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A sala de aula como espaço para debate e reflexão

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Academic year: 2021

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A sala de aula como espaço para debate e reflexão

Fabiana Fontoura Candido Gabriela Klaus

Introdução

Neste artigo propomos relatar o desenvolvimento do projeto “Repensando preconceitos e desigualdades sociais”, realizado no segundo semestre de 2014 por bolsistas do Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência (PIBID/UFRGS Língua Portuguesa) no Colégio Estadual Protásio Alves, localizado em Porto Alegre. O projeto foi realizado em uma turma de segundo ano do ensino médio com cerca de trinta alunos, no período da tarde.

Para tanto, serão abordados quatro aspectos relativos ao projeto e ao seu desenvolvimento. O primeiro diz respeito ao planejamento, que teve como ponto de partida o aluno e então a sala de aula, e trata também do contato inicial dos alunos com a temática do projeto; o segundo aborda o trabalho com direitos humanos na sala de aula; a terceira seção explora como se deu o processo de reescrita dos alunos; o quarto aspecto trata do trabalho com propagandas e da reflexão sobre como a mulher é representada nelas; as considerações finais, por sua vez, versam sobre como essa prática docente afetou a nossa formação e a formação dos alunos enquanto cidadãos.

Será que é assim mesmo? Como eu (aluno, sujeito) percebo esse tema?

Reavaliar-se e avaliar a realidade que nos cerca envolve analisar os discursos que nela são encontrados. Apenas após essa avaliação cuidadosa é possível formar uma opinião crítica e esclarecida sobre um tema. Assim, partirmos da realidade do aluno, da sua leitura de mundo – como enfatiza Paulo Freire (1989) – e chegamos à leitura da palavra, no sentido de que o trabalho com a Língua Portuguesa permita que o aluno seja capaz de ler e resolver problemas através dos textos, por meio de aulas

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que tenham significação real e prática na vida dos alunos, conforme os Referenciais Curriculares do Rio Grande do Sul (2009).

Como professoras de Língua Portuguesa e Literatura em formação, acreditamos que o espaço escolar da sala de aula pode e deve ser usado para promover a reflexão e estimular o pensamento crítico dos alunos através de leituras e discussões. Dessa forma, o principal objetivo do projeto era refletir sobre preconceitos e desigualdades existentes na sociedade brasileira e no mundo.

Para isso, era preciso assegurar que a sala de aula, durante os períodos de Língua Portuguesa, fosse um lugar seguro para que os alunos pudessem falar de suas impressões e experiências no mundo, de forma a construir sentido(s) para elas à luz das noções fundamentais de respeito à dignidade da pessoa humana. Esse trabalho demanda reflexão linguística e crítica, pois ambas são indissociáveis nesse processo, constituindo-se como o segundo objetivo do projeto.

Na primeira aula, os alunos reuniram-se em grupos e receberam tirinhas que tratavam dos seguintes temas:

A reflexão sobre os textos envolveu discussões sobre por que a redução da maioridade penal está em evidência, quais seriam as consequências caso ela fosse aprovada e se isso se relaciona de alguma forma com preconceito e discriminação social. Todos os temas possuíam ligação entre si, principalmente a violência contra a mulher, a sua representação na mídia e a dignidade humana. Os alunos discutiram sobre as seguintes perguntas, com o objetivo de fomentar o pensamento crítico e a

Redução da maioridade penal; Violência contra a mulher;

Preconceito e discriminação social;

Dignidade humana e respeito ao ser humano; Imagem da mulher na mídia.

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Quadro 2 – Questionamentos direcionados aos alunos

Posteriormente, cada grupo foi convidado a ler o seu texto para a turma e expor as suas reflexões sobre ele. Também nesta aula, os alunos foram questionados sobre temas pelos quais se interessariam em trabalhar e alguns falaram do ENEM (Exame Nacional do Ensino Médio), pois gostariam de saber como a redação é avaliada. A partir disso, conciliamos essa demanda com o tema do nosso projeto e pesquisamos sobre propostas de redações anteriores que se encaixassem na temática.

O que são direitos humanos? Quem tem direito a eles?

A segunda aula do projeto teve como base a Declaração Universal dos Direitos Humanos[1], de 1948. A preparação para a leitura foi uma conversa inicial sobre o que os alunos entendem por direitos humanos, por que é necessário que exista um documento que os assegure, por que são importantes e o contexto de elaboração desse texto (pós-Segunda Guerra Mundial).

Também foram trazidos à discussão outros documentos importantes para os Direitos Humanos no mundo, como a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão[2], de 1789, e a Declaração de Independência dos Estados Unidos da América[3], de 1776.

a) No seu entendimento, do que trata a tirinha? b) O que você pensa a respeito?

c) Você acha importante debater sobre os temas que elas propõem? Por quê?

d) Você já foi vítima de violência e/ou discriminação? Conhece algum caso?

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Escolhemos onze artigos do documento da Declaração Universal dos Direitos Humanos e cada grupo recebeu dois para ler e analisar. Por estar estruturado em artigos, o texto demandou maior esforço dos alunos para entendê-lo, com a nossa mediação de leitura. As seguintes perguntas foram feitas aos alunos, de modo a instigá-los à reflexão:

Quadro 3 – Questionamentos sobre Direitos Humanos direcionados aos alunos

Os artigos sobre a liberdade assegurada ao homem de escolher o seu trabalho e não mais ser forçado a ele foram destacados pelos alunos. Decorrente dessa discussão, a relação entre a dignidade humana e a atividade exercida no trabalho foi o tema estruturante da aula seguinte.

Assim, o conto Pai contra mãe, de Machado de Assis – que já havia sido trabalhado pela professora da turma - foi retomado pelas professoras bolsistas. Em seguida, um trecho do filme Quanto vale ou é por quilo?, de Sérgio Bianchi, foi exibido, de forma a apresentar uma releitura contemporânea do texto machadiano aos alunos. Desse modo, pudemos estabelecer conexão com as propostas de redação do ENEM dos anos 2000 e 2010, as quais serviram de mote para a próxima produção textual: a primeira tem como tema Direitos da criança e do adolescente: como enfrentar esse desafio nacional?, e a segunda O trabalho na construção da dignidade humana. Os alunos escolheram uma proposta e a desenvolveram, com base nas reflexões ao longo do projeto.

a) No seu entendimento, o que o texto do artigo significa? b) Você acha que esses direitos são respeitados?

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Reescrita: momento de reavaliação

A continuidade do projeto foi dedicada à devolução dos textos lidos e comentados aos alunos, à conversa individual sobre as sugestões de mudança e à orientação para a reescrita. Para ajudá-los nesse processo, foram introduzidos os conceitos de concretude e unidade temática (GUEDES, 2002).

Com exemplos dos próprios textos, construímos os referidos conceitos através da noção de que, para ser inteligível, um texto deve tratar de um assunto e abordá-lo da forma mais completa possível, isto é, fornecer ao leitor todos os dados possíveis para que ele possa avaliar, por meio do próprio texto, o que está lendo.

Dessa forma, pressupõe-se a escolha de um único tema e o uso de argumentos e exemplos para tornar o texto adequado ao seu contexto de produção e circulação, nesse caso a sala de aula e a leitura para colegas e professores.

Estudo da representação da mulher em propagandas

A parte final do projeto foi dedicada à análise de propagandas, com o objetivo de investigar como a mulher é representada nelas. Cada grupo recebeu diferentes imagens impressas em uma folha e foi convidado a discutir sobre elas. Periodicamente as imagens eram trocadas, para que a discussão pudesse ser ampliada. Alguns exemplos dos questionamentos feitos pelas professoras ao grande grupo são observados no Quadro 4:

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Após a análise das imagens e debate com a turma, os alunos concluíram que a figura da mulher era representada de duas formas nas propagandas: ou como uma potencial compradora de utensílios domésticos ou como uma espécie de “atrativo”, pois não havia ligação entre a presença dela e a finalidade do produto. A conclusão, então, foi de que a mulher é representada de forma estereotipada nessas propagandas, como um atrativo para o consumo do produto, pois a sua imagem incorporada a ele chamaria a atenção de consumidores masculinos, público a que as propagandas são direcionadas. Os alunos ainda identificaram que em algumas propagandas também havia preconceito racial e discriminação social.

Considerações finais

Todo o planejamento foi feito em acordo com um dos principais objetivos do PIBID, que é auxiliar na formação dos acadêmicos na futura profissão que exercerão, ou seja, a docência. Assim, o desenvolvimento deste projeto reforçou a importância de trabalhar em sala de aula temas que efetivamente tenham espaço na vida dos alunos fora da escola, de forma que eles possam trazer suas experiências e refletir sobre elas, tornando-se sujeitos do seu aprendizado. Percebemos, também, que a escolha dos textos e a mediação de leitura foram fundamentais para que o conhecimento

a) Do que a propaganda trata? b) A que público se destina?

c) Você percebe algum “problema” nesse discurso? Por quê? d) Você concorda com a imagem e o texto? Por quê?

e) Como você reformularia essa propaganda?

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Tivemos por prioridade fazer da sala de aula um espaço integrador e plural, um meio de educação para a sensibilidade, que aceitasse o debate e a troca de ideias de forma ordenada e, principalmente, que despertasse nos alunos o entendimento (ou pelo menos a suspeita) de que as condições de dignidade e dos direitos humanos estão representados em qualquer lugar e meio, o tempo inteiro, sendo respeitados ou não. Por isso a escolha do uso das tirinhas, da Declaração Universal dos Direitos Humanos e das propagandas: embora muito diferentes em conteúdo, gênero e forma, ambas estavam permeadas pela(s) realidade(s) humana(s) e, como tal, eram retratos dela(s) em diferentes contextos.

O trabalho em grupo, que foi a dinâmica mais utilizada em sala de aula, não seria possível sem a total participação dos alunos. Era preciso que eles se envolvessem na discussão, que se interessassem pelo tema e vissem nele uma oportunidade de agir no mundo, através da palavra escrita e falada. A integração deles como turma, como sujeitos que sabiam que precisavam respeitar o momento de fala do outro porque também gostariam de ser ouvidos no seu momento de fala, foi fundamental e impressionante: um grupo interagia com o outro, somando diferentes pontos de vista e trazendo o debate para o grande grupo. Nem um aluno ou aluna ficou calado durante as aulas: as suas reflexões, as suas vozes e suas palavras foram ouvidas e lidas por nós, professoras, e pelos seus colegas. E isso, com certeza, fez e fará diferença na sua formação como aluno, sujeito e cidadão.

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Referências bibliográficas

ASSIS, Machado de. Pai contra mãe. Conto. Disponível em

<http://www.dominiopublico.gov.br/pesquisa/DetalheObraForm.do?select_action&co _obra=1951> Acesso em: 18 de abr. de 2014.

FREIRE, Paulo. A importância do ato de ler: em três artigos que se completam. 23 ed. São Paulo: Cortez, 1989.

GUEDES, Paulo Coimbra. Da redação escolar ao texto – um manual de redação. Porto Alegre: Ed. UFRGS, 2002.

SECRETARIA DE EDUCAÇÃO DO RIO GRANDE DO SUL. Referencial Curricular: lições do Rio Grande. Volume I. Porto Alegre, 2009. Disponível em <http://www.educacao.rs.gov.br/dados/refer_curric_vol1.pdf> Acesso em: 18 de jun. de 2014.

Filme:

BIANCHI, S.; LEBLANC, P.; PEREIRA, M. A. Quanto vale ou é por quilo? Produção de Patrick Leblanc e Mário Alberto Pereira. Direção de Sérgio Bianchi. Brasil, Agravo Produções Cinematográficas S/C Ltda, Riofilme, 2005. DVD. 104 min. color. son.

[1] Disponível em <http://www.dhnet.org.br/direitos/deconu/textos/integra.htm> Acesso em: 03 de ago. 2015.

[2] Disponível em <http://www.fd.unl.pt/docentes_docs/ma/mla_MA_19926.pdf> Acesso em: 03 de ago. 2015.

[3] Disponível em

<http://www.uel.br/pessoal/jneto/gradua/historia/recdida/declaraindepeEUAHISJNet o.pdf> Acesso em: 03 de ago. 2015.

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Fabiana Fontoura Candido

Estudante de Letras com ênfase em Língua Portuguesa e Língua Inglesa e suas respectivas Literaturas na UFRGS. Atua no Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência (PIBID UFRGS/Língua Portuguesa) desde março de 2014.

Gabriela Klaus

Estudante de Letras com ênfase em Língua Portuguesa e Língua Inglesa e suas respectivas Literaturas na UFRGS. Atua no Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência (PIBID UFRGS/Língua Portuguesa) desde março de 2014.

Referências

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