Lei sobre a mudança dos dez dias de Outubro que se suprimiram por causa da reformação gregoriana
(transcrição com a grafia e a pontuação atualizada)
Dom Filipe pela graça de deus, rei de Portugal, e dos Algarves daquém e dalém mar em África, senhor da Guiné e da conquista, navegação e comércio de Etiópia, Arábia, Pérsia, e da Índia, etc. faço saber aos que esta minha Lei virem, que o nosso mui Santo Padre Gregório décimo terceiro, ora presidente na universal igreja de deus, ordenou um calendário perpétuo para que nele se celebrasse o dia da Páscoa da Ressurreição do nosso senhor Jesus Cristo, no próprio tempo em que os Sumos Pontifícios antigos, e o Santo Concilio Niceno o determinaram (como no breve que sua santidade sobre isso passou e no dito calendário que mandou fazer mais largamente se contem). E por quanto para esse efeito era necessário diminuírem dez dias do ano que corria, declarou sua Santidade que fossem do mês de Outubro, que ora virá, deste ano presente de mil quinhentos e oitenta e dois, para que passados os primeiros quatro dias do dito mês se começasse logo a contar dos quinze dias, e daí por diante até aos
trinta e um, e os mais meses corressem pela conta antiga que até agora tiveram. E querendo-me confrontar em tudo (como é razão) com o que sua santidade assim ordenou, tenho escrito a todos os Arcebispos, Bispos e mais Prelados destes meus Reinos, que façam publicar o dito Calendário e o cumpram e guardem, e façam inteiramente cumprir e guardar, segundo forma dele. E ora por esta presente Lei mando a todos os meus súbditos e vassalos, e a todas minhas Justiças e aos Escrivães da minha fazenda e Câmara e a todos os Tabaliães das Notas, Escrivãesdo judicial e dos Órfãos e a todos e quaisquer outros oficiais a que pertencer, que em todas as Cartas, Alvarás, Provisões, Contratos, Termos, Autos Judiciais e em qualquer outras escrituras que fizerem, em que se haverem de declarar os dias em que se fazem os ponham conforme ao acima dito: de maneira que tanto que passar o quarto dia do dito mês de Outubro próximo vindouro (que será uma quinta-feira dia do bem aventurado São Francisco) logo ao seguinte dia sexta-feira em que haviam de contar os cinco dias do mês, se diga aos quinze e outro dia seguintes aos dezasseis e daí por diante se continue, com os mais dias até aos trinta e um que é o último dia do dito mês (posto que ele na verdade não terá mais que vinte e u dias este ano presente). E outrossim se continuarão os mais dias dos outros meses deste ano como dantes, sem haver diferença nem novidade de alguma, assim nos ditos meses, como em todos os
meses dos anos vindouros, por quanto esta diminuição de dias há somente lugar no dito mês de Outubro deste ano presente de mil quinhentos e oitenta e dois. E quando assim começarem a continuar os ditos quinze dias do dito mês, se declarará logo que fazem à dita mudança por vir tudo desta Lei. E porque haverá promessas, contratos, e obrigações feitas antes da publicação desta lei, porque algumas pessoas estão obrigadas a fazer algumas coisas, ou pagar algumas quantias a certo termo, e a diminuição dos dez dias poderia ser em seu prejuízo: conformando-me nesta parte com a declaração feita por sua Santidade: Mando a todas minhas justiças, que quando em juízo se mover tal dúvida a determinem como for direito dando mais dez dias em lugar dos que foram diminuídos para cumprirem com as ditas obrigações de modo que pela dita diminuição não se fiquem as partes prejudicadas e o mesmo se guardara quando se tratar de alguma pessoa ter caído em comisso, e nas restituições, prescrições e casos semelhantes, em que possa haver prejuízo de partes, causado da diminuição dos ditos dez dias. E porque em algumas partes destes meus reinos e senhorios (por estarem muito distantes deles, e além do mar, e pela brevidade do tempo) esta Lei não poderá vir à notícia dos moradores delas, para se poder fazer a dita diminuição no dito mês de Outubro deste presente ano, se fará no ano seguinte de mil quinhentos e oitenta e três, ou no ano em que esta Lei nas ditas partes for publicada,
conforme ao que nela se contem, como sua santidade o tem declarado. E mando ao Regedor da Casa da Suplicação, e ao Governador da Casa do Civil, e a todos os meus desembargadores, Corregedores, Ouvidores, Juízes e Justiças e a qualquer outros Ministros, a que o conhecimento pertencer, que assim o cumpram, e guardem, e façam inteiramente cumprir e guardar. E assim mando ao Doutor Simão Gonçalves Preto do meu Conselho, Chanceler mor destes meus reinos e Senhorios, que faça logo publicar na Chancelaria esta minha Lei e fixar o traslado dela sob meu selo, e seu sinal, nas portas dos meus Paços, e nas portas da Câmara desta Cidade de Lisboa. E outros tais traslados se fixarão nas portas das Cidades de Évora, Coimbra, e Porto, e da Vila de Santarém. E assim enviará logo com muita diligência os mais traslados que foram necessários passados pela dita maneira, aos Corregedores das Comarcas, Ouvidores dos Mestrados, e aos Ouvidores das terras, mando que os publiquem os lugares onde estiverem, e nos mais das suas Comarcas, e Ouvidorias para que a todos seja notório. E esta se registará no livro da mesa dos meus Desembargadores do Paço, e nos Livros das Casas da Suplicação e do Cível, e a própria se lançará na Torre do Tombo. E por firmeza de tudo o que nele se contem a mandei passar por mim assinada, e passada pró minha Chancelaria, e selada com o meu selo dela. Dada na cidade de Lisboa a 20 de setembro, Manuel Barata a fez, Ano do
Nascimento de nosso senhor Jesus Cristo, de mil quinhentos e oitenta e dois.
el rei
Foi publicada a lei del rei nosso senhor atrás escrita, na Chancelaria por mim Gaspar Maldonado perante os oficiais da dita chancelaria, e outra muita gente que vinha requerer seu despacho. Em Lisboa, a 20, de Setembro de 1582.
