2006, p. 278.

(30)

legiferante, por mais que estes sejam imprecisos ou genéricos, sem qualquer possibilidade de extensão do seu objetivo, ainda que aparente ser medida de maior justiça.

Portanto, pode-se depreender que o sistema normativo brasileiro, a exemplo de diversos outros, notadamente os ocidentais pós-Segunda Guerra, sofreu incontestável influência do modelo proposto por Kelsen, na tentativa de restabelecer o positivismo jurídico. De mais importante, ressalta-se a hierarquia das normas, sendo a Constituição o mais alto escalão de Direito positivo, visto que nela está o fundamento de validade de todas as demais produzidas pelo legislador ordinário. Logo, todas as normas que integram o ordenamento jurídico nacional só serão válidas se se conformarem com as normas da Constituição Federal.48

48 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 33ª ed. rev. e atual. São Paulo:

(31)

3. DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE DAS NORMAS INFRACONSTITUCIONAIS

Passado o exame conceitual das normas constitucionais, sua natureza jurídica, aplicabilidade, eficácia e hierarquia perante as demais, restou clara sua sobreposição em relação à legislação ordinária. Desse modo, pretende-se demonstrar, neste tópico, o procedimento adequado para garantia de tal supremacia, destacando a necessidade de sua estrita observância, sob pena de ser tal normatização passível dos mais ardilosos arbítrios do aplicador do direito, equiparando-as, por consequência, às normas de escalão inferior. Como dito anteriormente, o dever de observância aos preceitos expostos na Constituição Federal decorre do princípio da supremacia, segundo o qual todas as situações jurídicas devem se conformar com os princípios e preceitos da Constituição.49Aquelas que nasçam confrontantes com a Carta Magna serão passíveis das sanções de nulidade ou anulabilidade, tendo em vista sua invalidade normativa.50

Nas palavras de Gilmar Ferreira Mendes:

“os conceitos de constitucionalidade e inconstitucionalidade não traduzem, tão somente, a ideia de conformidade ou inconformidade com a Constituição. Assim, tomando de empréstimo a expressão de Bitar,51dir-se-á que

constitucional será o ato que não incorrer em sanção, por ter sido criado por autoridade constitucionalmente competente e sob a forma que a Constituição prescreve para a sua perfeita integração; inconstitucional será o ato que incorrer em sanção – de nulidade ou anulabilidade – por desconformidade com

o ordenamento constitucional”.52

Percebe-se, pois, que diversas são as possibilidades sancionatórias, tendo em vista a ampla gama de possibilidades de descumprimento de prescrições constitucionais de validade, notadamente nos textos mais extensos típicos do neoconstitucionalismo, nos quais há a tentativa de estabelecimento de um estado de bem-estar social.

Não bastasse, Uadi Lammêgo Bulos prescreve que:

49Ibid.

50 Expressão utilizada por Hans Kelsen, conforme demonstrado em tópico anterior. Apesar de não se dizer,

hodiernamente, que a norma nasça inválida, pode-se concluir que a declaração de inconstitucionalidade nada mais é do que um ato declaratório de invalidade normativa com efeitos, via de regra, ex tunc.

51Cf. BITAR, Orlando. A lei e a Constituição, in Obras Completas de Orlando Bittar, Brasília, Conselho

Federal de Cultura, 1978, v.2, p.39.

52 MENDES, Gilmar Ferreira. Curso de direito constitucional. 7ª ed. rev. atual. São Paulo: Saraiva, 2012,

(32)

“controle de constitucionalidade é o instrumento de garantia da supremacia das

constituições. Serve para verificar se os atos executivos, legislativos e jurisdicionais são compatíveis com a carta magna. Controlar a constitucionalidade, portanto, é examinar a adequação de dado comportamento ao texto maior, mediante a análise dos requisitos formais e materiais. Enquanto a inconstitucionalidade é a doença que contamina o comportamento desconforme à constituição, o controle é o remédio que visa restabelecer o

estado de higidez constitucional.”53

Nada mais, portanto, do que a concretização de uma supremacia inerente à ordem constitucional. Percebe-se que a defesa e proteção da Constituição não são atributos exclusivamente jurisdicionais, sendo, em verdade, direcionados ao Poder Público de forma geral.

Necessário se faz, portanto, demonstrar as subdivisões do controle de constitucionalidade quanto ao órgão, ao modo e ao momento de sua realização, para, empós, delimitar aquelas que serão objeto do presente estudo.

No tocante ao órgão, subdivide-se em político, jurisdicional ou misto. O primeiro é o que entrega a verificação da inconstitucionalidade a órgãos de natureza política, tal como o próprio Poder Legislativo.54Exemplo clássico é a atuação das Comissões de Constituição e Justiça do Congresso Nacional, as quais são responsáveis por verificar, previamente, a adequação constitucional de projeto de lei ou de emenda. Já em relação ao segundo, também denominado judicial review, é a faculdade que as

constituições outorgam ao Poder Judiciário de declarar a inconstitucionalidade de lei ou outros atos do Poder Público que contrariem, formal ou materialmente, preceitos ou princípios constitucionais.55Este é o clássico modelo de controle, presente na quase totalidade das constituições modernas, e que será o objeto principal do presente trabalho monográfico. Por último, o controle misto realiza-se quando a constituição submete certas categorias de leis ao controle político e outras ao controle jurisdicional.56

Tem-se que, à vista da Constituição vigente, temos a inconstitucionalidade por ação ou por omissão, e o controle de constitucionalidade é eminentemente o jurisdicional, por mais que se admita um controle político anterior à vigência da norma,

53 BULOS, Uadi Lammêgo. Curso de direito constitucional. 9ª ed. rev. e atual. de acordo com a Emenda

Constitucional n.83/2014, e os últimos julgados do Supremo Tribunal Federal. São Paulo: Saraiva, 2015, p.186.

54 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 33ª ed. rev. e atual. São Paulo:

Malheiros Editores, 2010, p. 49.

(33)

combinando os critérios difuso e concentrado, este de competência do Supremo Tribunal Federal.57

Quanto ao modo, pode ser incidental ou principal. No primeiro, a inconstitucionalidade é arguida no contexto do processo ou ação judicial, em que a questão da inconstitucionalidade configura um incidente, uma questão prejudicial que deve ser decidida pelo Judiciário.58Percebe-se que tal modelo é mais facilmente visível no modelo difuso de constitucionalidade, o qual será explicitado posteriormente. Já o controle principal permite que a questão constitucional seja suscitada autonomamente em um processo ou ação principal, cujo objeto é a própria inconstitucionalidade da lei.59É a configuração própria do controle abstrato de constitucionalidade, mais difundido quando se faz uma análise à luz do Direito Comparado, em virtude da supervalorização moderna da jurisdição constitucional.

No Brasil, em virtude da influência do constitucionalismo norte-americano, foram adotados ambos os modos, em virtude da existência de controle difuso e concentrado de constitucionalidade de leis ou atos normativos do Poder Público.

No que tange ao momento, pode ser preventivo ou repressivo. O primeiro efetiva-se antes do aperfeiçoamento do ato normativo.60Notadamente acontece no momento da análise da adequação de projetos de lei ou emendas ao texto constitucional. Atrela-se, sobremaneira, ao controle político anteriormente demonstrado, mas a ele não é exclusivo.61O repressivo, mais comum no constitucionalismo moderno, somente ocorre após a promulgação da lei ou sua entrada em vigor.

O direito pátrio admite ambas as possibilidades, visto que as Casas Legislativas têm como comissão fixa a de Constituição e Justiça, responsável pelo controle preventivo de constitucionalidade, e, obviamente, admite o controle repressivo nos modelos difuso e concentrado.

57Ibid.

58 MENDES, Gilmar Ferreira. Curso de direito constitucional. 7ª ed. rev. atual. São Paulo: Saraiva, 2012,

p.1098.

59Ibid. 60Ibid.

61 O controle preventivo também pode ser via judicial, na medida em que os parlamentares estão autorizados

(34)

Nesse sentido, sabendo que o objeto do presente estudo diz respeito tão somente à impossibilidade de afastamento de normas infraconstitucionais nos tribunais sem declaração de inconstitucionalidade, será analisado o controle de constitucionalidade jurisdicional, incidental e repressivo, já que não cabe aos órgãos colegiados realizar qualquer espécie de controle político, visto que sua função é eminentemente jurisdicional, bem como não seria razoável adentrar às nuances do modo principal, já que não se pretende que a discussão seja especificamente da lei pelo controle abstrato, mas do afastamento da sua incidência em caso concreto. Além disso, pelos mesmos motivos referentes à impossibilidade de realização de controle político pelos tribunais, resta impossibilitada a análise detida do controle constitucional preventivo.

3.1 Controles difuso e concentrado de constitucionalidade

Merece maior destaque a análise dos modelos jurisdicionais de controle de constitucionalidade, tendo em vista que é sobre eles que recaem a atividade dos tribunais na análise da legislação infraconstitucional.

Como visto anteriormente, será analisado o controle de constitucionalidade estritamente jurisdicional, o qual compreende os modelos difuso, concentrado e misto. O primeiro assegura a qualquer órgão judicial incumbido de aplicar a lei a um caso concreto o poder-dever de afastar a sua aplicação se a considerar incompatível com a ordem constitucional.62Este modelo surgiu após o emblemático caso Marbury x Madison do direito norte-americano, e a ele o Brasil faz referência ao adotá-lo na práxis jurídica nacional. Por sua vez, o segundo, com manifesta influência da doutrina austríaca de Hans Kelsen63, pressupõe a fiscalização concentrada de normas, exercida por um órgão de cúpula do Poder Judiciário.64Por fim, o misto, como o vocábulo pressupõe, mescla a

62 MENDES, Gilmar Ferreira. Curso de direito constitucional. 7ª ed. rev. atual. São Paulo: Saraiva, 2012,

p.1100.

63 Mais uma vez é demonstrada a influência de Hans Kelsen na garantia da supremacia constitucional. No

controle concentrado, tal influência decorre da análise do sistema austríaco de 1920 (Oktoberverfassung),

segundo o qual existia um Tribunal Constitucional encarregado, dentre outras atribuições, de exercer o controle concentrado de leis mediante requerimento especial. Foi a partir desse momento que o constitucionalismo moderno passou a adotar como prática a existência da possibilidade de revisão de leis em abstrato e realizadas por órgãos de cúpula do Poder Judiciário.

64 BULOS, Uadi Lammêgo. Curso de direito constitucional. 9ª ed. rev. e atual. de acordo com a Emenda

(35)

utilização dos dois modelos, utilizando-os concomitantemente, mas cada um dentro do seu espectro de possibilidades.

No Brasil, indiscutivelmente após a Constituição Federal de 1988, passou-se a adotar o modelo misto, no qual o controle difuso é realizado por juízes e tribunais, nos processos de sua competência, além das vias extraordinárias perante as Cortes Superiores.65O concentrado é exercido pelo Supremo Tribunal Federal, no momento em que fiscaliza as leis e atos normativos federais e estaduais, na via de ação, bem como pelos Tribunais de Justiça, na fiscalização de leis e atos normativos estaduais ou municipais confrontantes com as constituições estaduais.66

Nessa perspectiva, percebe-se que a diferença fundamental entre os dois modelos é o órgão controlador e os efeitos das decisões declaratórias de inconstitucionalidade. Enquanto um – difuso – pode ser exercido por qualquer magistrado investido em suas funções, com os efeitos de sua decisão recaindo somente entre as partes litigantes, o outro – concentrado – somente pode ser arguido perante os órgãos colegiados, em discussão abstrata sobre a lei, porém com efeitos vinculantes não somente às partes, mas a todo o Poder Público (erga omnes).

Pretende-se, neste momento, utilizar-se somente do modelo difuso, tendo em vista que o afastamento da incidência de norma infraconstitucional sem a declaração de inconstitucionalidade nos termos ora esposados, pressupõe uma litigância prévia entre partes distintas sobre uma relação jurídica própria, ou seja, não somente uma discussão em abstrato.

Além disso, ainda mais especificamente o controle difuso realizado pelos tribunais de segunda instância ou das Cortes Superiores por meios dos recursos especiais (especial e extraordinário), tendo em vista as regras específicas para a declaração de inconstitucionalidade no âmbito desses órgãos colegiados. Não se nega a possibilidade de realização do controle pelo juiz singular, até porque é pressuposto da própria ideia de controle difuso, mas, por não ser dispensado a ele regramento específico para tal feitura, mais cientificamente adequado será delimitar para o âmbito que detém normatização

65Cf. Constituição Federal da República Federativa do Brasil, art. 97, art. 102, III, a, b e c, art. 105, III, a,

b e c.

(36)

processual própria, na medida em que independentemente, ao final, o objetivo será atingido e poderá ser estendido seus efeitos para qualquer grau de jurisdição.

Sabendo disso, cabe ressaltar ponto fundamental para o desenvolvimento argumentativo, qual seja: o controle difuso não se faz somente sobre normas postas, ou seja, como ressaltado anteriormente, a verificação de inconstitucionalidade no Brasil pode ser por ação ou omissão. Esta omissão legislativa, se confrontante com norma expressa da Constituição, pode ser arguida pelas partes em qualquer grau de jurisdição, devendo o magistrado, se verificada a procedência da inconstitucionalidade por omissão, agir para supri-la até que norma posterior sobrevenha à decisão.

Tal entendimento encontra amparo na doutrina de Marinoni, quando expressa que:

“se o juiz deve controlar a atividade legislativa, analisando sua adequação à

Constituição, é pouco mais do que evidente que a sua tarefa não deve se ater apenas à lei que viola um direito fundamental, mas também à ausência de lei que não permite a efetivação de um direito deste porte. As omissões que invalidam direitos fundamentais evidentemente não podem ser vistas como simples opções do legislador, pois ou a Constituição tem força normativa ou força para impedir que o legislador desrespeite os direitos fundamentais, e, assim confere ao juiz o poder de controlar a lei as omissões do legislador, ou

constituirá apenas proclamação retórica e demagógica.”67

Diferencia-se, ainda, tal declaração de inconstitucionalidade por omissão na via difusa de uma possível correlação com o mandado injuntivo expresso no art. 5º, LXXI, da Constituição Federal, na medida em que este visa a oferecer ao indivíduo um instrumento apto para exercer prerrogativas, direitos e liberdades constitucionais inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania, impedidos de exercício por falta de norma regulamentadora.68Em outros termos, há uma previsão constitucional, um mandamento para que o legislador ordinário atue acerca de determinado tema, e, mesmo a despeito disso, assim não se faz, sem qualquer motivo para a inoperância. De outro modo, na declaração de inconstitucionalidade o que se tem é uma relação fático-jurídica entre partes distintas sobre a qual é disposto um mandamento constitucional fundamental sem amparo legislativo, mesmo que a Constituição não tenha ordenado expressamente a atuação legiferante como o faz para o cabimento do mandado de injunção.

67 MARINONI, Luiz Guilherme. Novo curso de processo civil. 2ª ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Editora

Revista dos Tribunais, 2016, p. 73.

68Cf. BULOS, Uadi Lammêgo. Curso de direito constitucional. 9ª ed. rev. e atual. de acordo com a

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