• Nenhum resultado encontrado

Uni FMU CENTRO UNIVERSITÁRIO CENTRO DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "Uni FMU CENTRO UNIVERSITÁRIO CENTRO DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA"

Copied!
84
0
0

Texto

(1)

CORPO: INSTRUMENTO PARA DESENVOLVER NOSSO POTENCIAL DE EVOLUÇÃO PESSOAL

A visão do hatha-yoga, da bioenergética, da psicologia formativa e do rolfing

VANESSA G. MALAGÓ

SÃO PAULO 2006

(2)

VANESSA G. MALAGÓ

CORPO: INSTRUMENTO PARA DESENVOLVER NOSSO POTENCIAL DE EVOLUÇÃO PESSOAL

A visão do hatha-yoga, da bioenergética, da psicologia formativa e do rolfing

Monografia apresentada ao Centro de Pós-Graduação e Pesquisa da Uni FMU – Centro Universitário, como requisito parcial para obtenção do Título Especialista em Yoga

(3)

Ao Ivan,

(4)

Agradecimentos

À querida amiga Ana Nava, pelas longas conversas e pelas experiências e descobertas compartilhadas antes e ao longo desse trabalho.

À Ana Cristina, Ana Paula e Roberto, meus primeiros professores e mentores nesse caminho do yoga.

Aos meus alunos, que me trazem a satisfação de poder ensinar e a possibilidade de aprender continuamente.

(5)

Precisamos aprender a repensar a anatomia como mais do que um simples materialismo estático, ilustrações de mortos, abstrações sob a forma de fórmulas fisiológicas, idéias a respeito da natureza, em vez da natureza em si mesma. A anatomia, na verdade, diz respeito a um processo vivo, dinâmico, um mistério, uma iniciação, a forma da experiência que dá origem ao sentimento, ao pensamento e à ação. Refere-se a nós como formas de Refere-sentir. [...] Conhecer a anatomia emocional é experimentar as dores do desejo e da decepção, os conflitos do contato e a luta pela satisfação, o sabor da intimidade e da individualidade, o conhecimento do amor condicional e incondicional.

(6)

RESUMO

A visão de corpo e mente como algo integrado é compartilhada em diversas escolas, tanto do Ocidente como do Oriente. O Ocidente partiu de uma visão integrada para uma divisão entre corpo e mente, idéia preconizada no século XVII por Descartes, e que se difundiu no pensamento ocidental a partir daí. No final do século XIX e início do século XX esse conceito começa a ser revisto e a associação entre corpo e mente passa novamente a ser considerada no trabalho de alguns estudiosos.

Hoje essa idéia vem sendo retomada no Ocidente e é comum admitirmos que problemas como estresse ou depressão afetam diretamente o corpo e a saúde física. Mas, e o contrário? O corpo também não influencia a mente? Se o corpo expressa nossas emoções, não seria possível através do trabalho com o corpo, influenciar estados emocionais e mentais?

O Hatha-yoga é uma das escolas do Oriente que vê o corpo e mente de forma integradas. O corpo é o instrumento para a descoberta de si mesmo. No

caminho do autoconhecimento, o Hatha-yoga propõe que se parta daquilo que nos é mais concreto, nosso próprio corpo, para então atuar sobre aspectos mais sutis. A mesma visão do corpo como ferramenta para a autodescoberta é vista em escolas do Ocidente, como a análise bioenergética, a psicologia formativa e o rolfing. Nesse trabalho tratamos dessas diferentes abordagens, comparando-as, ressaltando pontos de ligação entre elas e comentando aspectos em que podem ser complementares.

(7)

PREFÁCIO

Durante minha adolescência, era comum meus pais me dizerem: “Arruma essa postura, menina!” No começo eu acho que não dava muita importância pra isso. Depois, fui me dando conta, mas como me manter ereta? Eu até que tentava, respirava fundo, jogava os ombros pra trás, alongava a coluna,

expandindo o peito. Mas quem disse que durava? Num esforço que me parecia sobre-humano, eu podia mantê-la, por vejamos, 5 minutos! E então eu já

estava novamente no meu antigo padrão, ombros voltados para dentro, a barriga apontada para frente e o peso do corpo pendendo sobre a parte de trás dos joelhos.

Sempre pratiquei esportes e o contato com o corpo me parecia algo familiar. Pratiquei natação, vôlei, basquete, capoeira e escalada, mas a postura, continuava a mesma. Foi com o yoga, num processo lento e gradual, que comecei a travar contato com novos padrões e referências em meu corpo. Como acionar a musculatura das costas, deixando os ombros relaxados? Como abrir o peito, sem erguer a cabeça e tensionar a nuca? Como distribuir o peso do meu corpo igualmente entre os pés? Como esticar as pernas sem hiperextender os joelhos? Como manter meu centro de equilíbrio numa postura invertida?

Meu objetivo inicial com o yoga era trabalhar o corpo. Naquela época, quando comecei a praticar, meu conhecimento sobre o yoga se restringia às posturas feitas em sala de aula e exercícios respiratórios. Procurando saber mais sobre o assunto, recorri aos livros. Em diversos textos sobre o yoga era comum ouvir sobre a união entre corpo e mente. Mas o que isso significava?

Admitimos com naturalidade que a mente afeta diretamente nossa saúde física. Quantas vezes não escutamos: “fulano passou tanto stress que teve uma úlcera”. Aí parecia estar a relação entre corpo e mente. Mas não era só isso.... Há vários anos atrás, ainda na minha adolescência, li o livro “O corpo fala” (de

(8)

Pierre Weil e Roland Tompakow, Ed. Vozes). A idéia de que o nosso corpo espelha nossas emoções e sentimentos me despertou bastante interesse. Segundo o livro, através do corpo, dizemos muito sobre nós mesmos. Numa conversa, não apenas as palavras nos trazem informações sobre nosso

interlocutor, mas a maneira com que ele se expressa com o corpo pode nos dar informações valiosas. A linguagem do cotidiano traduz continuamente como o corpo expressa emoções e sentimentos. “Fulano é um sujeito casca-grossa”.... “Ela tem os pés no chão”. Usamos expressões como essas no nosso dia-a-dia, e muitas vezes, nem nos damos conta dessa relação.

Essa idéia do corpo como reflexo de nossas emoções veio novamente à tona, muitos anos depois, a partir do meu contato com o yoga. Não poderíamos também interferir na mente pelo corpo? Não seria essa a proposta dos asanas e pranayamas?

Na experiência de expandir e contrair, tensionar e relaxar, construir e

desconstruir uma postura fui aprendendo a identificar melhor meu próprio corpo e a dar novas formas a ele. Ainda que ocorra de modo lento e progressivo, assimilar uma nova forma envolve uma experiência de certa forma dolorosa. À medida que se vai incorporando um novo padrão postural, a antiga referência começa aos poucos a parecer inadequada e pouco funcional. Como me portar? Abro ou fecho o peito? Expando-me ou me contraio? A sensação inicial é a de não encontrar uma forma adequada, como se a nova forma ainda me fosse um pouco estranha e a antiga, então já não me servisse. Aos poucos vou

assumindo um novo corpo, mas percebo que não é só isso. Eu por inteira, já não sou mais a mesma.

A conexão mente e corpo começou a parecer mais clara. Como experenciar as coisas da vida, senão em meu próprio corpo? Como praticar o amor, se não me entrego, se meu coração se mantém intocável e escondido na armadura das costas e na curvatura dos ombros? Como praticar o contentamento, se a respiração antecipa os instantes e não se dá tempo para que possam ser desfrutados? Como ter determinação e perseverança se as pernas não se sustentam?

(9)

Dessa experiência nasceu a motivação para investigar como o yoga e outras escolas do Ocidente enxergam essa relação corpo-mente.Como ver como uma unidade, aquilo que tendemos a separar? Mais do que isso, como vivenciar corpo e mente de forma integradas?

Nesse caminho, descobri o corpo como ferramenta para o autoconhecimento e evolução pessoal. À medida que aprendemos a assumir novas formas, mudamos não apenas essa camada visível e concreta de nós mesmos (o corpo), mas a maneira como vemos e interagirmos com o mundo. Nos abrimos para novas escolhas e novas formas de experienciar o mundo a nossa volta.

(10)

SUMÁRIO INTRODUÇÃO ... 1 A conexão mente-corpo... 1 O objetivo do trabalho... 2 AS BASES DO YOGA... 3 História... 3 O que é o yoga? ... 8

O Yoga Sutras de Patanjali... 8

Hatha-yoga ... 20

PSICOTERAPIA CORPORAL E OUTRAS ESCOLAS DO OCIDENTE... 23

A ANÁLISE BIOENERGÉTICA ... 24

A PSICOLOGIA FORMATIVA ... 29

O ROLFING... 38

O CORPO E AS EMOÇÕES ... 43

A “dor agradável” ... 48

FUNDAMENTAÇÃO E ESTABILIDADE EMOCIONAL ... 51

RESPIRAÇÃO E EMOÇÃO... 58

POSTURA ERETA E PADRÕES POSTURAIS... 61

CONCLUSÃO... 67

(11)

INTRODUÇÃO

A conexão mente-corpo

Há aproximadamente 400 a.C, Hipócrates, pai da medicina ocidental, já se referia à influência da mente sobre o corpo. Na cultura oriental, bem antes disso, há cerca de 5000 anos atrás, os primeiros textos de medicina ayurvédica já tratavam o corpo e mente de forma integrada. Da mesma forma, a medicina chinesa também relacionava corpo e mente.

No Ocidente, a divisão entre corpo e mente, preconizada por Descartes no século XVII, levou a medicina a concentrar-se no corpo, deixando de lado aspectos psicológicos. Essa concepção dualista dominante na cultura

ocidental, é que tornou possível o surgimento da Psicologia como temos hoje, como ramo terapêutico separado da Medicina. Enquanto a Medicina estuda os fenômenos orgânicos, a Psicologia, estuda os fenômenos psíquicos. A relação entre corpo e mente foi negligenciada pela psicologia durante anos. No século XIX esse conceito começou a ser revisto através dos estudos do médico

austríaco Wilhelm Reich. O trabalho de Reich levou ao aparecimento de outras escolas, como a escola de Análise Bioenergética, baseada nos estudos do médico americano Alexander Lowen.

Atuando num campo distinto da psicologia e a partir de estudos realizados sobre o colágeno, a bioquímica americana Ida P. Rolf desenvolveu na década de 40 um processo de educação corporal denominado Rolfing. Segundo Ida Rolf, o comportamento e as emoções estão diretamente ligados à estrutura. Ao realizar um trabalho que buscava promover uma postura mais equilibrada e a integração estrutural, ela acreditava que promoveria não apenas o bem-estar físico, mas também o mental e espiritual.

Assim, pouco a pouco vamos notando no Ocidente uma retomada da idéia que associa o corpo à mente. Hoje nos parece natural o fato de que estados

(12)

aparecimento de doenças, mas ainda não parece claro que nessa relação mente e corpo, não apenas o mental afeta o físico, mas o contrário também é verdadeiro. Se nosso corpo expressa nossas emoções, será que mudando certos aspectos corporais podemos influenciar o mental e o emocional?

O objetivo do trabalho

O objetivo desse trabalho é investigar como algumas escolas do oriente e do ocidente enxergam a relação corpo-mente e em especial, o papel que o corpo assume como instrumento para se desenvolver o potencial de evolução

pessoal que reside dentro de nós mesmos .

Do oriente, analisaremos a visão do Hatha-yoga e, das escolas ocidentais, os trabalhos realizados por Alexander Lowen, Stanley Keleman e Ida Rolf. Nossa proposta é a de apresentar relações entre o Hatha-yoga e os trabalhos

desenvolvidos no ocidente por esses estudiosos.

No Hatha-yoga, corpo e mente são uma estrutura única e inseparável. Da mesma forma, as demais escolas abordadas nesse trabalho se dedicam a estudar as manifestações comportamentais e energéticas da mente sobre o corpo, e do corpo sobre a mente, tratando-os em seu conjunto e não como elementos dissociados. O ponto-chave de aproximação entre esses sistemas de conhecimento é a visão integrada entre corpo e mente e o objetivo do encontro de si mesmo. Ainda que tragam técnicas distintas e sejam completos em si mesmos, podem ser complementares e é o que pretendemos investigar aqui. Antes de avançar nessa investigação, vamos apresentar o ponto de partida das bases conceituais que os formam.

(13)

AS BASES DO YOGA

História

Acredita-se que o yoga tenha surgido com os drávidas, povo que habitava a região do Vale do Indo, que hoje corresponde ao norte da Índia e parte do Paquistão. Estima-se que a civilização do Vale do Indo, representada por duas grandes cidades, Mohenjodaro e Harappa, tenha existido entre 3000 a.C e 1500 a.C. Apenas no começo do século XX é que essas cidades foram

redescobertas e até hoje os estudos arqueológicos continuam na região, onde foram encontrados diversos objetos, cerâmicas, utensílios e brasões, que nos contam um pouco sobre a cultura e os costumes dessa civilização. Entre esses objetos, uma espécie de selo, retratando uma figura em postura de lótus é a primeira indicação da prática do yoga. A civilização do Vale do Indo possuía uma escrita própria, que, infelizmente não foi desvendada até hoje. Não há, portanto, como saber, se já naquele período, existia algum tipo de registro escrito sobre o yoga. Tampouco se sabe como se deu o desaparecimento dessa civilização . Essa é uma questão que divide os historiadores, mas boa parte deles, acredita que o que tenha colaborado para o desaparecimento dos drávidas foi a invasão da região por um povo indo-europeu, conhecido como ária. Os árias subjugaram a população local, impondo sua própria tradição. É dentro da tradição ariana que surgem os primeiros textos indianos, os Veda, textos que eram em sua maioria de cunho ritualístico. Na tradição ariana havia uma rígida divisão social e dentro dessa divisão social, os brâmanes, que representavam a classe religiosa, eram os detentores dos conhecimentos presentes nos Veda.

O termo yoga com a conotação que conhecemos hoje aparece por volta de 800 a.C, nos textos finais dos Veda, as Upanishads. Ao contrário dos hinos e rituais expostos nos Veda, as Upanishads relatam diálogos entre um mestre e seus discípulos, que vivem isolados na floresta, levando uma vida ascética. Indícios da prática de yoga já aparecem em textos anteriores a esse, como o

(14)

Atharva-Veda, texto mais ou menos contemporâneo das primeiras Upanishads, que

menciona a existência desses grupos ascéticos e os descreve como praticantes de misteriosas disciplinas respiratórias.

As Upanishads descrevem uma nova forma de acesso ao sagrado. Os critérios para aquisição do conhecimento transmitido por elas não estavam relacionados à classe social como ocorria com os Veda, mas sim às qualificações psicológicas por parte de quem buscava esse saber. As Upanishads apresentam uma profunda mudança de valores, voltando a atenção do mundo exterior para o mundo interior. O ascetismo representa a renúncia ao mundo exterior, de onde a felicidade não pode ser alcançada. A dor e sofrimento humanos são causados pela ignorância, pelo desconhecimento do homem de que sua essência é a mesma essência do universo, brahman. Para alcançar a felicidade é preciso experienciar essa identidade com brahman através do

yoga.

Durante esse período, vários textos mencionam a importância do yoga, mas sem explicações minuciosas sobre o método. A mais antiga exposição sistemática do yoga que chegou até nós é o Yoga Sutras, compilado por Patanjali entre os séculos II a.C e IV d.C. Patanjali não inventou o yoga e as práticas descritas no Yoga Sutras, apenas registrou o conhecimento existente no seu tempo e que foi preservado ao longo dos séculos através da transmissão oral de mestre para discípulo. O Yoga Sutras é escrito dentro desse mesmo contexto das Upanishads, que envolve a idéia da renúncia e asceticismo. O Yoga Sutras de Patanjali, também conhecido como Raja Yoga, dá ênfase a aspectos meditativos da prática .

O Bhagavad-Gita, escrito entre os séculos IV a.C e IV d.C, é outro texto importante sobre o yoga e representa uma síntese entre os dois pontos-de-vista, na medida em que procura unir valores, até então díspares. O

Bhagavad-Gita apresenta diferentes vias para a prática do yoga. Cada indivíduo é livre

para escolher a forma de yoga que está em afinidade com seu caráter, sem a necessidade de abandonar seus deveres sociais e viver uma vida ascética.

(15)

Assim como no Bhagavad-Gita, nos anos que se seguem, novos movimentos e escolas aparecerão, propondo diferentes caminhos para a prática do yoga. Até essa época nenhum dos textos sobre yoga chega a detalhar e explicar técnicas envolvendo o trabalho físico. Será apenas por volta do século IX que o corpo começa a ser encarado como instrumento de transcendência. Entre os séculos IV d.C e XII d.C aparece na Índia um movimento cultural chamado Tantrismo. O Tantrismo foi um movimento de revalorização da natureza, dos aspectos da vida mundana e de recuperação dos valores negados pelas tradições ascéticas. Ao contrário dos ascetas que viam o corpo como um mero acúmulo de vísceras, cujo destino final é morrer e apodrecer, no tantrismo o corpo é visto como instrumento do homem em sua busca espiritual. O Tantrismo com todas as transformações culturais, sociais e religiosas que acarretou, trouxe uma forte influência ao yoga.

O Hatha-yoga, de onde vieram as posturas físicas (asanas) tão em voga hoje no Ocidente, surgiu entre os séculos IX e X.d.C e recebeu influência direta do Tantrismo. Ao invés de abandonar as sensações corporais, o hatha-yoguin passa a valorizar o culto ao corpo para o desenvolvimento da alma. O

Hatha-yoga, entretanto, não se opõe às idéias contidas no Yoga Sutras. Na visão do Hatha-yoga e do tantrismo, o homem, vivendo então num mundo desorientado,

não tinha como transcender a partir do caminho apontado no Yoga Sutras. Era preciso utilizar meios específicos e adequados para os novos tempos. O foco das práticas passa a ser o corpo, usado como ponto de partida para a investigação das realidades mais sutis . Diz Tara Michaël (1975, pg. 165): “o

yogi que segue a via tântrica não procura desapegar-se do mundo fenomenal

apoiando-se sobre as forças do intelecto; ele visa a transmutar toda a natureza, a partir de sua forma mais grosseira, a manifestação corporal.”

O fato de não encontrarmos nos textos anteriores ao Hatha-yoga e ao tantrismo a exposição de práticas físicas, não significa que essas não existissem. Os asanas e pranayamas (técnicas que envolvem o trabalho físico) são mencionados no Yoga Sutras, mas não há nenhum detalhamento sobre essas técnicas. No Yoga Sutras não há enfoque sobre o corpo e sim sobre os mecanismos de controle da mente. Uma explicação que se dá para isso é que

(16)

o Yoga Sutras apresenta um ensinamento para iniciados, que já tinham domínio sobre as técnicas físicas.

Os principais textos sobre o Hatha-yoga são o Hatha Yoga Pradípiká, o e o

Shiva Samhitá e são neles que encontramos as primeiras descrições sobre asanas. O Hatha Yoga Pradípiká foi escrito durante o século XIV e descreve 16

posturas . O Gheranda Samhitá é um manual do século XVII que se baseou no

Hatha Yoga Pradípiká e apresenta 32 posturas. O Shiva Samhitá é do século

XVIII e é o que apresenta o maior número de posturas, 84. Além de apresentarem diferentes asanas, esses textos apresentam técnicas de controle do alento (pranayamas), técnicas de purificação, entre outras. Não podemos afirmar que as datas desses textos correspondem a data de criação do

Hatha-yoga. Pela tradição indiana, o conhecimento era transmitido de mestre para

discípulo oralmente e daí, podemos deduzir que essas práticas eram bem mais antigas que os textos a seu respeito.

O Yoga no Ocidente

O Yoga chegou ao Ocidente a partir da presença de portugueses e ingleses na Índia, que traduziram para seus idiomas textos tradicionais. A primeira tradução em inglês do Bhagavad Gita é de 1785. Em 1893, Swami Vivekananda vai para os Estados Unidos para uma palestra no Primeiro Parlamento de Religiões do Mundo, onde fala sobre o Raja Yoga. Depois disso palestrou durante dois anos em diferentes cidades da Europa.

Yogananda foi outra figura importante na disseminação do Yoga na América. Em 1920, ele foi convidado a representar a Índia em um Congresso , realizado em Boston. Sua conferência nesse Congresso e subseqüentes palestras na Costa Leste dos Estados Unidos foram entusiasticamente acolhidas, e em 1924 ele partiu para uma turnê de conferências através do continente. Durante as três décadas seguintes, Paramahansa Yogananda contribuiu de maneira profunda no sentido de criar no Ocidente uma percepção e uma apreciação mais aguda da sabedoria espiritual do Oriente. Em Los Angeles ele

(17)

estabeleceu a Sede Internacional da Self-Realization Fellowship, uma instituição fundada por ele em 1920.

Essas primeiras aproximações do Ocidente com o yoga estavam relacionadas diretamente ao Vedanta e ao Raja Yoga, práticas com enfoque na meditação. Os asanas ganharam maior proeminência no Ocidente a partir do século XX, quando se passou a olhar mais seriamente para os benefícios físicos da

prática. Na Índia, Paramahansa Madhavadasaji encorajou cientistas e médicos locais a explorar os aspectos fisiológicos da prática de asanas. Um de seus estudantes, Kuvalayananda fundou o primeiro instituto voltado a essa exploração, o Kaivalyadhama Ashram and Research Institute. Além de

Kuvalayananda, que explorou os benefícios físicos e psicológicos da prática do

yoga, dois outros mestres indianos, Swami Sivananda,de Rishikesh e T.

Krishnamacharya, de Mysore, colaboraram para essa disseminação,

expandindo o repertório do Hatha-yoga (com um variado sistema de asanas e técnicas de pranayama) e apresentando-o também às mulheres. Grande parte das escolas de Hatha-yoga presente hoje no Ocidente tiveram influência no trabalho desenvolvido por esses homens. O trabalho de Krishnamacharya começou por volta de 1930, quando recebeu um financiamento do marajá de Mysore para dar aulas e disseminar o conhecimento sobre o yoga entre jovens estudantes. Dois de seus alunos se destacaram e desenvolveram um estilo próprio de yoga, hoje bastante difundidos no Ocidente. Pattabhi Jois

desenvolveu o ashtanga vinyasa yoga, uma prática de Hatha-yoga que trabalha com o sistema de vinyasa, que sincroniza respiração e movimento. B.K.S. Iyengar criou uma escola conhecida pela ênfase dada ao alinhamento postural e utilização de acessórios de apoio para a realização dos asanas e que hoje é conhecida como Iyengar Yoga.

(18)

O que é o yoga?

Para entender o que é o yoga, vale a pena começar entendendo o que o yoga não é. Marcos Rojo (2003) comenta:

“Infelizmente, por ignorância ou apelo comercial, o Yoga chegou ao Ocidente trazendo na bagagem conceitos que não necessariamente pertencem ao seu universo. Por parte de quem fala ou preconceito de quem escuta, já foi confundido com faquirismos, autoflagelação, religião, ginástica e prática misteriosa para fanáticos e iniciados no esoterismo...” (ROJO, 2003 pg.50)

Como vimos anteriormente, existem diferentes linhas e escolas de yoga, entretanto todas elas buscam o mesmo objetivo. E que objetivo é esse? A palavra yoga vem da raiz sânscrita yuj, que significar unir, juntar. Yoga significa união, integração, união do ser individual com o Ser absoluto, atemporal. O

yoga busca alcançar o conhecimento de si-mesmo, o conhecimento do atman,

do deus que habita dentro de nós mesmos.

O Yoga Sutras de Patanjali

No tratado de Patanjali yoga significa tanto o objetivo (união) como o método que leva a esse objetivo. Yoga é a supressão dos movimentos da consciência, é aquietar sua mente. Somente silenciando a mente é que poderemos remover o sofrimento que vem do mundo fenomênico e encontrar a felicidade suprema. Somente com a mente calma, poderemos nos encontrar com a nossa real natureza. Para lidar com o sofrimento e alcançar esse objetivo, o Yoga Sutras propõe uma estratégia de oito passos ou oito partes, o Ashtanga Yoga

(ashta=oito, anga=membro).Quando falamos em passos, nossa tendência é pensar linearmente. No caso do Ashtanga, o melhor seria pensar numa

(19)

imagem em espiral em que a cada volta se percorre os vários passos e esses vão novamente se repetindo até que se chegue ao centro.

Os oito passos que compõem o sistema de Patañjali são:

1. Yamas 2. Niyamas 3. Asanas 4. Pranayama 5. Pratyahara 6. Dharana 7. Dhyana 8. Samadhi

Iyengar (2001a) compara os oito passos descritos no Yoga Sutras a uma árvore. Os yamas e niyamas são as raízes e os troncos, o que dá base a essa árvore, os alicerces da prática.

Os yamas e niyamas são comumente interpretados como princípios éticos que guiam nossos relacionamentos com os outros e com nós mesmos. Ainda que possam conduzir a uma conduta ética, o objetivo maior da prática dos yamas e

niyamas é o de aquietar a mente. Os yamas e niyamas não foram definidos no Yoga Sutras como princípios éticos para a conduta social, mas sim para a

conduta pessoal. Eles não implicam em sermos bons ou maus, mas nos mostram como nossos atos trazem implicações para nós mesmos.

1- Yamas

A palavra yama pode ser traduzida por refreamento e vem do verbo yam, que significa refrear, restringir. Os yamas são: ahimsa, satya, asteya, brahmacharya e aparigraha.

(20)

AHIMSA – não-violência

Tornou-se mote da campanha nacionalista de Gandhi, quando então se tornou um conceito bastante conhecido no mundo contemporâneo, inspirando igualmente Martin Luther King. Swami Kuvalayananda (1963) vê ahimsa não apenas do ponto-de-vista físico, mas da sua presença em pensamentos. A violência nos pensamentos pode ser pior do que a violência em si, quando praticada sem a intenção e sem ressentimentos. É o caso, por exemplo, de um cientista que utiliza animais em experiências, um açougueiro que mata exercendo sua profissão, mas sem o desejo de matar.

A não-violência não se aplica apenas aos outros, mas também na relação que temos com nós mesmos. Se alguém nos bate no estômago e ficamos sem ar, é fácil reconhecer essa situação como violenta. Por outro lado, é difícil reconhecer um comportamento como violento quando provocamos em nós mesmos sensações prejudiciais através de pensamentos e ações. É interessante observar também que quando agimos de forma violenta em relação a alguém, primeiro ferimos a nós mesmos. Quando você está com raiva, quem sofre? Você sofre. Seus batimentos cardíacos aumentam e sua respiração se altera.

SATYA - veracidade

Satya implica em ser verdadeiro nos pensamentos, sentimentos, palavras e

ações. Taimni (2001) comenta que a mentira cria uma espécie de tensão mental e emocional que nos impede de harmonizar e tranqüilizar nossa mente.

ASTEYA – não-roubar

O professor indiano Aadil Palkhivala (fonte: artigo publicado na Revista Yoga Journal – ver bibliografia) comenta que asteya não significa apenas “não-roubar”, mas desenraizar crenças subconscientes ligadas a falta e carência, que causam cobiça e a necessidade constante de acumular coisas.

(21)

BRAHMACHARYA – moderação dos sentidos

Tradicionalmente, brahmacharya é traduzido como celibato. O termo

brahmacharya significa literalmente “o que caminha com brahman”. Gulmini

(2002) explica:

“Esse termo era utilizado para designar o estudante bramânico durante o período em que aprendia os Veda aos pés de um mestre. Como a castidade era exigência disciplinar, brahmacharya tornou-se sinônimo de continência dos impulsos sensoriais, sobretudo o sexual (lembremos que o sistema de Yoga de Patanjali é de cunho totalmente ascético).” (GULMINI, 2002 pg. 268)

Iyengar (1979) argumenta que a maioria dos yoguis e sábios da antiga Índia eram casados e que brahmacharya não significa uma austeridade forçada. Para ele, aquele que pratica brahmacharya é o que vê o sagrado em todas as coisas.

Brahmacharya também pode ser visto como moderação dos sentidos. Quando

os sentidos estão esparramados, estamos fora de nosso centro. A busca incessante pelo prazer (não apenas sexual) nas coisas que estão fora de nós, nos afasta de encontrar nossa própria essência. Praticar brahmacharya não significa nos abster do prazer ou deixar de buscar o prazer no que fazemos, mas não sofrer na busca pela repetição do prazer.

APARIGRAHA – não-possessividade

A prática de aparigraha não significa que devamos banir nossos desejos e aspirações e nos livrarmos de todas as nossas posses para crescer espiritualmente. No nosso mundo de hoje, inundado pela publicidade, a idéia de desejar mais e mais e de criar necessidades desnecessárias e a compulsividade ao consumo são bastante visíveis. “Eu preciso comprar ...”, “Não posso ficar sem isso...” A conscientização de aparigraha nos liberta do hábito de nos identificar com as coisas que nos rodeiam para nos

(22)

aproximarmos da nossa própria essência. Dependemos de certas posses materiais para viver (roupas, comida, casa), mas não devemos viver apenas para manter essas posses.

2- Niyamas

Os niyamas são observâncias que o yoguin deve seguir. São eles: saucha,

santosha, tapas, svadhyaya e isvara pranidhana. SAUCHA - pureza

Saucha está associada à idéia de pureza, tanto externamente como

internamente, o que comemos, o que vemos, o que ouvimos e o que pensamos. Na tradução de Gulmini (2002) temos: “Da purificação surge a repugnância pelo próprio corpo e o não-contato com os outros”. Uma tradução praticamente igual a essa é feita por Taimni (2001). Considerando o aspecto ascético do Yoga Sutras, o corpo é visto como algo sujo e é preciso desapegar-se dele para nos tornarmos desapegar-sensíveis e vermos as coisas como elas realmente são.

Já na visão de algumas escolas de Hatha-yoga, isso é visto de forma distinta. Iyengar (1998) esclarece que, ainda que o corpo se deteriore, o praticante não deve vê-lo com aversão, mas deve mantê-lo limpo e purificado como gratidão a sua própria essência (purusa). Através de saucha, o corpo é o instrumento do yoguin na busca do conhecimento espiritual.

SANTOSHA - contentamento

Taimni (2001, pg. 197) comenta: “A principal causa da nossa constante infelicidade é a perpétua conturbação da mente causada por todo tipo de desejos. [...] Uma mente calma está apta a refletir em si mesma, a bem-aventurança, inerente a nossa verdadeira natureza divina.”

Marcos Rojo (2003, pg.58) dá uma boa explicação sobre Santosha: “... contentamento é dar valor para o que já se tem, e não ficar olhando o que está faltando”. Ele explica ainda o contentamento com a seguinte fórmula:

(23)

“Contentamento = Aquisições / Expectativas”. Ou seja, se sempre tivermos mais expectativas que aquisições, o contentamento nunca vai ser igual a um. Isso não significa que não devemos ter expectativas e desejar novas coisas. Estudamos, esperando passar na prova; viajamos, esperando nos divertir... Boa parte do que fazemos tem uma expectativa futura. O problema é apoiarmos totalmente nossa felicidade na realização dessas expectativas. Se não encontrarmos contentamento no que temos hoje, estaremos numa busca incessante pela felicidade que nunca será alcançada, já que sempre haverá novos desejos.

TAPAS - determinação

Tapas vem da raiz tap, que significa queimar, calor. Citando Taimni (2001,

pg.181): “O significado da palavra deriva, provavelmente do processo de submeter-se o ouro impuro a um forte calor, através do qual todas as impurezas são queimadas, permanecendo somente o ouro puro.”

Tapas combina em si o significado de diversas palavras: autodisciplina,

purificação, determinação e se refere ao esforço para se alcançar um determinado objetivo.

SVADHYAYA – auto-reflexão

Svadhyaya é muitas vezes traduzido como leitura dos textos sagrados. O

significado por trás de svadhyaya parece ir bem além disso, e alguns autores o traduzem por auto-estudo, auto-reflexão. Svadhyaya está associado à idéia de interiorização, de autoconhecimento e busca por aquilo que realmente somos. Fazer uso das nossas atividades como espelho para descobrir mais sobre nós mesmos, seja a prática de asanas ou nosso relacionamento com os outros e nós mesmos, é uma forma de se praticar svadhyaya.

ISVARA PRANIDHANA - entrega

Isvara Pranidhana é interpretado como consagração ao Senhor, e pode ser

visto como ato de entrega, não necessariamente a Deus, mas a algo maior que si mesmo. Isso significa fazer o melhor que podemos, sabendo que o resultado final não está em nossas mãos.

(24)

Isvara Pranidhana se aproxima muito do conceito de fé exposto por Lowen (1983):

“A fé é uma qualidade do ser: de estar em contato consigo mesmo, com a vida e com o universo. É uma sensação de pertencer a uma comunidade, a um país e à Terra. Acima de tudo é a sensação de estar assentado no próprio corpo, na própria humanidade e na sua própria natureza animal. Ela pode ser todas essas coisas porque é uma manifestação da vida, uma expressão da força vital que une todos os seres”.

(LOWEN, 1983 pg.151/152)

3. Asanas

Asanas são posturas psicofísicas que conferem estabilidade ao corpo e, assim

como os passos anteriores (yama e niyama), têm o propósito de acalmar as inquietações da mente.

No Yoga Sutras, o primeiro aforismo que aborda o asana (sutra II-47) é comumente traduzido como: “o asana deve ser estável e confortável”. Swami Kuvalayananda (1963, pg. 26) afirma: “asana é aquilo que contribui para a estabilidade e para a sensação de bem-estar.” De acordo com ele, esse

aforismo é traduzido erroneamente por “o asana é estável e confortável” , o que pode se fazer pensar que para praticar asanas, basta adotar uma postura fácil de realizar e manter. Ele comenta que o Hatha Yoga Pradipika, no aforismo I-17 faz a mesma colocação, ao definir asana como aquilo que contribui para estabilidade, saúde e flexibilidade.

Em relação a isso, Iyengar (1998) comenta que Patanjali descreve nesse sutra o asana em sua perfeição. Não se pode dizer que uma postura é um asana, apenas por ser confortável. Disciplina e atenção devem ser aplicadas na prática de cada asana, que deve ser executada com firmeza e estabilidade.

(25)

Através do asana o yogi busca a inteligência e a consciência que está escondida em seu corpo, e é a partir daí que poderá acessar sua própria essência. Segundo ele, a perfeição no asana é alcançada quando o corpo, mantendo-se firme e estável, cessa qualquer tipo de esforço, e assim, funde-se com sua essência. Quando o praticante alcança esse estado de equilíbrio, atenção e relaxamento se fazem presentes simultaneamente, e o praticante então não pode mais ser atingido por dualidades como prazer e dor. O efeito do asana é pôr fim às diferenciações entre corpo e mente, mente e alma. Quando corpo, mente e alma estão unidos em uma postura perfeita, o praticante alcança o estado de felicidade suprema.

Segundo Swami Satyananda Saraswati (2002) o aforismo de Patanjali que define o asana é interpretado como uma postura estável e confortável. Ele comenta que no contexto do Yoga Sutras o asana deve ser praticado para desenvolver a capacidade de se sentar confortável numa posição por um longo tempo, como é necessário para a meditação. Ele comenta que no Raja Yoga,

asana se refere a uma posição sentada, enquanto que no hatha yoga isso

significa algo mais. Asanas são posições específicas do corpo que abrem os canais de energia e centros psíquicos. Eles são ferramentas para aumentar nossa consciência e para promover uma base estável para a exploração de nosso corpo, respiração e mente. Saraswati (ibid.) afirma:

“A mente e o corpo não são entidades separadas, ainda que haja uma tendência para pensarmos e agirmos como se fossem. [...] A prática de asanas integra e harmoniza corpo e mente. Tanto o corpo como a mente permitem o desenvolvimento de tensões e nós.[...] O objetivo do

asana é aliviar esses nós. Os asanas aliviam as tensões

mentais , lidando com elas no nível físico, atuando somática e psicologicamente através do corpo e da mente. Por exemplo, tensões emocionais podem bloquear o funcionamento normal dos pulmões, do diafragma e prejudicar o processo respiratório.” (SARASWATI, 2002 pg. 11)

(26)

O trabalho com o corpo nos faz despertar para experiências mais sutis. Como afirma Rojo (2003):

“É fácil perceber no corpo as modificações provocadas por uma alteração emocional. Alguém tenso logo

apresenta ombros suspensos e rígidos com alteração no tônus muscular. Alguém deprimido pode apresentar uma postura de flexão ou inclinação da cabeça para frente. A idéia do yoga é seguir o caminho do físico para o mental, interferir onde as emoções interferem;ou seja,

primeiramente no tônus muscular, na postura, e posteriormente na respiração.” (ROJO, 2003 pg.61)

Pedro Kupfer (extraído do artigo “Asana: pensando com o corpo” - ver

bibliografia) também faz uma colocação interessante sobre o papel dos asanas dentro do caminho do yoga: “O Yoga quer dar um corpo novo ao praticante, que ele mesmo irá construir, célula por célula, fibra por fibra. Usando esse novo corpo como instrumento, ele poderá avançar a passos largos em direção à meta do Yoga.” De acordo com ele, a construção desse novo corpo possibilita ao praticante perder a identificação com o antigo corpo, vinculado à couraças de tensão muscular e samskaras , impressões mentais subconscientes.

4. Pranayama

Segundo Pedro Kupfer:

“A palavra pranayama deriva de dois termos sânscritos:

prana , que significa alento, força vital, respiração,

energia, vitalidade e ayama, expressão que, segundo o Amarakosha , significa extensão, intensidade,

propagação, dimensão. Pránáyáma, então, é o processo através do qual se expande e intensifica o fluxo da energia no interior do corpo. Em outra acepção, esta

(27)

palavra estaria formada pelos vocábulos prána,

designando a energia vital e yama, que significa controle, domínio, retenção, pausa. Donde, pode traduzir-se

também como domínio da bioenergia, utilizando técnicas respiratórias.” (extraído do artigo: “Força vital, respiração e consciência” – ver bibliografia)

A vida está intimamente ligada à respiração. Podemos passar alguns dias sem nos alimentar, mas não muito tempo sem respirar. Respirar bem, significa viver melhor. Os pranayamas melhoram as funções respiratórias em geral, mas formam também um dos mais importantes canais de acesso para as emoções. A respiração é a primeira função fisiológica que se altera quando mudamos nosso comportamento. Todos os estados emocionais afetam a respiração. Kupfer comenta que cada estado emocional corresponde a um ritmo respiratório. Uma respiração profunda e ritmada demonstra satisfação, segurança e serenidade, enquanto que respiração curta e rápida denota

ansiedade, insegurança ou medo. Aprendendo a manipular o ritmo respiratório conseguimos modificar e sutilizar as emoções, o que interfere diretamente em nossa qualidade de vida.

A atividade da mente e da respiração andam de mãos dadas. Quando a

respiração está agitada, a mente acompanha sua velocidade. Os pranayamas, assim como os três primeiros passos descritos por Patanjali nos ajudam a controlar e acalmar nossa mente.

5. Pratyahara

Pratyahara é a retração dos sentidos, com o intuito de centrar-se em si mesmo.

Constantemente somos bombardeados por imagens, sons e sensações, que nos arrastam para a experiência externa e agitam a mente. Pratyahara induz a um estado de relaxamento profundo e consciente, preparatório para a

(28)

meditação, a partir do momento em que nos desvinculamos dos estímulos vindos do mundo exterior. Como menciona Michael (1975):

“Liberar-se da sujeição dos sentidos é de importância primordial para o yogin, pois são os poderosos impulsos dos sentidos que constantemente agitam e submergem o espírito. O indivíduo não pode absorver-se na

consciência pacificada do Eu, enquanto não tiver dominado a influência dispersiva dos sentidos.” (MICHAEL, 1975 pg.90)

6. Dharana

Dharana é traduzido como concentração. A palavra concentração é muitas

vezes tomada com um sentido diferente em nosso dia-a-dia. É importante não confundir a concentração intelectual com a concentração yóguica, que diferem em seus propósitos e na maneira como são conduzidas. Na concentração intelectual canalizamos nossa atenção numa determinada direção e a partir de uma idéia vamos desenvolvendo outras idéias. Na concentração yóguica, você começa com vários pensamentos e vai aos poucos diminuindo, focalizando sua atenção em uma única idéia. Dharana portanto, é a atenção em um único ponto, uma concentração que pode ter como apoio um objeto para observação, como por exemplo, um símbolo, uma imagem ou um som específico.

7. Dhyana

Dhyana é traduzido como meditação. Quando, em Dharana, a atenção chega a

seu ápice, transforma-se em concentração extrema, ou Dhyana. Enquanto em

Dharana, a concentração em um único ponto só é atingida por alguns

instantes, em Dhyana a concentração se torna prolongada e ininterrupta. Michael (1975) esclarece:

“Quando o controle sobre a atenção se consolida, os inumeráveis pensamentos e distrações que intervinham e se imiscuíam no espírito, frustrando-o em sua

(29)

concentração, diminuem de freqüência e importância, e a partir daí a lucidez do yogin se intensifica, eliminando toda sonolência, dissipando toda bruma mental, toda sombra, toda reserva, e revelando o objeto numa

claridade direta e fixa. A meditação conduz ao Samadhi.” (MICHAEL, 1975, pg.94)

8. Samadhi

Segundo o Yoga Sutras (apud MICHAEL, 1975, pg.94), “Quando só o objeto meditado resplandece na consciência, que aparece esvaziada de sua própria forma, tem-se o Samadhi.” Nesse momento, o objeto de observação e o observador se fundem em pura consciência, tornando-se um só. A dualidade entre sujeito e objeto é abolida. Samadhi é a liberação, o estado de iluminação, em que o contemplador se absorve na consciência universal.

Como mencionamos anteriormente, para Patanjali, yoga é tanto o meio como o fim. Vyasa (apud MICHAEL, 1975, pg. 95) afirma “o Yoga deve ser conhecido por meio do Yoga, o próprio Yoga conduz ao Yoga. Aquele que se aplica sem descanso ao Yoga, no final encontra no Yoga uma alegria permanente.”

Samadhi é o objetivo último do yogin. Em Samadhi ele deixa sua consciência

individual é então capaz de entrar na essência de seu ser, estando assim liberado de todo o sofrimento.

(30)

Hatha-yoga

O Hatha-yoga se coloca como complemento ao Yoga Sutras de Patanjali e como meio para alcançá-lo. A afirmação da Hatha Yoga Pradipika (SOUTO,

2000 pg.35) confirma isso: “Saúdo o Todo-poderoso senhor Shiva (Adinatha),

que ensinou o conhecimento do Hatha Yoga. Este conhecimento é como uma escada, para o praticante que procura alcançar o elevado Raja Yoga em sua busca espiritual”.

Hatha significa em sânscrito força, violência. A interpretação do Hatha-yoga como yoga da força vai de encontro ao enfoque dado ao corpo e à idéia de se partir do mais grosseiro para o mais sutil na busca pela transcendência. Outra interpretação é de que o Hatha-yoga é a unificação do sol (ha) com a lua (tha). O sol, nesse caso corresponde à energia masculina e a lua à energia feminina, que circulam em nosso corpo através de canais de energia denominados nadis. Esses canais podem chegar a 72 mil, segundo alguns textos. Devesa (2003, pg. 112) comenta:

“Apesar de vários autores modernos buscarem uma relação entre canais e análogos no corpo denso (nervos, artérias e veias), não existe qualquer relação entre canais de energia sutil e regiões anatomicamente definidas do corpo físico.”

A energia vital ou prana entra em nós a partir da respiração através de dois nadis importantes, ida e pingala, que partem respectivamente das narinas esquerda e direita. Ida representa a energia feminina e pingala a energia

masculina. Um dos mais importantes canais de energia é o sushuma nadi, uma canal central que corre no interior do eixo cerebroespinhal. Ao longo do trajeto de sushuma encontramos cruzamentos de canais sutis que, em alguns pontos se entrecruzam , dando origem a um turbilhão circular de energia, denominado chakra. No sushuma nadi se encontra adormecida a kundalini, energia

criadora, que ao ascender através dos chakras e alcançar o topo da cabeça, leva ao Samadhi. A kundalini se representa simbolicamente como uma

(31)

serpente, enroscada na base da coluna. O objetivo do Hatha-yoga é fazer despertar a serpente e ascendê-la através de sushuma nadi.

Apresentamos a seguir uma breve descrição dos sete principais chakras:

1) Muladhara, que significa “fundação, a base raiz”. Localiza- na região entre o

ânus e os genitais, na base da espinha dorsal. Está relacionado às

necessidades básicas do indivíduo, como alimentação, sono, sexo, etc; e a sensação de estabilidade e firmeza tanto no plano físico como psicológico.

2) Svadhisthana, que significa “lugar ou morada do ser”. Localiza-se no baixo

ventre e na cintura pélvica no nível dos órgãos genitais, atuando sobre eles e sobre o sistema urinário. Está relacionando a função sexual e a experiência de aproximação com o outro.

3) Manipura, que significa "cidade das gemas" ou "cidade da jóia

resplandecente". Localiza-se no plexo solar, na região do umbigo,

compreendendo todo o sistema digestivo. Está associado a expansividade e sociabilidade e as sensações de prazer e dor.

4) Anahata, que significa “não golpeado, não tocado”. Localiza-se no plexo

cardíaco, na região do coração e relaciona-se com as funções afetivas.

5) Vishuddha, que significa “purificação”. Compreende todas as estruturas da

boca, pescoço e garganta. Está associado a expressividade, criatividade e fala.

6) Ajna, que significa “autoridade, comando, poder ilimitado”. Localiza-se um

pouco acima das sobrancelhas e entre elas e compreende os olhos, ouvidos e nariz. Relaciona-se a capacidade de visualizar e compreender conceitos em um nível que vai alem do racional e ao despertar da intuição.

7) Sahashara, que significa “o de mil pétalas”. Localiza-se no topo da cabeça.

(32)

kundalini ascende a sahashara é que se dá o Samadhi, o estado de comunhão

com todas as coisas.

De acordo com Swami Satyananda Saraswati (2002) a prática dos asanas não apenas fortalece o corpo, mas ativa e desperta os centros responsáveis pela evolução da consciência, estimulando os chakras e distribuindo a energia gerada pela kundalini por todo o corpo. Para ele, o objetivo principal do

Hatha-yoga é balancear o fluxo entre ida e pingala. Quando ida e pingala se

equilibram e a mente é controlada, então, sushuma, que é o nadi mais importante, começa a fluir. Quando sushuma flui, a kundalini desperta e ascende sobre os chakras.

Pedro Kupfer comenta que o trabalho do Hatha-yoga é um longo caminho através de ações purificatórias, físicas e psíquicas, que visam limpar o espelho da alma para que ela possa refletir sua verdadeira face. Esse trabalho inclui a prática dos yamas e niyamas, o uso do corpo através dos asanas, a purificação da energia vital através dos pranayamas e a purificação do psiquismo através da meditação . (Extraído do artigo “O corpo é o templo da divindade” – ver bibliografia)

Concluindo, o Hatha-yoga é um caminho, que, tendo o corpo como ponto de partida, busca o aperfeiçoamento nas dimensões sutil, emocional, mental e psíquica para a realização do objetivo final de todas as forma de yoga, a libertação da ignorância e a integração com brahman, essência de todas as coisas.

(33)

PSICOTERAPIA CORPORAL E OUTRAS ESCOLAS DO

OCIDENTE

A psicoterapia corporal ou somática tem suas raízes nos trabalhos

desenvolvidos por Wilhelm Reich (1897- 1957), depois de seu afastamento do movimento psicanalítico. Reich foi aluno e colaborador de Freud e em seu trabalho como psicanalista começou a observar que muitos de seus pacientes não progrediam dentro do tratamento psicanalítico. Reich percebeu que muitos deles resistiam ao tratamento, ainda que de forma inconsciente, e que essa resistência, era muitas vezes, expressa no próprio corpo do paciente, sob a forma de tensões. Começa então a dedicar-se a um método próprio de trabalho que buscava integrar mente e corpo. Para Reich, o corpo contém a história de cada indivíduo e é através dele que podemos resgatar as emoções mais profundas e restabelecer a mobilidade biopsíquica, flexibilizando e rompendo couraças e armaduras emocionais que funcionam como mecanismos de defesa.

A psicoterapia corporal se divide hoje em uma série de vertentes, que trabalham com a idéia da interação entre os aspectos fisiológicos e orgânicos e os

processos emocionais, afetivos e psíquicos. Nesse trabalho abordaremos em particular, a análise bioenergética de Alexander Lowen e a psicologia formativa de Stanley Keleman. Saindo do campo da psicologia corporal, mas explorando a mesma idéia de corpo e mente integrados, está o trabalho realizado por Ida Rolf, que também analisaremos aqui.

(34)

A ANÁLISE BIOENERGÉTICA

A análise bioenergética foi sistematizada por Alexander Lowen e John Pierrakos, a partir do trabalho de Reich, de quem Lowen foi aluno. Ainda que adotando uma abordagem terapêutica distinta da de Reich, Lowen foi fortemente influenciando por ele. Reich observou em seu trabalho na clínica psicanalítica que as

resistências apresentadas por seus pacientes não se manifestavam somente através da fala, mas em gestos, na maneira de falar, na maneira de andar, etc. Essas resistências também estavam relacionadas à musculatura corporal, através de tensões que limitavam o movimento e a respiração, e que Reich denominou couraça muscular. Lowen comenta sobre isso (1977):

“A formulação de Reich a respeito da identidade funcional entre a tensão muscular e o bloqueio emocional foi um dos grandes insights desenvolvidos no curso de terapia analítica de problemas emocionais. Abriu a porta para um novo campo de investigação analítica e Reich foi o

primeiro a explorar suas possibilidades.” (LOWEN, 1977 pg. 30)

Para Reich a expressão corporal é a perspectiva somática da expressão emocional, que é vista no nível psíquico como “caráter”. Ele elaborou o

conceito de que o caráter e a atitude muscular eram funcionalmente idênticos e serviam a mesma função energética. Assim, não era necessário depender apenas de sonhos ou da técnica de associação livre para chegar até os impulsos inconscientes e suas resistências. Os trabalhos realizados a partir dessas formulações levaram ao uso da respiração no procedimento

terapêutico. Em relação a isso Lowen (1977) observa:

“A análise do nível somático havia revelado que os

(35)

a fim de suprimir ansiedade e outras sensações... Em situações que são vividas como amedrontadoras ou dolorosas, prende-se a respiração, contrai-se o diafragma e enrijece-se os músculos abdominais. A descarga da tensão resulta em suspiro. Se este padrão se torna crônico, o peito está sempre numa postura de inspiração do ar, a respiração é baixa e o estômago duro.” (LOWEN, 1977, pg. 31)

Lowen partiu do conceito de couraça muscular de Reich para o desenvolvimento de seu próprio trabalho, que se baseava no seguinte questionamento: Se

estrutura corporal e temperamento estão relacionados, é possível modificar o caráter de um indivíduo sem uma alteração de sua estrutura corporal e de sua mobilidade funcional? Ao mudar a estrutura e aprimorar sua mobilidade, não poderíamos efetuar as modificações no temperamento, desejadas pelo paciente?

Como define o próprio Lowen (1977, pg. 16), “o terapeuta bioenergético analisa não apenas o problema psicológico do paciente como o faria qualquer analista, mas também a expressão física do problema, na medida em que é manifesto em sua estrutura corporal e movimento.”

A técnica envolve a leitura do corpo, da expressividade de seus movimentos, procurando analisar e elaborar o significado das tensões musculares crônicas e uma tentativa sistemática de liberá-las.

Para Lowen (1977, pg. 13/14) , a psicanálise apresenta uma precariedade em sua técnica, ao não considerar o corpo diante dos conflitos psíquicos e

emocionais. A palavras e as idéias são insuficientes para promover a

transformação necessária, limitando-se muitas vezes à um autoconhecimento intelectual. A análise bioenergética se propõe a conjugar o trabalho corporal que busca propiciar um contato maior com o próprio corpo, sensações e sentimentos; com o processo analítico, que tenta elaborar estes conteúdos, tendo como

(36)

referência a história do indivíduo.

A bioenergética trabalha com a hipótese de que há uma energia fundamental no ser-humano. Os processos psíquicos e somáticos são determinados pela operação dessa energia, que Lowen denomina bioenergia. A análise

bioenergética ajuda a pessoa a compreender seus problemas emocionais, a natureza e a origem dos conflitos internos e trabalha para liberar os padrões de tensão muscular. A tese fundamental da bioenergética é de que o acontece com a mente se reflete no corpo e vice-versa.

Lowen desenvolveu posições e exercícios que propiciam um maior contato com o corpo e sua vitalidade. Veio daí o conceito de grounding, que tornou-se uma característica da abordagem bioenergética: a vitalidade das pernas, a respiração profunda, a sensação de proximidade com o solo; o contato com a realidade,com o seu corpo e sua sexualidade.

Lowen (1977) coloca que o problema da segurança emocional não pode ser separado em uma pessoa, da questão da segurança física do seu andar. Ainda que o problema possa ser resolvido ao nível verbal, desaparece mais rápida e completamente em uma terapia que combine a análise com um trabalho direto do distúrbio físico. A terapia bioenergética tem como objetivo fazer com que o

paciente trave contato com seus pés e com o chão e, ao mesmo tempo, torná-lo consciente da relação entre seu problema emocional e sua correspondência física. Lowen (1983) afirma:

“Levar os sentimentos ao ventre para que a pessoa possa sentir suas entranhas, e às suas pernas para que ela as sinta como raízes móveis, chama-se fundamentar o indivíduo. A pessoa assim assentada sente que tem um apoio sólido no chão e a coragem para se erguer ou movimentar-se como desejar.” (LOWEN, 1983, pg. 39)

(37)

linguagem são sinônimos. Dizemos que uma pessoa realista é a aquele que tem os pés no chão, enquanto que a pessoa que vive em sonhos, está nas nuvens. Lowen (1983) complementa:

“Grounding é um conceito bioenergético e não apenas uma metáfora psicológica. Quando colocamos um fio terra num circuito elétrico fornecemos uma saída para a descarga de sua energia. No ser humano, sua fundamentação também serve para liberar ou descarregar as excitações do corpo. A energia em excesso do organismo vivo está

constantemente sendo descarregada através da

movimentação ou do aparelho genital. Ambas são funções da parte inferior do corpo. A parte superior é incumbida principalmente de energizar na forma de comida, oxigênio ou estímulos sensoriais e excitações. [...] Se a pessoa não pode se carregar adequadamente, ficará fraca,

descarregada, e mostrará uma falta de vitalidade. Se ela não puder se descarregar adequadamente ficará suspensa no ar.” (LOWEN, 1983, pg.42)

A função de descarga está associada ao prazer. O indivíduo incapaz de

descarregar um estado de tensão sente dor, ainda que ela não seja consciente. Ele procura amortecer sua dor, enrijecendo partes do seu corpo e tem medo de liberar a rigidez, porque essa poderá evocar novamente a dor. A pessoa numa condição como essa, passa a sentir falta de prazer em relação à vida, sua respiração fica restrita, seu apetite e seu interesse pela vida diminuem. Lowen (1983) diz : “[...] qualquer distúrbio na fundamentação é como a destruição de algumas das raízes que mantêm a vida de uma árvore. Destrua as raízes e veja quanto tempo ela se manterá ereta e viva.”

De acordo com Lowen (1977) , toda conduta terapêutica que pretende fundamentar uma pessoa deve realizar uma liberação significativa de suas tensões musculares. Não podemos evitar a rigidez no corpo que vem com a

(38)

idade, mas podemos evitar a rigidez que vem de tensões musculares geradas por conflitos emocionais não resolvidos. Na análise bioenergética, a pessoa volta a ter contato com suas tensões, a fim de que possa percebê-las e se tornar consciente do seu significado. Que ações estão sendo evitadas

inconscientemente a partir dessa tensão? Como ela age para limitar sentimentos e sensações? Que efeito causa no comportamento e nas atitudes?

Lowen (1977) coloca que mesmo o analista freudiano tradicional analisa a expressão facial de seu paciente, mas são poucos os terapeutas analíticos que analisam a forma e movimento da parte inferior do corpo. O paciente tem uma postura ereta? O peso das pernas está colocado sobre as pernas ou sobre o sacro? Como o peso do corpo é distribuído nos pés? A postura de uma pessoa, a maneira com que ela fala e se move nos ajuda a entender melhor quem ela é. De acordo com ele não é possível uma mudança no indivíduo, se não há um trabalho em dois níveis, o somático e o psíquico. No nível somático, a

bioenergética trabalha com o aumento na mobilidade, coordenação e controle, e no psíquico, atua com a reorganização dos pensamentos e atitudes. Lowen (1977, pg. 115) afirma: “Não é possível realizar a terapia bioenergética sem uma elaboração das atitudes e comportamentos cotidianos e das forças genéticas e dinâmicas que fizeram com que tais atitudes e comportamentos surgissem.” A função terapêutica é ajudar o paciente a encontrar seu caminho de auto-amor e auto-aceitação e desenvolver a fé em si mesmo.

(39)

A PSICOLOGIA FORMATIVA

A psicologia formativa desenvolvida por Stanley Keleman se baseia no fato de que o corpo de uma pessoa é moldado por suas experiências internas e

externas, crescimento, relacionamentos, trabalho, resolução de problemas, etc. Sua forma é impressa pelas tensões e desafios da existência e as respostas que cada um dá ao mundo cria sua forma emocional única. Keleman comenta que se pudéssemos fotografar nossa vida e projetá-la quadro por quadro, perceberíamos que somos seqüências móveis de formas emocionais variadas. Geneticamente recebemos um corpo, mas também construímos um corpo a partir do modo como nos usamos e de nossas experiências.

De acordo com a psicologia formativa não “temos” um corpo, “somos” o corpo. Nosso corpo pulsa e tem experiências. As emoções acontecem através dele. Se choramos, se rimos, se sentimos dor ou prazer, isso é sentido em nosso corpo.

Keleman acredita que não se pode mudar a mente sem mudar o corpo e enfatiza que seu método se baseia na experiência vivenciada e não na

construção teórica de idéias. O insight psicológico é importante, mas não cria por si só, mudança suficiente.

Segundo Keleman (1992), um dos elementos característicos de matérias vivas é sua capacidade de se expandir e se contrair, de se alongar e se encurtar, inchar e encolher. O organismo humano é visto como uma bomba pulsátil, composto de uma série de tubos e camadas. Sobre isso, ele desenvolve alguns questionamentos:

“O que acontece, dentro de nós, quando estamos emocional e psicologicamente estressados? O que acontece com nossos tubos? O que acontece com o relacionamento entre as bolsas de nossos tubos e os outros tubos que os envolvem? Como nos organizamos

(40)

para nos proteger? Fuga ou luta, colapso ou rigidez?” (KELEMAN, 1992, pg. 17)

Padrões contínuos de estresse emocional podem fazer com que esses tubos e camadas se tornem rígidos e alongados, inchados, densos e comprimidos ou frágeis e em colapso. Os perigos internos ou externos mudam nossa forma, mas apenas temporariamente. Voltamos a um estado normal, quando o perigo passa. Entretanto, em algumas situações a reação pode persistir, passando a fazer parte da nossa estrutura. Essa continuidade de uma resposta temporária é que é identificada como estresse. Keleman (1992, pg. 80) afirma:“Muitas pessoas estão sempre em um estado de retesamento moderado contra um perigo que elas não conseguem articular plenamente”.

O estresse perturba os padrões de pulsação, diminuindo a amplitude da pulsação celular e afetando nossos sentimentos, pensamentos e ações. Podemos nos superexpandir e perder a capacidade de recuar ou o contrário, nos encolher e perder a capacidade de expansão. Keleman (1992) comenta:

“O organismo lida de duas formas com agressões contínuas ou cumulativas. Ou resiste ou cede. Resistir requer que o organismo fique em pé, perante o ataque, para repeli-lo. Ceder requer que o organismo se renda, aceite a agressão e recue para um nível inferior de funcionamento. Ao resistir, o organismo torna-se mais sólido, se enrijece ou se retesa. Ao criar mais forma, estrutura, limites e solidez, o organismo torna-se overbound. Ao ceder, o organismo amolece, rende-se, assemelha-se mais ao líquido. Ao criar menos forma, menos limite e um estado mais liquefeito, o organismo torna-se underbound”. (KELEMAN, 1992, pg.90)

(41)

Os músculos desempenham o papel de assegurar o movimento, tanto da estrutura total do organismo, como também de substâncias internas. Além disso, sustentam a postura e provêm informações sobre auto-identidade e limites. Keleman (1992) afirma que os músculos reagem instantaneamente à experiência.

“Sentimo-nos retesados em situações tensas ou

experimentamos uma certa agitação no coração, como medo ou alegria. Os músculos permitem um contato imediato com a realidade: externamente, pela ação do esqueleto, e internamente, pelo aumento ou redução do batimento cardíaco e da atividade do sistema digestivo”. (KELEMAN, 1992, pg. 49)

Ele complementa (1992, pg.72): “Um músculo normal, ou contido, é elástico, capaz de expansão ou contração plenas. O músculo é firme, suave, com flexibilidade e elasticidade”.

A figura apresentada a seguir ilustra como se caracterizam diferentes estruturas musculares:

(42)

Fonte: Anatomia Emocional, pgs. 96 e 97

Os músculos overbound oferecem muita resistência e são sólidos demais. Podem ser densos ou rígidos, cheios de nós. Músculos rígidos têm dificuldade para se contrair e os músculos densos para se expandir. Já os músculos underbound criam pouca resistência. Podem ser inchados, intumescidos como se estivessem cheios de gordura, liquido ou ar ou frágeis e atrofiados.

Músculos inchados ou frágeis não conseguem prover os limites que ajudam a gerar pressão e o organismo extravasa ou entra em colapso. De acordo com Keleman numa sensação de bem-estar e tranqüilidade , observa-se que o diafragma e a parede corporal são moles, mas firmes, o peito e o abdômen são flexíveis, podendo se expandir e se contrair. Sob estresse contínuo, o corpo se

(43)

fixa nas emoções de emergência, caminhando para a rigidez ou colapso. Acerca disso Keleman (1992) faz a seguinte consideração:

“As emoções expressam um clima interno e se

relacionam com a motilidade e a pulsação. Essa relação é recíproca. A pulsação gera emoção e sentimento. Emoção e sentimento influenciam a pulsação. Pulsação é um bombeamento. Quando o bombeamento é

superestimulado, os sentimentos são exaltados e

inflados. Quando o bombeamento é restrito, diminuem a expressão emocional e o sentimento. A raiva e a fúria nos retesam e nos enrijecem, e a pulsação aumenta. A tristeza e a derrota nos liquefazem e nos amolece, e a pulsação diminui. A expressão emocional, dessa forma, é afetada pela perpetuação de um padrão de estresse”. (KELEMAN, 1992, pg. 105)

As imagens apresentadas a diante seguem uma seqüência que vai do enrijecimento à compactação depois ao inchaço e por fim, ao colapso De um lado, a pessoa torna-se maior, que é o caso das estruturas rígida e inchada, e de outro, torna-se menor, que é o que se vê nas estruturas densa e em

colapso. Cada um dos tipos apresentados envia uma mensagem emocional ao mundo. Tanto a rigidez como o inchaço são perturbações da expansão, mas suas intenções são distintas. A rigidez visa manter o outro afastado e o inchaço, trazer o outro para perto. O mesmo se passa com a densidade e o colapso, que são perturbações de compactação. A densidade tem por objetivo afastar o outro e o colapso serve para trazer o outro para perto.

(44)

Fonte: Anatomia Emocional, pg. 160

Keleman observa que alguns indivíduos trazem características como as da imagem, sendo predominantemente rígidos, densos, inchados ou em colapso. Outros são combinações desses tipos, assumindo estruturas diferentes nas partes de cima e de baixo do corpo, ou em diferentes camadas e bolsas. Keleman (1992, pg. 164) explica: “As camadas e bolsas, organizadas para resistir às agressões contínuas, podem também ter camadas e bolsas

compensatórias. [...] Uma cabeça superexcitada pode ser uma compensação para uma pelve subexcitada. Vísceras rígidas podem compensar músculos fracos.”

(45)

Todas essas estruturas expressam o presente imediato do indivíduo, como ele vê o mundo e interage com ele para obter contato e realização. Para Keleman não há forma perfeita, tipo ideal ou estrutura melhor do que outra, mas sim uma forma que é funcional para quem a utiliza.

Keleman afirma que muitas vezes nossos problemas persistem porque não sabemos como organizá-los ou desorganizá-los. Podemos estar excitados, sem saber o que fazer com isso ou podemos estar com raiva e não conseguir nos acalmar. Podemos ser incapazes de criar uma experiência satisfatória, o que leva muitas vezes, ao distresse emocional. Se não entendermos nosso comportamento somático e continuamos a nos identificar com velhos padrões não há como mudar nossa história. Keleman (1995) comenta sobre isso:

“Quando as coisas não vão bem emocionalmente, procuramos motivos ou justificativas biográficas para nosso próprio comportamento ou alheio. Os problemas são analisados em termos de causalidade: Quem começou a briga? Quais eram as circunstâncias ou o motivo? Mas alguém também poderia perguntar: Como me usei para entrar nessa briga? Usei uma voz exigente e uma postura agressiva? Endureci para lutar ou me encolhi rejeitado? As respostas a essas questões expõem a natureza somática e emocional do

comportamento e revelam como palavras, emoções, pensamentos e gestos musculares se conectam.” (KELEMAN, 1995, pg. 15)

O procedimento que Keleman propõe para descobrir o próprio processo organizador chama-se metodologia do COMO. O primeiro passo na

(46)

atividade. Ele torna explícito o seu modo de se usar em determinada situação, ajudando a tornar consciente seus padrões de sensação.

A metodologia do COMO envolve 05 estágios:

1. O primeiro estágio é a percepção de como se está, o que está acontecendo, qual seu padrão postural , qual sua imagem na situação presente . Aqui

observamos como lidamos com um problema, com um conflito interno e como corporificamos essa experiência.

2. No segundo estágio observa-se como se cria essa imagem e como ela é perpetuada muscularmente. Essa percepção acontece intensificando

muscularmente e em pequenos passos a organização.

3. No terceiro estágio o objetivo é desfazer, passo a passo, a organização observada no estágio anterior. Como acabo com esse modo de me

corporificar? Utiliza-se aqui o exercício da sanfona. Intensifica-se ao máximo um padrão de tensão e então volta-se atrás, afrouxando e relaxando, até experimentar a sensação de alongamento muscular. Keleman (1995, pg. 28) sugere: “Se você percebe sua barriga contraída, pode usar a própria sensação de contração para desfazê-la. Contraia com força, menos, mais, menos, até ter a sensação de poder deixar o abdômen descer”.

4. O quarto estágio é um momento de pausa e reorganização, de receber e perceber as respostas somático-emocionais que emergem.

5. O quinto estágio é o início de uma nova organização, ou a repetição da antiga referência. Como uso o que aprendi? Nesse ponto há a escolha. Posso

esquecer o que acabo de experimentar e continuar com o modo anterior ou posso usar o que acabo de aprender e formar uma nova resposta.

A metodologia do COMO é para Keleman a ferramenta para se explorar o processo pessoal. Keleman (1995, pg. 27) diz : “Em vez de se remoer, se

questionar, procurar as faltas, se culpar, use o COMO para deixar que sua forma lhe fale, ensinando como uma resposta a um evento externo se configura de dentro para fora.”

Referências

Documentos relacionados

A prova do ENADE/2011, aplicada aos estudantes da Área de Tecnologia em Redes de Computadores, com duração total de 4 horas, apresentou questões discursivas e de múltipla

Nesse sentido, aborda a escala interregional ao discutir o referido Eixo e, também, a escala intraurbana das cidades supracitadas, onde serão investigadas as

Sistemas informáticos de apoio à decisão Normas de orientação clínica (guidelines) Revistas de especialidade baseadas na evidência Revisões sistemáticas da literatura

Ana Loureiro: Professora de Yoga com formação em Atman Kriya Yoga, Happy Yoga, Yoga Integral, Hatha Yoga, Swásthya Yôga, Tantra Yoga e Ayurveda. É também líder de Danças

EXEMPLO4: Calcule a viga contínua abaixo usando o método das forças e em seguida trace os diagramas finais de força cortante e momento fletor.. Despreze as deformações devidas à

conservativos quanto à morfologia da flor para a maior parte das espécies, também foram importantes para que o cálice fundido pudesse se fixar em algumas

Enova es la máquina para café espresso y cappuccino que, respetando los principios de calidad y tradición que distinguen a la marca Faema, une la funcionalidad con un estilo moderno

O marcador de proliferação celular MIB-1, também identi- ficado como Ki-67, conforme a metodologia que se empregue na imuno-histoquímica, expressa-se comumente em células da