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1.2 Alimentação contemporânea e o desenvolvimento do comportamento

1.2.1 O peso infantil em excesso: compreensão bioecológica

Entre os transtornos alimentares da infância, o excesso de peso e a obesidade são um dos problemas mais frequentes, figurando, assim, um grave problema de saúde pública com abrangência global (FISBERG, 2003a; 2003b; 2006; IOTF, 2004; WANG; LOBSTEIN, 2006; WEINBERG, 2008; POPKIN, 2009; WHO, 2010).

Segundo a Word Health Organization – WHO – (2010), a prevalência crescente e o caráter epidêmico da obesidade infanto-juvenil, em países

36 desenvolvidos e em desenvolvimento, estão associados a maiores chances de morte prematura e de doenças crônicas na fase adulta, representando um dos principais desafios de saúde neste século. Pelo menos 2,6 milhões de pessoas morrem anualmente por estarem com sobrepeso ou obesas. Crianças obesas e com sobrepeso têm maior probabilidade de se tornarem adultos obesos e de desenvolverem doenças crônicas não transmissíveis, como diabetes e doenças cardiovasculares, ainda jovens. Para a maioria das doenças resultantes do excesso de peso, os riscos dependem, parcialmente, do período em que a obesidade começa a se instalar e da duração do agravo. Desta forma, crianças e adolescentes obesos sofrem consequências na saúde, tanto a curto quanto a longo prazo.

As estimativas da WHO (2009) para 2010 foram que 43 milhões de crianças com menos de cinco anos de idade estariam acima do peso. Em termos de números absolutos, a prevalência é muito maior em países em desenvolvimento. Existe uma estimativa de 35 milhões de crianças com sobrepeso/obesidade nos países em desenvolvimento, comparados a 8 milhões nos países desenvolvidos.

A obesidade infantil é uma doença complexa, caracterizada como um acúmulo excessivo de gordura sob a forma de tecido adiposo. Existem vários métodos diagnósticos para identificar um indivíduo obeso e em sobrepeso. O IMC - índice de massa corporal (peso/estatura2) e a medida da dobra cutânea do tríceps (DCT) são bastante utilizados em estudos clínicos e epidemiológicos. Para o diagnóstico dos transtornos da alimentação na infância, as percepções dos pais devem ser levadas em consideração. Pois, muitas vezes, os pais constroem expectativas exageradas em relação ao crescimento e ao peso de seus filhos. Geralmente, atribuem algum déficit desta natureza a problemas na alimentação, não levando em consideração as determinações genéticas da criança (ALMEIDA et al., 2004; KACHANI et al., 2005; WEINBERG et al., 2008).

No diagnóstico, a anamnese detalhada e o exame físico apurado são essenciais para revelar aspectos da etiopatogenia. No quadro de monitorização, o acompanhamento através da antropometria se faz necessário para diagnosticar e acompanhar crianças com déficit no crescimento e com risco nutricional. No entanto, o crescimento infantil não se faz de forma linear,

37 portanto, o acompanhamento deve ser realizado durante um período de, no mínimo, quatro meses para que o resultado seja fidedigno. O IMC é identificado de acordo com a idade e o sexo da criança. Para a sua classificação, utilizam- se os pontos de corte das curvas disponibilizadas pela Organização Mundial de Saúde (MELLO et al., 2004; ONIS et al., 2007; WEINBERG et al., 2008).

Em suma, o diagnóstico da criança e do adolescente obeso deve-se basear em um conjunto de avaliações, e, principalmente, ser tecido num contexto relacional, no qual aspectos subjetivos da díade mãe-filho sejam acolhidos como uma importante dimensão do transtorno alimentar e, outrossim, contribuir no direcionamento terapêutico (BATH; BAUR, 2005; WEINBERG et al., 2008).

Várias dimensões contribuem para etiologia da obesidade infantil. Fatores genéticos, sócio-econômicos, ambientais, comportamentais, emocionais (incluindo, aqui, o vínculo mãe-filho) e sistemas familiares disfuncionais entram em sinergia, configurando um complexo quadro de saúde física e emocional. O manejo da obesidade na infância é um desafio, pois está associado à mudança de hábitos, inclusive alimentares, de toda a família, principalmente dos pais. Outro fator que o dificulta é a falta de entendimento da criança e o do adolescente quanto ao real valor do problema (BATCH; BAUR, 2005; KOCHI; MONTE, 2006).

Em recente revisão de literatura, Lobstein et al., (2004) referiram um grande número de estudos que apresentaram associação positiva entre peso ao nascer e subsequente obesidade, nos primeiros anos de vida. Destacaram, ainda, que estudos desta mesma revisão indicam a forte associação entre obesidade dos pais, principalmente a materna, e obesidade infantil. Outros estudos evidenciam associação positiva entre baixo peso ao nascer, déficit de peso para a estatura e consequente obesidade abdominal e síndrome metabólica, devido ao efeito de crescimento rápido decorrente da restrição de crescimento intrauterino. Dessa forma, crianças que nascem nessas condições podem crescer mais rapidamente nos primeiros anos de vida (catch-up growth), estando mais expostas ao risco de desenvolvimento de obesidade.

Martins e Carvalho (2006) buscaram, através de revisão sistemática, estudos que associavam o peso ao nascer e o excesso de peso na infância. Alguns estudos apresentaram associação positiva entre peso mais elevado ao

38 nascer e maior probabilidade de apresentar obesidade na infância. Outros, contrariamente, não apresentaram associação linear, nem para peso mais elevado nem para baixo peso. Não obstante os resultados controversos, houve uma associação predominantemente positiva entre o peso ao nascer e o desenvolvimento de excesso de peso na infância. Os autores dessa revisão atribuem tal fato à existência de duas correntes teóricas subjacentes aos estudos que avaliam o papel do peso ao nascer e seu efeito na obesidade futura. A primeira, seria uma vertente puramente biológica, relacionada ao ambiente intrauterino adverso, o qual promoveria uma reprogramação compensatória durante a infância, levando um maior risco de doença crônica ao adulto. A outra vertente ressalta a influência de fatores pós-natais, independentes dos aspectos relacionados à biologia fetal: velocidade de crescimento, ganho de peso durante a infância, alterações nos padrões alimentares e de atividade física, mudanças nos estilos de vida alicerçados pela modernização globalizada. Os autores concluem que a ausência de uma abordagem integrada dificulta a compreensão da dinâmica entre variáveis contextuais e individuais. Tal abordagem constitui, na atualidade, uma tarefa essencial, de forma a subsidiar o quadro de componentes associados ao aumento da prevalência de obesidade infantil.

Monasta et al., (2010), compilaram em um estudo as revisões sistemáticas acerca dos fatores envolvidos, desde a concepção até os cinco anos de idade, na determinação da obesidade. Os resultados confirmam estudos citados anteriormente: diabetes materno, tabagismo materno, desmame precoce, curta duração do sono, tamanho e peso ao nascer acompanhada do rápido crescimento infantil, atividade física insuficiente e horas de permanência assistindo a programas de televisão constituem os principais fatores. Os autores alertam que pesquisas futuras deverão centrar-se nas intervenções precoces a fim de confirmar o papel dos fatores de risco e de proteção e, desta forma, combater o alto custo que a obesidade representa para as gerações presentes e futuras.

Nesse cenário, a partir dos estudos ora apresentados, é fundamental demostrar como o progressivo aumento ponderal infantil encontra-se inserido numa perspectiva sistêmica, entrelaçada em níveis ou ambientes ecológicos que alcançam amplitudes cada vez mais complexas, e que o entendimento das

39 dimensões isoladamente não é suficiente para se ter uma compreensão abrangente do fenômeno.

A Teoria Bioecológica do Desenvolvimento Humano (TBDH) tem como precursor Ürie Bronfenbrenner (1917-2005), cujo percurso biográfico agrega forte influência multicultural, o que lhe conferiu uma lente diferenciada de observação dos processos de desenvolvimento atravessados pela diversidade do ambiente. Erradicado nos EUA desde os sete anos de idade, formou-se em Psicologia e Música. Nasceu em Moscou e migrou com sua família num momento de profundas transformações sociais e política, demarcando o início da ascenção comunista com a Revolução Russa, conviveu desde então, em contato com diferentes grupos étnicos e culturais durante sua escolarização, acentuando seu contato com diferentes modos de viver e pensar. Em sobreposição, conviveu em sua infância muito proximamente com a atividade laboral do pai que era médico de uma instituição para pessoas com sofrimento psíquico e necessidades especiais, acompanhava frequentemente o pai em visitas regulares ao sanatório, localizado numa área rural no qual sua moradia era circunvizinha. Em relatos autobiográficos, Bronfenbrenner afirma que a partir daí já se demarcava um importante ponto em seu desenvolvimento no qual se revelava numa importante “transição ecológica” que iria influenciá-lo ao longo da vida e, invariavelmente, determinaria suas escolhas profissionais na medida em que observava, já desde a mais tenra idade, que os pacientes tinham decréscimos socioemocionais e intelectuais significativos no período que era avaliado após a internação, o que justificava o sentenciamento pela permanência na instituição, por vezes, perpetuamente.

O desenvolvimento humano a partir dessa abordagem, que representa a vanguarda da ciência do desenvolvimento contemporânea, é compreendido de forma dinâmica e contextualizado; um sistema vivo que representa a diligencia das relações do desenvolvimento com importante relevância na inter-relação entre sujeito em atividade e seu ambiente complexo, integrado e mutável, desde as relações mais adjuntas rumo ao alcance de níveis ascendentes de complexidade. Em adição, o desenvolvimento é abarcado como o conjunto de processos através dos quais as particularidades da pessoa (aspectos biológicos, psicológicos e comportamentais) e do ambiente interagem para produzir constância e mudança nas características da pessoa no curso de sua

40 vida, na qual, simultaneamente, irá influenciar direta e mutuamente o ambiente, recriando-o, no qual este operará de forma correlata no desenvolvimento ao longo do ciclo da vida (BROFENBRENNER, 2005).

The plasticity (the potential for systematic change) associated with the engagement of the active individual with his or her active context legitimates an optimistic approach to the possibility that applications of developmental science may improve the course and contexts of human life (BROFENBRENNER, 2005, p. 9).

A ideia principal dessa abordagem é a de que o ser humano cria o ambiente que dá forma ao seu desenvolvimento. Suas ações influenciam os diversos cenários físicos e culturais dos sistemas ecológicos que se encontram inseridos, tornando-se, assim, produtores ativos de seu desenvolvimento. Com uma forte tônica na otimização do ciclo vital, tal abordagem vai além da descrição e da explicação, opera nos níveis relacionais da pessoa no contexto ativo de suas produções nos níveis ecológicos, reconhecidos como sistemas entrelaçados, são eles: microssistema; mesossistema; exossistema; macrossistema; cronossistema. Destarte, esse modelo destaca de forma mutuamente integrada e dialética a importância e o alcance dos ambientes ecológicos no desenvolvimento humano, possibilitando um olhar mais próximo dos cenários em que efetivamente o desenvolvimento se processa, na busca dos enlaces afetivos e as relações de poder na dinâmica interpessoal. (BROFENBRENNER, 2011).

Com as inúmeras reformulações e ampliações da teoria, que progressivamente foi auferindo maior nível de complexidade, o Modelo dos Sistemas Ecológicos de Bronfenbrenner destaca a pessoa em desenvolvimento e seus circunstantes numa ordem privilegiada de apreciação na qual, a partir da década de 90, demarca um período importante de amadurecimento e consolidação da abordagem que ofereceu o suporte para o surgimento dos métodos de investigação. Com esse entendimento, o escopo teórico passa a integrar quatro aspectos fundantes e inter-relacionados: o modelo processo- pessoa-contexto-tempo (PPCT) que agrega um dos principais conceitos da teoria, o de “processo proximal” (KOLLER, 2011).

41 A dimensão processo do modelo PPCT insere-se no estabelecimento necessário de um padrão ou de uma base estável para que ocorram as relações de mutualidade e reciprocidade, nas quais possam ser progressivamente mais complexas entre pessoas e seus ambientes. Para ser efetivo esse padrão de relações necessita de um compasso contínuo por longos períodos de tempo. Brofenbrenner (2005, p.6) destaca que o desenvolvimento humano acontece através de processos de interações recíprocas, progressivamente mais complexos, entre um organismo humano ativo, em evolução biopsicológica, e pessoas, objetos e símbolos no seu ambiente imediato.

O modo de operar nessa base regular e duradoura de interação no ambiente imediato é denominado de “processos proximais”, nos quais despontam como “motores primários do desenvolvimento”; impulsionam as capacidades biológicas e o potencial genético rumo às aptidões mais sofisticadas. Exemplos desses processos estão contidos no cuidado com o bebê, formas e práticas de alimentá-lo, atividades lúdicas entre o cuidador e entre as crianças, práticas esportivas, aquisição de novos repertórios etc. Para se estabelecer processos proximais satisfatórios é necessário que cinco dimensões estejam engajadas interatuando no ciclo estímulo-desenvolvimento: 1- a participação ativa numa atividade; 2- a atuação deve ser subsidiada por uma base relativamente regular por um período de tempo estendido; 3- as atividades devem alcançar maiores níveis de complexidade; 4- a reciprocidade deve estar garantida entre os atores envolvidos; 5- os recursos abarcados na situação, objetos e símbolos, presentes no espaço imediato, devem evocar a atenção, a exploração e a imaginação da pessoa em desenvolvimento. Com o propósito de se desenvolver intelectual, emocional, moral e socialmente, toda criança necessita de uma ou mais pessoas em que ela possa construir uma relação de “apego emocional”, mútuo e forte, estando esses atores envolvidos na produção de bem-estar no qual subsidiará o interesse da criança no engajamento de atividades mais operacionais até as mais simbólicas. Somando-se a essas proposições e conjugando ainda mais os elementos que interatuam como força motriz à complexidade dos resultados desenvolvimentais esperados, incluem-se a forma, o poder, o conteúdo e a direção dos processos proximais que variam sistematicamente a partir de as

42 características da pessoa, do contexto mais imediato quanto ao mais remoto, aliado as mudanças e permanências que ocorrem ao longo do ciclo de vida articulado com a demarcação histórica que atravessa e produz subjetividade (BROFENBRENNER; CECI, 1994; BROFENBRENNER; EVANS, 2000).

A pessoa em desenvolvimento no modelo PPCT é compreendida como um ser biológico e psicológico que, em interação contínua em seu contexto, vai se tornando produto e produtor desta inter-relação. A conotação em espiral representa a palavra interação descrita por Bronfenbrenner como sendo multidimensional e processual. Dito de outra forma, o desenvolvimento é implicado numa ordem ascendente de complexidade que ocorre através de ampliações e aproximações entre a pessoa e os diversos elementos do cenário ecológico, sobrepostos num composto dinâmico e sinérgico entre os circunstantes, objetos e símbolos envolvidos. O próprio desenvolvimento da pessoa está conjugado com o do ambiente em um inter-jogo e uma “inter-ação” recíprocos, criando e recriando a si e seu contexto. A produção de sentidos aí decorrente vai dando contornos próprios e significação ao sujeito demarcando seus modos de subjetivação e a forma como ele lida no ambiente. Outrossim, um elemento crítico relacionado à pessoa e enfatizado por Bronfrenbrenner é o de “experiência”. Para além dos fatos e circunstâncias concretas no cotidiano dos sujeitos, o mais importante para dar visibilidade real aos processos proximais, é como a pessoa significa e doa sentido para aquela vivência e correlaciona consigo e aos demais envolvidos. A forma como a experiência vivida é subjetivada torna-se a tônica dos processos desenvolvimentais pelo laço que traz com os sentimentos e afetos do sujeito. Dessa forma, a experiência nessa perspectiva, herança agregada pela influência de Kurt Lewin sobre a teoria de campo e pela Fenomenologia, nos conduz ao conceito de Lebenswelt, no qual o mundo vivido não é apreendido de forma naturalizada, mas co-originalmente construído pela intencionalidade da consciência.

O ambiente contextualizado, multideterminado em sua forma física e sociocultural, tem a função decisiva no desenvolvimento, bem atestando que cada pessoa construirá o mundo a partir da percepção psicológica que se tem dele, tornando-se um sujeito singular em meio à complexa diversidade do contexto, caracterizado pelo modelo PPCT da Teoria Bioecológica. Nem o mundo e nem a pessoa são concebidos de forma isolada, mas em co-afetação

43 mútua e progressiva. O contexto foi subdividido, portanto, em níveis sobrepostos uns aos outros: o “microssistema” configura-se pelo complexo de relações imediatas que a pessoa está inserida; são relações proximais que situam a criança numa rede de relações diretas. O “mesossistema” refere-se ao conjunto de microssistemas, constituindo o nicho do desenvolvimento num determinado período de vida. O “exossistema” é formado pelos espaços em que a pessoa em desenvolvimento não está inserida diretamente, mas opera dinamicamente sobre o comportamento e o desenvolvimento. São ambientes que funcionam como uma extensão do mesossistema; constituem-se como estruturas sociais específicas que produzem formas de afetar ou determinar o que ocorre nas relações proximais, ou seja, tem um impacto direto apesar de operar a distância, por ter contato indireto com a pessoa em desenvolvimento. O “macrossistema” é o âmbito que engloba todos os outros da ecologia e influencia os diversos sistemas; envolve a cultura, as macro instituições, assim como as políticas públicas (BRONFENBRENNER; MORRIS, 1998).

O conceito de “cronossistema” sistematiza a importância do tempo no modelo PPCT; é uma dimensão que agrega subsequentemente aos demais elementos da teoria o período, demarcando transições importantes face aos eventos ambientais que ocorrem ao longo da existência. A observação de como as mudanças e continuidades se dão ao longo do ciclo vital, num determinado recorte de tempo, oferece uma perspectiva ampliada da interação bioecológica, na medida em que apreende a influência da contiguidade de tempo necessária para que determinado fenômeno em sua “inter-ação” se desvele no ambiente no qual a pessoa vive. Esse conceito vem sancionar a ideia do envolvimento interconectado da pessoa-ambiente em mútua constituição, de movimento espiralado que reconhece a produção do real pela facticidade da mudança, ou seja, desenvolver-se é estar em contínua mudança, para tanto, necessita de um baseamento de tempo que se torna cumulativo e concorra para os processos desenvolvimentais significativos. Essa perspectiva evidencia o como as mudanças contextuais do macrossistema podem impactar os indivíduos em seus ambientes/relações proximais, como mudanças políticas e sociais, crises econômicas, mudanças na composição familiar e etc (BRONFENBRENNER; MORRIS, 1998; BROFENBRENNER; EVANS, 2000).

44 Destarte, nessa perspectiva, a episteme que ancora a Bioecologia do Desenvolvimento Humano sustenta que o desenvolvimento é o resultado de uma interação e construção social e histórica multifacetada em suas consignações. Ao delimitar as especificidades de cada cenário cultural, a pessoa é coparticipe de sua edificação e da realidade que está inserida, não assumindo aspectos universalistas, mas entrelaçada e mutuamente constituída na qual alberga um mosaico de experiências individuais conectadas e indissolúveis com os fenômenos circundantes, recriando a si e o mundo continuamente. Pelas proposições de uma materialidade em constante mudança e renovação – a estabilidade é momentânea. Com isso, situá-la no âmbito da Ontologia Dialética, por necessariamente estar envolvido com a natureza do ser que potencialmente pode ser abordada, de uma materialidade que é líquida, enseja aproximações teóricas de destaque à Fenomenologia e a Dialética.

O desenvolvimento constitui importante processo nas formas de subjetivação do sujeito, ou seja, desde o nascimento e ao longo do ciclo vital o ser humano se desenvolve em todos os aspectos. A família ocupa um lócus privilegiado nesse enfoque enquanto um dos microssistemas e esteio para as relações proximais iniciais e basilares do sujeito e suas formas de singularização contextualizada. Contudo, cada configuração familiar desenvolve com sua dinâmica de vida própria, um campo de formação na educação de seus filhos que, indubitavelmente, encontraremos na cultura um importante papel, na medida em que atravessa e produz modos de subjetivação. Assim, conforme Bronfenbrenner (2011, p. 5), o desenvolvimento é definido como uma mudança duradoura na maneira pela qual uma pessoa percebe e lida com seu ambiente. Nesta forma Bioecológica de compreender o desenvolvimento, a família é o microcosmo inicial no estabelecimento das primeiras interações sociais que, a posteriori, esses arranjos serão sucessivamente ampliados e progressivamente adquirindo maior complexidade. Em suma, desenvolver-se e aprender implica estar em interação com o outro, com isso, compreender o excesso de peso infantil considerando o contexto ambiental em sua diversidade ecológica se torna um campo teórico- metodológico estratégico, tanto para a temática da promoção e prevenção, quanto para a intervenção e consolidação de políticas públicas de saúde e

45 sociais voltadas ao bem-estar da população (POCOCK et al., 2010; YUNES; GARCIA; PIETRO; SILVEIRA, 2011).

O desenvolvimento do comportamento alimentar infantil acampa uma diversidade de dimensões que necessita ser cotejada e que compreende desde as relações proximais contidas no microssistema ao mais amplo ambiente socioecológico. Indubitavelmente, o repertório alimentar de uma criança depende inicialmente de como o cuidador principal, geralmente a mãe, ao referirmos sobre o espaço familiar, representa a alimentação para si, quais são as concepções e crenças acerca de alimentação e nutrição a genitora traz nas suas práticas acerca da alimentação do filho. Nessa proposição, pode-se afirmar que na construção desse repertório de aquisição de conhecimentos e