Certo dia Davi, o doce cantor de Israel, que possuía um coração totalmente voltado para Yahweh, um
verdadeiro adorador, parou para contemplar a criação. Todo o seu ser foi tão tomado de uma profunda
expressão de adoração diante de tanta beleza, que
compôs o lindo cântico que se encontra do Salmo 8 da nossa Bíblia:
“Ó, Yahweh, Adonai, como é majestoso o teu nome em toda a terra! Tu, cuja glória é cantada nos céus” (Salmo 8:1)!
Mas em meio à admiração e enlevo movidos pela sua contemplação das obras das mãos de Deus que o
cercavam, ele se detém numa curiosa comparação:
“Quando contemplo os teus céus, obra dos teus dedos, a lua e as estrelas que ali firmaste, pergunto: Que é o homem, para que com ele te importes? E o filho do homem, para que com ele te preocupes?” (Salmo 8:3,4).
Na língua original em que o Antigo Testamento foi escrito, existem várias palavras para “homem”. Aqui, Davi usou duas delas.
A primeira foi “enosh”, que se refere ao homem caído em seu pecado. É como se quisesse dizer:
“Que é o homem miserável, desgraçado, em seu
estado caído, cheio de debilidade, ignorância e pecado, para que coloques Teu coração nele, e o conserves
Na expressão “filho do homem,” Davi usa a palavra Adam, de onde vem o nome de Adão.
É como se ele disse: “E o que é o filho de Adão, o primeiro grande rebelde, o filho caído de um pai
caído? O que é o homem comum, ou o mais eminente dos homens, para que te lembres dele, ou dignes-te em visitá-lo?”
Encontramos a mesma pergunta saída dos lábios de Jó: “Que é o homem, para que tanto o engrandeças, e
ponhas sobre ele o teu pensamento, e cada manhã o visites, e cada momento o proves?” (Jó 7:17,18).
Duas idéias diferentes têm sido extraídas destas
palavras. A primeira é: “o homem não é digno de ser notado por Ti; por que, então, Tu contendes com ele?” A segunda: “quão surpreendente é Tua generosidade para que fixes Teu coração, Teus mais fortes afetos, em tal criatura tão pobre, vil, impotente como o homem
(enosh), ao ponto de exaltá-lo muito além de todas as outras criaturas, e marcá-lo com a mais particular
Calmet parafraseia este versículo assim:
“Merece o homem, em seu estado presente, tua atenção? Que é o homem para que Deus se dê ao trabalho de o examinar, testar, provar e afligir? Não estará Ele honrando-o demais para pensar tão
seriamente sobre ele? Ó Yahweh! Eu não sou digno de que Tu estendas Teu cuidado sobre mim!” (Adam
“O que é o homem? Que reivindicação teria alguém tão fraco, débil, mortal para ser lembrado? O que existe no homem que o intitula tanto a ser notado? Por que Deus confere-lhe sinal de tanta honra? Por que ele o colocou acima das obras de suas mãos? Por que Ele fez tantos arranjos para seu conforto? Por que Ele fez tanto para o salvar? Ele é tão insignificante, sua vida é como um vapor, que aparece por um pouco e logo desaparece; ele é tão pecador e poluído, que a pergunta pode bem ser feita, por que tal honra lhe foi conferida, e por que tal domínio sobre o mundo lhe foi dado?” (Albert Barnes’ Notes on the Bible)
“O que é o homem para que o visites?” Enviando Teu Espírito Santo para o convencer do pecado, da justiça, e do juízo? É por estas visitas do Deus Criador que o homem é preservado em um estado em que possa ser salvo. Fosse Deus retê-las, não existiria nada na alma do homem senão pecado, escuridão, dureza,
corrupção e morte. Mas agora a graça, favor e
misericórdia de um Deus que é todo amor, sem deixar de ser justiça, encontram o homem, mesmo em seu estado degradado, para o levar ao estado primeiro. E que estado é este? Dele fala Davi a seguir.
Depois de perder-se em considerações reveladoras da dificuldade em entender o amor e cuidado de Deus para com o homem caído, Davi volta o seu
pensamento para o modo como ele fora criado: “Tu o fizeste um pouco menor do que os seres celestiais (no original Elohim) e o coroaste de glória e de honra. Tu o fizeste dominar sobre as obras das tuas mãos; sob os seus pés tudo puseste” (Salmo 8:5,6).
“Contudo, pouco abaixo de Deus o fizeste; de glória e de honra o coroaste. Deste-lhe domínio sobre as obras das tuas mãos; tudo puseste debaixo de seus pés”
Esta declaração nos remete a Gênesis. Depois de criar todas as coisas, no último dia da Criação, Deus entra em Conselho eterno e decide: “Façamos o homem à nossa imagem, conforme a nossa semelhança"
(Gênesis 1:26).
Interessante é a definição do homem dada em um catecismo: “Esta declaração nos leva a algumas das mais tremendas verdades a respeito do homem e sua relação com Deus.”
O Homem foi Criado por um Ato Voluntário de Deus. “Façamos” aponta para uma obra voluntária ou
deliberada. O homem não é fruto de um acidente, mas de uma decisão, um plano, um projeto de Deus.
O Homem foi Criado por um Ato Direto de Deus. Deus se envolveu com a criação do homem, usando Suas próprias mãos para moldar o seu corpo (Gênesis 2:7) e soprando nele o “fôlego da vida.” Note: “O
fôlego de Deus se tornou a alma do homem; sua alma, portanto, nada mais é do que o fôlego de Deus. O
resto do mundo existe pela palavra de Deus; o homem por Seu próprio fôlego peculiar. Este fôlego é o selo e garantia de nossa relação com Deus, de nossa
O Homem foi Criado por um Ato Soberano, isto é, um Decreto de Deus.
Enquanto Deus dirigiu uma palavra à terra na criação dos elementos terrenos, a criação do homem é
resultante de um Decreto Divino, o qual proclama, de partida, a clara distinção e supremacia do homem
O Homem foi Criado como um Ato Exclusivo de Deus. Alguns comentaristas dizem que quando Ele diz
“façamos” estava se referindo ao “conselho dos anjos,” porém isto não tem fundamento bíblico. O homem
não foi feito à imagem de anjos; em toda a Bíblia está claro que a criação é ato exclusivo do Deus Triuno.
O Homem foi Criado por um Deus Triúno.
Aqui precisamos nos estender um pouco mais. O plural “façamos” foi considerado pelos pais e teólogos
antigos, quase unanimemente, como indicativo da Trindade. O Pai, o Filho e o Espírito Santo teriam
entrado em conselho. Muitos comentaristas modernos consideram tratar-se apenas de um plural de
majestade. Outros, que Deus dirigiu-se a Si mesmo. Ainda outros defendem tratar-se dos anjos que estão ao Seu redor e se constituem o seu conselho ou
testemunhas. Defendemos a primeira posição. Isso faz sentido em diversos aspectos:
Pai, Filho, e Espírito Santo são todos identificados como “Criador” (Jó 33:4; João 1:3; Efésios 3:9; Colossenses 1:16; Hebreus 1:2)
Segundo, o Espírito Santo é mencionado em Gênesis 1:2 - “E o Espírito de Deus se movia sobre a face das águas.”
Terceiro, faz sentido que o nome hebraico para Deus seja
Elohim, uma palavra plural, uma vez que a Trindade é formada por três pessoas distintas.
O Escritor Sagrado, inspirado pelo Espírito Santo, muitas
vezes escreve revelações que desconhece. Quem as conhece e discerne é o próprio Espírito, que nos revela o que está por trás da letra, hoje, quando lemos a Bíblia pronta.
É teologicamente incorreto querermos encontrar o sistema teológico do Novo Testamento imbutido nos textos do Antigo Testamento.
O que quer dizer imagem e semelhança? As duas
palavras carregam a mesma ideia de semelhança. São sinônimas, e estão combinadas apenas para adicionar intensidade ao pensamento.
A leitura do capítulo dois de Gênesis completa o quadro. Lá são descritos os estágios da criação do homem. Primeiro, Deus formou o corpo do pó da terra, isto é, a parte material, visível, do homem; a casa terrena para sua habitação. Depois colocou nele seu espírito, que é seu verdadeiro ser. É neste espírito do homem, não no seu corpo, que está a imagem e semelhança do Criador. Deve ser assinalado, porém, que a semelhança vai só até aí. Deus existe desde a
eternidade, é onipresente, onisciente e onipotente, e o homem nunca se assemelhará a Deus nesses tributos.
O homem é semelhante a Deus nas disposições morais da alma, chamadas comumente retidão ou justiça
original (Eclesiastes 7:29). “A imagem de Deus consiste nas aptidões da personalidade que nos fazem capazes de interagir com outras pessoas, de pensar, e refletir, de possuir livre arbítrio.”
O que é a Imagem? Seria a razão, em seu sentido mais elevado? Ou poder para conhecer a Deus? Ou
imortalidade? A solução que para nós parece mais
completa é que a Imagem reside no dom misterioso da Personalidade, trazendo não apenas capacidade
mental mas, muito mais, capacidade moral, e
verdadeiro livre arbítrio. Os reformadores como Lutero e Calvino enfatizaram o aspecto espiritual e moral da imagem de Deus no homem. Lutero a identificava com a justiça original que foi perdida na queda. Calvino a identificava com qualidades naturais e com qualidades morais.
Em um catecismo encontramos o comentário: “O homem foi criado à imagem de Deus, no sentido de que é capaz de conhecer e amar livremente a seu
próprio Criador. É a única criatura sobre a terra a quem Deus ama por si mesmo, e a quem chama a
compartilhar sua vida divina, no conhecimento e no amor. O homem, enquanto criado à imagem de Deus, tem a dignidade de pessoa: não é somente algo, senão alguém capaz de conhecer-se, de dar-se livremente e de entrar em comunhão com Deus e as outras
O Homem Traz a Semelhança de Deus na Personalidade
Deus é um ser pessoal e assim formou o homem. Ele tem uma personalidade. Entendemos por
personalidade a presença dos poderes de pensar, sentir, querer, consciência própria e direção própria. Dos seres criados na terra só o homem os possui. Ele pensa, raciocina, reflete, tem intelecto. Ele é possuidor das mais diversas emoções e tem capacidade de
decidir, fazer escolhas.
Esses poderes pessoais presentes no homem indicam a semelhança com o seu Criador. Todos esses
componentes da personalidade são identificáveis em Deus logo no primeiro capítulo de Gênesis.
Intelecto: “Disse Deus.” Vemo-lo liberando palavras pensadas, medidas, na execução de um projeto
previamente desenhado.
Emoção: “Viu Deus que era bom.” Ao fim de cada dia da criação Ele expressa Seu sentimento a respeito e ao completar a obra enche-se de gozo na auto-avaliação do seu trabalho, porque conclui que “tudo era muito bom!”
Vontade: Cada obra é expressão de uma decisão, uma escolha deliberada. Na expressão “façamos o homem” está a suprema evidência de um Ser portador do livre arbítrio.
O Homem Traz a Semelhança Moral de Deus
Strong define um ser moral como “um ente livre e ativo, mas ao mesmo tempo sujeito a uma lei no que diz respeito ao bem e ao mal”. O homem é este ser moral dotado de um senso de responsabilidade para com o seu Criador. Por isso seu próprio coração o
condena quando não anda segundo os Seus preceitos morais (1 João 3:20,21).
Como ser moral, o homem tem uma consciência.
Novamente uma definição de Strong: “A consciência é o juízo do homem aplicado ao seu próprio
procedimento, quer aprovando as boas ações, quer reprovando as más”
O homem, imagem de Deus, possui o que se costumou chamar "Justiça Original" ou mais explicitamente conhecimento
verdadeiro, justiça e santidade. Ao criar o homem é dito que “Deus viu que era muito bom” (Gênesis 1:3) e justo (Eclesiastes 7:29).
O Novo Testamento mostra a natureza original do homem ao retratar a nova criação em Cristo. Trata-se de um resgate, um retorno, uma recriação. A nova condição em Cristo é de um
verdadeiro conhecimento (Colossenses 3:10), e o revestir-se “do novo homem, que segundo Deus foi criado em verdadeira
justiça e santidade” (Efésios 4:24). Estes três elementos constituem a justiça original, perdida no pecado e
reconquistada em Cristo: conhecimento, justiça e santidade. Esta é a imagem moral de Deus, ou simplesmente a imagem de Deus em seu sentido mais restrito, pois o homem saído das
O Homem Traz a Semelhança Espiritual de Deus
Deus é espírito e certamente Sua imagem no homem faz dele um ser também espiritual. Isto é logo revelado no dar vida ao homem, quando Deus soprou em suas narinas, o “fôlego da vida” (Gênesis 2:7), e o homem “se tornou um ser vivente” ou “alma vivente.” Isso quer dizer que a personalidade do homem só se manifesta através do corpo do homem pela presença do espírito que lhe foi dado.
O “fôlego da vida” é o princípio da vida do homem e o “ser vivente” é a expressão dessa vida através do corpo. Assim o espírito está ligado e adaptado ao corpo, mas pode existir fora do corpo. Quando alguém morre, na realidade apenas o corpo morre. O espírito continua a viver, e nisto está uma
manifestação da semelhança de Deus.
O homem é a imagem de Deus em virtude de sua natureza espiritual.
1- A doutrina Bíblica do homem como imagem de Deus, estabelece a verdadeira dignidade da raça
humana (Gênesis 1:26-27; 5:1-2; 9:6). O homem não é um produto de coisas ao acaso como ensinam os
evolucionistas. Se isso fosse verdade, o homem não
teria dignidade. Se isto fosse verdade, não importaria o assassinato, a opressão, o racismo, etc. A Bíblia ensina que o homem é uma criação especial de Deus, por isso tem dignidade e sentido na vida.
2- A doutrina do homem como imagem de Deus,
estabelece a verdadeira dignidade de cada indivíduo como ser humano (Gênesis 1:26-27; 5:1-2; 9:6; 1
Coríntios 11:7; Tiago 3:9).
3-A doutrina do homem como imagem de Deus, estabelece a verdadeira dignidade da relação
matrimonial e o papel complementar do homem e da mulher. Todo tipo de imoralidade distorce a imagem de Deus. Quando como homens não tomamos a função de líderes e cabeças em nossos lares, estamos mal representando a imagem de Deus.
4-A doutrina Bíblica do homem como imagem de Deus sublinha a total depravação do homem caído. O
homem caído veio a mal representar o seu Criador. O pecado do homem continua sendo uma rebelião
contra a majestade, poder e benevolência de Deus.
5- A doutrina Bíblica do homem como imagem de Deus provê um padrão para a santificação. Nossa obrigação de crescer nesta santidade está fundamentada em
nossa relação com Deus como feitos à sua imagem (Levítico 19; Mateus 5:48). Ser santo é ser o mas parecido possível com Deus.
6-A doutrina Bíblia do homem como imagem de Deus identifica a meta da salvação em Cristo. A meta da
salvação é: restaurar-nos à antiga condição de perfeita imagem de Deus e ser transformados à imagem de
Cristo (1 Coríntios 4:4; Colossenses 1:15; Hebreus 1:3). É uma grande motivação para nós saber que um dia, por sua graça, seremos uma fiel imagem daquele que nos criou e salvou (1 João 3:1-3).
Definimos o homem como: “O homem é um ser
espiritual, que possui uma alma, habita em um corpo, criado à imagem e semelhança de Deus. Traz em si o sopro divino; foi investido de completa autoridade sobre as obras das mãos do seu Criador; coroado por Deus de honra e glória, com a responsabilidade de
reinar na terra e guardá-la, protegendo-a de qualquer intruso; vivendo, falando e agindo em absoluta
harmonia e comunhão com o autor da vida, a quem deve total obediência, honra, glória, adoração e