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Com 3 meses ela [pediatra] pediu para eu dar a sopa

4.2.1 Percepções maternas acerca do estado nutricional do filho

A percepção é o processo de organização e interpretação da informação sensorial na produção de significados, ou seja, é o resultado de complexos processos e mecanismos pelos quais as pessoas elaboram e geram um saber sobre os outros e sobre si. Dessa maneira, a percepção de uma pessoa implica a organização da informação sobre o sujeito e a atribuição de propriedades que culminam na construção de um juízo avaliativo, formado não somente das características físicas observáveis, mas igualmente de características e estados não observáveis do sujeito percebido. É um processo dinâmico que vai mais além da aparência física, no qual se processa mecanismos emocionais, cognitivos e motivacionais, entre outros, que afetam o juízo estabelecido no qual nem sempre corresponde à entrada sensorial (SCHIFFMAN, 2005).

A respeito da percepção materna acerca do peso de seus filhos, uma variedade de estudos tem reportado que a maioria das mães de crianças com sobrepeso e obesidade não percebem adequadamente o peso do filho, tendendo a considera-lo com um peso menor (HIRSCHLER et al., 2008; DOOLEN; ALPERT; MILLER, 2009; FLORES-PEÑA, 2009; TSCHAMLER et al., 2010; ANDRADE et al., 2011).

Flores-Peña et al., (2014), em estudo que avaliou os preditores da percepção materna sobre o peso do filho com sobrepeso e obesidade, estudantes de escola pública, identificaram que, entre 951 mães com filhos nessa condição, residentes no noroeste do México, 74,9% do grupo estudado não perceberam adequadamente o peso do filho, referindo-se a eles como se estivessem com peso de normalidade ou até mesmo abaixo do peso. O estudo traz a discussão de que mães de crianças maiores de seis anos tem maior

151 probabilidade de perceber de forma adequada, mas, em contrapartida, as mães acreditam que as crianças na idade pré-escolar, por estar em fase de crescimento, não permanecerão com o excesso de peso na vida adulta. Por outro lado, os pesquisadores alertam que, pela alta prevalência de crianças com excesso de peso e obesidade associado à percepção materna inadequada, sugerem que essa condição nutricional pode se tornar comum, ou seja, existe a tendência de se naturalizar esse fenômeno. Outra questão que potencializa essa tendência, é o fato de haver uma crença dominante de que o excesso de peso das crianças significa ter uma boa condição de saúde e que não interfere nas atividades diárias.

Níveis adequados de percepção e preocupação materna com o peso da criança são dimensões importantes que prediz as práticas alimentares na infância de forma a consubstanciar o crescimento e o desenvolvimento saudáveis. Além disso, as terapêuticas bem sucedidas direcionadas à educação alimentar de crianças com foco na família, visando à manutenção de antropometrias de normalidade, devem ter como base o esclarecimento dessas variáveis subjetivas no plano assistencial. Com isso, acentuamos a importância de compreender a percepção que nossas mães têm acerca do estado nutricional da criança. A forma como apreendem a condição corporal do filho é uma construção subjetiva processual, ou seja, ao longo da experiência vivida na primeira infância, ante aos acontecimentos adversos relacionados ao período gravídico e neonatal, as mães vão alicerçando as formas de representação mental do corpo do infante. Num mesmo plano simbólico, essa representação traz referências não somente do filho, mas dos empreendimentos idealizados numa identidade materna afirmada positivamente (SILVA, 2013).

Em estudo realizado por Keller et al. (2013), teve por objetivo a identificação de características dos pais (idade, renda, atitudes alimentares) e das crianças (composição corporal, hábitos de consumo alimentar e práticas de atividade física) que possam melhor predizer os fatores envolvidos na percepção e preocupação dos pais com o peso da criança. Em delineamento transversal que investigou 75 pais com filhos entre 4 a 6 anos, de diversas etnias, foi utilizado como instrumento Child Feeding Questionnaire (CFQ). Os resultados indicam que a preocupação e percepção dos pais com o peso dos

152 filhos são melhor compreendidas por modelos direcionados ao comportamento alimentar das crianças e distribuição de gordura corporal. Ou seja, a preocupação e a percepção dos pais mais se concentram na ingestão dos alimentos que são altamente palatáveis e com alta densidade energética e na distribuição da gordura corporal do que a percepção da condição de excesso de peso e obesidade de seus filhos.

Interpolando esses achados com o estudo realizado por Pescud; Pettigrew (2012), um estudo de natureza qualitativa realizado com mães australianas de baixa renda sobre as práticas alimentares na infância. Os resultados apontam para o sentimento de culpa materna relacionado à ingestão de elevada quantidade de alimentos altamente ricos em gordura, sal e açucares. A partir dessa evidência, verificamos uma importante compreensão acerca dos achados do nosso estudo que poderão subsidiar a assistência à criança nascida prematura com baixo peso. Mães australianas de classe socioeconômica menos favorecida têm medo que seus filhos passem fome e sentem a necessidade de garantir a afeição de seus filhos através dos alimentos que eles mais gostam. Em adição, atribuem ao escasso período de tempo e os elevados custos com a alimentação, como sendo os fatores externos envolvidos com as práticas alimentares adotadas para seus filhos, mas que, de igual forma, estão submergidos no sentimento de culpa que vivenciam por essa condição.

Assim como as mães australianas, as práticas alimentares adotadas pelas mães de nosso estudo e a forma como percebem o peso em excesso de suas crianças estão circunscritas por motivações mais profundas que alicerçam não somente as práticas, mas o estado nutricional de sobrepeso como sendo aceitável e, em muitas vezes, desejado por elas. Nesse ínterim, as mães de nosso estudo, após o intervalo de 2 a 5 anos do nascimento, mantêm a crença que seus filhos receberam pouco alimento na UTIN; têm a lembrança que as gotas de leite ou os mililitros de leite dispensados eram insuficientes frente à esqualidez e ao pequeno tamanho do bebê. Nessa mesma linha simbólica de interpretação, possivelmente, as escolhas alimentares e todo o procedimento envolvido na forma de alimentá-los esteja, entre outras questões simbólicas, alicerçando o medo que seus filhos possam vir a sentir fome, algo inaceitável por elas e que as remetem às “penúrias” do pós-parto. A vívida lembrança da

153 fragilidade do bebê, pequeno e “só a pele e o osso”, impulsionam as escolhas maternas em alimentos que elas têm a confiança de que irá fortalecê-los. Visam reparar ou compensar um passado de muito sofrimento para seus filhos que, irremediavelmente, sentiam-se culpadas pela ocorrência da prematuridade. Talvez, essa culpa passada e não satisfatoriamente elaborada e integrada pelas mães, ao longo do desenvolvimento da primeira infância, possa estar envolvida na necessidade de satisfazer as predileções dos filhos por alimentos palatáveis, que em sua maioria são hipercalóricos, e se traduzem como contraindicados ou não recomendados pela condição clínica especial e metabolismo diferenciado, bem característico do baixo peso ao nascimento. Aliado ao desejo de percebê-los “fortes e saudáveis”, como uma forma de aliviar as marcas simbólicas do estresse vivido no risco de morte eminente do bebê, como nos disse Veridiana: “um dia tá vivo, no outro tá morto”, as depoentes, além de garantir a afeição dos filhos com fins do fortalecimento do vínculo afetivo entre eles, fortemente ameaçado com a separação à época da internação, não percebem que o estado nutricional atual possa oferecer riscos à saúde da criança. Como nos disse Liliane: “É uma maravilha, é tudo de bom”.

Assim, nesse complexo campo que envolve o vínculo mãe-filho- alimentação, na condição de prematuridade e baixo peso, é de urgente importância contemplar, desde a alta hospitalar ao seguimento de saúde dessas crianças em fase pré-escolar, os aspectos subjetivos desse enlace no qual aglutinam fortes determinantes que irão balizar as práticas alimentares na infância e a percepção materna sobre o estado nutricional da criança. Por esse contexto, as informantes declaram:

Ele não tá muito pesado não, quando ele for crescendo

ele vai perdendo mais, né? Acho que é porque eu tinha tanta vontade de ver ele com umas carninhas no corpo, pra mim eu acho a coisa mais linda do mundo [risos]. Você vê uma criança com 700g e depois vê com vinte e poucos quilos, acho que tipo é uma vitória, é uma vitória, né? (Mércia, mãe do bebê de 700g).

154

Eu achei uma maravilha [filha com excesso de peso],

porque diz que criança de sete mês, algumas bota dificuldade pra comer, tem doenças, mas a minha eu achei

uma maravilha ficar normal e aceitar tudo. Eu tive sorte! Prefiro que ela fique cheinha, porque quando ela fica

doentinha, ela perde peso. É tipo uma reserva! (Rosa, mãe do bebê de 1,200g)

Não [não achava ele obeso], eu achava gordinho, mas

não achei que ele tivesse o peso que ele estava né

quando ela [doutora] me falou, porque quando eu levei

ele [para a consulta] já tava com quarenta e cinco quilos com cinco anos. (July, mãe do bebê de 1.100g)

Quando ele fica mais cheinho, fico mais feliz, se alimenta bem, saudável, tá comendo. Ele tava mais

ganhando [peso], não que era gordão, ele tá cheinho e não é como aquelas criança obesa, entendeu? Muito gordinhas e que a gente vê de cara que já tá obesa. Ele não é assim não! Cheinho tá ótimo demais! (Dora, mãe do bebê de 1,110g).

Pelos depoimentos, além de não perceberem o estado nutricional da criança alterado para excesso de peso, as mães sentem-se satisfeitas com essa condição nutricional. Há um contentamento à condição de risco nutricional, até mesmo como compensação por uma possível perda de peso, ocasionada por doenças típicas da infância, tais como viroses e infecções diversas transitórias. Em adição, a concepção de que o peso atual “é uma vitória”, “é tudo de bom”, “é uma maravilha”, remete à luta travada por elas pela recuperação do recém-nascido, desde o nascimento antecipado e, com a alta hospitalar, ainda considerado como “frágil” e “pequeno demais”.

A corporeidade ou corpo relacional infantil, ou seja, o corpo infantil vivenciado e percebido pela mãe, portanto subjetivado, assume o estatuto da prova factível da sobrevivência da criança e, ao mesmo tempo, oferece os subsídios necessários para os reparos simbólicos à parentalidade prejudicada.

155 Em acréscimo, relembramos que as mães disseram que a gravidez não foi planejada e, na maioria dos casos, não foi desejada, o que pode reforçar em maior ou menor proporção os sentimentos de culpa envolvidos no desfecho adverso e no risco de morte e, por conseguinte, afetar as formas de subjetivação da identidade materna. O alimento e as práticas alimentares por essa perspectiva delineiam os impasses dessa jornada e, simultaneamente, assumem o meio pelo qual as mães irão fortalecer o corpo débil, visto anteriormente com risco de morte. O peso em excesso, não percebido como prejudicial e sim como desejável, possivelmente, cumpra com a função de obnubilar ou “apagar” as vicissitudes empreendidas no nascimento pré-termo. Em suma, o bebê de risco traz à realidade, de forma mais vívida, as emoções ambíguas acerca de sua chegada e conteúdos mais profundos que circunscrevem a salvaguarda da construção da identidade materna.

A seguir, próximo e último capítulo de apresentação dos resultados desse estudo, versará sobre os contextos de vulnerabilidade socioafetiva familiar que se destacam por vários aspectos disfuncionais, mas, a tônica recai, sobretudo, por se caracterizar como um ambiente desfavorável na promoção de aportes que possam gerar e consolidar a segurança física e emocional, com importante impacto na provisão dos cuidados maternos.

156 4.3 Contextos de vulnerabilidade socioafetiva familiar

Eu pedi medidas protetivas, fui na Delegacia da Mulher e meti uma Maria da Penha nele!

Veridiana, mãe do bebê de 660g Nesse capítulo, que apresenta a última temática central que reúne os achados desse estudo, discutiremos as experiências das mães num cenário que envolve desde a violência doméstica à insegurança alimentar frente à escassez de recursos financeiros, e como são estabelecidos padrões de enfrentamento com vistas à superação das dificuldades. Nesse contexto, discutiremos como os cuidados maternos, especificamente as práticas alimentares do filho são impactadas pela dinâmica familiar conflituosa. Dessa forma, serão problematizados os percalços vividos em histórias de relacionamentos conjugais que envolvem a dependência química, com a presença da dependência alcoólica e drogas ilícitas, a violência doméstica, com a sujeição do abuso psicológico à agressão física. Por fim, o desemprego, com as penúrias da falta de recursos financeiros na provisão das necessidades básicas da família, gerando um ambiente de insegurança alimentar e desfavorecendo o desenvolvimento desse sistema numa perspectiva integral.

A associação positiva entre estado nutricional infantil e condições ambientais oferece um modelo complexo de entendimento da forma como as práticas alimentares na infância são impactadas desfavoravelmente. As atitudes e experiências alimentares refletem o cenário bioecológico no qual a criança e sua família estão expostas e, ao mesmo tempo, de forma dinâmica, essa realidade determina e influencia o ambiente numa configuração recíproca. Por outras palavras, sabendo que o estado nutricional da criança, sobretudo nos primeiros anos de vida, é o principal indicador de saúde e reflete à diversidade das condições sociossanitárias a que estão sujeitadas, destacamos, aqui, a condição de vulnerabilidade socioeconômica e a estrutura familiar disfuncional como pontos problemáticos, portanto, prejudiciais ao pleno crescimento e desenvolvimento saudáveis, especificamente na dispensação do cuidado materno na esfera alimentar (VITOLO et al., 2008).

157 Numa perspectiva de compreensão sistêmica, a necessidade de dependência básica do ser humano é uma condição intrínseca ao desenvolvimento no qual irá se complexificando, na medida em que a criança for ampliando sua teia de relacionamentos, a partir do sistema familiar de origem. Então, para além da relação diádica mãe – filho, a forma como uma criança percorre sua matriz de identidade, inserida no núcleo familiar, será um dos parâmetros de como será a sua vida adulta. A complexa teia de relações intrafamiliares e o “contágio” psicológico de carências fundamentais nas relações de dependência básica estruturam a forma pela qual a pessoa reconhece o seu valor pessoal, sua autoestima, e estabelece o repertório de seus relacionamentos, inclusive a relação com a comida.

A epígrafe de abertura dessa sessão ilustra e retrata como o grupo de mães participantes do estudo, em grande parte, tem uma história para relatar sobre os percalços vividos na relação conjugal que gerava sofrimento psíquico e autoestima prejudicada, excessos alimentares como forma de controle do estresse, vergonha e humilhação, vulnerabilidade social e insegurança alimentar.

Vários estudos mostram que a relação disfuncional com o alimento e o excesso de peso em mulheres que convivem em sistemas familiares com a presença de violência física e/ou psicológica, é uma forma de lidar com a sobrecarga do estresse e altos níveis de ansiedade ensejados pela insegurança das relações interpessoais no ambiente familiar. As mensagens, explícitas ou veladas, de conteúdo ameaçador de desintegração, não só do núcleo parental, mas, sobretudo, ao colocar em risco a vida dos envolvidos, pode levar a mulher, a uma tentativa de salvaguarda do eu e buscar uma proteção narcísica, a comer em excesso (KHLAT; JUSOT; VILLE, 2009; LEVITAN; DAVIS, 2010; YOUNT et al., 2011; SILVA; TAQUETTE; HASSELMANN, 2014).

A busca do prazer na comida, cujo efeito se dá pela liberação de catecolaminas específicas, é o caminho no qual muitas mulheres encontram para lidar com o ambiente disfuncional; é uma forma de proteger-se de algo que ela convive cotidianamente na qual representa, simbolicamente, ser muito maior que ela. Até mesmo a corpulência na forma de sobrepeso concebe uma

158 forma de ser inconsciente de aquisição de “força”, de robustez, para lidar com as adversidades da vida (TEIXEIRA, 2003).

Por essa temática, importante para a discussão das práticas alimentares na infância, é o estilo inadequado de consumo alimentar em ambientes desfavorecidos não só cotejado pela baixa renda, mas, especialmente, pela precariedade das relações afetivas num sistema familiar inseguro. Advêm por esses percalços, os estilos e modos de alimentação com fins de preservação das necessidades afetivas básicas, visando obter alicerces que possam consubstanciar e impulsionar o desenvolvimento dos seus membros (HOFFMAN, 2013).

Boynton-Jarrett et al., (2010), em revisão de estudos teóricos e apoiados em delineamentos prospectivos de pesquisa, postulam que a obesidade infantil pode estar associada com padrões de disfunção familiar. A exposição às adversidades na infância, incluindo a violência familiar, pode se associar fortemente ao estado nutricional de risco nos primeiros anos de vida, com a obesidade no final da adolescência ou início da idade adulta. O abuso na infância tem sido associado à emergência de transtornos do comportamento alimentar na adolescência e na idade adulta. Afirmam, adicionalmente, que as mudanças comportamentais, incluindo inatividade física e atratividade excessiva pela comida, podem ser compreendidas como um meio de lidar com o impacto psicológico do abuso, o que pode levar à ruptura dos sistemas metabólicos e alterações hormonais. Assim, a associação entre violência intrafamiliar e obesidade infantil pode ser determinada por diferentes vias de entendimento. Conflitos familiares podem limitar a disponibilidade emocional materna e influenciar o estilo parental para as necessidades de cuidados e provisão de alimentação adequada, tanto na qualidade como na quantidade. A comida pode ser usada em excesso como uma ferramenta para consolar ou pacificar as necessidades emocionais da criança. Alternativamente, a violência familiar é angustiante e pode causar importantes alterações afetivas, levando à diminuição do controle do impulso e ingestão calórica excessiva. Complexos mecanismos biológicos são afetados diretamente. A estimulação crônica do eixo hipófise-hipotalâmico por estressores ambientais, incluindo a violência familiar, pode elevar os níveis de cortisol, desregulação de mediadores

159 neuroendócrinos do caminho de recompensa, influenciando as práticas alimentares compulsivas, bem como o acúmulo de gordura visceral.

Ao focalizarmos o excesso de peso infantil no baixo peso ao nascer por um modelo de compreensão bioecológico no qual preconiza um olhar multifacetado e inter-relacionado dessa realidade, percebemos a abrangência que essas questões assumem no mesossistema. Dessa forma, Fox & Benson, (2006) lançam na pauta dessas problematizações que mulheres quando experimentam a violência doméstica por parceiro íntimo podem ser mais propensas a viver em comunidades com elevados níveis de desorganização social e violência, aumentando o alcance do impacto negativo sobre as crianças, na medida em que a violência se amplia da relação proximal para o âmbito, também, comunitário. Locais ou bairros com elevados índices de violência tendem a tornar restritos os ambientes favoráveis ao lazer, ao exercício físico como também o brincar ao ar livre. Além disso, a falta de segurança pode aumentar o isolamento social das mulheres que experimentam a violência pelo parceiro íntimo, por meio da limitação do contato com os vizinhos, impedindo o desenvolvimento de relações de apoio e aumentando, assim, o risco de obesidade infantil e influenciando a capacidade de produção de cuidado integral a criança.

Estudo realizado por Boynton-Jarrett et al., (2010) examinou o risco de obesidade entre crianças pré-escolares, com mães vítimas de violência crônica do parceiro íntimo. Analisaram, em desenho de pesquisa prospectiva, um recorte da população estudada, quando delimitou uma sub-amostra da pesquisa intitulada Fragile Families and Child Well-being. A violência do parceiro íntimo foi definida como sendo a exposição materna a qualquer abuso, seja emocional e/ou psicológico, sexual e físico, durante a gravidez, infância (0- 12 meses) e na primeira infância, atravessando por toda fase pré-escolar (60 meses). Os participantes do estudo (n = 1.595) eram crianças nascidas entre 1998 e 2000, bem como seus pais, que foram entrevistados no período neonatal, aos 12, 36 e 60 meses de vida. Como resultado encontraram que 16.5% das crianças estavam obesas, até os cinco anos de idade; 49.4% dessas mães reportaram alguma forma vivida de violência pelo parceiro íntimo. Os resultados sugerem que a exposição materna crônica à violência do parceiro íntimo está associada ao risco elevado para a obesidade em crianças

160 na fase pré-escolar, especialmente entre meninas. Os autores advertem que os profissionais de saúde pública devem considerar o impacto da violência familiar no risco para o excesso de peso infantil na concepção e implementação de intervenções neste setor.

No momento em que as mães entrevistadas nessa pesquisa nos dizem: “Ele [filho] come tudo o que eu como”, elas estão afirmando que suas escolhas e modos alimentares são, também, as da criança. Como afirma Rosa: “Eu como pizza, hambúrguer, pastel, coxinha e essas coisas. E ela come tudo isso também!”. Importante sublinhar, que as práticas maternas “obesogênicas” adotadas são determinadas tanto pelo macrossistema de transição alimentar,