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Nulidades no procedimento do júri

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UNIVERSIDADE DO SUL DE SANTA CATARINA CAROLINA CESA DE MELO DE SOUZA

NULIDADES NO PROCEDIMENTO DO JÚRI: UM CAMINHO “NATURAL”?

Florianópolis 2009

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NULIDADES NO PROCEDIMENTO DO JÚRI: UM CAMINHO “NATURAL”?

Monografia apresentado ao Curso de Graduação em Direito da Universidade do Sul de Santa Catarina, como requisito parcial à obtenção do título de Bacharel em Direito.

Orientador: Prof. Maria Lúcia Pacheco Ferreira Marques, Dra.

Florianópolis

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NULIDADES NO PROCEDIMENTO DO JÚRI: UM CAMINHO “NATURAL”?

Esta Monografia foi julgada adequada à obtenção do título de Bacharel em Direito e aprovado em sua forma final pelo Curso de Direito, da Universidade do Sul de Santa Catarina.

Florianópolis, 25 de novembro de 2009.

___________________________________________________ Prof. Maria Lúcia Pacheco Ferreira Marques, Dra.

Universidade do Sul de Santa Catarina

___________________________________________________ Prof. Paulo Calgaro de Carvalho

Universidade do Sul de Santa Catarina

___________________________________________________ Prof. Priscila de Azambuja Tagliari

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NULIDADES NO PROCEDIMENTO DO JÚRI: “UM CAMINHO NATURAL”?

Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo aporte ideológico e referencial conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do Sul de Santa Catarina, a Coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e a Orientadora de todo e qualquer reflexo acerca desta monografia.

Estou ciente de que poderei responder administrativa, civil e criminalmente em caso de plágio comprovado do trabalho monográfico.

Florianópolis (SC), 11 de novembro de 2009.

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Dedico este trabalho para o Rafa, meu grande amor, que sempre me apoiou, em todas as minhas idéias e desejos e aos nossos filhos Gabriel e Rafael, que são a razão da minha vida.

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Agradeço a todos os meus mestres que durante uma longa caminhada me mostraram um Direito fascinante, pelo qual fizeram com que eu me apaixonasse a cada dia.

Agradeço em especial a Professora Maria Lúcia que me mostrou um lado diferente do Direito Penal, sempre buscando me ajudar a ver cada caso como único, fazendo com que eu abandonasse os meus medos e preconceitos.

Agradeço a minha mãe que mesmo nas vezes que ninguém acreditaria em mim acreditou! Que sempre patrocinou meus sonhos e minhas vontades, segurando minha mão e me incentivando a levantar em todas as vezes que caí. Ao meu pai, que sempre me desafiou a ser melhor que ele, que nunca se contentou com menos que a perfeição e me faz buscá-la até hoje. Meus queridos pais, vocês terão eternamente o meu amor a minha gratidão.

Agradeço aos meus sogros, que foram fundamentais em todo meu processo de formação, desde os bancos da escola até os da graduação. Agradeço em especial por todas as vezes que vocês cuidaram dos meus filhos para que eu pudesse estudar. Vocês são muito especiais para mim!

Agradeço ao meu grande amigo e companheiro Rafael. Um homem que foi capaz de abdicar dos seus sonhos para que eu realizasse os meus. Que foi capaz de me cuidar, me incentivar, me entender e me amar sem pedir nada em troca! Meu amor, obrigada por me deixar voar e sonhar!

Agradeço aos meus filhos, que são a razão da minha vida! Filhos queridos, vocês, tão pequeninos, não imaginam como foram importantes para que eu conseguisse chegar ao fim, pois todas as vezes que eu desanimei, eu olhei para os seus rostinhos e busquei forças!

E por fim, agradeço a Deus, que me agraciou com pessoas tão especiais a minha volta.

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“Não posso escolher como me sinto, mas posso escolher o que fazer a respeito”. (WILLIAM SHAKESPEARE)

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Pesquisa cujo tema central é o Tribunal do Júri, visa mostrar o surgimento e desenvolvimento do instituto, o procedimento no direito pátrio e as efetivas perdas que o réu poderá vir a sofrer ante sua instauração. O presente estudo monográfico utilizou o método de abordagem dedutivo e a técnica de pesquisa bibliográfica. Os capítulos de conteúdo se dividem de forma que o primeiro transmite uma noção básica do instituto, desde o seu surgimento até os dias atuais, bem como do funcionamento do Júri Popular em outros países. O segundo, amplamente voltado ao esclarecimento do funcionamento do Júri no Brasil, considerando as recentes alterações sofridas pela legislação. Por fim, o terceiro pontua as causas de nulidade do procedimento, a influência da mídia na formação da opinião dos jurados e a apresentação de alguns casos causadores de comoção social. Assim, a pesquisa resultou no convencimento de que os fatores externos ao julgamento, como é o caso da mídia, são capazes de influenciar no livre convencimento dos jurados, fazendo com que, antes mesmo do início da sessão o réu já esteja condenado.

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1 INTRODUÇÃO ... 10

2 DO JÚRI POPULAR ... 12

2.1 RETROSPECTIVA HISTÓRICA ... 12

2.2 O JÚRI NO BRASIL ... 16

2.2.1 Evolução constitucional do Tribunal do Júri ... 16

2.2.2 O Tribunal do Júri e a Constituição de 1.988 ... 20

2.2.2.1 Princípios constitucionais vinculados ao Júri ... 24

2.2.3 Tribunal do Júri na atualidade ... 24

2.3 TRIBUNAL DO JÚRI E DIREITO COMPARADO ... 26

2.3.1 O modelo norte-americano ... 27

2.3.2 O modelo francês ... 28

2.3.3 O modelo espanhol ... 29

3 O FUNCIONAMENTO DO TRIBUNAL DO JÚRI ... 31

3.1 O PROCEDIMENTO DO JÚRI ... 31 3.1.1 Primeira fase ... 32 3.1.1.1 Impronúncia ... 32 3.1.1.2 Absolvição ... 33 3.1.1.3 Desclassificação ... 34 3.1.1.4 Pronúncia ... 35 3.1.2 Segunda fase ... 37

3.2 DAS PRINCIPAIS ALTERAÇÕES FEITAS PELA LEI 11.689/08 ... 39

3.2.1 Da acusação e instrução preliminar ... 39

3.2.2 Do juízo de admissibilidade da acusação ... 40

3.2.3 Da preparação do processo para julgamento... 41

3.2.4 Dos jurados ... 42 3.2.5 Do desaforamento ... 42 3.2.6 Da organização do Júri ... 43 3.2.7 Da instrução em plenário ... 43 3.2.8 Dos debates ... 44 3.2.9 Do questionário e votação ... 45

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3.2.11 Da ata do julgamento ... 47 3.2.12 Dos recursos ... 47 3.3 PARTES ATUANTES ... 47 3.3.1 O magistrado ... 48 3.3.2 O promotor ... 49 3.3.3 O advogado ... 50 3.3.4 O assistente de acusação ... 52 3.3.5 Os jurados ... 52

4 DANOS DECORRENTES DO JULGAMENTO PELO TRIBUNAL POPULAR ... 57

4.1 NULIDADES ... 57

4.1.1 Nulidades no procedimento do Júri ... 59

4.1.1.1 Falta, omissão ou irregularidade na sentença de pronúncia, no libelo ou na entrega de cópia do libelo ao réu... 60

4.1.1.2 Falta de intimação do réu para julgamento ... 61

4.1.1.3 Falta de intimação de testemunhas arroladas no libelo ou na contrariedade ... 61

4.1.1.4 Presença de pelo menos quinze jurados ... 62

4.1.1.5 Falta ou irregularidade no sorteio dos jurados ... 62

4.1.1.6 Quebra na incomunicabilidade dos jurados ... 63

4.1.1.7 Erro na elaboração dos quesitos ou incompatibilidades nas respostas ... 64

4.1.1.4 Falta de acusação ou defesa no julgamento ... 65

4.2 O JÚRI DA MÍDIA ... 65

4.2.1 A mídia e a formação de opinião dos jurados ... 65

4.2.2 Afronta aos princípios constitucionais da presunção da inocência, devido processo legal, contraditório e ampla defesa ... 69

4.3 CASOS MARCANTES ... 71

4.3.1 O caso Daniella Perez ... 72

4.3.2 O caso Von Richthoffen ... 73

4.3.3 O caso Dorothy Stang ... 74

5 CONCLUSÃO ... 76

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1 INTRODUÇÃO

O presente trabalho monográfico versa acerca do controverso instituto do Júri Popular. A pesquisa procura apontar como o julgamento proferido pelo Tribunal do Júri pode não ser a forma mais justa de aplicação da normal penal, causando, em grande parte das vezes, nulidades e prejuízos ao réu.

De forma geral, a pesquisa visa mostrar o surgimento e desenvolvimento do Tribunal do Júri, o procedimento no direito pátrio e as efetivas perdas que o réu poderá vir a sofrer ante sua instauração. De forma específica objetiva-se conhecer a história do instituto, bem como o cenário de sua aplicação no Brasil e no mundo; o funcionamento do Tribunal do Júri, de forma que se demonstre o seu procedimento, incluídas as principais alterações oriundas da lei 11.689/08 e o papel das partes que nele atuam; e por fim tentar-se-á demonstrar os danos causados por este tipo de julgamento, apontando as principais nulidades e influências ocorridas durante o processo.

Salienta-se que o tema abordado no trabalho monográfico tem por objetivo mostrar o funcionamento do Tribunal do Júri, bem como os reflexos de sua aplicação para o réu, sendo assim, se faz necessário apontar o quanto este procedimento, em seu desenrolar, interfere de forma nem sempre justa, na vida do réu. Ocorre que tal instituto do Direito Penal busca entregar à sociedade os seus criminosos, para que ela própria profira um julgamento, ponto este capaz de gerar grande parte das nulidades.

Nesse sentido, procura-se demonstrar que nem sempre o Tribunal do Júri é a forma mais justa de julgar um criminoso, haja vista a diversidade de fatores capazes de influenciar no resultado final do processo. A maior motivação para pesquisar acerca deste tema é despertar nos leitores uma visão crítica sobre o Tribunal do Júri e a forma como se produz justiça dentro deste instituto. Abordar este assunto é uma forma de fazer com que seja repensado este modelo de julgamento, fazendo com que possam surgir novas opções ao réu, principalmente opções fora do senso comum e da sede de vingança privada.

Os procedimentos metodológicos utilizados no desenvolvimento do presente trabalho consistem em método de abordagem; método de procedimento e técnica de pesquisa.

Inicialmente, é importante especificar alguns pontos acerca dos procedimentos adotados para que o estudo monográfico tomasse corpo. O método de abordagem escolhido foi o dedutivo, em que se partiu de uma idéia geral com intuito de alcançar uma particular, daí extraindo as conclusões. Nesse caso, a partida se deu de teorias e legislações, para que ao final

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fossem alcançados fatos particulares e específicos, resultado este, atingido mediante a análise e detalhamento de premissas. O método de procedimento utilizado foi o monográfico, realizado a partir de pesquisas acerca de registros disponíveis tais como: livros, artigos, teses, reportagens etc. As técnicas utilizadas para pesquisa, ou seja, a forma de operacionalização, serviram como mediação prática para realização da pesquisa em si, fazendo com que houvesse compatibilidade entre os métodos e paradigmas adotados. Assim, optou-se pela técnica bibliográfica, com fundamentos expostos em textos escritos por outros pesquisadores. De forma meramente ilustrativa foram citados alguns casos reais, o que não se trata propriamente de um estudo de caso ou de campo, cujo intuito era situar o leitor na realidade fática do tema abordado.

A estruturação do presente trabalho se deu em três capítulos de conteúdo, sendo o primeiro voltado a uma noção básica do instituto, desde o seu surgimento até os dias atuais. Buscou-se, ainda, no primeiro capítulo, indicar o funcionamento do Júri Popular em outros países, de forma que se evite qualquer confusão acerca de toda a mística e glamourização dadas ao tema pela indústria cinematográfica, por exemplo. Já no segundo capítulo, visou-se a explicação do funcionamento do Tribunal do Júri no país, levando em conta a legislação pátria e suas recentes alterações, bem como os atores e partícipes desta polêmica instituição. E ao final, no terceiro capítulo de conteúdo são citadas de formal pontual as nulidades no procedimento e a influência da mídia na opinião dos jurados. A pesquisa se encerra mediante a apresentação de alguns casos marcantes, de forma que se possa confrontar a influência externa e os resultados de tais julgamentos.

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2 DO JÚRI POPULAR

2.1 RETROSPECTIVA HISTÓRICA

Mossin (2009) afirma que sempre surge um ponto de dúvida acerca do nascimento de determinado instituto, não sendo diferente com o Júri. Segundo o autor, na tentativa de buscar origens nos helistas gregos e nas questiones perpetuae romanas, não se encontrou nada semelhante às características do Júri. Algumas semelhanças foram encontradas nos tribunais noruegueses (Langretto-men), suecos (Nambd) e dinamarqueses (Noevinger).

Salienta que é impossível afirmar com segurança a origem do Júri, mas possivelmente iniciou-se no direito inglês, com influência do direito normando. Citando Hélio Tornaghi exemplifica o funcionamento do instituto à época. Que em se tratando da prova, o acusador poderia sustentar a acusação pelo seu próprio juramento ou pelo de outras pessoas, os coniuratores, que pelo princípio da credulitate, lhes era atribuído crédito à alegação que afiançavam. Com o passar do tempo passou a ser exigido que os conjuradores tivessem conhecimento do fato, por tê-lo visto ou apurado. Nesse sentido, tem-se que “[...] os conjuradores passaram a dizer a verdade sobre o que eles próprios sabiam.”. Oportuno mencionar que os conjuradores não figuravam como juízes, pois não ingressavam na seara do direito, apenas limitavam-se aos fatos como toda testemunha. (MOSSIN, 2009, p. 169).

Ademais, recorrer aos conjuradores evitava ordálias, razão pela qual o instituto se generalizou. De modo que, ocorrido um crime, os moradores locais eram convocados para examinar o corpo de delito e investigar a autoria, indicando, em seguida, um indiciado ao julgamento. Assim, o órgão composto de doze a vinte e três homens recebeu o nome de Júri de Acusação. Os julgamentos eram, feitos por juízes ou órgãos competentes e a pronuncia era uma acusação escrita que vinha a afirmar que determinado indivíduo havia cometido um delito.

Tem-se que o Júri surgiu na Inglaterra após o Concílio de Latrão ter abolido as ordálias e os juízos de Deus. Ainda de acordo com Mossin (2009, p. 170):

Juízes de Deus era um tipo de prova utilizado pelos germanos, na Idade Média, que tinha como base a crença de que Deus interferia para dar razão a quem tem.

De outro lado, o juízo de Deus assumia as formas de ordália, que provinha do alemão Urteil, antigamente UrtheilI, que era implicativo de decisão, sentença e duelo (duorum bellum, Zweikmpf), guerra de dois, luta de dois, guerra privada, além

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do juramento (Scwur, o verbo é Schwören), cujo valor também decorre da convicção de que Deus castiga o perjuro.

Ainda para efeito de esclarecimento, as principais ordálias eram a prova da

fogueira, a prova do pão e do queijo, a prova da cruz, a prova da água fria, a prova da água quente e do ferro em brasa.

O autor salienta que, ante o exposto, é possível perceber que na Inglaterra, desde aquela época, o povo era chamado a participar na justiça criminal.

Já no final do século XIV, surgiu o Júri de Julgamento, sendo as testemunhas transformadas em juízes, que de acordo com as provas coletadas diziam se o acusado era culpado ou inocente. Novamente citando Hélio Tornaghi, o autor pontua o surgimento do Júri especial em meados do século XV, cuja existência se consagrou apenas no século XVII, mais precisamente em 1.671. (MOSSIN, 2009).

Mossin (2009) aborda o surgimento do Coroner’s jury, em que um representante da coroa, com competência para reunir pessoas no local em que houvesse ocorrido um crime, tomava-lhes o juramento de bem servir, para juntos procederem o exame super visum

corporis. Estas pessoas, juntamente com os doze jurados se pronunciavam acerca dos óbitos

ocorridos nas prisões, bem como atestavam a morte dos executados.

Diante do fenômeno da Revolução Francesa o instituto do Júri se alastrou por toda Europa e só não foi adotado pela Holanda e pela Dinamarca. Entretanto, salienta Mossin (2009) que nos demais países que adotaram o colegiado popular para decidir não houve o prestígio que lhe fora atribuído na Inglaterra, razão pela qual, com o passar do tempo, tiveram suas linhas básicas alteradas, inclusive quanto à competência, transformando-se em tribunais escabinados – em que juízes e jurados votavam para decidir.

No ano 1.933 o Júri de acusação deixou de existir, sendo substituído pelos juízes instrutores e, o Júri de sentença passou a atuar em um número de processos reduzidos, apenas para os crimes mais graves. Com o passar dos tempos, segundo Mossin (2009) o Júri perdeu prestígio na Europa, em grande parte das vezes decorrente da sua própria deficiência reconhecida pelos povos. Exemplifica alguns países, como a Alemanha que o aboliu através da reforma de 1.924. Na Itália, com a chegada do fascismo, o tribunal popular restou substituído pela Corte d’assise, voltando a aparecer em 1.947 na forma de escabinado. Já na França, com a promulgação do Código de Procedimento Criminal de 1.957-1.958 transformou-se em escabinado, sendo que os membros, juntamente com os juízes deliberam acerca dos fatos e dos pontos de direito.

Mossin (2009, p. 171) também faz referencia ao modelo vigente na América, citando a eliminação do Júri do México no ano de 1.929, “[...] tendo em linha de consideração

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seus sonoros e indiscutíveis fracassos naquele país, pois, ainda que fosse um espetáculo, não fazia justiça”.

Da obra de Marques (2009) colhem-se opiniões divergentes à Mossin no tocante à origem do Júri. Cita o autor contemporâneo Rogério Lauria Tucci, que se refere aos antecedentes do Tribunal do Júri na lei mosaica, nos dikastas, na Heliéia, ou no Aerópago gregos, assim como nos primitivos germanos, além da Inglaterra, que o teria disseminado no restante da Europa e na América. Afirma que para Tucci a gênese do Júri encontra-se em Roma, no período do sistema acusatório, remetendo o julgamento do individuo aos seus pares diante da observância de determinadas regras.

Depreende-se de Marques (2009, p. 21):

Ao defender a origem romana da instituição, Tucci destaca que: autores

contemporâneos preferem, todavia, quiçá mais comodamente, vislumbrar seu nascimento na Inglaterra, ou, então, e com maior simplicidade, sequer enfrentar esse importante aspecto fenomenológico do tema versado.

Marques (2009) continua referenciando Tucci ao apontar que no exercício da justiça ateniense já existiam cidadãos designados para julgamentos coletivos, lhes sendo exigidos, como requisitos: idade de trinta anos, reputação ilibada e quitação plena do tesouro público. Antes mesmo da existência desse tribunal de pares, o Deuteronômio, o Êxodo, o Levítico e os Números já mencionavam o Tribunal Ordinário, o Conselho dos Anciãos e o Grande Conselho, encontrando-se na legislação mosaica a origem da instituição do Júri. Entretanto, defende que o embrião do Tribunal Popular pode ser visto em Roma, nas

questiones perpetue. Com a Lex Calpurnia (149 a.C.) instituindo a primeira questio, uma

espécie de comissão de inquérito, cuja finalidade era investigar e julgar casos de funcionários estatais que tivessem causado prejuízos a provincianos. Nesse passo colaciona:

[...] A quaestio era formada por um presidente (praetor vel quaesitor) e, no máximo,

cinqüenta cidadãos (iudices iurati), escolhidos, de início, entre os senadores; posteriormente, com a Lex sempronia, proposta por Caio Gracco (122 a.C.), entre senadores, cavaleiros e tribuni aerarii, uma terça parte de cada ordem.

(MARQUES, 2009, p 21).

Gomes e Sica (2005) discorrem que durante muito tempo, antes das monarquias, a justiça era exercida pelo povo. Dos romanos citam os judices juratis e dos gregos os diskatas. Entretanto afirmam que em que pese tal bagagem, foi na Inglaterra que a justiça popular tomou força. Salientam que atualmente o modelo inglês é um dos mais parecidos com o sistema vigente no Brasil. Segundo os autores, o Júri clássico – participação popular na

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administração da justiça – provavelmente foi importado para a Inglaterra após sua conquista pelos Normandos (1.066). Nessa época lhe foi atribuído o nome juror, pois os cidadãos, sob um juramento, se reuniam para proferir o julgamento. Em 1.215, a Carta Magna do Rei João sem Terra previa em seu art. 9º o direito “de um homem livre ser julgado por seus pares”. No ano de 1.367 o procedimento sofreu uma alteração, devendo haver unanimidade entre os veredictos. Inicialmente os jurados eram doze, o que remetia aos doze apóstolos reunidos no Dia de Pentecostes. Esses jurados eram escolhidos conforme conhecimento técnico específico que possuíssem sobre a causa. Entretanto, o inverso ocorria no século XVIII, em que os jurados que tivessem conhecimento técnico acerca do caso a ser julgado, deveriam solicitar sua exclusão do procedimento.

Ainda de acordo com Gomes e Sica (2005), no século XVII a instituição do Júri se instalou de forma definitiva na Inglaterra, seguida dos Estados Unidos, decorrência da colonização. Até a metade do século XIX, o Júri era a única forma de julgamento nos países da common-law e, paralelamente na Alemanha, surgiram as cortes-mistas (escabinados). E no início do século XX ainda era predominante na resolução de conflitos, tanto na esfera cível quanto na penal.

A Espanha reinstituiu o tribunal popular em 1.995 – abolido pela ditadura de Franco – através da Ley del Tribunal del Jurado, sendo composto de juízes togados e juízes leigos, o que é adotado praticamente em toda Europa Continental. Citam a Revolução Francesa de 1.789, que através de uma lei de 16 de setembro de 1.791, influenciada pela obra de Montesquieu – O Espírito das Leis – instituiu o Júri clássico na França. Oportuno colacionar que tal modelo perdurou por quase cem anos no país. (GOMES; SICA, 2005).

De acordo com Leão (2001) a origem do Tribunal do Júri também remonta a história da Inglaterra, aproximadamente em 1.215. Nessa época o Concílio de Latrão havia abolido as ordálias e os juízos de Deus. Nascia neste momento o Tribunal Popular. Cita a obra de Marcos Cláudio Acquaviva, em que transcreve os dizeres de Vicente de Paula Vicente de Azevedo:

Abolidas as torturas na Inglaterra em face do Concílio de Latrão, o fato é que, caracterizada por fé robusta, existia, a par da religião, com seus ritos e dogmas, um conjunto de tradições e escusas que exerciam, mesmo fora da autoridade religiosa, império sobre os espíritos. Entre essas crenças generalizadas, ou superstições populares, havia a seguinte convicção: em lembrança dos doze apóstolos que haviam recebido a visita do Espírito Santo, quando doze homens de consciência pura se reuniam sob a invocação divina, a verdade infalivelmente se encontrava entre eles. Desta crença teria nascido o Júri. A origem mística e o caráter religioso se observam ainda na fórmula do juramento do Júri inglês. Há a invocação expressa de Deus.

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2.2 O JÚRI NO BRASIL

Almeida (2005) afirma que o Júri foi instituído no Brasil em 18 de junho de 1.822, no período imperial, com jurisdição para apreciar os crimes de imprensa, sob inspiração legislativa do Senado da Câmara do Rio de Janeiro, recepcionada pelo então Príncipe Regente Dom Pedro de Alcântara. Nesta época, as decisões do colegiado – composto por vinte e quatro cidadãos honrados, inteligentes e patriotas – admitiam apelação única e direta ao Príncipe Regente. Salienta que o tribunal era desprovido de força soberana, haja vista a qualificação de homens bons estar estreitamente ligada à renda e patrimônio mínimos determinados, elevando o Júri a um patamar de privilegiados em uma sociedade conservadora e escravista, mas de toda forma tratava-se de “avanço à morosidade cultural de antanho”.

O Brasil conheceu o júri ainda sujeito às ordenações Filipinas, sem o que se pode nomear como um quadro evolutivo dos processos e práticas jurídicas, perante suas antecessoras históricas, Manuelinas e Afonsinas, refletindo mais a vaidade de sucessões reais do que exatamente um curso de civilização daquela parcela do “mundo em europeização”. (ALMEIDA, 2005, p. 36).

Gomes e Sica (2005) salientam que excluindo a Constituição do Estado-novo de Getúlio Vargas, todas as demais Constituições traziam em seu bojo a previsão do tribunal popular. Na Constituição de 1.824 o Júri se encontrava inserido no sistema judiciário. Em 1.891, 1.946, 1.967, Emenda 1/69 – não se estabeleceu de forma clara a soberania dos veredictos – e de 1.988 em que o Júri foi elevado ao status de direito e garantia fundamental.

A Magna Carta de 1.988, em seu art. 5º, XXXVIII, reconhece o Júri com a forma que a lei lhe aprouver, assegurados a plenitude de defesa, o sigilo nas votações, a soberania dos veredictos e a competência para julgamento de crimes dolosos contra a vida. Disciplinado no Código de Processo Penal, trata-se de procedimento bifásico e extremamente moroso.

2.2.1 Evolução constitucional do Tribunal do Júri

Almeida (2005) aponta em sua obra uma evolução constitucional do Júri no Brasil. Iniciando pela Constituição Imperial, de 25 de março de 1.824, em que o Júri estava

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“inserido na porção reservada ao Poder Judiciário” e obteve um alargamento em sua competência para diversas condutas típicas e litígios cíveis.

Preconizava o art. 151 que “O Poder Judiciário é independente, e será composto de Juízes e Jurados, os quaes terão lograr assim no Cível, como no Crime nos casos, e pelo modo, que os códigos determinarem”. O art. 152 concedia aos magistrados a prerrogativa da aplicação da lei conforme o pronunciamento do Tribunal Leigo: “Os Jurados pronunciam sobre o facto, e os Juízes applicam a Lei”.

Almeida (2005) destaca, ainda, que dentre as modificações introduzidas, o Código de Processo Penal do Império, de 29 de novembro de 1.832, cujo conselho era dividido em dois, sendo um Júri de Acusação formado por vinte e três membros e, um Júri de Julgação composto de doze membros. Tornaram-se requisitos para o jurado “ser eleitor, externar bom senso e probidade”, o que minimizou a elitização anterior. Entre os anos de 1.841 e 1.842, a Lei n. 261 e o Regulamento n. 120 extinguiram o Júri de Acusação. Assim conclui o autor, à p. 37: “De então, vencidas Redações Legislativas (Leis n◦s 562/1850 e 2.033/1871; Regulamento n◦ 707/1850; Decreto n◦ 4.824/1871), que mais desfizeram suas próprias alterações, o Júri marchou para a “República dos Marechais”.

Ao mencionar a 1◦ Carta Republicana de 24 de fevereiro de 1.891, o “art. 72, §31 manteve-se fiel à instituição do Júri, subtraindo-o da esfera constitucional do Poder de Julgar, para destacá-lo entre os direitos e garantias individuais e coletivos”. Ocorre que o texto do artigo 72, diante da perfunctoriedade referencial trazia: “É mantida a instituição do jury”, o que resultou em ferrenho embate jurídico. Oportuno mencionar que, em 03 de setembro de 1.926 o art. 72 foi alterado através de Emenda Constitucional, sem qualquer alteração benéfica à instituição do Júri.

É citando Ruy Barbosa que Almeida (2005, p. 38) referencia a síntese redacional do art. 72:

É mantida a instituição do jury, declara ali o pacto de 1891. A attenção do intérprete deve fixar-se na expressão manter, aqui excepcionalmente empregada pelos autores da Constituição. Manter é conservar o que está, em condições que lhe não alterem a identidade. O legislador, nesta parte, não se limita a assegurar a instituição do jury, á similhança do que faz em relação a outras garantias liberaes: manda respeital-a na situação em que a encontrou. Isto é, não contente de lhe affiançar a existencia, caracteriza-o, prorrogando a duração da entidade preexistente. Essa clausula tem, portanto, o duplo valor de uma garantia e uma definição. Resolve continuar as fórmas tutellares do jury, taes quaes as fixára o uso nacional, apoiado no das outras nações. A palavra adoptada nesse contexto significa o apreço extraordinario, que, entre todas as fórmas protectoras da liberdade, merecia aos constituintes esse tribunal. Ella não fossiliza o jury, cerrando-o hermeticamente a alterações accessorias, que possam melhoral-o, fortalecendo-lhe, e aprimorando-lhe as virtudes: melhoral-o, na direcção das suas qualidades essenciais é, sem duvida

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conserval-o. Mas obsta de modo inflexivel a inovações, que, sob o nome de reforma, o modifiquem organicamente, demudando-lhe as feições caracteristicas, e interessando-lhe os elementos sbstanciaes.

E conclui afirmando:

É com assumida razão a preocupação interpretativa, egressa da “economia constituinte”, dela sobressaindo-se, entretanto e uma vez mais, a resistência da instituição popular, constitucionalmente protegida e mais dificilmente modificável em seu malefício próprio – o tempo enrije-se os institutos positivos que a vontade humana, nem sempre progressista, não consegue destruir... porque não pode... delas precisa. (ALMEIDA, 2009, p. 38).

Citando a Constituição de 16 de julho de 1.934, a primeira do século XX, Almeida (2005, p. 38-39) aponta a primeira agressão contra o Júri, haja vista retroceder a atitude anunciada na Carta anterior, deslocando o instituto do Júri do capítulo “Dos Direitos e Garantias Individuais” para o capítulo “Do Poder Judiciário”. O art. 72 previa: “É mantida a instituição do jury, com a organização e as atribuições que lhe der a lei”. Afirma ainda, que esta diferenciação fragilizou tecnicamente o instituto, “teoricamente permitindo mudanças procedimentais com menor rigor legislativo, e por outra deflagrou novos embates entre juristas de escol”.

Ao referenciar a Constituição de 10 de novembro de 1.937, a chamada Lei da ditadura Vargas, período de intervencionismo em nome do Estado, Almeida (2005) trata como o mais violento golpe contra o Júri. Inicialmente houve omissão acerca de referencias embora mantivesse em vigor o instituto no art. 183: “Continuam em vigor, enquanto não revogadas, as leis que, explícita ou implicitamente, não contrariem as disposições desta Constituição”. Entretanto, foi no ano seguinte que o Decreto-Lei 167 de 05 de janeiro condenou a existência do Júri. Esta traição ao Júri, conforme palavras do autor, flagrou o autoritarismo contra a cidadania de modo vexatório, haja vista o Júri manter-se formalmente, entretanto podado de qualquer força soberana.

Nesse sentido, Almeida (2005, p. 39) perfaz do seguinte entendimento:

Contudo, havendo sempre que goste do rejeito, o pseudo fortalecimento do Poder Judiciário foi louvado por alguns como mecanismo de contenção de excessos diagnosticados no Tribunal do Povo, emanados de causas variadas, com registros egressos do mando e da corrupção entre poder e politicagem, amigos quase sempre inseparáveis. Insofismável, entretanto, é que alguns comprometimentos de células do Júri, no que condiz à sua manipulação fatual, existiam mais intensamente pela própria ingerência dos poderes dominante e governante, porém abalados porque nem sempre já aquele Tribunal Popular respondia satisfatoriamente às suas pretensões politicamente protetoras ou perseguidoras, conforme a situação do eleitor sub judice ou de seu chefe político, pois afinal, cedo ou tarde, o processo de civilização

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histórico-sociológico passa a se impor, nem que homeopaticamente seja. É de um velho coronel da política: “amigo meu não erra, engana-se; inimigo meu, se não

tiver defeito, é fácil arranjar-lhe alguns”.

Em que pese o período de retrocesso salientado pelo autor, foi na Constituição de 18 de setembro de 1.946 que houve o resgate da democracia brasileira com a soberania do Júri. À época, os Estado Unidos do Brasil restauraram a democracia por meio da Constituição, e dentre outros atos, reintroduziu o Tribunal do Júri no capítulo dedicado aos direitos e garantias individuais. Assim, devolveu-se ao instituto a soberania dos veredictos, que até o presente momento era relativa, passando à absoluta. É o que se colhe do art. 141, § 28:

É mantida a instituição do júri, com a organização que lhe der a lei, contando que seja sempre ímpar o número de seus membros e garantido o sigilo das votações, a plenitude da defesa do réu e a soberania dos veredictos. Será obrigatòriamente da sua competência o julgamento dos crimes dolosos contra a vida.

Ao discorrer acerca do artigo acima transcrito Almeida (2005) salienta a questão da soberania absoluta das decisões oriundas do Júri. Justifica que é facilmente dedutível do texto constitucional expresso, quanto pela evidente necessidade do Estado Democrático, como exigência da cidadania. Nesse período a legislação infraconstitucional que regulamentava o instituto se dava pela Lei 263/48, que fora inserida no Código de Processo Penal de 1.941 (art. 543, III, d), que em referencia ao seu art. 8º, admitia o manuseio de recurso apelatório para combater os veredictos populares, atribuindo aos Tribunais ad quem a competência de determinar o retorno dos autos ao julgamento do Tribunal a quo uma única vez sempre que a decisão do Júri Popular fosse tida como errônea, em face de ser proferida manifestamente contrária à prova dos autos, não lhe atribuindo, ao contrário do Decreto-Lei 167, poder para modificá-la.

Conclui Almeida (2005, p. 41):

Era (e permanece sendo) a razão do poder sobrepujando a constitucionalidade, a liberdade, a valorização dos direitos e garantias do homem, expressados na vontade do povo, fonte do poder, que julga seus pares, e somente poderá evoluir esta prática pelo exercício do seu uso, à mercê, obviamente, de mudanças estruturais positivas a maior credibilidade do sistema de julgamento popular, o que depende, com patente sobrepujança, de vontade política.

Discorre, ainda, Almeida (2005, p.41-42) acerca da Constituição de 24 de janeiro de 1.967, em que os generais retornaram ao poder determinando nova constituição, e sobre a Emenda n.◦ 01 de 17 de outubro de 1.969. A Constituição outorgada em 1.967 manteve o

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Tribunal do Júri entre os direitos e garantias individuais, “embora sob o jugo opressor da legalidade positivista da força das baionetas”.

O art. 150, § 18, rezava: “É mantida a instituição e a soberania do júri, que terá competência no julgamento dos crimes dolosos contra a vida”. Afirma de forma textual que assumindo o caráter coator, a emenda imposta em 1.969 se desmascarou, suprimindo termo soberania, de forma que o art. 153, § 18, passou a constar: “É mantida a instituição do júri, que terá competência no julgamento dos crimes dolosos contra a vida”. (ALMEIDA, 2005)

Ante tais alterações, aduz o autor que o Júri manteve-se sem os patamares da Constituição democrata de 1.946. Desta forma, salienta:

Permaneceu, assim, a instituição disponível à operacionalização do direito pátrio. Mas, no que pertence àqueles duros anos de opressão sem democracia e desmandos sem cidadania, segundo a imperativa “vontade das armas”, em que, de fato (e sob

pretenso direito; o positivismo da razão desumana), a vontade do mando no poder,

com a escusa de representação estatal, tudo podia, tudo fazia, exceto converter as consciências dos verdadeiros (e nem sempre assumidos publicamente) democratas. (ALMEIDA, 2005, p. 42).

E finaliza citando a Constituição de 05 de outubro de 1.988 – a Constituição Cidadã – em que o Tribunal do Júri se firmou no inciso XXXVIII do art.5º. Inserido na porção reservada aos direitos e deveres individuais e coletivos, a Magna Carta lhe assegurou a plenitude de defesa, o sigilo das votações, a soberania dos veredictos e a competência para julgar os crimes dolosos contra a vida. Contextualizando que:

Cadente é a proteção que destina ao art. 5º a disposição inflexível do art. 60, § 4º, IV, impedindo qualquer modificação mandamental intermediada por Emenda, castrando, assim, a ação, às vezes perversa, do Poder Constituinte Derivado. É que o § 4º aloja as denominadas cláusulas pétreas (não petrificadas, todavia). (ALMEIDA, 2005, p. 42-43).

Almeida (2005) conclui afirmando que a Constituição de 1.988 é a chegada de novos tempos, em que os direitos fundamentais estão em permanente evolução, surgindo uma geração de direitos magníficos, indiscutivelmente constituindo uma quarta geração, considerando a dignidade da pessoa humana e inspirando legislações democráticas por todo o mundo.

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Da obra de Moraes (2006) colhe-se que o Tribunal do Júri, de origem anglo-saxônica, é observado como uma prerrogativa democrática do cidadão, sendo este julgado por seus semelhantes. Para o autor trata-se de um Tribunal Popular, de essência e obrigatoriedade constitucional, regulamentado por lei ordinária.

Conforme Leão (2001), a Constituição de 1.988, dotada de espírito democrático veio reafirmar a identidade constitucional do Tribunal do Júri em seu art. 5º, inciso XXXVIII e alíneas, sendo de forma sábia incluído como partes dos Direitos e Garantias Fundamentais. Afirma que o lastro do Tribunal do Júri versa sob a regulamentação e organização do Júri mediante legislação infraconstitucional, desde que assegurados a plenitude de defesa, o sigilo das votações, a soberania dos veredictos e a competência para julgamento de crimes dolosos contra a vida. Para o autor, a plenitude de defesa está ligada à concessão de igualdade de condições ao réu, para que possa contra-arrazoar tudo que lhe for dito em desfavor. Para que o julgamento proferido alcance justiça, aponta a necessidade de a balança estar equilibrada. Nesse diapasão, defesa e acusação deverão possuir as mesmas oportunidades para tentar convencer os jurados. No que se refere ao sigilo das votações, cita-o como condição necessária para proteger a livre manifestação de pensamento dos jurados.

Ainda ao discorrer acerca do sigilo nas votações Leão (2001) correlaciona esta liberdade à consciência da responsabilidade social do papel desempenhado pelo jurado, devendo permanecer imune às interferências externas para proferir o veredicto. Enfatiza acerca do papel atribuído ao Juiz-Presidente do Tribunal do Júri, que deverá permanecer em um estado de atenção permanente, promovendo a vigilância e coibindo toda e qualquer forma de interferência no momento das votações, assegurando o sigilo.

No tangente a soberania dos veredictos Leão (2001) atribui um caráter de imutabilidade à decisão proferida pelo Conselho de Sentença. Justifica tal atribuição citando, ante a inadmissão de “juízes togados exercerem, concomitantemente, o judicium rescindens e o judicium rescisorium, porque há impossibilidade de a decisão alicerçada em veredicto dos jurados ser subtraída, quiçá substituída, por outra sentença sem esta base" (BULOS, 2000 apud LEÃO, 2001). Ressalta que o preceito constitucional da soberania dos veredictos não pode ser sinônimo de uma “onipotência desmedida”, citando, inclusive, a possibilidade de realização de novo julgamento quando os jurados decidirem de forma manifestamente contrária às provas dos autos.

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Não permitiram, em nenhum caso, pudesse a instância superior reexaminar a causa e proferir a decisão adequada. Autorizaram ao Tribunal ad quem corrigir as distorções, quando o erro partir do Presidente do Júri, jamais quanto ao pronunciamento do Conselho de Sentença.

De acordo com Moraes (2006, p. 77) a possibilidade de apelação quando a decisão dos jurados for manifestamente contrária às provas dos autos não afeta a soberania dos veredictos, haja vista a nova decisão também ser proferida pelo Júri popular. Segundo o autor este é o entendimento do Supremo Tribunal Federal, “que declarou que a garantia constitucional da soberania do veredicto do júri não exclui a recorribilidade de suas decisões. Assegura-se tal soberania com o retorno dos autos ao Tribunal do Júri para novo julgamento”. Cita, ainda, a revisão criminal, afirmando entender-se que diante do princípio da proporcionalidade, deverá prevalecer o princípio da inocência em relação à soberania dos veredictos.

Leão (2001) relaciona a competência do Tribunal do Júri para crimes dolosos contra a vida com a tutela de valor constitucional supremo acerca da vida humana, afirmando ser dela a fonte para os demais direitos de personalidade, “imprescindíveis à realização do ser humano enquanto pessoa”. Elenca em sua obra os tipos penais sujeito ao julgamento popular: homicídio (art. 121, CP), induzimento, instigação ou auxílio ao suicídio (art. 122, CP), infanticídio (art. 123, CP) e aborto (arts. 124 a 127, CP), tanto nas modalidades tentadas quanto consumadas. Salienta ser esta a competência mínima do Tribunal do Júri, sem óbices à lei declinar outras competências ao tribunal popular. Oportunamente menciona que, em determinadas situações, crimes dolosos contra a vida não serão julgados pelo Tribunal do Júri. É o que ocorre com as chamadas competências especiais por prerrogativa de função, ou seja, quando tais crimes forem praticados por autoridades que gozem de foro privilegiado no bojo da própria Constituição.

Moraes (2006) ressalta que o art. 5º, XXXVIII, não deve ser entendido de forma absoluta, uma vez que existem hipóteses excepcionais em que crimes dolosos contra a vida não serão julgados pelo Tribunal do Júri.

Assim, todas as autoridades com foro de processo e julgamento previsto diretamente pela Constituição Federal, mesmo que cometam crimes dolosos contra a vida, estarão excluídas da competência do Tribunal do Júri, pois, no conflito aparente de normas da mesma hierarquia, a de natureza especial prevalecerá sobre a de caráter geral definida no art. 5º, XXXVIII, da Constituição Federal.

Esta regra se aplica nas infrações penais comuns cometidas pelo Presidente da República, Vice-Presidente, membros do Congresso Nacional, Ministros do Supremo Tribunal Federal, Procurador-Geral da República, Ministros de Estado, membros dos Tribunais Superiores, do Tribunal de Contas da União e pelos chefes de missão diplomática de caráter permanente, conforme jurisprudência pacífica, pois

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já se firmou posição no sentido de que a locução constitucional “crimes comuns”, prevista nos art. 102, I, b e c, da Constituição Federal abrange todas as modalidades de infrações penais, inclusive os crimes dolosos contra a vida, que serão processados e julgados pelo Supremo Tribunal Federal.

Igualmente, aplica-se nos denominados “crimes comuns” praticados por governadores dos Estados e do Distrito Federal, desembargadores dos Tribunais de Justiça dos Estados e do Distrito Federal, membros do Tribunal de Contas dos Estados e do Distrito Federal, dos Tribunais Regionais Federais, dos Tribunais Regionais Eleitorais e do Trabalho, membros dos Conselhos ou Tribunais de Contas dos Municípios e do Ministério Público da União que oficiem perante tribunais, que sempre serão, nos termos do art. 105, I, a, da Constituição Federal, processados e julgados pelo Superior Tribunal de Justiça.

Ainda, no caso de crimes dolosos contra a vida praticados por Prefeito Municipal, em face da maior especialidade, aplica-se o art. 29, X, da Constituição Federal, competindo o processo e julgamento ao Tribunal de Justiça.

Ressalte-se, por fim, que o processo e julgamento de crimes dolosos contra a vida praticados pelos órgãos do Poder Judiciário e pelos membros do Ministério Público, em razão de determinação do foro competente por norma direta da Constituição Federal, não serão julgados pelo Tribunal do Júri, mas sim pelo Tribunal competente, por prevalência da norma de caráter especial. (MORAES, 2006, p. 78-79).

Conclui afirmando que a competência do Júri não é absoluta, haja vista a própria Constituição prever, em face da dignidade de certos cargos e da relevância destes para o Estado, a competência de Tribunais para julgamentos conforme os arts. 29, VIII; 96, III; 108, I, a; 105, I, a; 102, I, “b” e “c”.

Moraes (2006, p. 80) aponta, ainda, entendimento do Supremo Tribunal Federal acerca de hipóteses de conexão e continência:

Envolvimento de co-réus em crime doloso contra a vida, havendo em relação a um deles prerrogativa de foro como tal definida constitucionalmente, não afasta, quanto ao outro, o juiz natural revelado pela alínea d do inciso XXXVIII do art. 5º da Carta Federal. A continência, porque disciplinada mediante normas de índole instrumental comum, não é conducente, no caso, à reunião dos processos. A atuação de órgãos diversos integrantes do Judiciário, com duplicidade de julgamento, decorre do próprio texto constitucional, isto por não se lhe poder sobrepor preceito de natureza estritamente legal.

E ressalta que em decorrência do poder constituinte derivado decorrente de auto-organização, corolário da autonomia federal prevista no art. 18 da CF, as Constituições Estaduais poderão atribuir aos seus agentes políticos prerrogativas de função de natureza processual penal, fazendo com que membros do Poder Legislativo ou Secretários de Estado, por exemplo, sejam julgados pelos seus respectivos Tribunais de Justiça. Entretanto, só será possível a supressão da competência constitucional do Tribunal do Júri pelas Constituições Estaduais quando houver paradigma na Constituição Federal, ou seja, se na Magna Carta não houver expressamente prerrogativa de foro aos agentes públicos federais, não poderá a Constituição Estadual conceder aos respectivos agentes estaduais.

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Nesse sentido colaciona a Súmula 721 do STF: “A competência constitucional do Tribunal do Júri prevalece sobre o foro por prerrogativa de função estabelecida exclusivamente pela Constituição estadual”.

2.2.2.1 Princípios constitucionais vinculados ao Júri

Colhe-se dos dizeres de Almeida (2005) que a Constituição Federal é o ancoradouro reservado aos princípios de cada nação de vigência soberana e democrática. Tratam-se de construções abstratas inclusas em completo espaço teórico ordenado e pacífico, que regem a vida em sociedade conforme diretrizes da Carta Magna. Segundo o autor os princípios comandam as regras e não admitem desatenções, sob pena de trair todo o ordenamento jurídico, devendo ser utilizados na solução de conflitos, obedecendo um escalonamento. Em que pese nem todos os princípios favorecerem da mesma maneira todas as áreas do direito, todos se encontram interligados pela possibilidade de utilização. Os princípios revelam sua força de engrandecimento e modificações sociais nas situações de fato, onde eles são apropriadamente manuseados. Cita como princípios constitucionais diretamente vinculados ao instituto do Júri os princípios da legalidade, da reserva legal, do juiz natural, da igualdade, do contraditório e ampla defesa, da presunção de inocência, do favor rei, da verdade real, da oralidade, da proibição de provas ilícitas, da publicidade, do devido processo legal, da segurança jurídica e da proporcionalidade.

Vieira (2003) refere-se ao procedimento do Júri como a maneira mais eficaz de atender aos princípios que regem o processo criminal. Segundo a autora o contraditório se materializa diante dos efetivos debates entre as partes, de forma que o juiz-presidente lhes assegure a igualdade. O princípio da oralidade resta configurado pelo fato de as provas serem produzidas e sustentadas à viva-voz. Salienta, ainda, que a publicidade resta inerente a todo procedimento, exceto no tocante ao sigilo das votações (art. 5º, XXXVIII, b, CF).

Nesse sentido, D’Angelo (2005) afirma que os princípios sempre estarão acima de quaisquer normas, mesmo que o legislador assim não entenda, haja vista não ser competência deste e sim do Poder Judiciário e do próprio Tribunal do Júri.

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Segundo Monssin (2009) atualmente encontra-se em vigor o CPP de 1.941. Em 23 de fevereiro de 1.948, com o advento da Lei 263 vários artigos do Código de Processo Penal tiveram seu texto alterado, sendo que alguns ainda se encontram em vigor. A Lei n.◦ 5.941 de 1.973 alterou alguns preceito processuais penais, entretanto não se encontram mais em vigor. E no ano de 1.995 a Lei n.◦ 9.033 deu nova redação ao art. 408, § 1º, que se encontra em vigor até hoje.

O autor aduz que Júri é a instituição jurídica formada por homens de bem a quem se atribui o dever de julgar acerca dos fatos levados ou trazidos ao seu conhecimento. Trata-se de um tribunal especial, composto por um juiz presidente e vinte e cinco jurados, dos quais sete serão sorteados para compor o conselho de sentença. Salienta Monssin (2009, p. 189) que a denominação Tribunal do Júri inclui, além dos jurados e do juiz togado, todos os auxiliares de justiça, sendo assim, um órgão complexo da jurisdição.

Ao júri, compreendido como a instituição popular, ou mesmo magistratura popular, atribui-se o encargo de afirmar ou negar a existência do fato criminoso imputado a uma pessoa, costuma denominar-se, propriamente, de conselho de sentença.

A denominação de juízes de fato atribuída ao conselho de sentença tem fulcro na singular circunstância de que este colegiado popular somente aprecia matéria fática ligada à imputação increpada ao acusado.

Não obstante dizer-se que ao júri compete julgar o crime ou delito, não lhe cabe

aplicar a pena: é atribuição do juiz-presidente, que, impondo-a, guardará a sanctio legis, segundo as circunstancias elementares ou qualificativas evidenciadas pelo júri.

Portanto, a aplicação de matéria de direito é incumbência do magistrado que preside a sessão do júri, e nem poderia ser de outra forma, mesmo porque para aplicar o direito é imprescindível que a pessoa tenha formação na área jurídica e exerça atividade profissional neste sentido, representando o Estado quanto ao ius puniendi. O julgamento proferido pelo júri resulta no reconhecimento de fatos constantes do processo e trasladados para o questionário (rol de quesitos), a ser respondido pelos jurados, consoante seu compromisso, sem trair sua honra e sua consciência.

Goulart (2008, p. 9-10) discorre em sua obra que o procedimento do Júri se distingue do procedimento ordinário por conter duas fases, sendo a primeira do juízo de formação de culpa – judicium accusationis – e a segunda do julgamento – judicium causae – sendo então, denominado um procedimento bifásico. Na primeira fase existe ampla possibilidade de produção de provas, constituindo um juízo de admissibilidade da imputação, sendo este o momento de fixação dos limites “com que essa admissibilidade vai ser apresentada em plenário, isto se não for suprimida do julgamento pelo tribunal popular por eventual decisão de impronuncia, de absolvição sumária ou de desclassificação do delito imputado ao réu”.

Segundo Mirabete (2005) a instrução processual dos processos de competência do Júri Popular ocorre conforme os arts. 394 a 405 (crimes punidos com reclusão). Encerrada a

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primeira fase, que é semelhante em ambos os procedimentos, o processo para a seguir os ditames dos arts. 406 a 497, que tratam especificamente do Júri.

2.3 TRIBUNAL DO JÚRI E DIREITO COMPARADO

Segundo Bonfim (2007) a América do Sul desconhece composição do Júri análoga ao modelo brasileiro. Aponta a inexistência do instituto na Holanda, bem como as diferenças no modelo Belga, em que doze jurados deliberam sobre a culpabilidade antes de se reunirem com três magistrados para decidir a pena a ser aplicada. O mesmo ocorre na Dinamarca, diante do “Tribunal Correcional”. Resgatando a origem do Júri brasileiro, aponta o “tribunal de escabinados” da Suécia, chamado de nämnd, que existe apenas para julgamento de delitos de imprensa. Já no modelo suíço, conforme Bonfim (2007), cada grupo de pequenas cidades ou vilas tem procedimento próprio. Em Genebra, como exemplificou, doze jurados e três magistrados compõem o Tribunal Criminal de Valais. Na Alemanha, o Júri tradicional deixou de existir em 1.925, diante da instituição do “escabinado”, figurando os assessores, que se tratam de dois jurados eleitos pelo período de quatro anos, “tomando assento ao lado de três magistrados”.

Conforme Gomes e Sica (2005) o sistema alemão não é acusatório puro, havendo cortes-mistas com duas composições: as Amstgericht – com um juiz profissional e dois juízes leigos – e as Landgerischt – com dois profissionais e três leigos, utilizadas conforme a gravidade dos crimes.

Bonfim (2007, p. 08) contextualiza o sistema vigente no Reino Unido.

Por outro lado, na Inglaterra – tão grande é sua respeitabilidade que o Júri é uma espécie de “vaca sagrada” na expressão de Spencer – encontramos doze como o número de jurados, número este de quinze na Escócia. No Reino Unido, contudo, é tamanha a gama de variantes possíveis na forma procedimental (processo) que impossível qualquer razoável comparação.

Gomes e Sica (2005) apontam como interessante e adequada a forma de apelação no modelo italiano, haja vista a devolução do conhecimento da matéria recorrida se dar perante outro Conselho de Sentença, também misto, fazendo com que o recurso não seja apreciado com extremo tecnicismo.

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A Argélia, segundo Bonfim (2007), importou o modelo francês, fazendo constar no art. 258 do Código de Processo Penal um Tribunal Criminal, composto de três magistrados e quatro assessores jurados sorteados para a sessão trimestral. O modelo Marroquino era similar, entretanto, com o advento da lei publicada em 28 de setembro de 1.974 os assessores jurados foram substituídos por magistrados, compondo as Câmaras Criminais do Tribunal de Apelação, o que o descaracterizou. Aduz que procedimentos semelhantes podem ser observados por toda a África francofônica.

Bonfim (2007) menciona ainda a Ásia, afirmando que na Coréia do Sul inexiste Júri e no Japão o instituto é ignorado, mesmo diante do fato de seu sistema judiciário ser muito semelhante ao adotado nos Estados Unidos. Todavia, existem relatos de que a prática do Júri os interessa, haja vista registros da imprensa européia, que recentemente, durante o

affaire Carrefour du Développement, vários professores e juízes japoneses acompanharam

com interesse o julgamento proferido pela Cour d’Assises. Pontuou brevemente acerca da existência de formas semelhantes ao Júri em países como Canadá, Áustria, Austrália, Grécia, Noruega e Nova Zelândia e, semelhantes ao escabinado na Europa Oriental – Búlgaria, Polônia, Rússia e Rômenia.

2.3.1 O modelo norte-americano

Tourinho Filho (2009) afirma que atualmente o Júri perdeu a importância que lhe era atribuída em outras épocas. Cita a Europa Continental onde apenas Bélgica, Espanha e parte da Suíça o admitem. Ocorrendo o mesmo na Austrália, África do Sul, Inglaterra e Estados Unidos. O autor aborda o sistema norte americano por suas características próprias:

O denominado Petty Jury, constituído de doze pessoas sorteadas dentre os eleitores da comunidade, além da função de julgar procedente ou improcedente a acusação, pesa-lhe ainda a de recomendar ao Juiz sobre a pena a ser imposta. Após a produção das provas, os jurados, e somente eles, reúnem-se na sala secreta e ali discutem sobre a responsabilidade ou não do acusado. Se optarem pela condenação, a decisão deve ser unânime. Não o sendo, a legislação de alguns Estados opta pela absolvição do réu, e em outros, o Juiz-Presidente declara que o julgamento foi incorreto (mistrial) e determina a convocação de novo julgamento. No júri norte-americano, o Juiz-Presidente se limita a policiar a sessão e zelar pelo fairness (a igualdade de condições conferida às partes): não interroga o réu nem ouve vítima, testemunhas ou peritos. Essa função é exclusiva das partes. (TORINHO FILHO, 2009, p. 42).

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Conforme Bonfim (2007), nos Estados Unidos, ante as variadas formas de Júri, ocorrem conflitos entre a legislação federal e estadual, se assemelhando ao modelo que concebemos – os Trial Juries. Entretanto, diferencia-se do modelo brasileiro pela composição (que é de doze jurados), pela necessidade de votação unânime, além da inexistência da “incomunicabilidade entre os jurados” e do “sigilo das votações”.

Goulart (2008) salienta que no modelo norte-americano, antes de o réu submeter-se ao julgamento do tribunal popular, há necessidade de que os argumentos da acusação submeter-sejam aceitos pelo Grand Jury (indictment) ou que a acusação tenha sido formulada pelo próprio

Grand Jury (presentment). Dessa forma, o Grande Júri exerce um juízo de admissibilidade de

forma semelhante ao juiz da pronúncia no modelo brasileiro.

Ademais, Goulart (2009, p. 77) especifica o procedimento:

Nas cortes federais, o grande júri deve ser composto por um número de membros não inferior a 16 nem superior a 25, bastando o voto da maioria para que a acusação seja aceita contra o réu, encaminhando-o a julgamento pelo pequeno júri.

A seleção dos 12 cidadãos que participarão do julgamento (integrantes do pequeno júri) ocorre em etapa prévia, denominada voir dire, momento em que as partes podem oferecer suas recusas, justificadas ou não. Há um limite às recusas imotivadas, não havendo limitação àquelas acompanhadas de alguma causa que as autorize.

Na fase da escolha, possuem as partes ampla liberdade na formulação de indagações aos jurados (visando à seleção de dos que irão compor o conselho de sentença) [...]. Feita a seleção dos jurados que irão compor o pequeno júri e instalada a sessão de julgamento, as partes apresentam suas alegações iniciais, oportunidade em que o órgão julgador toma conhecimento da imputação e de sua negativa, bem como das provas que serão produzidas. Em tal momento, a atuação das partes cinge-se à elaboração de sucinta exposição dos fatos que pretendem provar.

Cuida-se de momento significativo do procedimento, pois ao júri é feita exposição do fato a ser julgado. Do órgão julgador, invoca-se atenção para os meios de prova que serão produzidos. Nenhuma alusão ao direito aplicável à espécie é feita nesse instante, tampouco há referência a argumentos jurídicos.

Ao órgão acusador incumbe, primeiramente, apresentar seus meios de prova. Em seguida, à defesa reserva-se momento para prova de sua assertiva.

Logo, nesse contexto, tem-se um jurado com postura passiva, haja vista a adoção do sistema adversary, que tem por característica a confiança de toda iniciativa processual às partes. (GOULART, 2009).

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Segundo Bonfim (2007) a França suprimiu o Júri tradicional definitivamente no ano de 1.941, instituindo a Cour d’Assises – sistema escabinado. Ao apontar a composição, o autor menciona a presença de três juízes e nove cidadãos. O procedimento não possui tempo para debates, porém é competente para julgar os crimes mais graves. Semelhante é o sistema italiano, chamado de giudici popolari é composto de dois juízes e seis cidadãos.

Tourinho Filho (2009, p.43) contextualiza o modelo francês:

Quando da ocupação da França pelos alemães, durante a Segunda Grande Guerra, na época do Marechal Pétain, eles ali implantaram o Tribunal dos Escabinos (Schöffen, dos alemães; Échevin, dos franceses). E, desde então, é o Tribunal dos Escabinos que predomina na França [...]. Trata-se de instituição parecida com o Júri. O Conselho de Julgamento é constituído de cidadãos leigos e de Juízes togados. Na França, após os debates, “les magistrats de la cour et les jures” se reúnem na Sala das Deliberações e dali não podem sair sem as suas decisões. São nove jurados e dois Juízes togados que integram a denominada Cour d’assises, formada pela Cour propriamente dita e pelo Jury.

Colaciona Goulart (2008) que a escolha dos jurados no modelo francês se dá por meio do sorteio de nomes inclusos na lista eleitoral anual daquele país. Afirma que a competência da Cour d’Assises se limita a julgar pessoas que lhe são enviadas por uma decisão de acusação de um juiz de instrução ou por uma câmara de instrução (casos de apelo contra decisão de juiz de instrução). Magistrados e jurados, em conjunto, decidem acerca da culpabilidade e da pena a ser imposta ao acusado. O presidente explica aos jurados as conseqüências de seus votos, de forma que ambos, sob o comando do presidente, manifestam seus pontos de vista e opiniões. A votação se dá de forma escrita e secreta, e, finda a apuração, as cédulas de votação são queimadas. Cumpre ressaltar que se faz necessária a maioria de oito votos para decisões sobre culpabilidade ou aplicação de pena máxima, enquanto ocorre a exigência de sete votos para as demais questões que versem sobre penas.

Gomes e Sica (2005) pontuam que a partir de 1.945, com a introdução das cortes-mistas, o percentual de absolvições na França caiu de 25 para 8%. Exemplificam, ainda que a

Cour d’Assises exige oito votos para que o réu seja condenado.

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Segundo Bonfim (2007, p. 08), na Espanha, após a supressão em 1.936, o Júri retornou apenas após 1.995, com fulcro no art. 125 da Constituição de 1.978, que previa a participação dos cidadãos na distribuição da justiça:

A partir daí, de uma forma ou de outra, encontramos tribunais mais ou menos semelhantes a uma visão de Júri, mesmo que essa “analogia” comporte em sua maior parte os “escabinados”, que estão em franca ascensão, Júris mistos, em que se assentam leigos e magistrados de carreira, decidindo sobre a culpabilidade e a pena. Na Espanha, a competência do Júri encontra-se elencada na Ley Orgánica del

Tribunal del Jurado, sendo possível futura ampliação do rol de crimes nela elencados. A

seleção dos crimes cuja competência é atribuída ao julgamento popular, geralmente de elementos normativos facilmente compreendidos pelos julgadores leigos, é formada por: crimes contra a vida, crimes de funcionários públicos (exceto a prevaricação), crimes contra a honra, a liberdade e a segurança e os crimes de incêndio. Oportuno salientar que os crimes operados contra pessoas só serão julgados pelo Júri Popular se consumados. (GOULART, 2008, p. 94).

Goulart (2008) pontua as críticas acerca da competência do Júri naquele país. Segundo o autor, como o critério determinante da competência não versa sobre a gravidade do delito, mas sobre a sua natureza, ocorre a inclusão de delitos de baixa relevância punitiva ao lado de crimes punidos com pena máxima.

Gomes e Sica (2005) pontuam que no modelo espanhol, formado por nove jurados e um juiz-presidente, a responsabilidade penal se configura diante de sete votos.

O juiz-presidente dirige os debates e fornece aos jurados instruções que possibilitem a chegada ao veredicto. Aos jurados leigos compete o juízo de valor acerca dos fatos objetos da causa e da culpabilidade do acusado. Dessa forma, a decisão dos jurados integra o conteúdo do veredicto, sendo competência do juiz-presidente o acolhimento de tal, em sede de sentença. Ademais, salienta-se que no modelo espanhol de Júri popular, no tocante à disciplina da prova, os jurados poderão se dirigir por escrito às testemunhas, peritos e acusados, mediante prévia declaração de pertinência proferida pelo juiz-presidente, de forma que consigam elucidar os fatos sobre os quais versem as provas. (GOULART, 2008).

(32)

3 O FUNCIONAMENTO DO TRIBUNAL DO JÚRI

Tourinho Filho (2009) afirma que a atual Constituição Federal retomou o entendimento da Constituição de 1.946 no sentido de o legislador poder aumentar o rol dos crimes cuja competência obrigatória é do Tribunal do Júri.

Segundo o autor, atualmente o Júri é formado por um Juiz togado, vinte e cinco jurados, que serão sorteados para formação do Conselho de Sentença. Trata-se de órgão colegiado, heterogêneo e temporário.

Heterogêneo, porque constituído de pessoas das diversas camadas da sociedade, sem distinção de raça, etnia, credo, sexo, profissão, classe, social ou econômica, origem ou grau de instrução, sendo presidido por um Juiz togado; temporário, porque pode não se reunir todos os dias ou todos os meses. (TOURINHO FILHO, 2009, p. 37-38).

Salienta Tourinho Filho (2009) que o Júri existe tanto na esfera Estadual quanto na Federal, ressalvando os casos em que o crime doloso contra a vida ocorrer a bordo de navio, aeronave (excetuando a competência militar), ou contra pessoas a serviço da União, de suas autarquias e empresas públicas em que o julgamento ocorrerá na esfera Federal. Conclui afirmando que os crimes dolosos contra a vida serão de competência da Justiça Federal de acordo com o Decreto-Lei n◦ 253/67, sendo que todos os demais crimes dolosos contra a vida que não se enquadrarem nos termos do referido artigo serão de competência da justiça dos Estados.

3.1 DO PROCEDIMENTO DO JÚRI

Conforme Tourinho Filho (2009) o procedimento do Júri é escalonado ou bifásico, sendo que a primeira fase se encerra com a decisão do juiz que pronunciar o réu e a segunda inicia e termina com o julgamento pelo Tribunal do Júri. Salienta que a primeira fase destina-se à demonstração da existência de crime doloso contra a vida, consumado ou tentado, e que o réu foi o autor, trata-se do jus acusationis estatal.

Nucci (2008) discorda da divisão do procedimento em duas fases, haja vista entender que diante da criação expressa da fase da preparação do processo para julgamento

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em plenário o procedimento tornou-se trifásico, dividindo-se em: juízo de formação da culpa, juízo de preparação do plenário e juízo de mérito.

3.1.1 Primeira fase

O procedimento se inicia com o recebimento denúncia ou queixa (para a hipótese do art. 29, CPP). Após o recebimento, o réu é citado para responder a acusação no prazo de dez dias, contados do cumprimento do mandado ou do comparecimento do réu em juízo nos casos de citação inválida. Caso a defesa não seja apresentada no prazo legal, deverá o magistrado nomear defensor para que a ofereça no mesmo prazo. Em sede de resposta, poderá o acusado alegar tudo que interesse à sua defesa (juntada de documentos e justificações, especificar provas pretendidas e arrolar até oito testemunhas). Havendo documentos e preliminares na resposta, deverá o juiz dar vistas ao Ministério Público pelo prazo de cinco dias. Em seguida o juiz determinará a realização das diligências e designará audiência dentro do prazo máximo de dez dias. Na audiência, quando possível, deverá ser ouvido o ofendido, as testemunhas de acusação e de defesa, bem como esclarecimentos do perito, acareações, reconhecimento de pessoas ou coisas, e por fim, o interrogatório do réu. Após a oitiva do réu, iniciar-se-ão os debates, com prazo de vinte minutos, prorrogáveis por mais dez, para cada uma das partes. Existindo assistente de acusação o prazo deste será de dez minutos, concedidos mais dez à defesa. Em dez dias o juiz deverá proferir a decisão. (TOURINHO FILHO, 2009).

Segundo Tourinho Filho (2009) a descrição acima exposta se refere à primeira fase do procedimento, também chamada de formação da culpa ou judicium acusationis, devendo a mesma ser concluída em noventa dias. Ainda, conforme o autor, a decisão a ser proferida pelo magistrado, no prazo de dez dias, poderá ser de impronúncia, absolvição, desclassificação ou pronúncia.

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Será proferida quando o magistrado não se convencer da existência do crime ou de indícios suficientes de autoria. Assim, julgará improcedente a peça de acusação. Desta decisão caberá recurso de apelação conforme art. 416, CPP, podendo ser interposto pelo Ministério Público, pelo querelante (quando for o caso) e pelo assistente de acusação. Ressalta-se que, enquanto não extinta a punibilidade, o réu não ficará livre de novo processo pelo mesmo fato, mesmo que impronunciado, mediante surgimento de novas provas. (TOURINHO FILHO, 2009).

Mossin (2009) classifica a impronúncia como uma decisão processual terminativa, haja vista não permitir a continuidade do processo. Para o autor tal decisão equivale à

absolutio ab instantia, razão pela qual possui efeitos limitados, sendo tais imutáveis, uma vez

que não assegurados pela coisa julgada.

3.1.1.2 Absolvição

Espínola Filho apud Mossin (2009, p. 292) aduz que “mantendo o princípio que se tornaria tradicional no direito processual pátrio, de que, apesar de ser da competência do Tribunal do Júri o julgamento da infração, o juiz, a que está afeto a pronúncia, pode absolver, nessa fase, o acusado.”.

Mossin (2009) assegura que as situações de absolvição previstas pelo legislador são taxativas, ou seja, numerus clausus, não podendo ser estendidas. Entretanto, salienta que para efeito de absolvição deverá a prova ser inalcançada pela dúvida, deverá ser clara, nítida e incontroversa, caso contrário, deverá o juiz pronunciar o acusado com base na máxima in

dubio pro societate.

Segundo o art. 415, CPP:

Art. 415. O juiz, fundamentadamente, absolverá desde logo o acusado, quando:

I – provada a inexistência do fato;

II – provado não ser ele autor ou partícipe do fato; III – o fato não constituir infração penal;

IV – demonstrada causa de isenção de pena ou de exclusão do crime.

Parágrafo único. Não se aplica o disposto no inciso IV do caput deste artigo ao caso de inimputabilidade prevista no caput do art. 26 do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal, salvo quando esta for a única tese defensiva.

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Nesse diapasão, Tourinho Filho (2009) assevera que o disposto no inciso IV não se aplica para o caso da inimputabilidade prevista no art. 26, CP, exceto se esta for a única tese de defesa.

3.1.1.3 Desclassificação

O juiz poderá desclassificar o crime, de maneira própria ou imprópria, para outra infração de competência do Júri, ou para infração de competência do juiz singular. Na primeira hipótese pronunciará o réu como incurso nas penas do artigo que entenda ter o réu violado. Já na segunda hipótese, se o magistrado se convencer que o crime cometido não seja de competência do Tribunal do Júri, deverá remeter os autos ao juízo competente (art. 419, CPP), evitando, em sede de sentença dar tipificação específica ao delito. (TOURINHO FILHO, 2009).

Ainda, dos dizeres de Tourinho Filho (2009), colhe-se que nos casos de desclassificação para outros crimes de competência do Júri aplicar-se-á a regra do art. 418, CPP, e quando necessário, tomadas as providências previstas no art. 384, CPP, devendo, ainda, a peça acusatória ser aditada.

Senão vejamos:

Art. 418. O juiz poderá dar ao fato definição jurídica diversa da constante da

acusação, embora o acusado fique sujeito a pena mais grave.

Art. 384. Encerrada a instrução probatória, se entender cabível nova definição

jurídica do fato, em conseqüência de prova existente nos autos de elemento ou circunstância da infração penal não contida na acusação, o Ministério Público deverá aditar a denúncia ou queixa, no prazo de 5 (cinco) dias, se em virtude desta houver sido instaurado o processo em crime de ação pública, reduzindo-se a termo o aditamento, quando feito oralmente.

§ 1o Não procedendo o órgão do Ministério Público ao aditamento, aplica-se o art. 28 deste Código.

§ 2o Ouvido o defensor do acusado no prazo de 5 (cinco) dias e admitido o aditamento, o juiz, a requerimento de qualquer das partes, designará dia e hora para continuação da audiência, com inquirição de testemunhas, novo interrogatório do acusado, realização de debates e julgamento.

§ 3o Aplicam-se as disposições dos §§ 1o e 2o do art. 383 ao caput deste artigo. § 4o Havendo aditamento, cada parte poderá arrolar até 3 (três) testemunhas, no prazo de 5 (cinco) dias, ficando o juiz, na sentença, adstrito aos termos do aditamento.

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