• Nenhum resultado encontrado

O MUNDO QUE QUEREMOS VER: PERSPECTIVAS PÓS Relatório da Christian Aid Setembro de 2013

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "O MUNDO QUE QUEREMOS VER: PERSPECTIVAS PÓS Relatório da Christian Aid Setembro de 2013"

Copied!
44
0
0

Texto

(1)

QUEREMOS VER:

PERSPECTIVAS

PÓS-2015

Relatório da Christian Aid

Setembro de 2013

(2)

Capa: Comunidades sem terra da Índia unidas em campanha pelos direitos à terra, durante a Jan Satyagraha, a Marcha por Justiça, em 2012. O movimento tem suas raízes nas experiências de comunidades pobres indianas, e foi organizado por Ekta Parishad, parceiro da Christian Aid, que enfatizou a suprema importância da solidariedade dessa campanha.

Crédito : Christian Aid/Simon Williams

Autoria: Helen Dennis

A Christian Aid gostaria de agradecer a nossos parceiros e autores por sua contribuição para com este relatório, que não teria sido possível sem eles.

Colaboradores da equipe da Christian Aid: Maeve Bateman, Chiara Capraro, Alexander Carnwath, Vitumbiko Chinoko, Celia Cordova, Alison Doig, Gaby Drinkwater, Aisseta Kabre, Priya Lukka, Mara Luz, Ana Claudia Menezes, Sophie Powell, Alex Prats, Nadia Saracini, Joseph Stead, Katharine Teague.

As opiniões dos parceiros da Christian Aid expressas neste relatório, não refletem necessariamente as políticas da Christian Aid e não devem ser a ela atribuídas. Entretanto, essas opiniões são muito importantes para a elaboração de nossas políticas e trabalho de incidência.

A pobreza é um ultraje contra

a humanidade. Ela despoja os indivíduos

de sua dignidade, liberdade e esperança,

e do poder sobre suas próprias vidas.

A Christian Aid tem uma visão – acabar

com a pobreza – e acreditamos que

essa visão pode tornar-se realidade.

Conclamamos a todos que se juntem a nós.

christianaid.org.uk

(3)

CONTEÚDO

Prefácio: Dr Rowan Williams

2

Introdução 3

Vozes parceiras: África

6

CEPA - Centro de Incidência e Política Ambiental, Malawi 7

Réseau MARP - Rede para a Promoção de Abordagens Participativas, Burkina Faso 8

Instituto de Estudos sobre Pobreza e Desigualdade, África do Sul 10

Rede de Justiça Fiscal África 12

União Cristã Feminina (UCF) – Angola 14

INERELA+ 16

Vozes Parceiras: Ásia e Oriente Médio

18

Social Watch - Observatório da Cidadania das Filipinas 19

Campanha Nacional pelos Direitos Humanos dos Dalits / NDW, Ìndia 20

BCAS - Centro de Estudos Avançados de Bangladesh 22

AWN - Rede de Mulheres Afegãs 24

Rede Árabe de ONGs para o Desenvolvimento 25

Vozes Parceiras: América Latina e Caribe

26

Centro Humboldt, Nicarágua 27

KOINONIA, Brasil 28

Corambiente, Colômbia 30

UNITAS, Bolívia 32

INESC, Brasil 34

Plataforma Boliviana sobre Mudança Climática 35

Uma agenda para o desenvolvimento sustentável e equitativo

36

Recomendações

40

(4)

PREFÁCIO

Dr Rowan Williams, Presidente da Christian Aid e ex-arcebispo da Cantuária

Já há alguns anos, os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODMs) representam não só um parâmetro do pensamento sobre os fundamentos de um mundo mais justo e mais seguro, como ainda têm o papel de nos lembrar de que é possível que os governos do mundo reconheçam, como imperativo moral de todos nós, a necessidade de uma ação comum. Ao voltarmos nossa atenção para 2015, data em que a princípio se esperava atingir as Metas do Milênio, nos deparamos com sentimentos contraditórios. No entanto, não importa o grau de desafio que nossas falhas em uma série de metas representem, é fundamental que, antes de tudo, nos mantenhamos fiéis à importância do fato de que elas existem.

A tarefa que a sociedade civil e os grupos de incidência enfrentam não é o de gerar aspirações do nada, mas fazer com que governos, órgãos públicos e o público em geral se responsabilizem pela melhor e mais generosa visão concebida, e que continuem a delimitar cada vez mais onde se encontram as necessidades mais agudas, ao escutarmos a experiência popular dos que enfrentam a pobreza, doenças, fome e injustiças. Este é o significado de um relatório como este. Ao tomarmos ciência do progresso real de algumas áreas, precisamos da maior clareza possível ao identificar onde as metas ainda devem gerar impacto real. Na última década, a maioria dos envolvidos na busca de desenvolvimento justo e sustentável salientou a importância fundamental das mulheres nesse processo, o que torna imperativa a atenção que deve ser dada a todos os tipos de discriminação e desvantagens que acometem meninas e mulheres em todo o mundo. Porém, estas páginas nos advertem da distância que ainda temos a percorrer. A saúde maternal e perinatal ainda é um grande desafio; as questões de igualdade de gêneros, sem falar da educação, ainda demoram a atingir o topo das listas em muitas estratégias nacionais. O pior de tudo é que a incidência de violência e abuso ligada a gênero ainda se mantém em níveis escandalosos e inaceitáveis em muitos países. Nós, da Christian Aid, contamos com que essas questões sejam tratadas com novo grau de urgência.

Além disso, é verdade que ainda há outras questões que agora parecem mais urgentes do que uma década atrás. Temos muito mais consciência, por exemplo, de como questões relativas à justiça global se entremeiam aos efeitos das mudanças climáticas, seja a elevação dos níveis de água no Pacífico ou a desertificação na África subsaariana. Sobretudo, o que não se pôde prever, no início do milênio, foi a crise econômica que precipitou novos tipos de dificuldades em locais inesperados, além de provocar muita ansiedade em relação aos gastos públicos. Nesse contexto, devemos elogiar a decisão do Reino Unido de proteger seu orçamento assistencial; mas agora precisamos que mais países intensifiquem seu compromisso com os ODMs e metas posteriores a 2015. Não só nos encontramos frente a uma dúvida moral, ou seja, - ‘vamos ficar parados e deixar os

mais vulneráveis arcarem com os maiores custos, no âmbito nacional e internacional?’- como ainda enfrentamos o desafio de que tipo de mundo vislumbrar para os próximos 10 ou 20 anos. Queremos realmente ampliar as distâncias entre ricos e pobres, com toda a instabilidade que implica a insegurança global, os deslocamentos, a violência e a miséria que engloba, em última análise, a todos em todo o planeta?

Em qualquer dessas situações, é essencial que ouçamos não só as vozes dos especialistas, mas também a fala daqueles que estão na linha de frente. Ajudar a tornar essa fala audível para o maior número de pessoas possível é parte essencial da filosofia da Christian Aid, assim como ouvirmos com cuidado sobre a experiência daqueles que enfrentam desafios e crises, uma vez que temos um compromisso fundamental para com a dignidade que Deus confere a cada pessoa. Este relatório almeja ser mais do que um documento com registros das conversações entre órgãos e ativistas, ele deve ser uma plataforma para as vozes dos que mais importam, daqueles cujos interesses e bem estar precisamos servir e assegurar por todos os meios possíveis de que dispomos.

Espero que todos os que lerem este relatório encontrem aqui uma energia fresca, e que ele renove a ânsia de tornar a próxima fase de trabalho dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio e as discussões para a pós-2015 um exercício digno e inspirador para a cura do nosso mundo enfermo e das relações injustas que ainda o caracterizam.

Rowan Williams

(5)

INTRODUÇÃO

A Christian Aid acredita que pobreza não é inevitável e que pode ser erradicada. É isso o que impulsiona nosso trabalho; é a razão de a agenda de desenvolvimento do pós-2015 ser uma discussão tão importante. Entretanto, a erradicação da pobreza e a redução das desigualdades não vão acontecer sem vontade política; nada vai acontecer, se nossas metas forem pequenas e nossas análises falhas.

A erradicação da pobreza não é algo que alguns ‘fazem aos outros’. Na verdade, acreditamos que só irá acontecer por meio de parceria e de fortalecimento das comunidades, inclusive de mulheres e marginalizados. Pensando nisso, nossa abordagem do relatório foi extraída da experiência e conhecimento dos parceiros da Christian Aid em todo o mundo; de ouvir e refletir sobre as prioridades deles para as metas pós-2015, antes que façamos as recomendações àqueles que atualmente prosseguem com as negociações.

Isto vem acompanhado de muitas outras contribuições construtivas da sociedade civil e das organizações baseadas na fé. Vem acompanhado, também, dos resultados de consultas temáticas, pesquisas participativas e da pesquisa Meu Mundo 2015, que, durante a elaboração deste relatório, acompanhou a ONU realizar uma pesquisa de opinião pública junto a mais de 800.000 pessoas em 194 países, sobre as prioridades fundamentais para um mundo melhor.

Acreditamos que uma nova estrutura deve abordar, com profundidade, temas como a desigualdade e a resiliência ambiental, para que se possa atingir e manter a erradicação da pobreza. As contribuições que seguem apoiam este ponto de vista e oferecem uma visão de como uma agenda global pode causar impacto de âmbito nacional e local.

O mundo em 2013

Em cada 100 pessoas:

• 12 vivem em favelas;

• 15 são desnutridas;

• 17 vivem em extrema pobreza ou com menos de US$1,25 por dia;

• 35 não têm acesso a um banheiro decente;

• 37 vivem com menos de US$2 por dia.

Além disso, a situação de mulheres e crianças continua intolerável:

• 1 em cada 4 crianças no mundo são raquíticas; 1

• na África subsaariana, 1 entre 9 crianças morrem antes da idade de 5 anos;

• 57 milhões de crianças em idade escolar primária não frequentam escola;

• em todo o mundo, cerca de 70% das mulheres correm risco de violência durante suas vidas;

• 140 milhões de mulheres que gostariam de ter acesso à contracepção, mas não a têm;

• só 20% dos parlamentares em todo o mundo são mulheres.

Isto é particularmente injusto, dada a concentração de riqueza e renda no mundo. Embora a riqueza global esteja crescendo, ela é controlada por um número pequeno de indivíduos, ajudados pelos aspectos do sistema financeiro global atual:

• Os 20% mais ricos controlam e consomem 80% dos recursos mundiais;2

• Os mais ricos (1% da população) controlam 39% da riqueza mundial: US$52,8 trilhões; 3

• Os que possuem US$5 milhões ou mais, controlam praticamente um quarto da riqueza mundial;

• Apesar da crise econômica, 2012 assistiu a 10% de aumento no número de milionários;

• estima-se, atualmente, que cerca de US$21 trilhões se encontram escondidos em paraísos fiscais; 4

• A cada ano, os países em

desenvolvimento perdem US$1 trilhão em fluxo ilícito de capital.5

Enfrentamos, ainda, uma crise ambiental e climática que irá aumentar em frequência e severidade os

desastres naturais, causando impacto em todos nós, particularmente os mais pobres e mais vulneráveis. Se mantivermos os negócios na atual trajetória de emissões globais, seguindo para um mundo 4ºC graus mais quente, provavelmente iremos nos defrontar com:

• um aumento da ocorrência de seca em áreas plantadas de 15,5% para 44%;6

• declínio da disponibilidade de água de até 50% em algumas regiões;7

• 3 bilhões de pessoas reduzidas à pobreza.8

(6)

O mundo em que vivemos

Em 2013, o mundo está cada vez mais desigual e menos sustentável. Embora tenhamos obtido algum ganho importante em termos da redução da pobreza desde 2000, vale a pena refletir sobre alguns dos desafios mais urgentes que temos pela frente, e em como a situação atual ainda é ofensiva. O quadro na página anterior aponta alguns dos desafios presentes no mundo hoje: a pobreza extrema, os índices de mortalidade de crianças abaixo de cinco anos, níveis de desnutrição infantil, a falta de acesso a educação, de acesso a água e saneamento; violência contra a mulher; participação desigual da mulher na sociedade; níveis de sonegação fiscal; divisão entre ricos e pobres; luta por sustentabilidade ambiental, e por último, mas não menos importante, a mudança climática e todos os seus impactos.

Os mais pobres não só correm mais riscos, como são os menos culpados. Há uma ligação direta entre desigualdade e mudanças climáticas. À medida que as maiores rendas tendem a estar relacionadas com um maior índice de pegadas de carbono, os mais pobres estão mais expostos aos danos causados por elas. O Malawi produz 0,1 toneladas métricas de dióxido de carbono per capita em comparação aos Estados Unidos que produzem 17,3 toneladas métricas por capita, e ao Qatar, que produz 44 toneladas métricas per capita.9

Por que metas globais?

As estatísticas são de estarrecer, deveriam nos indignar e nos por em ação. Elas exigem um foco renovado sobre a pobreza global, além de uma reconsideração fundamental de algumas estruturas financeiras globais, de mudança imediata para modelos de produção e consumo sustentáveis e de baixo carbono, e de crescimento mais inclusivo.

A Christian Aid crê que uma nova estrutura global de desenvolvimento seria uma ferramenta importante na luta por um mundo mais justo. Ela precisa ser apoiada por outros processos multilaterais, tais como o progresso para uma justiça fiscal e a transparência financeira, ações que reduzam o risco de desastres que as comunidades enfrentam, e um acordo climático com vínculo jurídico.

Acreditamos que novos objetivos justos e ousados podem ajudar a impulsionar a erradicação da pobreza, a redução da desigualdade e a promoção de desenvolvimento sustentável. Entretanto, é importante também testar hipóteses sobre o valor e o propósito de um novo conjunto de objetivos10 e refletir sobre o sucesso

dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODMs) atuais.

Nos últimos anos, testemunhamos importantes conquistas de redução da pobreza. Como por exemplo:

• desde 1990, mais de 2,1 bilhões de pessoas ganharam acesso a fontes mais adequadas de água potável;11

• a meta do ODM relacionado ao acesso universal a tratamento antirretroviral dos portadores de HIV, tornou-se possível;

• entre 2000 e 2011, o número de crianças fora da escola caiu de 102 milhões para 57 milhões;

• entre 1990 e 2011, o índice de mortalidade de crianças com menos de cinco anos caiu em 41%.

Estas são conquistas positivas, mas nem sempre é fácil atribuí-las exclusivamente aos ODMs. As metas certamente marcaram o vocabulário e as estruturas estratégicas12.

Mas seu impacto direto sobre a redução da pobreza é mais difícil de determinar. Parece haver evidência de que o financiamento internacional dos setores sociais cresceu após o acordo dos ODMs13 , mas não está tão claro o seu impacto sobre a mobilização dos recursos domésticos.

O recente relatório do Government Spending Watch (Observatório de Gastos Governamentais) mostrou que apesar do número de compromissos importantes assumidos pelos governos de aumentar o gasto em áreas como saúde, educação e agricultura, a implementação desses compromissos vem diminuindo e questões importantes, como igualdade de gênero, proteção ambiental e proteção social, vêm sendo negligenciadas14.

Os ODMs estão sendo digeridos; as prioridades dos ODMs vêm penetrando os Trabalhos sobre Estratégias para a Redução da Pobreza15, embora seletivamente e ocasionalmente,

com algumas alterações,16 e as metas de gastos que

vão se estabelecendo. Entretanto, outros fatores como o financiamento por meio de doações, a restrição das receitas e a falta de prestação de contas prejudicam o progresso em campo, limitando o impacto que os objetivos poderiam causar. Não podemos desistir dos objetivos globais em face desses fatores; não, pelo contrário, eles devem encorajar todos os envolvidos a pensar com muito cuidado em como traduzi-los para os contextos nacionais, em como eles imaginam estes objetivos sendo usados e por quem, e nos mecanismos de prestação de contas que deverão apoiar as realizações, frente à nova estrutura. Nossa esperança é que a agenda de desenvolvimento pós-2015, cuidadosamente concebida com a participação da sociedade civil e das comunidades pobres em todo o mundo, consiga desempenhar as funções a seguir:

(7)

1 Criar um sentimento de solidariedade e responsabilidade global para a erradicação

da pobreza, combatendo as desigualdades e atingindo um desenvolvimento sustentável;

2 Incentivar uma resposta coordenada nas áreas estratégicas em que se faça necessária, tais como o combate ao HIV, ou, para oferecer um exemplo diferente, a mitigação das mudanças climáticas, ou do sistema fiscal internacional;

3 Estabelecer normas globais, elevar os padrões e impulsionar investimentos de âmbito nacional em áreas como a igualdade de gênero;

4 Manter questões como a pobreza global,

as desigualdades e o desenvolvimento sustentável no mais alto nível da agenda política.

Visão pós-2015

Qual o mundo que nós queremos ver? Esta é, certamente, uma pergunta vital – e a resposta vai determinar os tipos de metas, objetivos e indicadores que irão constituir a nova estrutura da pós-2015. Será simplesmente um mundo sem pobreza, caracterizado por pessoas vivendo com US$1,25 por dia, ou podemos ser um pouco mais

ambiciosos? O desenvolvimento está relacionado, basicamente, ao crescimento econômico, ou temos uma visão mais

completa de bem estar e de desenvolvimento humano? Estamos falando principalmente de preenchimento das necessidades materiais ou há outras dimensões que precisam ser levadas em consideração?

O Painel de Alto Nível da Agenda Pós-2015 já definiu sua visão, assim como alguns exemplos de objetivos e metas voltados à ‘erradicação da pobreza e transformação das economias por meio de desenvolvimento sustentável’. 17

Membros do Grupo Aberto de Trabalhos das Metas de Desenvolvimento Sustentável, estabelecido em 2012 pela conferência Rio+20, também estão considerando suas prioridades.

A Christian Aid espera que esses processos sejam logo reunidos para que possamos definir um conjunto de objetivos claros e ambiciosos.

Nas páginas que se seguem, 17 parceiros da Christian Aid em todo o mundo nos falam sobre o mundo que cada um deles quer ver.

‘O desenvolvimento está relacionado

basicamente ao crescimento econômico

ou temos uma visão mais completa de bem

estar e de desenvolvimento humano?’

Foto: Mulheres na vila de Keleguem, nordeste de Burkina Faso, carregam pedras com as quais constroem cinturões de pedras – muros baixos que ajudam a proteger o solo da erosão causada pela chuva e pelo vento. Construídos com o apoio da Réseau MARP, parceira da Christian Aid, os muros permitem que as culturas se desenvolvam e produzam mais alimentos. Fo to : C h ris tian A id /K ev in L eig h ton

(8)

VOZES PARCEIRAS

ÁFRICA

Aminata Sawadogo e seu neto Souley, de onze anos (ao centro), com seus animais na vila de Keleguem, nordeste de Burkina Faso. Aminata participou de um projeto de pecuária monitorado pela Réseau MARP, parceira da Christian Aid, em que,depois de uma crise de alimentos causada pela seca, as pessoas mais vulneráveis da vila receberam um par de animais, um dos quais eles deveriam passar a outra pessoa vulnerável da vila C h ri st ian A id /K ev in L ei g h ton

(9)

Como a maioria das pessoas nos países africanos,

os malawianos se encontram na linha de frente de impactos causados pelas mudanças climáticas, devido à sua grande dependência da agricultura pluvial. Pesquisas realizadas pelo CEPA mostram que os padrões não confiáveis de chuva colocam cada vez mais em risco a viabilidade de cultivo em planaltos, uma vez que a maioria das atividades agrícolas são desenvolvidas em ecossistemas frágeis.

As palavras de Nkhuleme Ntambalika, do Distrito de Balaka, traduzem o apelo da maioria dos fazendeiros malawianos:

As palavras de Nkhuleme Ntambalika, do Distrito de Balaka, traduzem o apelo da maioria dos fazendeiros malawianos: “Costumávamos ter um nível de chuva bastante estável, adequado e não erosivo. Hoje, ninguém sabe quando plantar. Quando a chuva chega, ou é muito pouca para o plantio, ou tão pesada, que os campos alagam e sofrem erosão. Então, vem uma seca prolongada e queima as plantas que germinaram. No processo, perdem-se as sementes e somos forçados a plantar de novo. Se temos sorte, conseguimos uma boa colheita. Entretanto, na maioria dos casos, hoje em dia, a chuva desaparece quando cultivos como o do milho estão no estágio crítico de formação e pendoamento das espigas” (2010).

A maioria dos desastres recentes no Malawi, com perda de vidas, plantações e de infraestrutura, vem sendo associada aos efeitos das mudanças climáticas. O Departamento de Assuntos de Gestão de Desastres descreveu mais de 12.500 famílias afetadas, de várias formas, por enchentes, tempestades e ventos fortes, durante a estação chuvosa de 2012-13. Nesses períodos de eventos climáticos tão extremos, a educação é geralmente interrompida, pois as inundações levam os prédios e os estabelecimentos de ensino com a corrente, ou os transformam em centros de refúgio para as comunidades afetadas. Mulheres são afetadas pelas mudanças climáticas de modo desproporcional, por arcarem com o ônus das atividades que sofrem mais o impacto das adversidades climáticas, incluindo a coleta de água e de lenha, garantia de acesso diário à alimentação.

Nesse contexto adverso, a ênfase dada às necessidades de adaptação e de reforço da resiliência da comunidade nunca é suficiente. Para que isso aconteça, é preciso que se forme uma parceria global mais forte e uma estrutura de ação, que vá além do status quo. A nova estrutura deve definir metas específicas para a mudança climática e a sustentabilidade ambiental, que incluam financiamento, capacitação

e transferência de tecnologia aos segmentos mais vulneráveis da sociedade (inclusive grupos socialmente excluídos como mulheres, crianças, idosos e pessoas com deficiências). As metas devem seguir prazos determinados para que o objetivo de aumentar a capacidade das comunidades de enfrentamento e adaptação aos impactos das mudanças

climáticas seja atingido. Além disso, mecanismos claros de prestação de contas devem ser definidos para que se concretizem os objetivos globais de redução da pobreza, em sintonia com a sustentabilidade ambiental da pós-2015. Desta forma, o simples reconhecimento dos desafios climáticos e da sustentabilidade ambiental na estrutura de desenvolvimento da agenda pós-2015 não basta, se não forem definidos mecanismos claros de ação, não importa o grau de articulação. A nova estrutura deve se basear e reforçar todos os princípios de desenvolvimento sustentável, inclusive a igualdade dentro e entre gerações, bem como o princípio participativo.

O mecanismo global deve também ser construído em torno do princípio de ‘Responsabilidades Comuns, mas Diferenciadas, de acordo com as Capacidades’, conforme reafirmado na recente Conferência da ONU sobre Desenvolvimento Sustentável - Rio +20. Esses princípios devem ser a base de um mecanismo claro de financiamento que possa implementar as metas comuns para um futuro sustentável e próspero para todos.

Além da dependência excessiva da agricultura pluvial,

a vulnerabilidade do Malawi à mudança climática é exacerbada por causa de sua baixa capacidade de adaptação (decorrente de sua reduzida base econômica), da limitada capacidade de agro processamento e de grande dependência de energia de biomassa. Com 88.5% da demanda total de energia dependente da queima de madeira, a demanda nacional de lenha e carvão – estimada em 7,5 milhões de toneladas por ano – é muito superior à oferta sustentável de apenas 3,7 milhões de toneladas por ano. O desflorestamento resultante leva à degradação de coleta e ao assoreamento, fazendo com que os campos de cultivo estejam mais propensos a inundações, restringindo a oferta de energia da rede nacional de base hidroelétrica.

Criado em 2002, o CEPA (Centro de Incidência e Política Ambiental – Malawi) tem a visão de uma sociedade justa e equitativa, que promove desenvolvimento sustentável. Seu objetivo é conduzir análises de políticas e defesa de gestão sustentável do meio ambiente e de recursos naturais. O CEPA visa a construção de pontes entre a ação política e a prática, entre os legisladores e as comunidades locais afetadas pela implementação dessas políticas, e entre as ações locais e os debates nacionais e globais sobre elas. Entre outras coisas, o CEPA facilita o acesso a informações ambientais e à justiça; contribui para a formulação de políticas relativas

à biodiversidade e biotecnologia, desenvolve pesquisas das políticas de reforma agrária e distribuição da terra, conduz atividades de qualificação e defesa do meio ambiente, coordena as vozes da sociedade civil sobre políticas

relacionadas às questões de mudanças climáticas e participa de debates internacionais sobre políticas de diversidade e mudanças climáticas.

cepa.org.mw

ADAPTAÇÃO E MELHORIA DA

RESILIÊNCIA DAS COMUNIDADES

SÃO FATORES FUNDAMENTAIS.

Herbert Mwalukomo, diretor de programa,

(10)

Quando o governo de Burkina Faso fez sua avaliação do progresso dos ODMs no início de 2013, ficou claro que ainda restava muito a ser feito, particularmente se considerarmos que a pobreza ainda está profundamente enraizada.

Os esforços para cumprir os ODMs foram prejudicados pelo surgimento de novos ou crescentes desafios, como os efeitos das mudanças climáticas e as crises de energia e de alimentos, que fizeram aumentar as desigualdades.

A experiência de campo da Réseau MARP confirma que, embora tenha havido progresso em certas áreas como educação e acesso a água potável, a pobreza permanece infiltrada; as mulheres, em particular, ainda são gravemente afetadas e os índices de mortalidade infantil continuam altos. Fica claro que as comunidades, especialmente as das zonas rurais, são extremamente vulneráveis às muitas catástrofes e crises que reincidiram nos últimos anos.

O objetivo de nosso trabalho de redução dos riscos de desastres (inspirado por parceiros como a Christian Aid e a Rede Global para a Redução de Desastres) é oferecer programas de resiliência com foco nas próprias comunidades. Isso envolve o desenvolvimento de ferramentas de

identificação das pressões sobre as comunidades, em nível de base.

Por exemplo, nossa abordagem de APCV (Análise Participativa de Capacidade e Vulnerabilidade) permite que todos os membros da comunidade – inclusive grupos de mulheres e pessoas marginalizadas – possam se unir e compreender os riscos que enfrentam. Uma vez identificados e analisados os riscos em conjunto, a população local pode criar um plano de ação, definindo a melhor forma de resposta. Ações de pressão aos parlamentares no âmbito nacional também são fundamentais para que sejam tomadas decisões em prol da sustentabilidade e do desenvolvimento inclusivo.

Acreditamos que os esforços para a criação de uma nova estrutura de desenvolvimento devem vir apoiados por uma vontade de reduzir essa vulnerabilidade, melhorando a resiliência das comunidades aos desastres e construindo a resiliência econômica dos mais vulneráveis da sociedade, como as mulheres. A proteção da segurança alimentar e nutricional dessas pessoas é fundamental para a proteção de seus meios de subsistência.

Um dos principais benefícios dos ODMs é fornecer a ferramenta e a estrutura de referência que as autoridades de Burkina Faso se comprometeram a implementar. Há um plano nacional em execução, que avalia o progresso dos ODMs e do financiamento (embora insuficiente) alocado pelo estado para a realização dos diferentes ODMs. Estes oferecem um meio de canalizar ações de desenvolvimento (do estado e das ONGs) relacionadas a objetivos precisos, de acordo com

prioridades acordadas. A implementação dos ODMs pode auxiliar a solucionar problemas ligados à educação, ao acesso à água potável e saneamento básico, segurança alimentar e nutricional, e redução da extrema pobreza.

Dois princípios fundamentais.

Em nossa opinião, o futuro programa de desenvolvimento deve se basear em dois princípios fundamentais: sustentabilidade e boa governança. Todos os aspectos da nova estrutura devem ser sublinhados por um compromisso com a sustentabilidade. Isso inclui a implantação de um sistema econômico

sustentável, justo e inclusivo, a redução das desigualdades e desequilíbrios sociais, e uma gestão sustentável dos recursos naturais. No tocante à boa governança, esta pode ser obtida com a garantia de que as atividades para o desenvolvimento sejam geridas com transparência e de acordo com a justiça social.

A nova estrutura de desenvolvimento deverá basear-se, principalmente, nas quatro prioridades:

1 Reforço da resiliência das comunidades a desastres;

2 Fortalecimento das mulheres, ajudando-as a construir sua resiliência econômica e a conquistarem uma voz política forte;

3 Redução da mortalidade infantil, pela redução da desnutrição e melhoria do acesso aos serviços de saúde e saneamento básico;

4 Apoio à gestão sustentável dos recursos naturais e ecossistemas, compartilhando as boas práticas. Além dessas, propomos as metas e indicadores a seguir:

Objetivo 1: Apoio ao fortalecimento econômico das mulheres, especialmente nas áreas rurais

• Acesso das mulheres aos meios de produção;

• Acesso das mulheres a fontes de financiamento que sustentem atividades geradoras de renda;

• Envolvimento das mulheres nas tomadas de decisões.

Objetivo 2: Reforço da resiliência das comunidades a desastres:

• Existência de um sistema de alerta precoce eficiente;

• Capacidade local de prevenção e gestão de desastres;

• Existência de infraestrutura para redução e mitigação dos riscos de desastres.

SUSTENTABILIDADE

E BOA GOVERNANÇA

(11)

Objetivo 3: Reforço da capacidade de adaptação às mudanças climáticas das comunidades:

• Implantação de atividades de adaptação às mudanças climáticas efetivas.

Objetivo 4: Redução da mortalidade infantil:

• Redução dos índices de desnutrição;

• Aumento dos índices de acesso à serviços de saúde;

• Melhoria dos níveis de saneamento.

Objetivo 5: Garantia de gestão sustentável dos recursos naturais:

• Existencia de mecanismos locales para la gestión de los recursos naturales.

• Crecimiento de la tasa de adopción de prácticas de manejo sostenible de los recursos naturales.

• Acceso equitativo a los recursos naturales.

• Legislación favorable a la utilización racional de los recursos naturales.

A Réseau MARP foi criada em 1992. Em 2007, foi reconhecida oficialmente, pelo estado burquinês, como ONG de serviços para o público, em reconhecimento aos sucessos obtidos no campo do desenvolvimento. O princípio mestre de todo o trabalho da Réseau MARP é de que a comunidade constrói seu bem estar por meio da participação ativa de seus membros. Algumas áreas centrais de seu trabalho incluem: garantia de alimento, gestão de recursos naturais, poupança e microcrédito, resposta a emergências, redução de risco de desastres, e incidências em favor das comunidades sob risco de desastre.

reseaumarpbf.org

‘O programa futuro de desenvolvimento

deve basear-se na sustentabilidade e na

boa governança’.

(12)

Historicamente, a sociedade civil da África do Sul está

intimamente relacionada a questões de direitos civis e políticos, que, obviamente, tem raízes no movimento de libertação anti-Apartheid e no apoio da solidariedade internacional para a questão.

Com a introdução do regime democrático em 1994, a visão de uma África do Sul transformada e igualitária estava à frente dos discursos de transição. Isto é evidenciado pelos princípios e direitos contidos na Constituição da África do Sul, cuja Carta de Direitos inclui os direitos socioeconômicos. Em sua adoção, nossa Constituição final foi aclamada como uma das mais progressistas em todo o mundo.

Desde a aprovação da Constituição em 1996, no entanto, a África do Sul vem lutando para realizar incursões significativas no que se refere aos enormes e inter-relacionados desafios apresentados pela pobreza, desemprego e desigualdades. Várias causas estruturais foram exploradas nesse sentido, tanto aquelas enraizadas nas políticas de exclusão do Apartheid, como em movimentos posteriores e em escolhas de políticas macroeconômicas.

Estado de desenvolvimento

Atualmente, enfrentamos uma interseção desconfortável entre a estrutura tradicional baseada em direitos e uma nova estrutura de ‘desenvolvimento’ mais ortodoxa. A primeira, como já mencionado, avança por meio da Constituição, enquanto a outra enfatiza a política de reorientação da África do Sul em direção a um ‘estado desenvolvimentista’. Muitos críticos questionam o significado dessa expressão, e exemplos são apontados sobre os estados desenvolvimentistas asiáticos e as muitas lições sobre a priorização de um desenvolvimento econômico em detrimento do desenvolvimento e dos direitos humanos.

Para muitos, nossa pesquisa junto ao SPII deixa claro que a expectativa de se poder desenvolver uma estratégia de subsistência sustentável voltada para os indivíduos e suas famílias permanece indefinida em face do elevado nível de desemprego formal. Parece haver um descompasso significativo entre as políticas intervencionistas concebidas e implementadas nos três níveis de governo, e os desafios e obstáculos reais enfrentados pela população. A crescente economia informal também parece iludir os políticos. Os pobres e marginalizados continuam à mercê de políticas

‘MENOS, SIM, MAS MELHOR’

Isobel Frye, diretora, do SPII (Instituto de Estudos sobre a Pobreza

e Desigualdades), África do Sul.

Fo to : C h ris tia n A id /S ar ah F ilb ey

(13)

que não consideraram, em sua formulação, a realidade deles. Na verdade, essas políticas serão sempre um desafio: pois estarão sempre situadas em ambientes difusos, que existem para além das principais abordagens atuais de relacionamento entre o estado político e a cidadania ativa, fortalecida, formalizada e informada.

Garantia de direitos

A nova estrutura de desenvolvimento precisa romper a dissonância percebida entre direitos e desenvolvimento. Políticas devem ser auditadas por um sistema de avaliação centrado nos seres humanos, que inclua extensa pesquisa qualitativa das experiências reais das pessoas, na tentativa de estabelecer e manter estratégias seguras de subsistência. Isto deve ocorrer dentro de uma estratégia contínua de informação das pessoas a respeito de seus direitos e de como assegurá-los em face de um estado que é, na melhor das hipóteses, caótico e, em geral, corrupto e disfuncional.

São necessários centros de aconselhamento que propiciem conhecimento dos direitos, assim como capacitação prática para os negócios e informações sobre acesso aos mercados, crédito, e outras formas de assessoria. As políticas precisam tratar de questões difíceis, como meios de expansão dos negócios do setor informal, que, por definição, não têm registro e são invisíveis. Isto é ilustrado pela pergunta sobre direitos, de como ampliar o acesso à proteção social no âmbito nacional: precisamos priorizar o modo como nos relacionamos aos padrões, ritmos e necessidades dos indivíduos que operam formas atípicas de emprego, nas periferias do setor formal. É importante que se aprenda a partir das experiências internacionais, mas é também importante a consciência de que é necessário aplicar esse conhecimento às realidades locais: é exatamente aí, que as pessoas comuns precisam ser incluídas, na auditoria de políticas, na elaboração de programas, nos sistemas de monitoramento e de avaliação.

Infelizmente, os ODMs têm causado poucos impactos em nosso trabalho na África do Sul. Apesar do partido no poder se comprometer a alcançar os principais ODMs até 2014, um ano antes da data prevista nos ODMs (devido ao final do mandato do atual governo), não houve qualquer movimento significativo, nem do estado nem da sociedade civil, de qualquer forma

sustentada ou programada. Isso é algo que precisa ser abordado. Qualquer que seja a agenda pós-2015 deve incluir, a saber, um acordo de metas e indicadores realistas definidos, que possam ser supervisionados por instituições de múltiplos atores.

Talvez, um dos desafios que enfrentamos na África do Sul seja, aparentemente, o número esmagador de planos e prioridades, e muito pouca fé na realização de qualquer um de seus fundamentos. ‘Menos, sim, mas melhor’ era a palavra de ordem do presidente anterior da África do Sul, e acreditamos que a lição importante a se aprender aqui é a de nos limitarmos às metas mais importantes, mais visíveis e mais inclusivas. Depois de realizá-las claramente, será mais fácil escolher e aplicar a mesma energia e compromisso aos desafios que se seguirem.

O SPII, Instituto de Estudos sobre a Pobreza e Desigualdade, é uma fundação sem fins lucrativos com base em Joanesburgo. Foi fundada há sete anos, com o propósito principal

de contrapor a falta de pesquisa empírica sobre a pobreza e a desigualdade observada na sociedade civil, tão necessária ao avanço de uma série de campanhas da sociedade civil na África do Sul e da sub-região da Comunidade Sul Africana de Desenvolvimento (SADC)

A metodologia do SPII combina pesquisa primária no âmbito da comunidade, com a análise de políticas e do engajamento do governo, de empresas organizadas e do trabalho

organizado. Entre as atuais áreas de pesquisa estão o Programa de Direitos Socioeconômicos, que inclui uma campanha para a introdução de um subsídio amplo de renda básica da SADC (Comunidade para o Desenvolvimento Da África Austral), financiado por um imposto sobre as atividades extrativistas, e um programa de cestas de necessidades básicas, que inclui um projeto de renda e despesa familiar primário. .

www.spii.org.za

‘We believe an important lesson to learn is to

limit ourselves to the most crucial, most visible

and most inclusive targets.’

Foto: Crianças brincam em um dos assentamentos informais da Cidade do Cabo, na área de Kayelitcha.

(14)

Muitos encaram a tributação como um tema complexo que deveria ficar nas mãos de especialistas; mas a história das economias desenvolvidas mostra que ela está no cerne de todo desenvolvimento significativo e da construção do estado. Entretanto, até muito recentemente, o discurso internacional sobre o desenvolvimento econômico dos países pobres procurava evitar discussões sobre tributos ou receitas fiscais como fontes essenciais de financiamento. Os ODMs não dão qualquer atenção aos tributos, nem mesmo, a tão aclamada Declaração do Milênio.

A questão de como os governos em todo o mundo financiam escolas, hospitais, estradas e outros serviços vitais não é nenhum bicho de sete cabeças. Impostos são a única fonte estável, confiável e sustentável de renda, que permite aos governos cumprir suas obrigações para com os cidadãos, garantindo-lhes acesso aos serviços essenciais básicos. Por isso, é vital que uma nova ‘parceria global para

o desenvolvimento’ ou objetivo financeiro, como o proposto recentemente pelo Painel de Alto Nível, priorize o imposto como fonte de financiamento do desenvolvimento.

O enfrentamento dos desafios e das más práticas que negam aos países em desenvolvimento sua devida receita fiscal,

devem estar no coração de qualquer nova estrutura global de desenvolvimento. Esses esforços devem incluir medidas que incentivem a geração de recursos tributários e reduzam a perda de receita dos países pobres, devido a sistemas financeiros globais falhos.

É um escândalo que haja mais de 1,3 bilhões, ou quase um quinto da população global, vivendo com menos de US$1,25 por dia; é moralmente inaceitável que mais dinheiro fuja dos países pobres para os ricos do norte, do que o contrário. Estima-se que para cada dólar que entra nos países pobres, US$10 saem.

Estudos recentes indicam que o continente africano perde mais de US$50 bilhões por ano resultante de fluxo ilícito de capital. É interessante notar, que enquanto se dá grande atenção ao combate à corrupção, a maior parte da perda de recursos para o continente se deve às más práticas corporativas, por empresas multinacionais que tiram vantagem da fraca regulação global, para eludir o pagamento de parcela justa de impostos. Estima-se que empresários e corporações ricas escondem US$21 trilhões de dólares em contas fora dos países, em paraísos fiscais, evadindo ou evitando o fisco.

NO CORAÇÃO DA JUSTIÇA FISCAL

Alvin Mosioma, diretor da Rede de Justiça Fiscal – África (TJN-A)

Fo to : C h ris tian A id /C h ar lo tte M ar sh al l

(15)

Embora a ligação não seja prontamente visível, a perda de receita fiscal dos países pobres representa dinheiro que poderia ser usado, por exemplo, para salvar as vidas de 150,000 crianças que morrem todos os anos no Quênia, por não conseguirem chegar a um hospital em tempo devido às más estradas, ou porque o hospital não tem a medicação adequada, ou porque não há médico disponível, ou, simplesmente, porque a criança não recebeu alimentação suficiente.

Aspiração, com pragmatismo

Embora não seja o único fator, fica óbvio que a capacidade do estado de prestação de serviços está diretamente ligada a sua capacidade de gerar recursos suficientes para atender a esses serviços. À medida que a agenda pós-2015 toma forma, devemos aprender com as ciladas dos ODMs e colocar em prática medidas que garantam que a nova estrutura seja não apenas uma aspiração, mas que seja pragmática.

A esse respeito, gostaria de propor as seguintes

recomendações, que acredito poderiam ajudar a fechar as comportas que permitem a fuga de recursos, além de alterar significativamente as fortunas dos países em desenvolvimento. Considerando-se que a evasão e fraude fiscais corporativas representam a maior origem de fluxos ilícitos, precisamos corrigir a governança global e assegurar que as empresas paguem a parcela justa de impostos. Isto deve incluir medidas que tornem mais difícil para as empresas esconder-se por trás de empresas de fachada, por meio de legislação que beneficie a propriedade. Devemos conhecer os verdadeiros proprietários, e onde se encontram. Além disso, é necessário um estímulo para a elaboração de uma estrutura acordada no âmbito internacional para a realização de relatórios e trocas corporativas sobre informações tributárias.

A transparência deve ser aplicada no âmbito global, bem como em nível nacional. Talvez esse não seja um território de ‘objetivo’ fácil, mas uma estrutura universal de desenvolvimento terá que lidar com questões complexas, se quiser ser levada a sério.

Em segundo lugar, vamos pensar em como as novas Metas de Desenvolvimento Sustentável (SDGs) podem promover sistemas tributários domésticos mais justos. Em muitos países, são os pobres que acabam pagando mais impostos, nos descontos proporcionais de sua renda, e isto não está certo. Quando os ricos conseguem evitar o pagamento de sua parte dos impostos, o governo precisa contar com os demais cidadãos para encher seus cofres. Na África, vemos uma mudança em direção à dependência do imposto sobre valor agregado, o que resulta em aumento de preços das necessidades básicas, como alimentos, saúde e educação, com que os pobres mal podem arcar. Uma meta ou objetivo relacionado à desigualdade de renda, ou um indicador que exija a publicação da relação de imposto direto e indireto, pode encorajar os governos na direção certa. É importante

notar, que enquanto a sonegação fiscal não for controlada, a implantação sistemas fiscais progressivos pelos governos será sempre obstruída. Portanto, sistemas tributários nacionais mais justos dependem da adoção de medidas globais

de transparência.

Em terceiro lugar, devemos reconhecer que quando aplicada de forma justa, a tributação também pode ser a ferramenta que mantém o governo responsável perante seus cidadãos. Um governo do povo, pelo povo, e para o povo só pode existir quando os recursos que financiam o desenvolvimento são gerados localmente e quando o desenvolvimento não depende de ajuda externa.

Em última análise, a conquista da justiça fiscal deve estar no coração da nova agenda pós-2015, o que significa a garantia de que uma parcela justa das receitas fiscais seja mantida nos países onde ocorrem as atividades econômicas significativas, permitindo, desta forma, que os estados possam financiar seu próprio desenvolvimento.

A TJN-A (Rede de Justiça Fiscal – África) é uma iniciativa pan-africana, membro da Aliança Global para Justiça Fiscal. Tem por objetivo a promoção de sistemas tributários progressivos, democráticos, e socialmente justos na África. A TJN-A defende os sistemas tributários que favorecem os pobres e financiam bens públicos. Ela desafia políticas e práticas fiscais prejudiciais que favorecem os ricos e que incentivam as desigualdades inaceitáveis.

taxjusticeafrica.net

‘A conquista da justiça fiscal deve estar

no coração da nova agenda pós-2015’.

Foto: Mina de Cobre de Mopani na Zâmbia, pertencente, em grande parte, a uma subsidiária da gigante Glencore FTSE100. A empresa multinacional foi acusada de sonegação fiscal na Zâmbia, embora negue a alegação. A mina causa grandes danos ambientais locais. Um parceiro da Christian Aid apoia a campanha de um grupo local que em defesa de melhorias no meio ambiente.

(16)

Em Angola, o desenvolvimento ainda enfrenta muitos desafios. Aqui, esboçamos algumas das questões que, em nossa opinião, devem ser incluídas na agenda pós-2015.

Em primeiro lugar, o fortalecimento econômico das mulheres é vital para a erradicação da pobreza e das desigualdades, para que se atinja pleno desenvolvimento da sociedade. Mulheres e meninas devem ter acesso a oportunidades de educação, para que possam desenvolver suas habilidades como empresárias por meio de estágios, bolsas de estudo e intercâmbios educacionais nos âmbitos nacional, regional e global. É essencial que se garanta o acesso das mulheres a oportunidades de trabalho, juntamente com a adoção de políticas que protejam as trabalhadoras domésticas da exploração. Políticas justas também devem ser postas em prática de modo a assegurar que as mulheres, jovens ou idosas, tenham direito à terra e à propriedade.

Barreiras sociais e culturais que impedem as mulheres da posse de propriedade e de terra devem ser desafiadas e eliminadas (por exemplo, quando o parceiro morre, a herança passa para o filho mais velho, ou em sua ausência, à família do marido). Entretanto, a Angola já ratificou um grande número de convenções e tratados internacionais; porém, o grande

desafio é sua implantação. Um exemplo disso é a Lei Contra a Violência Doméstica, aprovada pelo Parlamento Angolano, em 2011. É um passo muito importante para a proteção dos mais vulneráveis e punição dos autores de violência, mas ainda há muito a ser feito para que seja posta em prática.

Priorização da educação.

Os governos devem priorizar também a educação primária universal, como primeiro passo na construção de uma sociedade mais crítica, educada e forte. Em seu Sistema de Monitoramento dos ODMs, a ONU afirma que esta é uma meta que tem progredido mais na Angola. Ainda assim, em nossas comunidades o número de escolas privadas é maior do que as públicas. Além do mais, a pobreza impede que as crianças permaneçam na escola, pois suas famílias não podem arcar com as mensalidades. Acreditamos, ainda, que a educação deva ser garantida e adaptada à idade dos alunos.

Os jovens devem ter acesso garantido a serviços e informações sobre reprodução e saúde sexual, como parte das políticas de saúde do governo, que são quase inexistentes nessa área. Há ainda muitos obstáculos culturais,

O FORTALECIMENTO ECONÔMICO

DAS MULHERES É VITAL.

De Autoria de uma jovem da UCF (União Cristã Feminina)-Angola

Fo to : C h ris tia n A id /L ily P ee l

(17)

quando se trata de sexo, e não há métodos contraceptivos disponíveis para os jovens. De acordo com o Banco Mundial, em 2010, o índice de fertilidade dos adolescentes angolanos era a quarta mais alta do mundo, com 157 nascimentos a cada 1000 jovens entre 15 e 19 anos.

Nas áreas rurais, deve ser incentivada a criação e/ou manutenção de centros de recursos e bibliotecas, para que todos tenham acesso à informação. Esportes e atividades físicas devem ser promovidas, particularmente entre jovens mulheres, como parte do desenvolvimento integral físico, mental e intelectual.

Devem ser incentivadas as oportunidades de capacitação de liderança entre os jovens. A liderança promove virtudes como conhecimento, compromisso, responsabilidade e desenvolvimento da confiança, qualidades que geram uma sociedade mais ética e justa.

Líderes mulheres são modelos de inspiração para as jovens e podem promover mudanças positivas nas comunidades. Um exemplo que nos inspira é o da Ministra, a Reverenda Deolinda Teca, a primeira mulher a ocupar a posição de secretária-geral, na história do Conselho de Igrejas Cristãs em Angola. As meninas e as jovens que participam de nossos programas vêm promovendo mudanças em suas comunidades e famílias. Algumas já frequentam a universidade, outras têm empregos. Elas são as futuras líderes de Angola.

A educação produz impacto sobre a saúde da comunidade, enquanto melhora as condições de saúde das mulheres e reduz as taxas de mortalidade infantil. Os governos devem criar e implantar políticas de prevenção de doenças que afetam as crianças e garantir-lhes acesso aos tratamentos e medicamentos. Por exemplo, a malária é uma grande ameaça ao desenvolvimento da Angola; portanto, investimentos em educação e saneamento básico vão ajudar na redução dos altos índices de pessoas afetadas e mortas pela doença.

A maioria dos profissionais de saúde em Angola são mulheres que servem as comunidades pobres das áreas rurais e urbanas. No entanto, elas não têm recursos adequados para realizar o seu trabalho. O país precisa de mais profissionais da saúde, mais bem pagos. Além disso, mulheres portadoras de deficiência ou com problemas de saúde mental, especialmente as jovens e as crianças, são vítimas de discriminação e de abuso. Programas especiais sobre reprodução e saúde sexual deveriam ser disponibilizados para essas pessoas, de acordo com as suas necessidades e as circunstâncias.

Enfim, vale lembrar, que o HIV ainda é um desafio para muitos em Angola. Os pobres têm pouco acesso ao tratamento antirretroviral, e, com frequência, os centros de saúde não têm estoques dos reagentes necessários para a realização de testes de HIV. Por outro lado, a discriminação das pessoas que vivem com HIV está caindo, devido à divulgação de mais informações pelo rádio e pela televisão, por meio de campanhas do governo e de ativistas, nas igrejas e nas escolas.

Concluindo, acreditamos que em Angola há recursos suficientes para beneficiar os mais excluídos da sociedade, e esperamos que suas necessidades sejam priorizadas nos objetivos pós-ODMS.

A UCF-Angola (União Cristã Feminina) é parte de uma rede global, a Associação Cristã de Moças (YWCA). Desenvolve trabalho estratégico em educação, gênero e HIV, incentivando as mulheres angolanas a desenvolverem suas capacidades, apoiando suas intervenções nas questões públicas e na construção de uma sociedade com condições mais favoráveis para as mulheres. A UCF trabalha nos subúrbios pobres da capital Luanda, onde os índices de HIV, discriminação e violência contra a mulher são altos. Ela oferece oportunidades de trabalho e programas de capacitação profissional para jovens mulheres, cursos de alfabetização e campanhas de educação entre pares sobre saúde, questões sociais e cidadania. A UCF se compromete, também, com a expansão da conscientização sobre o HIV entre jovens mulheres. Em muitas ocasiões, a União vem influenciando as tradicionais estruturas masculinas de tomada de decisões, introduzindo em suas agendas questões que afetam as jovens mulheres angolanas.

worldywca.org

‘Os governos devem priorizar a educação primária

universal como primeiro passo para ajudar

a construção de uma sociedade mais crítica,

educada e forte.’

Foto do perfil: Escritores da UCF-Angola (da esquerda para a direita) - Tuiku Kiakayama Elisa, Apolonia Manuel Gabriel, Juliana Feliciano, Maria Mendes, Eloina Teresa dos Santos, Sofia Ambrosi

Foto principal: Jovens do projeto Meninas Construindo Pontes (Girls Building Bridges), em Angola, participam de uma brincadeira de aquecimento antes da aula, cantando e batendo palmas. O projeto Meninas Construindo Pontes é um programa de qualificação para a vida, desenvolvido pela UCF-Angola em um subúrbio pobre de Luanda, capital do país.

(18)

As mulheres têm o direito de decidir onde e quando ter filhos, independente de classe, raça, e status de HIV; mesmo assim, os direitos das mulheres que vivem com HIV (WLWH) ainda não são respeitados.

Ainda há muito a fazer para melhorar a saúde materna, combater pela raiz as causas de desigualdade de gênero, e garantir acesso universal à prevenção, tratamento, cuidado e apoio aos que vivem com o HIV. A INERELA+ tem um programa de Direitos à Saúde Reprodutiva e Sexual (SRHR) que busca promover o empoderamento de jovens mulheres, inclusive as WLWH, e é nosso desejo ver as necessidades delas atendidas, nos objetivos da pós-2015.

As políticas e serviços de Prevenção da Transmissão da Mãe à Criança (PMTCT) precisam de atenção especial. Embora estejam disponíveis em muitos países, o acesso é limitado. Os serviços ainda não estão integrados, pois são oferecidos em centros e níveis diferentes. A prática de coagir as WLHIV (Mulheres que Vivem com HIV) a assinar formulários de consentimento, que permitem aos profissionais de saúde realizar a esterilização delas, é um assunto que preocupa muito.

Em muitos casos, a assinatura desse consentimento ocorre quando a mulher está em trabalho de parto e as consequências do procedimento não lhes são explicados claramente. Isso mostra a considerável falta de conhecimento dos serviços de PMTCT e de outros métodos de prevenção da parte dos profissionais.

Este é um exemplo de uma área que tem profundo impacto nos direitos da mulher e de sua saúde materna. Ao considerarmos os objetivos da pós-2015, fica claro que há ainda muito a ser feito a respeito dos atuais ODMs. Em Moçambique, Zâmbia e África do Sul, abortos inseguros, malária e HIV respondem, direta ou indiretamente, por mortes maternas e outras complicações relacionadas ao parto. A malária continua a ser causa principal de morte materna. Agrava, indiretamente, os impactos fisiológicos da gravidez, juntamente com o HIV, que ataca os sistemas imunológicos da maioria das mulheres grávidas, da região da África subsaariana. Nesses países, a transformação das normas sócio-culturais para abordar questões como o casamento precoce, a infidelidade e as causas das dificuldades na evolução do trabalho de parto (distócias), continua sendo um grande obstáculo.

A SAÚDE MATERNA

NÃO PODE SER ESQUECIDA

Rev Phumzile Mabizela, diretora executiva, INERELA+

Fo to : C h ris tia n A id /R ac h el S te ve n s

(19)

Foto: Crianças cantam, dançam e brincam, em um clube infantil para famílias afetadas pelo HIV, na escola Eziama Uli, no sul da Nigéria. O clube semanal ensina as crianças sobre o HIV, sobre questões morais e de saúde, ajudando-as a lidar com sua condição.

Em Moçambique, o alto índice de gravidez na adolescência é um problema. A resposta ao HIV vem sendo enfrentada de diferentes formas, como através da promoção de mudanças de comportamento em relação ao uso de práticas mais seguras, inclusive de preservativo. Desta forma, nossa rede observou que seria decisivo nos voltarmos tanto para os líderes religiosos, como para seus congregados (principalmente jovens), treinando-os na prevenção do HIV com uma abordagem conhecida, em inglês, como SAVE (práticas mais seguras, acesso a tratamento, aconselhamento e testes voluntários, e fortalecimento).

A inclusão da educação sexual nos currículos escolares é outra questão importante, além da integração de todos os serviços de SRHR, para garantir que todos estejam sob o mesmo teto, e encorajar as mulheres a buscar e utilizar serviços que podem salvar suas vidas.

Áreas prioritárias

Todos nós precisamos aumentar nossos movimentos de incidências nessas áreas, especialmente sobre os direitos à saúde sexual e reprodutiva (DSSR), com o envolvimento maior dos atores religiosos nessas causas, o que seria particularmente positivo. Entre outras coisas, devem-se priorizar as seguintes áreas, tanto agora como na pós-2015:

• maior proteção socioeconômica das mulheres;

• mudanças de políticas e legislação, que ofereçam métodos modernos de contracepção, inclusive o envolvimento de mulheres nas estratégias de prevenção, que lhes permita um maior controle sobre sua saúde reprodutiva;

• redução da gravidez em jovens adolescentes;

• maior conscientização do público sobre as questões de DSSR;

• redução de mortes maternas;

• redução da transmissão da mãe para a criança;

• programação dos direitos humanos e da criança;

• promoção das estratégias em prol das SAVE em DSSR;

• mais trabalho com homens, incentivando-os a adotar comportamentos em busca de saúde;

• fortalecimento econômico das mulheres;

• erradicação da violência baseada em gênero, assegurando, especialmente, a proteção das minorias sexuais.

Somos uma comunidade de fé e temos a responsabilidade de aplaudir nossos governos pelos desenvolvimentos positivos, mas temos, também, de desafiá-los a promoverem programas que buscam cumprir os ODMs 3, 4 e 5. As mulheres africanas são a espinha dorsal das comunidades e da sociedade. Os governos têm de investir mais em programas que prolongam suas vidas.

INERELA+ é uma rede internacional de líderes religiosos, leigos e ordenados, mulheres e homens, que vivem com HIV, ou são afetados pessoalmente por ele. INERELA+ reconhece que os líderes religiosos têm uma autoridade singular, que desempenham um papel central na orientação moral e ética dentro de suas comunidades; na verdade, suas opiniões públicas podem influenciar nações inteiras. INERELA+ busca incentivar seus membros a usarem suas posições de respeito dentro das comunidades religiosas, de modo a romper o silêncio, desafiar o estigma e fornecer serviços de prevenção baseados em evidência, cuidado e tratamento. A INERELA+ tem sua sede em Johanesburgo, África do Sul, e inclui a rede africana ANERELA+.

inerela.org

‘Ainda há muito a fazer para melhorar a saúde

materna, combater pela raiz as causas

de desigualdade de gênero, e garantir que haja

acesso universal à prevenção, tratamento,

cuidado e apoio aos que vivem com o HIV.’

(20)

VOZES PARCEIRAS

ÁSIA E ORIENTE MÉDIO

WASSA (Associação de Serviço Social e Atividades Femininas), parceira da Christian Aid no Afeganistão, executa um projeto de processamento de tomates, capacitando mulheres de comunidades locais a desenvolver habilidades empresariais e ganhar a vida. Os tomates são cozidos, preparados e armazenados em frascos, para depois serem vendidos no mercado local.

C h ris tian A id /J o h an n a R o g er s

(21)

O Observatório da Cidadania das Filipinas (Social Watch Philippines) vem liderando o processo de consulta sobre a agenda pós-2015, em meu país. Ao mesmo tempo em que continuamos a defesa dos ODMs, enfrentamos a triste realidade de que, nas Filipinas, não seremos capazes de cumprir, até 2015, as metas de redução da pobreza, de acesso universal à educação, de redução dos índices de mortalidade materna e da disseminação do HIV.

É verdade que temos tentado. De fato, do nosso ponto de vista, os ODMs representam apenas um mínimo de desenvolvimento, as pessoas deveriam esperar mais. Temos pressionado os legisladores no Congresso e, ultimamente, até o próprio governo, para a realização dos objetivos, e tivemos algumas vitórias.

Entre elas, conseguimos maiores orçamentos para a educação de pessoas fora da escola, para a agricultura orgânica;

treinamento de agricultores sobre mudanças climáticas, e verba para a esterilização adequada do equipamento médico nos hospitais públicos. Entretanto, durante o governo de Gloria Macapagal Arroyo, essas foram, na maioria das vezes, vitórias só ‘no papel’. As verbas maiores prometidas estavam lá, preto no branco, como parte da Lei Geral de Apropriações, mas a presidente nunca as liberou.

Após 2010, o novo governo de Aquino foi mais receptivo às nossas demandas. Tivemos vitórias legislativas, com a assinatura da lei do Fundo de Sobrevivência do Povo e da Lei de Atendimento Universal à Saúde. A primeira é uma emenda à Lei de Mudança Climática, que irá disponibilizar e liberar mais recursos para a adaptação às alterações climáticas; a última é uma emenda ao programa de seguro nacional de saúde PhilHealth, que despolitiza o acesso a cartões de saúde que antes eram distribuídos pelos políticos. É claro que a aprovação do projeto de lei sobre Saúde Reprodutiva e sua transformação em lei é uma medida muito aguardada.

As pessoas antes dos lucros

Estamos trabalhando também no âmbito de governos locais, com o objetivo de tornar os orçamentos governamentais locais mais favoráveis às pessoas, e sensíveis aos ODMs. Nosso alvo são os agricultores, pescadores, povos indígenas, feirantes, grupos jovens, de mulheres, de idosos e de motoristas de triciclo. Nós os educamos a respeito do processo decisório do governo sobre gastos locais e os ensinamos a ler e analisar orçamentos e relatórios de auditoria.

Para nossa surpresa, descobrimos que as pessoas não só se interessaram em como seus impostos são gastos, como ainda perceberam como alguns dos serviços sociais básicos são mal financiados, e estavam dispostos a ajudar a aumentar as receitas locais. Por exemplo, eles incentivaram parentes

da capital, Manila, e de outras cidades, a pagar os impostos da comunidade em suas cidades natais, em vez de em áreas urbanas, sabendo que essas áreas urbanas têm, para início de conversa, grandes receitas.

Isso produziu alguns resultados. Por exemplo, na pequena cidade de Visayas, uma nova sala de aula foi construída com os impostos extras que as pessoas ajudaram o governo local coletar. Esse tipo de sensibilização, envolvimento público e disponibilidade de informação são essenciais para que os governos cumpram os objetivos da pós-2015, que esperamos sejam ainda mais ambiciosos do que os ODMs.

Ainda assim, precisamos de mais do que apenas dinheiro e informação. Precisamos de uma reavaliação essencial de nosso paradigma econômico. Sim, há crescimento econômico nas Filipinas, mas acompanhado de mais desigualdade, desemprego, subemprego e degradação ambiental. Portanto, nossa mensagem principal é: a pós-2015 não deve ficar só nos negócios, como de costume. As pessoas precisam ser colocadas antes dos lucros, a responsabilidade social corporativa não deve ser uma reflexão tardia, e as parcerias globais são o caminho a seguir. Precisamos de regras comerciais mais justas, de auxílio, de investimentos reais em vez de fluxos de capitais de curto prazo; de financiamento climático em vez de pagamento da dívida.

Esses princípios já deveriam estar no centro dos próprios ODMs. Agora, ao planejarmos para 2015 e depois, finalmente teremos a chance de torná-los realidade.

A Observatório da Cidadania das Filipinas (Social Watch) é uma aliança de mais de 100 redes e CSOs (Organizações da Sociedade Civil). Ela faz parte da rede global Observatório da Cidadania (Social Watch) que reúne coalizões de CSOs que lutam pela erradicação da pobreza e das causas da pobreza, para acabar com todas as formas de discriminação e racismo, pela garantia de distribuição equitativa da riqueza,

e concretização dos direitos humanos. Temos um compromisso com a paz e a justiça social, econômica, ambiental e de gênero. A Observatório da Cidadania (Social Watch) responsabiliza os governos, o sistema da ONU e as organizações

internacionais pelo cumprimento dos compromissos nacionais, regionais e internacionais de erradicação da pobreza.

socialwatchphilippines.org

A IGUALDADE É FUNDAMENTAL

PARA O DESENVOLVIMENTO.

(22)

A agenda pós-2015 deve equilibrar redução da pobreza e sustentabilidade. Até agora, os debates reconhecem a necessidade de se promover a inclusão social por meio de mudanças estruturais18. Entretanto, a falta de foco em direitos

humanos, inclusive no direito de acesso à terra e aos recursos naturais, decepciona. Isto talvez reflita a natureza da definição global de cima para baixo dos objetivos, com seu viés nos interesses e pontos de vistas dos especialistas, que, em geral, fazem vista grossa para os interesses dos mais marginalizados. A situação dos grupos mais vulneráveis do Sul da Ásia, inclusive os dalits (antes conhecidos como os ‘intocáveis’) e os adivasi (povo indígena), permanece deplorável e é sustentada pela DWD (discriminação com base no emprego e profissão, e na origem social) 19, questão que afeta um número estimado

de 260 milhões de pessoas em todo o mundo.

Os atingidos pela DWD sofrem com a falta de reconhecimento de seus direitos, e o acesso restrito e limitado aos recursos naturais, de que dependem para seu sustento, e que originalmente lhes pertenciam20. Um exemplo disso é a

barragem de Almatti, no distrito de Bijapur de Karnataka, em que a submersão de grandes áreas de terras férteis resultou no maior processo de reabilitação e reassentamento do mundo.

Em muitos locais, em todo o sul da Ásia, o esgotamento dos lençóis freáticos e o uso inadequado de produtos químicos na agricultura para o cultivo comercial estão causando danos ecológicos e aumentando os custos de produção, prejudicando duramente os dalits e adivasis que dependem da aquicultura e da agricultura21. Alguns sofrem os impactos da destruição dos

ecossistemas com mais severidade do que outros, e poucos reconhecem o ônus disso para os grupos mais vulneráveis e excluídos.

As noções de ‘propriedade’ dos recursos naturais e ambientais impõem problemas particulares para esses grupos.

Tradicionalmente e institucionalmente, os dalits sempre foram impedidos da posse de recursos naturais, apesar de dependerem pesadamente desses recursos para seu sustento. Por outro lado, as comunidades adivasi, em geral, não reconhecem a propriedade individual da terra e de seus recursos, que manejam tradicionalmente de forma comunitária. As implicações legais e econômicas dos modelos de conservação da biodiversidade, que atribuem um valor econômico à conservação de recursos naturais, afetam esses grupos de forma muito particular.

NÃO HÁ DESENVOLVIMENTO SEM

ELIMINAÇÃO DA DISCRIMINAÇÃO

BASEADA EM CASTAS.

N Paul Divakar, secretário geral e fundador da Campanha

Nacional de Direitos Humanos de Dalit (à esquerda),

e Lee Macqueen Paul, Pesquisa e Incidência da National Dalit

Watch Índia.

Fo to : C h ris tia n A id /S ar ah F ilb ey

Referências

Documentos relacionados

b) Execução dos serviços em período a ser combinado com equipe técnica. c) Orientação para alocação do equipamento no local de instalação. d) Serviço de ligação das

Antraquinonas Reação de Borntraeger O-heterosídeos - - Saponinas Espuma persistente Índice de espuma +++ 1cm/6 mL Flavonóides* Tricloreto de Alumínio Reação de Shinoda

13) Para tal fim cada Parte deverá comunicar a outra por escrito da existência e o objeto da controvérsia, para a resolução da mesma. 14) Caso isto não aconteça em até 60

7,18 Atualmente, o MS reco- menda a terapia preventiva para as crianças menores de 15 anos, contato de tuberculosos bacilíferos, sem sinais de TB ativa, não vacinadas com BCG,

Nesse contexto, nossos resultados demonstram que as combinações dos testes aplicados são válidos, e que os resultados encontrados com distâncias menores apresentaram

Para o entendimento do processo de constru çã o do samba enquanto um dos elementos da.. identidade nacional, ao longo da d é cada de 1930, torna-se necess á rio analisarmos as

Még épp annyi idejük volt, hogy gyorsan a fejük búbjáig húzták a paplant, és Mary Poppins már nyitotta is az ajtót, és lábujjhegyen átosont a

Avaliou-se o comportamento do trigo em sistema de plantio direto em sucessão com soja ou milho e trigo, sobre a eficiência de aproveitamento de quatro fontes