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Excesso de peso e obesidade em crianças que nasceram com muito baixo peso: vicissitudes das práticas alimentares na infância a partir da subjetividade materna

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Universidade Federal do Ceará

Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação

Faculdade de Medicina

Programa de Pós-Graduação

Doutorado em Saúde Coletiva

Angela Cardoso Andrade Timóteo da Silva

EXCESSO DE PESO E OBESIDADE EM CRIANÇAS QUE NASCERAM COM MUITO BAIXO PESO: VICISSITUDES DAS PRÁTICAS ALIMENTARES NA

INFÂNCIA A PARTIR DA SUBJETIVIDADE MATERNA

(2)

Angela Cardoso Andrade Timóteo da Silva

EXCESSO DE PESO E OBESIDADE EM CRIANÇAS QUE NASCERAM COM BAIXO PESO: VICISSITUDES DAS PRÁTICAS ALIMENTARES NA INFÂNCIA

A PARTIR DA SUBJETIVIDADE MATERNA

Tese de Doutorado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Saúde Coletiva – Associação Ampla: UECE/UFC/UNIFOR – Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Ceará, como requisito parcial para a obtenção do título de Doutor. Linha de pesquisa: Avaliação de Programas e Serviços de Saúde. Campo temático: Saúde Materno-Infantil.

Orientação: Prof.a Dr.a Márcia Maria Tavares

Machado

(3)

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação Universidade Federal do Ceará

Biblioteca Universitária

Gerada automaticamente pelo módulo Catalog, mediante os dados fornecidos pelo(a) autor(a)

S578e Silva, Angela Cardoso Andrade Timóteo.

Excesso de peso e obesidade em crianças que nasceram com muito baixo peso : vicissitudes das práticas alimentares na infância a partir da subjetividade materna / Angela Cardoso Andrade Timóteo Silva. – 2015.

213 f.

Tese (doutorado) – Universidade Federal do Ceará, Faculdade de Medicina, Programa de Pós-Graduação em Saúde Coletiva, Fortaleza, 2015.

Orientação: Profa. Dra. Márcia Maria Tavares Machado.

1. Prematuro. 2. Obesidade. 3. Violência Doméstica. 4. Sobrepeso. 5. Saúde da Criança. I. Título.

(4)

EXCESSO DE PESO E OBESIDADE EM CRIANÇAS QUE NASCERAM COM MUITO BAIXO PESO: VICISSITUDES DAS PRÁTICAS ALIMENTARES NA INFÂNCIA A PARTIR DA SUBJETIVIDADE MATERNA

Tese de Doutorado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Saúde Coletiva – Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Ceará, como requisito final para a obtenção do título de Doutor em Saúde Coletiva.

Defesa em: 11 de junho de 2015.

BANCA EXAMINADORA

_____________________________________________________

Prof.a Dr.a Márcia Maria Tavares Machado – UFC (orientadora)

_______________________________________________________ Prof. Dr. Álvaro Madeiro Leite - UFC

__________________________________________________________

Prof.a. Dr.a Ana Cristina Lindsay - University of Massachusetts Boston e

Harvard School of Public Health

__________________________________________________________

Prof.a Dr.a Mª de Fátima Rebouças Antunes - UNIFOR

__________________________________________________________

(5)

Nascemos, por assim dizer,

provisoriamente, em algum lugar;

pouco a pouco é que compomos em nós o lugar da nossa origem, para lá nascer mais tarde e, a cada dia, mais definitivamente.

(6)

DEDICATÓRIA

À doce Esther, minha filha amada, que suportou esperançosamente minhas

ausências, em momentos cruciais de seu desenvolvimento. Sua alegria

contagiante e incentivo constante possibilitaram a finalização deste trabalho.

A todas as mães prematuras, especialmente as

envolvidas nesse estudo, pelo compartilhamento

sensível de suas histórias e pela mensagem de

(7)

AGRADECIMENTOS

À Prof.a Dr.a Márcia Machado, querida mestra que, para além da sua posição

como orientadora no incentivo expresso à valorização deste trabalho, revelou

ser uma grandiosa amiga. Agradeço por sua sensibilidade e cumplicidade na

construção desta Tese.

À Prof.a Dr.a Ana Lindsay, pelo incentivo e coautoria em artigos que contém

parte da elaboração teórica desta Tese.

À coordenação do Programa de Pós-Graduação em Associação Ampla

UECE/UFC/UNIFOR por me proporcionar o espaço para essa discussão.

Ao Prof. Vianney Mesquita pelo seu entusiasmo e seu carinhoso cuidado na

revisão da gramática e do estilo.

A Zenaide e Dominique, secretárias da Pós-Graduação em Saúde Coletiva,

pela competência com que gerenciam as atividades de secretariado, sendo

sempre amáveis e solícitas aos meus pedidos.

À Aryadna Ribeiro, pessoa de longas “estradas” e “travessias”, pelo seu

companheirismo, bondade, doçura e fortaleza. O carinho que tenho pela nossa

história faz deste trabalho, inevitavelmente, ser seu também.

Aos queridos amigos do Instituto de Psicologia Clínica Sawabona – Lúcia

Montenegro, Conceição Barbosa, Solange Diniz e Edmundo Morais – obrigada

pelo incentivo constante e pelo nosso amor interhumano.

À Margareth Oliveira, amiga de todas as horas, pelo seu apoio e firme

presença no campo de pesquisa. Agradeço-lhe a tolerância pela minha

ausência em momentos necessários de compartilhamento de suas

(8)

Aos amigos, alunos e estagiários da Clínica-Escola do Serviço de Psicologia

Aplicada da Universidade de Fortaleza, pela cumplicidade no meu percurso,

especialmente à Marselle Fernandes, Patrícia Passos e Rosita Paraguassú.

Ao Langley, irmão e amigo, agradeço por sua confiança e pelo zelo que

dispensou em minha formação pessoal.

À tia Rosa e irmã Francisca, pessoas queridas que, com dedicação e amor,

cuida do meu lar e da minha família, zelando pelas minhas necessidades

(9)

RESUMO

Objetivou compreender, com origem na subjetividade materna, as práticas

alimentares de crianças entre dois a cinco anos com excesso de peso e

obesidade que nasceram prematuras com muito baixo peso. Para tanto,

buscou, com base nas vivências e percepções maternas, pôr em evidência o

processo multidimensional e sinérgico que envolve a associação entre

nascimento prematuro de muito baixo peso, cuidados maternos, práticas

alimentares e o excesso de peso na infância. Este estudo fundamenta-se na

Fenomenologia Hermenêutica como arcabouço teórico-metodológico de

natureza qualitativa. O grupo investigado foi composto por 12 mães que

frequentavam serviços públicos especializados no follow-up da criança

prematura, em Fortaleza-CE. As técnicas utilizadas foram: entrevista aberta e

registro em diário de campo derivado da observação direta da realidade de

pesquisa. Com suporte no exercício analítico-hermenêutico do material

empírico, destacaram-se três temáticas centrais nos achados: 1- Revivendo a

marca simbólica do nascimento prematuro; 2- Práticas alimentares da

criança de dois a cinco anos nascida prematura com muito baixo peso; 3-

Contextos de vulnerabilidade socioafetiva familiar e os excessos

alimentares. A discussão dos resultados se alicerça nas recordações, pelas

mães, das vicissitudes do nascimento prematuro de muito baixo peso, que

representou para a díade mãe-filho uma marca simbólica traumática, cujo

impacto alicerçou as dificuldades vividas pelas mães na provisão dos cuidados

ao bebê de risco com a chegada no domicílio, sobretudo no que se refere ao

microcosmo das práticas alimentares adotadas. Essas experiências adversas

vão desde a permanência da criança em UTIN, atravessaram os primeiros

anos de vida, e tem nos sentimentos de culpa e medo em perder o filho o

panorama que consubstanciou as práticas alimentares, com o firme objetivo

materno em fortalecer o corpo do bebê frágil e, assim, compensar o passado

difícil na luta pela sobrevivência e reparar os prejuízos à parentalidade em

curso. Foram observadas evidências de sintomas de estresse pós-traumático

após o intervalo de dois a cinco anos do nascimento prematuro, com tendência

à superproteção da criança. O que mais impactou as mães à época da

(10)

foi a alimentação dispensada na unidade intensiva. A angústia perante o

intenso volume de leite materno produzido e as poucas “gotas” de leite

administradas pela seringa ao bebê, revelaram-se aversivas, aumentando a

ansiedade e impactando negativamente a confiança materna. Contrapostas a

essa experiência, porém, somam-se as práticas alimentares “obesogênicas” na

infância, com alimentação pouco diversificada, excesso na oferta de alimentos

lácteos e a utilização de espessantes e farináceos, além do baixo consumo de

frutas, verduras e legumes. Em adição, não percebiam adequadamente o

estado nutricional do filho para excesso de peso ou obesidade, considerando

que seus filhos são fortes e saudáveis em relação o quadro anterior de

caquexia, com o baixo peso ao nascer. As mães relataram a experiência de

estresse crônico como resultante da violência doméstica pelo parceiro íntimo,

indicando que a atratividade e a impulsividade por comida de seu filho, assim

como a hiperalimentação no ambiente familiar, podem estar envolvidas em

necessidades simbólicas em que subjaz a salvaguarda do eu e o

apaziguamento do mal-estar e da inquietação infantil. Sintomas de estresse

pós-traumático, como ansiedade e depressão materna, medeiam os cuidados

com os filhos que, geralmente, são superprotegidos e superalimentados. Esses

achados indicam a necessidade de reformulação teórico-metodológica da

assistência nutricional ao prematuro em seus primeiros cinco anos de vida e,

simultaneamente, o incremento de políticas públicas que focalizem a

pluralidade de necessidades da família do bebê e da criança pequena nascida

prematura, numa mutação do olhar que alcance além dos esforços

empreendidos na sobrevivência do bebê de risco, centrada no corpo

anatomofisiológico, mas, sobretudo, na produção do cuidado integral numa

perspectiva bioecológica.

(11)

ABSTRACT

This study aimed at understanding the food habits of overweight and obese

children aged 2 to 5 who were born premature and with low weight, based on

maternal subjectivity. In order to do so, based on the mothers’ experiences and

perceptions, we attempted to highlight the multidimensional and synergic

process which involves the association between very low weight premature

birth, maternal care, food habits and excess weight in infancy. This study is

grounded in hermeneutic phenomenology as a theoretical-methodological

framework of a qualitative nature. The studied group consisted of 12 mothers

who received care at specialized public services providing follow-up to

premature children in Fortaleza-CE. The techniques we used were: open-ended

interview and daily field journals recording direct observations made at the

research location. Based on a analytical-hermeneutical review of the empirical

material, we uncovered three central themes in our findings: 1 – Reliving the

symbolic mark of premature birth; 2 – Eating habits of children aged 2 to 5

who were born prematurely with very low weight 3 – Social-emotional

vulnerability contexts within their families and excess food intake. The

discussion of results is grounded in the mothers’ recollections of the ups and

downs of a very low weight, premature birth. For the mother-child pair, it

represented a traumatic symbolic mark whose impact provided the foundations

of troubles experienced by mothers when providing care to a risk newborn upon

returning home, with respect to the micro-universe of adopted eating habits.

Those negative experiences range from the child remaining in an NICU and

growing up during their first years of life. Feelings of guilt and fear of losing

one’s child form the scenario which provides the basis for eating habits, with the

firm purpose on the mother’s part of strengthening the fragile baby’s body and

therefore making up for the difficult past struggling for survival and repairing the

ongoing damage to parenthood. We observed evidence of symptoms of

post-traumatic stress 2 to 5 years after the premature infant was born, with child

overprotection tendencies. The greatest impact on the mothers at the time when

their babies were hospitalized, in addition to clinical instability and the eminent

risk of death of their child, was the food given at the intensive care unit. Their

(12)

“drops” of breast milk given to their child using a syringe caused aversion,

increased anxiety and had a negative impact on maternal confidence. On the

other hand, there are “obesity-causing” eating habits in infancy, with little

diversity of foods and excess offer of milk products and use of thickening and

wheat products, in addition to low consumption of fruit and vegetables. In

addition, they did not properly realize their child’s nutritional status as

overweight or obese, since their children were strong and healthy considering

their previous state of cachexia with low weight at birth. Mothers reported their

chronic stress experience as resulting from domestic violence perpetrated by

their partners, indicating that the attractiveness and impulse for food shown by

their child, in addition to overeating in the family environment, could be involved

with symbolic needs that underlie safeguarding themselves and appeasing the

children’s discomfort and restlessness. Symptoms of post-traumatic stress,

such as anxiety and maternal depression, mediate the care given to children

who are usually overprotected and overfed. This establishes an important

scenario of “obesity-generating” eating habits for the child, who was born with

very low weight, and seriously harming their health at later stages of

development. Those findings indicate the need for a theoretical-methodological

reform of nutritional care given to premature children in their first 5 years, while

simultaneously improving Public Policies that focus on the multiple needs of the

baby’s family and of the premature child, changing the perspective to reach

beyond the efforts undertaken to ensure the survival of babies under risk, which

focus on the anatomy and physiology of bodies, favoring instead providing

comprehensive care under a bioecological perspective.

(13)

SUMÁRIO

APRESENTAÇÃO 01

Matriz existencial 01

1INTRODUÇÃO

1.1 Prematuridade e baixo peso ao nascer

06

06

1.1.1 Definição, correlações e epidemiologia 06

1.1.2 Os reveses entre o biológico, a cultura alimentar e o

ambiente socioafetivo 11

1.2 Alimentação contemporânea e o desenvolvimento do

comportamento alimentar infantil 14

1.2.1 O peso infantil em excesso: compreensão bioecológica 35

1.2.2 Epidemiologia 56

1.2.3 Obesidade infantil e vínculo mãe-filho 62

1.3 Questões norteadoras e pergunta condutora da pesquisa 67

2 OBJETIVOS 70

2.1 Objetivo geral

2.2 Objetivos específicos

70

70

3 METODOLOGIA 71

3.1 Natureza do estudo 71

3.2 Desenho da pesquisa 80

3.3 Organização do material e procedimentos para análise 83

3.4 Análise do material qualitativo 85

3.5 Aspectos éticos da pesquisa 86

4 RESULTADOS E DISCUSSÕES

4.1 Revivendo a marca simbólica do nascimento prematuro

88

(14)

4.1.1 Dificuldades na pós-alta hospitalar

4.2 Práticas alimentares da criança de dois a cinco anos com excesso de peso e nascida com muito baixo peso

4.2.1 Percepções maternas acerca do estado nutricional do filho

4.3 Contextos de vulnerabilidade socioafetiva familiar

109

119

150

156

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS 168

REFERÊNCIAS

ANEXO

172

195

(15)

1

APRESENTAÇÃO

O mundo fenomenológico é não o ser puro, mas o sentido que transparece na intersecção de minhas experiências, e na intersecção de minhas experiências com aquelas do outro, pela engrenagem de umas nas outras; ele é portanto inseparável da subjetividade e da intersubjetividade que formam a sua unidade pela retomada de minhas experiências passadas em minhas experiências presentes, da experiência do outro na minha.

Merleau-Ponty

Matriz existencial

Em 1995, principiava a minha trajetória como psicoterapeuta, facilitando

grupos de obesos em uma clínica de emagrecimento e em consultório

particular. Até então, imaginava que estava lidando somente com os aspectos

psicológicos da obesidade, aliados às questões do empobrecimento na

autoestima e imagem corporal, circunscritos à história de vida do sujeito.

Foi verificada, ao longo da prática clínica, a heterogeneidade de pessoas

e suas respectivas demandas focadas na disfuncionalidade das suas relações

com o alimento, o que as impulsionava à procura de um tratamento psicológico

nesta área. Observava pessoas com sobrepeso à procura de psicoterapia,

portadoras de pensamentos fixos e obsessivos em relação ao peso,

autoimagem corporal e comida; outras, com o peso dentro da faixa de

normalidade, mas com a autopercepção distorcida e se achando gordas; havia

ainda as que ignoravam suas determinações genéticas/ hereditárias, e que se

obrigavam a viver sob dietas restritivas a fim de se manter dentro de um peso

idealizado; as que comiam compulsivamente e purgavam o alimento por meio

de vômitos autoinduzidos ou utilizando outros métodos compensatórios e/ou

purgativos para se livrar da comida em razão do medo de engordar; outras

comiam compulsivamente mas não se utilizavam destas práticas inadequadas

de controle de peso. Enfim, um corolário de sintomatologias alimentares

acompanhadas de intenso sofrimento psíquico e significativo prejuízo na vida

global das pessoas, que extrapolava o excesso de peso em si e que, de certa

(16)

2

alimentar e seus desvios, culminando no Mestrado em Saúde Pública, com a

dissertação intitulada Para Além dos Sintomas: a trilogia do desamparo no

vivido de mulheres com transtornos do comportamento alimentar, e na

Especialização em Saúde Mental, com a monografia Excesso de peso na

infância e estigma: as faces ocultas das desordens do comportamento

alimentar. Ao longo dessa trajetória, foi concedida a oportunidade de realizar

dois cursos de aperfeiçoamento: o primeiro no Ambulatório de Bulimia do

Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da

Universidade de São Paulo, e o segundo no Ambulatório de Transtornos

Alimentares da Fundação Mário Martins, da Universidade Federal do Rio

Grande do Sul. Com a experiência adquirida nesses serviços especializados,

pioneiros no Brasil no cuidado desses agravos, foram reunidos os

conhecimentos necessários para o processo de implantação dos serviços

interdisciplinares de Fortaleza, Ceará.

Em 1997, como professora substituta do Departamento de Psicologia da

Universidade Federal do Ceará (UFC), tive a oportunidade de participar da

implantação do CETRATA – Centro de Estudos e Tratamento em Transtornos

Alimentares do Serviço de Saúde Mental, do Hospital Walter Cantídio da

FAMED/UFC. Em 2002, na Universidade de Fortaleza, como docente do curso

de Nutrição, ministrando a disciplina Psicologia da Nutrição, participei da

implantação do PRONUTRA – Programa Interdisciplinar de Nutrição aos

Transtornos Alimentares e Obesidade do Núcleo de Assistência Médica

Integrada – NAMI/UNIFOR.

Consubstanciando essa trajetória, e, ao mesmo tempo, solidificando a

formação de futuros nutricionistas e psicólogos nessa área específica do

conhecimento, que alia saberes e práticas advindas da Psicologia e da

Nutrição, foi concedida a oportunidade, em 2010, de ser criado um grupo de

estudos e produção de pesquisa científica, sediado no Centro de Ciências da

Saúde da UNIFOR. O Laboratório Interdisciplinar de Pesquisa sobre

Comportamento Alimentar: Corpo e Subjetividade – INTERFACES - integra

docentes e estudantes de graduação e pós-graduação com interesse em

pesquisar sobre objetos temáticos que tangenciam esse campo do

conhecimento: imagem corporal e seus desvios; sociedade do consumo; mídia

(17)

3

Ao recobrar esse percurso, que perfaz, em parte, a matriz existencial

que moveu o meu interesse acadêmico e assistencial de forma apaixonada,

procuro “tonalizar” o recorte que apresento nesta Tese, de natureza qualitativa.

Ao longo de dez anos dedicados à vida acadêmica e à clínica psicológica,

intervalo entre o mestrado e o doutorado, outra questão de pesquisa foi se

modelando. Alguns pacientes do ambulatório universitário e de minha prática

privada procuravam acompanhamento para a realização da cirurgia bariátrica e

metabólica. Após sucessivos investimentos para a perda de peso, e com uma

considerável coleção de insucessos e sentimentos de desesperança, seguiam

para o último recurso de tratamento, a fim de cuidar das morbidades

associadas ao severo excesso de peso. De forma bem frequente, anunciavam

em seus discursos que sempre foram “gordinhos”, que eram crianças que

comiam muito. Cito um depoimento, que revelou a vivência de muitos outros

pacientes: “Dra. eu tomava três mamadeiras de mingau de uma vez”. Com

tantos outros depoimentos referindo-se à infância com excesso de peso, a

questão que sobrevinha era: “como uma criança, que depende diretamente do

adulto para alimentar-se, consegue ingerir essa quantidade de alimento?” Será

que é uma questão de apetite verdadeiramente maior do que a maioria das

outras crianças? Quais são as dimensões que poderiam mediar às práticas

alimentares na infância?

Em entrevista com familiares, houve algumas experiências exitosas.

Mães e pacientes levavam frequentemente as fotos de quando eram

recém-nascidos, e alguns desses pacientes nasceram prematuros. As fotos

mostravam o antes e o depois, ainda na maternidade e no pós-alta hospitalar, e

de alguns meses adiante, com o peso recuperado. Os familiares falavam da

“aflição” de cuidar de uma criança tão frágil, do medo de “não vingar” e, ao

mesmo tempo, do orgulho em ter um bebê livre do risco de morte, “gordinho”.

O significado apreendido era de alívio, como se aquele bebê “gordinho”, ou

com excesso de peso, representasse a vitória conquistada pela mãe em seus

cuidados com o filho, com vistas ao distanciamento do risco de morte. Os

familiares não reconheciam que o excesso de peso “conquistado” se revelava

como importante problema de saúde, sobretudo em crianças que nasceram

(18)

4

À época, em 2009, coordenava um projeto de pesquisa sobre as

percepções maternas da obesidade infantil com mães de crianças em

tratamento ambulatorial especializado, trabalho publicado em capítulo de livro -

Saúde da Mulher: a diversidade no cuidado (ANDRADE, et al., 2011). Os

principais achados foram: alteração da percepção acerca do estado nutricional

do filho, não reconhecendo seu excesso de peso inicial; a preocupação com as

doenças associadas; e o sofrimento pelo preconceito.

Com apoio na articulação dessas experiências e o contato com a

produção de estudos e pesquisas do grupo de Saúde Materno-infantil do

Departamento de Saúde Comunitária da UFC, em 2010, inicia-se a elaboração

da questão de pesquisa que me direcionou ao Doutorado em Saúde Coletiva,

com a entrada no programa em 2011.

Cheguei em 2015, transcorridos 20 anos do início de minha atuação

nesse campo de estudos, apresentando a Tese como requisito parcial para a

obtenção do título de Doutorado em Saúde Coletiva. Destarte, mais um

“alinhavo” desse percurso e concluí provisoriamente as evidências, pois creio

que a dialética sem síntese que me impulsiona subsidiará a emergência de

novas hipóteses de pesquisa, que relativizará, possivelmente, meu

empreendimento até aqui, abrindo outras perguntas e possibilidades de

compreensão.

Portanto, apresento a Tese de defesa que responde à pergunta

condutora do estudo e os objetivos traçados para esse intento. Inicio nosso

texto com a revisão de literatura na qual é mostrada em forma de capítulos que

compõem o eixo teórico inicial e a lente através da qual possibilitará o

aprofundamento analítico, numa perspectiva interdisciplinar, das categorias

empíricas evidenciadas nos meus achados. Igualmente, a articulação desse

tecido teórico-conceitual estará na elaboração das considerações finais da

Tese, com perspectivas de ampliação do estado da arte acerca dos cuidados

maternos à criança nascida prematura de muito baixo peso. Desde a

INTRODUÇÃO, concebo o ponto de partida na caracterização conceitual da

prematuridade e do baixo peso ao nascer. Tratarei dos reveses entre o

biológico, a cultura alimentar e os aspectos socioafetivos nas decorrências para

o bebê prematuro, contendo a temática do peso em excesso na infância, que,

(19)

5

na área da Saúde da Criança no Brasil e no mundo. Caracterizarei a evolução

histórica da alimentação contemporânea, com especial destaque aos tópicos

sobre desenvolvimento do comportamento alimentar infantil e as implicações

para o bebê prematuro. Adiante, com base na Teoria Bioecológica do

Desenvolvimento Humano, conceituarei o excesso de peso na infância, a

Epidemiologia do agravo e a importância da compreensão do vínculo

mãe-filho-alimentação na obesidade infantil.

Posteriormente à mostra das questões norteadoras da pesquisa com o

recorte da pergunta condutora (1,3), e do OBJETIVO GERAL (2.1) e objetivos

específicos do estudo (2.2), apresentaremos o capítulo que compõe a

METODOLOGIA (3.0). Nessa sessão, serão indicados o escopo

epistemológico e a natureza do referencial teórico-metodológico de pesquisa

Fenomenológica Hermenêutica, assim como o desenho de pesquisa (3.2) que

possibilitou encontrar o grupo de mães que participaram do estudo e a

descrição das etapas de organização e análise do material qualitativo, bem

como os aspectos éticos da pesquisa, com o desvelamento das categorias

temáticas fundantes dos resultados e discussões.

Os RESULTADOS e DISCUSSÕES (4.0) serão delineados em três

seções: Revivendo a marca simbólica do nascimento prematuro (4.1) e as

dificuldades do pós-alta hospitalar (4.1.1); Práticas alimentares de crianças

de dois a cinco anos com excesso de peso e nascida prematura com

muito baixo peso (4.2) e a percepção materna acerca do estado nutricional do

filho (4.2.1); e, por fim, Contextos de vulnerabilidade socioafetiva familiar

(4.3). Nessa mesma seção, previamente à mostra dos capítulos supracitados,

serão descritas as variáveis socioeconômicas das mães que compõem o grupo

estudado, a identificação do peso ao nascer da criança, a indicação do

percentil que situa o diagnóstico nutricional para excesso de peso à época da

entrevista, assim como a faixa de idade de dois a cinco anos.

As CONSIDERAÇÕES FINAIS (5), REFERÊNCIAS, ANEXO e

(20)

6

1 INTRODUÇÃO

1.1 Prematuridade e baixo peso ao nascer

1.1.1 Definição, correlações e epidemiologia

A prematuridade é o problema perinatal atual mais importante, uma

questão preocupante no campo da Saúde Coletiva, não só pelos elevados

índices de morbimortalidade neonatal a ela associados, mas sobretudo pela

qualidade de vida adstrita das crianças que sobrevivem. Nascimentos

prematuros representam desafios difíceis para pais, médicos e a sociedade em

geral, já que bebês prematuros muitas vezes enfrentam um risco mais elevado

de comprometimento clínico, cognitivo e psicoafetivo, e, em alguns casos,

exigindo permanente assistência médica interdisciplinar. De acordo com o

relatório Born too soon (WHO, 2012), o elevado número de nascimentos

prematuros é uma preocupação de saúde global, com aumento expressivo em

quase todos os países, inclusive aqueles ditos desenvolvidos.

O bebê prematuro ou pré-termo é definido pela Organização Mundial de

Saúde (WHO, 1961) como aquele que nasce até 36 semanas e seis dias, ou

abaixo de 37 semanas. Crianças a termo são as que nascem entre 37 a 41

semanas, e pós-termo são as que nascem após 42 semanas.

O baixo peso ao nascer (BPN) é, geralmente, considerado na literatura

especializada, o fator isolado mais importante que afeta a morbimortalidade

neonatal e tem impacto sobre a morbimortalidade infantil. É um fenômeno

fortemente associado à prematuridade; um problema de grande importância

para a prática médica e para o campo do diagnóstico do desenvolvimento. Um

recém-nascido é considerado de baixo peso quando atinge um peso igual ou

menor que 2.500 g. Aqueles que nascem abaixo de 1.500g são denominados

de “muito baixo peso” e, os neonatos abaixo de 1000g, de “extremo baixo

peso” (WHO, 1961; 2012).

O peso baixo ao nascimento possui gênese multidimensional, sendo que

a duração da gestação e as características do crescimento intrauterino são

fatores preponderantes. O baixo peso ao nascer é decorrente do nascimento

(21)

7

Bebês com RCIU podem nascer com idade gestacional adequada ou a

termo, mas o crescimento fetal torna-se prejudicado devido a fatores adversos

na vida intrauterina e, com isso, a ocorrência de baixo peso ao nascer. Noutras

palavras, a incidência de neonatos com peso igual ou menor a 2.500g não

ocorre exclusivamente na prematuridade. A má nutrição fetal, de acordo com

Lima et al. (2011), predispõe a uma morbidade aumentada no primeiro ano de

vida e a um maior número de hospitalizações em regiões economicamente

desfavorecidas, principalmente devido a infecções respiratórias e diarreicas

com consequente aumento da mortalidade infantil.

Embora os avanços tecnológicos em UTIs Neonatais venham garantindo

a sobrevivência de bebês prematuros, com o foco eminentemente no

diagnóstico e na terapêutica, a qualidade de vida ao longo do desenvolvimento

na interface dos cuidados maternos, é uma questão pouco investigada e traz

uma lacuna importante no seguimento desses bebês ditos de risco. Com efeito,

o processo assistencial desde a hospitalização do bebê deve centrar-se numa

terapêutica sistêmica, que além dos esforços de manutenção da vida deve

investir na saúde dos laços afetivos da unidade familiar, ao promover a saúde

mental da díade mãe-bebê. Assim, além do risco biológico que a

prematuridade enseja, o risco elevado de desordens emocionais concorre

desfavoravelmente para a saúde global da criança e na sua vida adulta.

Recém-nascidos prematuros, principalmente aqueles com um período

prolongado de internação, tem risco aumentado de problemáticas referentes à

construção do apego e estabelecimento do vínculo afetivo mãe-bebê, de ser

abandonado por suas mães e, ainda, de ser vítima de maus tratos infantis

(MOREIRA, et al., 2003; ANDREANI et al., 2006, TAVARES et al., 2006).

Iniciativas no âmbito nacional vêm sendo desencadeadas para promover

mudanças nesse cenário. Como o crescimento das taxas de prematuridade

está diretamente ligado ao aumento das taxas de cesarianas, o Programa de

Atenção Integral à Saúde da Mulher e da Criança – Rede Cegonha (2011), tem

como proposta a mudança do modelo de atenção obstétrica no Brasil. Assim

como a implantação da Atenção Humanizada ao Recém-nascido de Baixo

Peso – Método Mãe-Canguru (2002), tem como desafio a implementação do

cuidado integral à díade mãe-bebê prematuro e sua família, inclusive no

(22)

8

De acordo com Gesell; Amatruda (2002), o peso de 2.500g no

nascimento e a idade gestacional de 37 semanas foram adotados como linhas

divisórias convencionais entre os bebês maduros e pré-termo, dadas a maior

mortalidade e morbidez e a necessidade de cuidados médicos e nutricionais

especiais dos bebês abaixo desse ponto de corte. Os índices mais baixos de

mortalidade ocorrem em bebês com peso superior a 2.500g e idade gestacional

acima de 36 semanas. O índice triplica quando a duração da gestação é

inferior a 37 semanas. Quando o peso no nascimento se situa entre 1500 e

2500g, com idade gestacional de 37 semanas ou mais, há um aumento de seis

vezes no índice de mortalidade; essa taxa é 20 vezes mais alta quando o

período de gestação é mais curto do que esse. Quando o peso ao nascimento

é inferior que 1500g, o índice de mortalidade é quase 100 vezes maior do que

o encontrado na população de referência madura, independentemente da

duração da gestação.

Essas correlações são expressas por um conjunto de termos

empregados nas tabelas de crescimento intrauterino e de risco de mortalidade

neonatal. As curvas dos percentis são elaboradas a partir da distribuição dos

pesos no nascimento em termos de determinadas idades gestacionais. O bebê

é classificado como adequado para a idade gestacional (AIG) quando o peso

ao nascimento se situa entre os percentis 10 e 90, grande para a idade

gestacional (GIG) quando fica acima do percentil 90 e pequeno para a idade

gestacional (PIG) quando se encontra abaixo do percentil 10. A mortalidade e a

morbidez dos recém-nascidos aumentam nos grupos PIG e GIG; o peso no

nascimento é extremamente importante: quanto menor o peso, maior o risco

(GESELL; AMATRUDA, 2002).

Segundo o informe do IBGE (2009) – Indicadores Sociodemográficos e

de Saúde no Brasil – em 2005, as regiões Sul e Sudeste alcançaram taxas de

9%. E, em 2007, o total de recém-nascidos de baixo peso no Brasil foi de 8,1%.

A publicação alerta para a necessidade de cautela na análise desses

resultados, indicando um possível aumento, tendo em vista a subnotificação da

ocorrência de BPN, especialmente nos casos de nascidos vivos que morrem

logo após o nascimento.

Através da análise das tendências atuais de nascimentos pré-termos,

(23)

9

das informações provenientes do Sistema de Informações sobre Nascidos

Vivos (SINASC) devido à baixa confiabilidade dos dados referentes à idade

gestacional. Sendo assim, recomendam a análise de estudos populacionais

para avaliar a sua prevalência e evolução ao longo do tempo. Os autores

destacam o crescimento da prematuridade nos Estados Unidos e Europa com

taxas de 13 e 9%, respectivamente. No Brasil, em regiões Sul e Sudeste

alcançam taxas de até 15%.

Silveira et al. (2008), em revisão de estudos de base populacional no

Brasil, avaliaram o aumento de nascimento pré-termo por meio de pesquisa na

base de dados Medline e Lilacs, desde 1950. Dos 71 estudos publicados em

periódicos, dissertações e teses foram analisados 12 trabalhos, por atenderem

integralmente os critérios de inclusão. Os pesquisadores encontraram taxas

que variam entre 3,4 a 15% nas regiões Sul e Sudeste, e 3,8 a 10,2% no Norte

e Nordeste, com tendências de aumento.

Silva et al. (2010) identificaram o paradoxo epidemiológico do BPN no

Brasil. Através de dados estimados do Sistema de Informações de Nascidos

Vivos e dados censitários, os pesquisadores encontraram taxas mais altas de

BPN e taxas mais baixas de mortalidade infantil nas regiões mais

desenvolvidas do que nas menos desenvolvidas; quanto mais alta as taxas de

baixa escolaridade materna, menor foi a taxa de BPN; Quanto maior o número

de leitos de terapia intensiva neonatal, mais elevada a taxa de BPN. A

contradição do BPN foi detectada no Brasil conjuntamente com o aumento da

prematuridade em algumas regiões brasileiras. Finalizam sugerindo que as

diferenças regionais na taxa de BPN parecem estar mais associadas à

disponibilidade de assistência perinatal do que às condições sociais.

Relatório divulgado pela Organização Mundial de Saúde – WHO –

(2012) analisa o panorama da prematuridade no mundo e revela que, a cada

ano, cerca de 15 milhões de bebês nascem prematuros no mundo; desses 1,1

milhão morrem a cada ano. Nascimentos prematuros representam quase

metade das mortes neonatais no mundo e a segunda causa principal de todas

as mortes de crianças menores de 5 anos. Mostra que o Brasil aparece na 10a

posição no ranking mundial em números absolutos, com 279,3 mil partos

prematuros por ano. Ou seja, para cada 100 nascimentos, o país tem 9,2% de

(24)

10

Ainda de acordo com o relatório da OMS, o crescimento no número de

nascimentos prematuros, em países mais desenvolvidos, está ligado ao

número de gestantes mais velhas que possivelmente se beneficiam das

técnicas de reprodução assistida e com o aumento no uso de medicamentos

para fertilidade, que consequentemente pode resultar em gravidezes múltiplas.

No revés deste cenário, em muitos países de baixa renda, as principais causas

de nascimentos prematuros incluem infecções, malária, HIV, e altas taxas de

adolescentes grávidas. Em adição a discussão das causas da prematuridade

no mundo, inclui também as induções médicas desnecessárias de cesarianas

antes do tempo, que têm contribuído para o aumento de nascimentos

pré-termo.

A etiologia do parto prematuro não é bem conhecida, mas de acordo

com Bettiol et al. (2010), os fatores de risco clássicos para prematuridade e

baixo peso ao nascer, incluem: baixo peso materno pré-gestacional; extremos

de idade materna; história prévia de natimorto e nascimento pré-termo;

tabagismo na gravidez e uso de drogas ilícitas; ganho de peso materno

insuficiente; cinco ou menos consultas no pré-natal; hipertensão arterial;

sangramento vaginal; infecção no tato genitourinário; baixa escolaridade;

trabalho extenuante; partos múltiplos; reprodução assistida; colo uterino curto;

intervalo interpartal curto; baixa qualidade da assistência pré-natal, falhando no

controle de infecções que levam a ruptura prematura das membranas. Esses

fatores, de acordo com o estudo, têm sido responsabilizados por apenas um

terço dos partos prematuros. Em contrapartida, dentre os fatores que atuam

sinergicamente na complexa teia de causas da prematuridade, existe, ainda, a

“epidemia” de cesarianas no Brasil que concorre sobremaneira para o aumento

de nascimentos pré-termo, alguns ocorrendo sem indicação médica aparente,

seja por agravo materno e/ou fetal. Os pesquisadores alertam para uma

parcela desconhecida de partos prematuros iatrogênicos, que ocorrem sem a

indicação médica correta.

Outro fator bem discutido pelos autores, ancorado pela escassez de

estudos no Brasil, é o estresse materno pré-natal e a violência doméstica que,

nas últimas décadas, têm surgido como potente fator de risco para desfechos

adversos do nascimento. A associação entre fatores sociais, psicológicos e

(25)

11

nascimento. Condições emocionais desfavoráveis fazem com que o sistema

nervoso autônomo libere certas substâncias químicas que podem favorecer o

parto pré-termo, na medida em que essas substâncias atravessam a barreira

placentária modificando a bioquímica do ambiente intrauterino.

Com efeito, Bettiol et al. (2010), na observância das tendências atuais

sobre a etiologia da prematuridade, finalizam a problematização citando, em

acréscimo, outro fator adverso: a precária rede de apoio social à mulher

grávida na contemporaneidade predispondo-a a emergência de transtornos

afetivos e ansiosos. Portanto, a ausência de uma rede de suporte social

dificulta ou até mesmo impossibilita a ativação de mecanismos de resiliência ao

estresse, com impacto significativo na gestação e intercorrências perinatais

diversas, dentre elas, bebês com BPN .

Em estudo de revisão sistemática da literatura, Araújo et al. (2010)

buscaram associação entre depressão materna no período gestacional e

ocorrência de BPN. A busca de artigos abrangeu o período de 1996 a 2007,

nas bases de dados PubMed, SciELO e ISIWEB. A busca bibliográfica resultou,

segundo as estratégias estabelecidas, na análise final de 10 artigos com

desenhos quantitativos do tipo coorte, caso-controle e transversal. Os autores

discutem sobre os fatores que afetam o binômio materno-fetal a partir do

período pré-concepcional e, em adição, advertem que a depressão pré-natal

pode estar sendo negligenciada. Dessa forma, a depressão durante a gravidez

pode ser considerada questão importante para o campo da saúde pública

devido aos sérios agravos que este transtorno pode acarretar, tais como: baixo

peso ao nascer; prematuridade, além de afetar o desenvolvimento infantil.

1.1.2 Os reveses entre o biológico, a cultura alimentar e o ambiente

socioafetivo.

Alguns estudos vêm alertando para o fato da especificidade da

programação metabólica de crianças nascidas com baixo peso, decorrentes da

prematuridade ou RCIU e da associação entre eles. Esse fato predispõe ao

maior risco, de desenvolver doenças crônicas ao longo do ciclo de vida, em

(26)

12

(SILVEIRA; HORTA, 2008; SANTOS; OLIVEIRA, 2011). Em adição, estudos

epidemiológicos têm demonstrado uma relação direta entre o baixo peso ao

nascer e o índice de massa corpórea (IMC) alcançado na vida adulta (SARNI et

al., 2005; LIMA et al., 2011). Segundo evidências publicadas, a “programação”

ou imprinting nas principais vias metabólicas do organismo, decorre da

exposição do feto ao ambiente uterino adverso, ou seja, fatores ambientais que

atuam precocemente na vida embrionária ou fetal, ou até mesmo na infância

precoce, podem ter profundas influências na saúde durante toda a vida. O

metabolismo fetal passaria por mudanças a fim de se adaptar ao contexto

diferenciado. Esses processos de adaptação fetal, que podem ser benéficos

para o concepto, podem converter-se em alterações permanentes do

metabolismo e gerar doenças metabólicas no adulto (SANTOS; OLIVEIRA,

2011).

De acordo com Cerviño (2005), no período fetal, o eixo

hipotálamo-hipofisário-adrenal e a atividade da suprarrenal são mais susceptíveis a

mudanças bioquímicas, e a exposição a situações de desnutrição pode afetar a

sua regulação. Em Recém-nascidos que são pequenos para a idade

gestacional e em bebês prematuros são encontrados altos níveis de cortisol

plasmático, como efeito da má nutrição fetal. O “stress metabólico”, resultante

de circunstâncias que prejudicaram o fluxo de nutrientes para o feto, aumenta o

cortisol e produz o catabolismo proteico. Ou seja, o organismo para se proteger

do evento adverso, que é a queima de massa muscular como fonte de energia,

diminui a secreção insulínica, tornando-se um organismo poupador.

Nesse ínterim, a privação nutricional, no início da gestação, pode afetar

a diferenciação dos centros hipotalâmicos que controlam a ingesta alimentar e

o crescimento. Por conseguinte, a disponibilidade posterior de alimentos, no

período pós-natal, pode produzir um acúmulo maior de gordura como reserva

energética, sendo este um mecanismo compensatório à nutrição inadequada.

Esses achados sugerem que a ativação precoce intrauterina do eixo endócrino

que comanda a secreção do cortisol, conhecido como o “hormônio do

estresse”, é um fato que se relaciona com o baixo peso ao nascer e com o

risco aumentado para o desenvolvimento de doenças crônicas no adulto

(27)

13

Em complemento, Salgado et al. (2009) descrevem os mecanismos da

hipótese da programação fetal para a fundamentação teórica dos estudos

empíricos com crianças e adolescentes que nasceram com baixo peso e

apresentaram médias mais altas de pressão arterial e maior perda de albumina

na urina. Os pesquisadores asseveram que quando há uma baixa oferta de

nutrientes ao feto durante a gestação, seu organismo se adapta a esse

ambiente “pobre”, com a baixa da atividade metabólica para a preservação de

energia. Em contrapartida, quando o padrão nutricional melhora muito no

pós-parto, a criança pode, ao longo da vida, desenvolver problemas como

obesidade, dislipidemia, resistência à insulina, diabetes tipo II, doenças

cardiovasculares, ou até mesmo, a associação dessas morbidades na forma da

síndrome plurimetabólica.

Destarte, com a especificidade própria de seu funcionamento

metabólico, bebês prematuros de baixo peso não se beneficiam da

superalimentação. Essas características, conjugadas ao ambiente de oferta

constante de alimentos, podem configurar-se num descompasso entre as reais

necessidades calóricas e nutricionais do bebê em risco nutricional e a

percepção materna do estado nutricional da criança.

Estudos qualitativos com mães com filhos internados em Unidade de

Terapia Intensiva Neonatal (UTIN) mostram a vulnerabilidade emocional da

maternidade prematura. Os sentimentos de insegurança, medo, culpa e

apreensão pelo prognóstico nem sempre estável tornam-se presentes e mais

frequentes na medida em que a internação se prolonga (PADOVANI, 2005; Sá

et al., 2012). Não obstante, essa condição se mantém após a alta hospitalar do

bebê, requerendo a continuidade dos cuidados da equipe de saúde, assim

como uma rede de apoio socioafetivo no compartilhamento do assistir a mãe e

o bebê (ANJOS et al., 2012). O ambiente da UTIN, conspícuo pela notoriedade

tecnológica, acentua a ruptura simbólica entre o bebê idealizado e o real. A

realidade desafiadora com o recém-nascido pré-termo pode ensejar para a

mãe condições de saúde mental adversa. Ou seja, vários estudos no campo da

Psicopatologia indicam a emergência de quadros psiquiátricos, potencializados

após o nascimento, que podem prejudicar o estabelecimento das bases

seguras do vínculo mãe-bebê e, consequentemente, a própria condição de

(28)

14

generalizada, com a presença de quadros fóbicos e de pânico, e os transtornos

afetivos são os mais prevalentes entre mães nas condições de nascimento

pré-termo (MORSCH;BRAGA, 2007).

Dentro desse contexto, a especificidade entre as necessidades

nutricionais do prematuro e a demanda excessiva de alimentos poderão gerar

quadros de obesidade infantil e morbidades associadas.

Estudos de coorte no Brasil vêm alertando para essa realidade. Crianças

prematuras tem o risco aumentado em 3,5 vezes de desenvolver excesso de

peso. Essa população específica encontra-se mais vulnerável às doenças de

base metabólica ao considerarmos a relação híbrida - natureza e práticas

alimentares na infância - que, inevitavelmente, é atravessada pela cultura

alimentar contemporânea e pelo estilo de vida sedentário (FARROW; BLISETT,

2005; BETTIOL et al., 2007; SILVEIRA et al., 2008;).

1.2 Alimentação contemporânea e o desenvolvimento do comportamento

alimentar infantil

Em nossa sociedade “obesogênica”, um conflito simbólico na ordem

estético-social é instituído e condicionado na medida em que as pressões entre

manter um corpo magro como ícone de modelo ideal de beleza e saúde, com

ampla aceitação social, concorrem com a superabundância de alimentos

altamente calóricos, processados industrialmente e com porções cada vez

maiores a menores custos. Em adição a esse fato, a condição de vida concreta

anuncia na mesma ordem, sobretudo no plano clínico metabólico que esse

descompasso é incompatível com a gestão da saúde, adoecendo,

incapacitando, aumentando o risco de morte e elevando os custos em saúde

com a superlotação em serviços para o tratamento às morbidades associadas

ao excesso de peso e a má alimentação.

Esses desdobramentos no contemporâneo, ainda não estão

completamente elucidados, segundo Gottlieb et al. (2008). Os estudiosos

referenciam como exemplo a gênese da síndrome metabólica que, entre as

muitas hipóteses e teorias sendo postuladas, é que desde o Período Paleolítico

a humanidade continua basicamente com o mesmo genoma. Afirmam que o

(29)

15

Revolução Industrial alavancado pelas profundas mudanças socioeconômicas

envolvidas no processo de Globalização. O avanço tecnológico das últimas

cinco décadas possibilitou o crescimento da indústria alimentícia, como uma

importante dimensão do crescimento técnoindustrial mundial.

O homem pré-histórico, do Período Paleolítico, era essencialmente

coletor e nômade. Ou seja, coletava frutos e raízes para complementar a sua

dieta; andava longas distâncias a procura de alimentos. Alimentavam-se da

carne da caça que abatiam. A dieta rica em proteínas, aliada a um intenso

gasto energético, conferia resistência a doenças e intempéries. Contudo,

apesar da baixa expectativa de vida do homem pré-histórico, eles estavam

evolutivamente adaptados àquelas condições de sobrevivência (baixa ingestão

calórica e alto gasto energético).

Popkin, (2009) assevera que com essa alimentação variada – muito

mais diversificada que a atual – os seres humanos do Paleolítico eram mais

altos com ossos e musculatura mais robustos. A alimentação dos habitantes

das regiões costeiras baseava-se mais na pesca, enquanto a dos habitantes do

interior era na caça, que, com o tempo, progrediu dos animais de pequeno

porte para os animais de grande porte.

A dieta básica – que variava de acordo com a estação do ano – era composta de sementes, nozes, raízes e tubérculos, peixes e mamíferos aquáticos. As pessoas que viveram nessa época não consumiam grãos nem outros laticínios além do leite materno. Bebiam água. A carne dos animais terrestres tinham baixo conteúdo de gordura e uma proporção ainda menor de gordura saturada, além de cinco vezes a proporção de gordura poli-insaturada contida na carne dos animais domésticos que consumimos atualmente. A ingestão de fibras era altíssima –

parte composta de fibras insolúveis. Entre aqueles que

sobreviviam às doenças infecciosas e viviam até um pouco mais de idade, doenças crônicas como diabetes, obesidade, doença cardíaca, câncer, cáries e problemas ósseos como

osteoporose eram desconhecidas (POPKIN, 2009. p. 17).

De acordo com Gottlieb et al. (2008), em discussão que se perfila a de

Popkin (2009), o Período Neolítico aconteceram grandes transformações, como

o desenvolvimento da agricultura e da criação de animais, como bovinos,

(30)

16

Metais, a ação do homem sobre a natureza tornou-se mais intensa, e colheitas

mais abundantes propiciaram o aumento da população. A Revolução agrícola

incrementou a dieta humana com a entrada de uma enorme variedade de

alimentos, principalmente dos cereais (arroz, cevada e trigo). A introdução de

cereais no “cardápio” da humanidade, cujo consumo de alimentos de origem

vegetal correspondia em até 90% da dieta humana, subsidiou alterações na

forma como eles eram tratados. Esses alimentos precisaram ser processados e

cozidos antes de ingeridos, o que passou a alterar a sua estrutura química.

Com isso, através dos achados arqueológicos, passou a se evidenciar as

possíveis causas, em termos genético-evolutivos, do desencadeamento de

mecanismos fisiopatológicos, já que os nossos genes estão adaptados a outro

modelo de dieta e de gasto energético.

(...) alguns autores estimaram alta ingestão de proteínas, cálcio, potássio e ácido ascórbico, e baixa ingestão de sódio na dieta no período final do Paleolítico. Atualmente, o que se percebe é justamente o contrário: alta ingestão de gorduras saturadas, gorduras trans, gorduras ômega 6 e cereais; e baixa ingestão de gorduras ômega 3, carboidratos complexos, fibras, frutas, verduras, proteínas, antioxidantes e cálcio; além de baixa

atividade física (GOTTLIEB et al., 2008. p. 34).

A partir desse contexto, a “história moldou nossa vida nutricional por

meio do crescimento da agricultura”, adverte Popkin (2009, p. 29). No

transcorrer, o número de pessoas envolvidas em atividades agrícolas foi sendo

reduzido, à medida que aumentava a especialização nos trabalhos em metal,

madeira e outros ofícios dos povos primitivos. No momento da entrada na era

moderna, que decorre dos últimos 400 anos, a fome começou a declinar no

mundo com o comércio afluente de açúcar e especiarias proporcionada às

nações europeias. Somente nos últimos 200 anos, os bens manufaturados,

como produtos têxteis, ferramentas e alimentos processados, passaram a fazer

parte do comércio global. Entretanto, especificamente ao comércio de

alimentos, é, em grande parte, um fenômeno posterior à Segunda Guerra

Mundial, já que, somente na Idade Moderna (séculos XV ao XVIII), a agricultura

passa a ter fins comerciais, e antes desse período era marcadamente de

(31)

17

A Revolução Industrial difundiu-se pelo mundo, e o trabalho manual

realizado pelos trabalhadores passa a ser suplantado pelo contexto fabril.

Imerso a esse processo, com repercussões progressivamente mundiais, a

mudança no perfil produtivo da sociedade trouxe um impacto extensivo e

importante não somente na organização econômica e social, mas sobretudo na

saúde das pessoas. A “cultura de massa”1, alicerçada pelas novas relações do

trabalho e o capital entre as nações, vem transformando o estilo de vida das

pessoas. Anteriormente, o homem tinha contato com a fabricação própria de

seu alimento, e com o advento da industrialização esse afastamento foi se

tornando imperativo, movido pelas forças socioeconômicas hegemônicas que

impulsionam a produção em alta escala com maior lucratividade.

Incontestável foi o salto que a Humanidade obteve ao ultrapassar o

paradigma da cosmologia metafísica, quando o conhecimento era especulativo

e passava, particularmente, pelas essências do divino, para a física galileiana,

momento que se instaura a revelação da realidade pela relação entre os

objetos e não mais pelo objeto puro. Nesse cenário, demarca-se a entrada na

Modernidade, ancorada por uma concepção de homem e de mundo, que irá

atravessar a constituição de todos os ramos do conhecimento, formatando a

ótica de apreensão da natureza pelo rigor metodológico. O método científico e

todo o conceito de ciência, a partir daí, trarão positividade e legitimidade na

produção do conhecimento e estarão presentes no disciplinamento da ciência.

Segundo Guiddens (2007), o projeto da Modernidade, ancorado por este

paradigma - que também personifica os seus limites - alcançou uma velocidade

vertiginosa, adoecendo o meio ambiente e a humanidade por não conseguir

acompanhar o seu ritmo intenso e avassalador.

De acordo com Nascimento (2007), o contemporâneo ou

pós-modernidade tem seu marco inicial a partir da década de 50 e alcança o topo

nos anos 90 com o acelerado processo de modernização da vida ocidental,

resultante das transformações científicas, tecnológicas e socioeconômicas que

promovem uma ruptura de tendências e estilos que, simultaneamente, na

1

(32)

18

mesma ordem de ascendência, revelam os inúmeros impasses das sociedades

industrializadas.

Em continuidade, a travessia pela segunda década do século XXI, em

pleno início do terceiro milênio nos situa na onda da Terceira Revolução

Industrial - época de grandes e profundas transições - estruturalmente

vinculada à Globalização e que impulsiona os países emergentes, como o

Brasil, a aderir às regras ditadas pela comunidade internacional, garantindo sua

sobrevivência numa economia “globalizada”, na qual as regras do mercado são

estabelecidas pelos grandes conglomerados financeiros. Com efeito, a

Globalização não deve ser vista simplesmente como um fenômeno restrito ao

plano econômico, envolve as esferas políticas e culturais, que diluem as

fronteiras e enfraquecem o Estado Nacional. Assim sendo, é um fenômeno que

se manifesta no microcosmo social; abrange não somente espaços locais, mas

afeta até as intimidades da existência pessoal, já que atua de modo a

transformar as condições concretas da vida cotidiana (GUIDDENS, 2007).

Transladando essa discussão no plano macroestrutural para o padrão

alimentar das populações, verificam-se os efeitos deletérios dos hábitos

alimentares inadequados, fortemente influenciados por dispositivos

imagético-midiáticos que massificam a cultura dos fast-foods e de um estilo de vida

sedentário que, de forma paradoxal, revelando a crise axiológica inerente a

esse processo, elegem a magreza como um ideal de beleza e saúde. Como

exemplo dessa assertiva, contata-se a incidência elevada de transtornos

alimentares e quadros de compulsão alimentar representando a contestação

dos padrões alimentares em benefício da estética e em detrimento à saúde

(ANDRADE; BOSI, 2004).

Nesse contexto sobre a antinomia de nossa sociedade em relação à

alimentação, os alertas sobre o excesso de carboidratos, gorduras saturadas e

açucares tem sido frequentes na mídia, resultando no termo “gastroanomia”,

que caracteriza a avalanche de informações contraditórias acerca da

alimentação, exigindo renúncias, gerando conflitos e disseminando

insegurança.

Em acréscimo, a popularização dos alimentos transgênicos desde o final

do século passado, que contém produtos e subprodutos de organismos

(33)

19

sanitário, ecológico e econômico e que reforça um padrão alimentar

heteronômico. Com isso, Nascimento (2007, p. 163), que reflete sobre a

complexidade e efemeridade das informações na contemporaneidade, disserta

sobre a instalação de um “mal-estar da alimentação” com profundos reflexos

nos modos de produção da saúde e da doença na população. Nascimento

alerta que

(...) a industrialização produziu um resultado ambíguo: ampliou as capacidades de produção e tornou global o intercâmbio de produtos, mas retirou a autonomia que as sociedades agrárias tinham para produzir e identificar o alimento na sua gênese, no seu sentido. E como se não bastasse, a comida industrializada é responsável por distúrbios vários (...). A vida sedentária típica das grandes metrópoles é apontada como uma das maiores causas de problemas circulatórios e cardiovasculares. A condenação de alimentos engordativos caminha lado a lado com o incentivo à vida saudável e à estetização do corpo (NASCIMENTO, 2007, p. 163).

Ao longo das principais transformações do perfil alimentar das

populações, contata-se que uma boa parte de nossas preferências alimentares

foi moldada pela história da evolução, e que nos últimos 50 anos, a velocidade

dessas mudanças, acirrada pela revolução tecnológica e a mundialização dos

alimentos, caracteriza o fenômeno denominado de Transição Nutricional.

A desnutrição energético-proteica como base das doenças carenciais,

como as morbidades infectocontagiosas, ainda subsiste no mundo e no Brasil,

caracterizando um dos paradoxos epidemiológicos do país. Victora et al. (2011)

demonstra que na Região Nordeste as hospitalizações por diarreia

correspondiam a 57% do total das internações entre menores de um ano, em

1980. Esse percentual diminuiu para 30% em 1990 e para 6% em 2009.

No mesmo plano de análise, mas, como o a face oposta desse

fenômeno, tem-se o risco nutricional por excesso de ingestão calórica com

menor dispêndio de energia. O sobrepeso e a obesidade e todo o arsenal de

morbidades associadas compõem o cenário que nos alerta para mudanças

profundas na epidemiologia em saúde da criança e para a necessidade de

implementação de novas respostas sociais e sanitárias aos novos desafios

impostos pelo novo padrão de morbimortalidade infantil, que vem alcançando

(34)

20

(SILVA, 2010). Complementa Gomes (2010, p. 329) na mesma discussão

temática, “Padrões alimentares, instalados desde os primeiros meses de vida,

e o estilo de vida predominante nos ambientes urbanos contribuem para a

identificação do sobrepeso em populações cada vez mais jovens”.

De acordo com Moreira; Goldani (2010), o estado nutricional materno,

assim como o ganho de peso gestacional, vêm sendo foco de vários estudos

devido ao papel determinante sobre os desfechos gestacionais. As coortes de

nascimentos, realizados em Pelotas, Ribeirão Preto e São Luís, têm

demonstrado que muitas doenças e agravos não transmissíveis do adulto têm

origem na vida fetal ou na infância. Assim, o bebê com BPN deve ser

considerado como criança de risco nutricional, por apresentar crescimento

pós-natal compensatório, podendo chegar ao peso normal para a idade ainda

durante o primeiro ano de vida, o que caracteriza o catch-up growth e, por

conseguinte, crianças que nascem nessas condições estão mais expostas ao

risco de desenvolvimento da obesidade. Com efeito, esses estudos

contemporâneos desenvolvidos no Brasil (BARROS et al., 2008) ao serem

perfilados aos estudos internacionais desenvolvidos por Barker et al. (2003) e

Lobstein et al. (2004), demonstram o impacto da RCIU e do BPN no

desenvolvimento da síndrome plurimetabólica do adulto (hipercolesterolemia,

diabetes, hipertensão e obesidade) e doenças cardiovasculares (DCV).

Há indícios que, para além do risco biológico envolvido na programação

fetal que expõe as crianças com BPN à obesidade e doenças crônicas, é o

modo como acontece esse crescimento acelerado e compensatório na infância

aliado às práticas alimentares maternas. Assim, o que totaliza e consubstancia

o risco nutricional para o excesso de peso na infância e no adulto nessa

população específica, é o risco biológico acrescido do socioambiental, este se

compreendido de forma sistêmica que conjuga as transformações advindas da

Transição Nutricional e Epidemiológica em nosso país.

A alimentação ocupa um lugar central no desenvolvimento infantil, já que

é em torno dela que se organizam, desde o nascimento, os primeiros contatos

entre a mãe e o bebê. Além do papel inicial estruturante da personalidade,

equivalendo a uma espécie de veículo simbólico em que as primeiras

experiências do neonato demarcam processos subjetivos na constituição da

Imagem

Gráfico 1 – Evolução de indicadores antropométricos na população de 5 a  9 anos de idade, por sexo – Brasil – períodos 1974-75, 1989 e 2008-2009

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