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Trabalho projecto Ines Castano Vol. 2

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Academic year: 2019

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(1)

 

 

 

 

 

 

São  Tomé  e  Príncipe:  

Cultura(s)/Património(s)/Museu(s)  

 

 

 

Inês  Filipa  Abreu  de  Castaño  

 

 

Setembro  2012  

 

Trabalho  de  Projecto    

de  Mestrado  em  Museologia  

(2)

ÍNDICE geral

1. Introdução

1.1. Definição do tema e objectivos

1.2. Enquadramento conceptual e metodológico

1

1

2

2. A prática da teoria

2.1. O social no binómio memória/património

2.2. Da memória social ao impulso museal

2.3.

Museu em contexto

5

6

11

20

3. São Tomé e Príncipe: conhecer o território

e a história como contexto

de desenvolvimento

3.1. Enquadramento geográfico

3.2. Raízes históricas de uma sociedade crioula africana

3.3 Sociedade e contexto político

3.4. Cooperação e desenvolvimento

3.5. Quadro legislativo

25

26

28

35

41

47

4. Cultura(s)/ Património(s)/ Museu(s) em São Tomé e Príncipe:

abordagem para um diagnóstico a partir do terreno

4.1. A Cultura Santomense: identidade cultural e Santomensidade

4.1.1 Língua e crioulos

4.1.2 Manifestações culturais

4.2. Património(s)

4.3 Acção Patrimonial

4.4. Museu Nacional de São Tomé e Príncipe

(3)

5.

V

ia de acção patrimonial para São Tomé e Príncipe

5.1. Um olhar exógeno:

Cabo Verde, relação inevitável

5.2. A experiência

Soya Kutu

5.2.1. Metodologia utilizada

5.2.2. Locais

5.2.3. Equipa de trabalho

5.2.4. Repercussões imediatas e a longo prazo

5.3. Proposta de acção: o

inventário

do

património

para o

desenvolvimento

5.3.1 Equipa de trabalho

5.3.2. Formação

5.3.3. Metodologia

5.3.4. Tentativa/erro

5.3.5. Educação patrimonial

5.3.6. Repercussões a curto, a médio e a longo prazo

84

85

92

93

94

95

95

96

99

100

101

103

103

104

6. Considerações finais

Referências bibliográficas

Apêndices

Anexos

106

110

vol. 2

(4)

ÍNDICE

APÊNDICES

ap.1

Entrevista | Guião

ap.2

Entrevistas (transcrições)

I.

Ernesto Carvalho e Djadjingu Neto

I

I

.

Caustrino Alcântara

III.

Nelson Campos

IV.

Frederico Gustavo dos Anjos

V.

Ernesto Carvalho

VI.

Francisco Costa Alegre

VII.

Albertino Bragança

VIII.

Carlos Espírito Santo

ap.3

Autorizações dos entrevistados

ap.4

Glossário:

Manifestações culturais santomenses

ap.5

Cronologia:

Realidade cultural santomenese 1975-2011

ap.6

Planificação diária das Oficinas Criativas

Soya Kutu

A-1

A-2

A-3

1

8

17

24

31

34

39

43

A-4

A-12

A-16

A-17

ANEXOS

fig.1

Mapa do Golfo da Guiné

fig.2

Lei n.º 4/2003 - Lei do Património Histórico-Cultural Nacional (excerto)

fig.3

Implantação do Forte de São Sebastião

fig.4

Museu Nacional de São Tomé e Príncipe:

Textos de sala

fig.5

Fachada principal do Museu Nacional de São Tomé e Príncipe

fig.6

Pormenor da fachada principal do Museu Nacional de São Tomé e Príncipe

fig.7

Escadaria de acesso ao

Piso 1

do Museu Nacional de São Tomé e Príncipe

fig.8

Capela de São Sebastião localizada no pátio central do Museu Nacional de

São Tomé e Príncipe

fig.9

Reserva do Museu Nacional de São Tomé e Príncipe

fig.10

Loja do Museu Nacional de São Tomé e Príncipe

(5)

fig.11

Cobertura-terraço do Museu Nacional de São Tomé e Príncipe

fig.12

Esculturas monumentais do Museu Nacional de São Tomé e Príncipe

fig.13

Pormenor da antecâmara do Museu Nacional de São Tomé e Príncipe

fig.14

Sala 1 - Sala de Jantar da Roça, Museu Nacional de São Tomé e Príncipe

fig.15

Sala 2 - Arte Sacra, Sala do Bispo D. Frei João Sahagun, Museu Nacional

de São Tomé e Príncipe

fig.16

Sala de Etnografia, Museu Nacional de São Tomé e Príncipe

fig.17

Sala da Agricultura, Museu Nacional de São Tomé e Príncipe

fig.18

Sala 8 - Sala da Independência, Museu Nacional de São Tomé e Príncipe

fig.19

Sala de exposição temporária, Museu Nacional de São Tomé e Príncipe

fig.20

Sala das Tartarugas, Museu Nacional de São Tomé e Príncipe

fig.21

Sala 10 - Sala do Massacre, Museu Nacional de São Tomé e Príncipe

fig.22

Sala 11 - Quarto da Roça, Museu Nacional de São Tomé e Príncipe

fig.23

Sala 12 - Sanzala, Museu Nacional de São Tomé e Príncipe

fig.24

Mapa de Cabo Verde

fig.25

Locais onde se realizaram as Oficinas Criativas

Soya Kutu

ANEXO digital

: Filmes Soya Kutu 2012

A-29

A-30

A-30

A-31

A-31

A-32

A-32

A-33

A-33

A-34

A-34

A-35

A-35

A-36

A-37

(6)
(7)

Identificação

Nome:

Idade:

Contacto:

Localidade:

Actividade profissional:

Habilitações literárias:

_____________________________________________________________________________

(para responsáveis de estruturas culturais)

Acerca da estrutura

Identificação:

Localização:

Antecedentes históricos:

Programação:

_____________________________________________________________________________

Parte I: Cultura Santomense

1. Como caracterizaria a cultura Santomense? [uma identidade cultural ou várias. ex. língua ou

outras práticas evolutivas]

2. Sítios e locais de interesse? [que os santomenses valorizam particularmente - associados a

histórias de vida, à tradição oral, à história da ilha]

3. No seu ponto de vista, o que deveria ser feito para preservar a cultura em São Tomé? [para a

construção de uma memória colectiva e referências identitárias comuns]

4. Haverá já alguns traços (materiais/imateriais) da cultura Santomense que se perderam? Quais?

5. Quais os agentes culturais (instituições/indivíduos) em São Tomé? [mesmo na área da

cooperação e desenvolvimento ou do património]

6. Quais os criadores culturais

Parte II: Um museu em São Tomé

1. Conhece o museu de São Tomé?

2. Que outra tipologia de museu gostaria que houvesse em São Tomé?

2. O que gostaria de ver num museu de/sobre São Tomé?

3. Os museus são para os visitantes. De que forma se pode apelar à participação da população na

constituição de um museu?

4. Onde deveria ser um museu de/para as pessoas?

(8)

Todas as conversas tiveram lugar na cidade de São Tomé (São Tomé e Príncipe) nos meses de Outubro e Novembro de 2011. O seu registo foi autorizado pelos entrevistados, sendo a transcrição da nossa responsabilidade.

Optamos por transcrever todas as conversas (gravadas com recurso a um gravador áudio), uma vez que não nos foi possível reunir as condições adequadas para registar sonoramente com boa qualidade a nossa recolha.

(9)

I. Conversa com Ernesto Carvalho e Djadjingu Neto, realizada no Museu Nacional de São Tomé e Princípe, no dia 28 de Outubro de 2011, às 14h30m.

Ernesto Carvalho (EC) - Director do Museu

Djadjingu Neto (DN) - Técnico de Conservação e Restauro

Para começar, pode referir-me as datas importantes na história do museu?

|03:44|

EC: Historicamente, o museu... o edifício é uma fortaleza. Foi construída no séc. XVI/XVII aquando do período do comércio atlântico para proteger a costa dos ataques dos piratas Franceses e Holandeses. Trata-se, portanto, de uma fortaleza com fins de defesa. 1575 é a data de construção do edifício. Funcionou durante esse período todo enquanto fortaleza para defesa da costa contra os ataques dos piratas. Só depois da independência é que se pensou e transformou este edifício em Museu Nacional. Os artefactos, os objectos que estão cá, foram trazidos directamente para cá das antigas roças (depois de nacionalizadas), das igrejas e do palácio do governador. Quem esteve na arrumação e na montagem deste museu foi a poetisa Alda do Espírito Santo, o Sr. Barros (afastado porque está doente) e um português de nome Ferreira da Silva. São estes os três protagonistas que criaram e montaram este museu. De lá para cá... pelo que eu sei, o edifício não sofreu nenhuma remodelação. A estrutura mantém-se, com algumas adaptações apenas, mas não existe nenhuma remodelação de fundo. É um edifício que já clama pela restruturação. Temos alguns problemas… com o tecto, enfim, com a iluminação, aliás o próprio edifício não é propício para um museu, isso nós sabemos, de acordo com conhecimentos científicos actuais. Nós carecemos de várias alternativas, mudanças. |07:03|

EC: Eu estou aqui há dois anos e tal. A minha licenciatura é em história e fui convidado para dar o meu contributo aqui, na medida do possível, com o apoio do técnico Djadjingu e o Sr. Barros (que não está cá) e eu tenho tentado compreender algumas acções do museu para além de algumas formações. Nós tivemos aqui algumas acções de formação a nível do museu com a Escola Património Africano (EPA - École du Patrimoine Africain).

Têm um protocolo para estas parecerias ou são esporádicas?

|07:40|

EC: Sabe, nós não somos autónomos. Dependemos da Direcção Geral de Cultura e muitas vezes as coisas processam-se sem nós sabermos como é que se processaram. Esse é outro dos problemas que nós temos. O director do museu não tem autonomia. O director pode estabelecer um projecto mas tem que ter a anuência da Direcção Geral de Cultura. E se o Director/a Geral (de Cultura) não for sensível (mesmo deste governo) à questão da cultura, do museu, isso é uma batalha morta. Isto é outro problema com o qual nós nos confrontamos.

|09:22|

DN: Dentro das datas comemoradas, além do dia internacional dos museus, dia 18 de Maio, temos também o dia de criação do museu, 11 de Julho de 1976.

|09:55|

EC: Outro aspecto, é que nós também temos problemas com o pessoal. Somos apenas eu, o Djadjingu, há uma senhora que faz de guia mas não tem nenhuma formação específica e duas encarregadas de limpeza. Hoje em dia, um museu não funciona com este número reduzido de gente.

|12:10|

(10)

Europeia, através do Projecto PAIC-PALOP (Projecto de Apoio às Iniciativas Culturais nos PALOP). São decisões tomadas a nível superior, nós damos apenas seguimento.

|12:49|

EC: Porque o objectivo é tornar este museu mais abrangente. Nós somos um museu… não temático, mas multi-facetado. Temos várias áreas, o museu é pluridisciplinar. O nosso objectivo é tornar o museu mais abrangente, mais aberto a todos os níveis; principalmente um dos objectivos que nós temos é trabalhar com crianças. Aliás o projecto já existe com a Escola e Património através do projecto “Meu Museu, Minha Escola”. As crianças da escola vêm ao museu tal como o museu vai à escola. Este projecto já começou mas falta dar um seguimento. Já há um protocolo estabelecido.

Com a União Europeia, através do PAIC-PALOP, também há um projecto. Aliás, decorreu aqui no museu a primeira, uma acção de formação onde participaram vários funcionários e que incluiu uma aula prática através da qual nos foi possível organizar a reserva. Na sequência deste projecto consta também um estágio em Portugal que estava projectado para este ano mas, até à data, ainda não sabemos. Contempla ainda alguns equipamentos para o edifício e para o seu funcionamento.

Então o museu continuará neste espaço?

|15:11|

EC: Até agora tudo indica que o museu continuará neste espaço. Há projectos para a fundação de outros museus mas não têm nada a ver com este.

|18:30|

EC: Ainda relativamente ao acervo do nosso museu, em tempos nós tínhamos... digamos... um outro... relativamente à Arte Sacra. Tentámos, uma vez mais, recuperar o edifício onde havia uma outra exposição de Arte, mas até agora... Nós temos muitos objectos para montar um museu apenas de arte sacra. Já foi pensado, já foi idealizado, mas ainda não recebemos resposta da outra parte. Porque o edifício em questão - a igreja do Bom Jesus - é tutelado pela igreja Católica e já se iniciou o processo, escrevendo uma carta a pedir a recuperação do edifício, mas não obtivemos resposta. E nós temos muitos objectos que estão entulhados e é preciso mais espaço.

E em relação à colecção, continuam a ser incorporados objectos?

|19:53|

EC: Não, actualmente não. Há muito tempo que não são incorporados objecto na nossa colecção.

E há alguma política de incorporação?

|20:14|

EC: Não. Nós podemos continuar a incorporar. O problema é que, não havendo uma inventariação dos objectos em todo o país... Por exemplo, a questão da inventariação das Roças. A Roça Rio do Ouro/ Agostinho Neto é uma das em que nós já tivemos um trabalho aturado, com a intenção de a inscrever na nossa lista indicativa nacional e avançar com a sua candidatura a património mundial, mas até agora...

E porquê a Roça Agostinho Neto?

|21:18|

(EC) De todas as Roças, nós elegemos, devido à sua natureza, à sua caracterização.

A ideia era ser só uma, não o conjunto das roças....

(11)

DN: A Roça Rio do Ouro é um conjunto de coisas dentro de uma só Roça. Abarca certas qualidades em relação às outras. É uma Roça que foi tomada como exemplo para dar o primeiro passo. Mas infelizmente o processo não avançou.

|22:47|

DN: As roças estão inventariadas, alguns edifícios, e algumas delas estão classificadas. Estão na lista indicativa de património nacional: religioso, arquitectónico, roças.

EC: A Dra. Nazaré de Ceita acompanhou este processo de classificação do património. |23:30|

DN: Ainda em relação à política de incorporação de objectos, há necessidade sim. Para fazer incorporação de objectos no museu há certos motivos que levam o museu a deslocar-se em busca de alguns objectos. Nós temos consciência que temos colecções em falta, então podíamos realizar determinadas deslocações à procura de certos objectos para completar algumas colecções. Mas não fazemos isso porque não temos condições para fazer as deslocações necessárias. Deveríamos ir às antigas roças, algumas estão vandalizadas, mas ainda há alguns objectos que poderiam ser recuperados. Mas temos também que fazer um trabalho de casa, preliminar, antes de ir para o terreno. Mas não temos recursos humanos e financeiros para ir para o terreno.

Então não há um programa de incorporações definido?

|25:43|

EC: Não. Nós aceitamos tudo, sendo um museu público.

Não há uma política criteriosa...

|26:19|

DN: Os objectos que cá estão, segundo informações que tenho, mesmo os que estão nas salas de exposição, muitos foram trazidos das roças mas outros foram doados. E essa doação pode continuar. Agora cabe ao museu decidir qual o tratamento que deve dar ao objecto, fazendo o seu enquadramento.

Há uma política de conservação?

|27:05|

DN: Sim, há uma tentativa de pelo menos manter as coisas no seu ponto razoável. Poderíamos fazer melhor se tivéssemos condições, pelo menos, básicas. Porque nem mesmo as condições básicas para certos trabalhos aqui, nós temos. Precisamos de fazer uma desinfestação e não podemos avançar porque não temos desinfectante. Pretendemos fazer um trabalho mais aprofundado num certo objecto... mas não podemos, porque não há determinados produtos, ou ferramentas ou materiais aqui no museu para tais actividades. Então, é muito difícil. Mesmo nas sala de exposição, uma das coisas que podia prevenir a degradação dos objectos, as ditas medidas de prevenção. Mas infelizmente, nem as luzes que temos nas salas de exposição são adequadas para certos materiais.

|28:46|

DN: Temos objectos na sala do Massacre, as fotografias, que daqui a pouco vão desaparecer. Já reclamámos isso. Basta recuperar, de uma forma ou outra, para não se perderem as originais. Mas é certo que, se nada for feito, aquelas fotografias vão desaparecer. Não só aquelas como outras fotografias também. Temos ainda pinturas de quase 2 metros de altura de ex-presidentes portugueses, como é o caso de Carmona1, que já estão

quase a esbranquiçar devido à incidência directa da luz natural. Neste momento, esta sala de exposição está fechada ao público.

|29:54|

(12)

DN: Depois, há ainda a humidade, que também contribui muito para a degradação que deveria ser atenuada com a aquisição de alguns equipamentos.

Há uma política de documentação e investigação?

|30:30|

DN: A documentação (inventário) que existe está fechada e só há uma cópia que é de acesso restrito e que, presentemente, se encontra no museu. Mas... tendo um inventário feito de raiz, ele pode ser disponibilizado ao público para investigações científicas.

Mas não há nenhum arquivo documental.

No que diz respeito aos espaços do museu, podemos falar em espaços diferenciados?

|33:25|

DN: A oficina (R/C) é de acesso reservado, bem como os gabinetes (R/C e 1º piso) e a reserva. O átrio, as salas de exposição, a cobertura, a loja e os lavabos são de acesso púbico (ambos sujeitos à aquisição prévia de bilhete)2.

|34:19|

Há uma exposição permanente. Alguns objectos estão expostos com carácter de rotatividade, dando lugar a outros armazenados na reserva. Há uma sala para a exposição temporária.

Existe, actualmente, um programa de difusão e comunicação?

|35:24|

EC: Em tempos produziu-se um desdobrável, mas precisa de ser actualizado, já não responde às exigências actuais. Aliás, nós estamos a tentar refazer e já temos um senhor que está disponível a colaborar connosco nesse sentido. Precisamos de publicitar mais, apesar de algumas carências. Nós, com algumas agências de navegação turística temos um acordo... uma cooperação e, de vez em quando, trazem-nos visitantes turistas. É uma parceria.

E em relação ao número de visitantes?

|37:00|

DN: Bom, se formos ver estatisticamente, todos os dias há visitantes, pelos menos um. Eu controlo a estatística do museu através de um quadro/tabela que eu elaborei, onde todos os visitantes ficam registados. Era uma coisa que não havia. Anteriormente só havia um livro do visitante e, caso ele não escrevesse uma mensagem, nós não tínhamos como controlar os números. Mas, desde 2009, que esta tabela de registo de visitantes foi elaborada e é preenchida criteriosamente.

|38:40|

DN: Além das agências também a época escolar tem muitas visitas. As visitas escolares são feitas através de marcação; a escola faz o pedido com o dia e a hora e, logo que a carta chegue, nós respondemos de imediato a marcar. Depois, no dia marcado, o visitante chega e nós fazemos a visita.

E como são organizadas essas visitas?

|39:36|

EC: A parte logística depende da própria escola.

2 Apenas uma antecâmara de acesso ao átrio (onde se podem ver quatro pinturas e uma peça em ferro) é pública. O

(13)

E normalmente são só escolas daqui da cidade ou vêm de todo o país?

|39:53|

DN: Vêm escolas de todo o país. Do Príncipe não, mas de São Tomé vêm escolas de norte a sul.

E abrange todos os anos escolares?

|40:10|

EC: Sim. Desde o jardim de infância até ao último ano do ensino superior - Lusíadas, IDF, ISP3.

As visitas são planeadas consoante a faixa etária?

|41:21|

EC: Sabe, a maior parte das vezes as próprias escolas não definem o objectivo da visita. Já houve algumas escolas, como por exemplo os alunos de Lusíadas, que vieram com um objectivo específico e, nesse caso, não precisaram de ir visitar todas as salas. A visita deles cingiu-se à Sala da Agricultura, do Massacre e Sala da Independência.

Mas para as escolas primárias é mais um passeio. |42:05|

DN: E do Liceu Nacional também há certas turmas que já vêm com objectivos traçados. Quando o professor está a falar sobre determinado tema, fala connosco e nós tentamos encaminhar a visita para passar essas informações.

Que tipo de segurança tem o museu (colecções/edifício/visitantes/funcionários)?

|43:11|

EC: Nós não temos qualquer tipo de segurança no museu. Nós mesmos somos os seguranças para proteger os objectos quando há visitantes. O próprio edifício também não tem segurança, está entregue à sua sorte e, por isso mesmo, já foi alvo de assalto.

Há algum plano de emergência face a calamidades (incêndios, inundações, terramotos)?

|43:48|

DN: Nós não temos nada. Nem alerta, nada. Não estamos ligados a nenhuma central. Nem temos primeiros socorros para prestar.

Em tempos o edifício já houve um vigilante mas deixou de existir. É um assunto que tem vindo a ser discutido, mesmo quando reunimos com o ministro, mas é sempre banalizado, tal como outros. E nunca vemos os problemas solucionados.

Nem o facto de ser um forte impede de ser assaltado. A porta de entrada já deu vários problemas. Então tivemos que adaptar e colocar uma fechadura com cadeado, se não as pessoas abriam e entravam. E foi por isso que coloquei o papel (em 3 idiomas) que diz: “Toque à campainha e aguarde”. Tal como os avisos de proibição de fotografar... eu arranjei os símbolos de proibição, fiz e coloquei em quase todas as salas por uma questão de segurança dos objectos.

E em relação aos recursos humanos (estrutura orgânica/organograma funcional)?

|47:15|

3 Universidade Lusíada de S.Tomé e Príncipe, pólo universitário da Universidade Lusíadas de Lisboa; IDF - Instituto

(14)

DN: Também temos problemas. O organograma está feito desde o ministério4, chega à direcção5, depois aqui

ao museu. Mas aqui não temos o organograma, está na Direcção Geral.

Eu só sei que eu estou aqui nesta área de conservação e restauro. Quer dizer... eu praticamente tomei esta área, de acordo com as formações que eu tenho vindo a fazer desde que cá estou. Caso contrário também poderia ser guia, que é um trabalho complementar que eu faço. Sempre que é preciso fazer visitas em inglês sou eu que faço. Quando as visitas são em francês ou português já não sou eu. Eu só faço visitas em português para ajudar, como é o caso das escolas em que, por vezes, temos visitas com 200 alunos e não é possível ser uma só pessoa a fazer.

Mas chegam a ter visitas com 200 pessoas?

|49:13|

DN: Sim, até mais. As visitas de navios-cruzeiros às vezes trazem entre 300 e 400 visitantes.

Há alguma política de bolsas, estágios ou voluntariado?

|52:23|

EC: Do meu conhecimento ninguém propôs. Há bem pouco tempo, em contacto com o Professor Henrique Coutinho Gouveia, ele propôs-me um mestrado em museologia em Cabo Verde, através de Juvenal Espírito Santo. Nós estamos a ver... Mas aqui é tudo estatal e as coisas dependem mais do Ministério da Educação... Mas voluntariado... bolsas...

|53:57|

DN: Voluntariado, houve sim. Houve uma senhora francesa (segundo o antigo responsável6) que deu uma

ajuda importante na recuperação de algumas imagens policromadas. A senhora era conservadora-restauradora. Creio que foi o único trabalho voluntário que houve.

Só para terminar, pode referir-se aos recursos económicos. O museu tem receitas?

|53:58|

EC: Sim, de bilheteira.

Têm uma orçamento para o funcionamento...

|54:15|

DN: O salário?

EC: Não. Isso não existe. Nós funcionamos com zero de orçamento do estado. Há um orçamento para a Direcção Geral de Cultura que nunca chega até aqui. Eu já cá estou há dois anos e tal e nunca fui chamado para discutir o que nós precisamos. Nós funcionamos com receitas. É com as receitas de bilheteira que nós compramos os produtos de limpeza.

Por exemplo, estão agora a elaborar um novo orçamento, mas o museu não foi chamado para apresentar, pelo menos, uma proposta do que é preciso. É só vontade...

Então as únicas despesas que têm é com gestão corrente?

|55:43|

EC: Sim, gestão corrente.

4 Ministério da Educação, Cultura e Formação 5 Direcção Geral da Cultura

(15)

E quando têm que montar as exposições temporárias?

|55:52|

EC: Desde que estou cá, nunca montamos uma exposição. Estamos a pensar em renovar a exposição... Agora há uma nova direcção (da cultura), um novo director, e eu vou ter um encontro aturado onde vou colocar um conjunto de questões que precisam de ser resolvidas; para eu saber qual é a sensibilidade dele.

Há um diagnóstico feito das carências e necessidades do museu? Estão identificadas as prioridades?

|56:48|

EC: A prioridade para mim (eu já sei que ele vai dizer outra!), enquanto responsável, é o edifício. Para mim seria a recuperação do edifício... do prédio. Mesmo que nós tenhamos vontade, como o técnico Djadjingu com toda a vontade de recuperar alguns objectos, se o tecto continuar a chover... esse trabalho é em vão. Aliás, já havia um projecto para a recuperação do edifício, já havia um orçamento, mas o dinheiro, a verba para o projecto, para a recuperação desapareceu, evaporou. Mas eu creio que ele dirá que a prioridade enquanto... conservação, são os objectos, os materiais para a conservação!

|58:02|

DN: Eu discordo. Parece-me que recuperar o edifício é prioritário. Numa das reuniões que tivemos com a antiga directora (da cultura) eu propus-lhe a criação de um outro edifício para museu. Porque continuando aqui os objectos têm um prazo de vida. Mesmo os de madeira, metal, fotografias, não importa a categoria ou material de constituição. É certo que os objectos que cá estão têm um tempo limite de vida. Se estivessem noutras condições o tempo seria um outro, creio que seria mais alongado. Mas aqui nestas condições... O antigo responsável dizia que até nós estamos em risco. O que fará aos objectos?

Neste momento está a degradar-se a colecção e o edifício.

Ao recuperarmos o edifício já estaríamos a estancar a primeira degradação dos objectos resultante dos ataques externos.

A fazer a recuperação do edifício teríamos que fazer a deslocação da colecção para outro local.

Há ainda uma outra questão, para terminar, que não ficou esclarecida. Em relação à organização do espaço, como está definido o percurso expositivo?

|01:03:07|

DN: Primeiro começamos na Arte Sacra, depois a Agricultura, depois Independência, depois exposição temporária, Tartarugas, Massacre, Quarto da Roça, Sanzala, Etnografia e Sala de jantar.

O que falta é a organização das salas por ordem cronológica para ser compreendido como um museu da história de São Tomé.

Este museu reúne então diferentes tipologias de museu?

|01:03:07|

A intenção é mesmo essa, reunir diferentes tipologias num só espaço. Só que falta uma organização cronológica.

E porque motivo foi organizado assim?

|01:06:02|

Bom, como o dito inventário, também a falta de conhecimento, creio, é o que está na origem. Tendo condições, tendo conhecimento... é mais prático. Na ausência de conhecimentos totais é tudo mais difícil.

(16)

II. Conversa com Caustrino Alcântara, realizada no Café Jasmim (Casa da Cultura), no dia 4 de Novembro de 2011, às 11h.

Identificação

Nome: Caustrino Leal de Jesus Alcântara Idade: 41 anos

Localidade: Boa Morte

Actividade Profissional: Prestador de serviço intelectual / Coordenador na ONG Adra Kids

Habilitações literárias: Engenharia em electricidade e equipamento industrial (licenciatura por concluir), jornalismo (licenciatura por concluir), administração hospitalar (licenciatura por concluir); autodidatismo em linguística7

Parte I: Cultura Santomense

Como caracterizaria a cultura Santomense? [uma identidade cultural ou várias]

|05:35|

Para mim, não existem várias identidades culturais santomenses. Para mim, o que existe é a identidade cultural santomense. Ora, São Tomé diverge de qualquer uma das paragens da africanidade. No luso-africanismo o santomense diverge de todos, desde logo por matrizes da origem, enquanto os outros tinham um povo puro, São Tomé e Cabo Verde não tinham. Porque a Guiné tinha, lá do Casamansa8. E, no entanto,

São Tomé conseguiu outra coisa - que Cabo Verde não conseguiu - a partir de 1515 São Tomé consegue a carta de alforria com poder igual a um europeu. Para quem? Primeiro para os mulatos, depois em 1517 já entram os escravos domésticos, também as mães escravas negras vindas da Nigéria. Até 1800 e tal... Com todo o poder e direito ao bem, também tem terra, tem direito a escravos, pode trabalhar na função pública, tal como um europeu. Nem Angola, Cabo Verde, Guiné Bissau ou Moçambique, só em São Tomé.

Um santomense na tropa, quando saía tinha ordem segunda, um de Portugal tinha ordem primeira, um angolano tinha que ter ordem terceira, em Cabo Verde ninguém pensou nisso... É uma grande diferença! Então, como é que se constrói, ou por outra, qual é a matriz cultural de um santomense? Esse bicho é esquisito... porque ele tem várias origens. O forjar cultural é de 1880 com Estanislau Augusto Pinto que cria a Sociedade 23 de Setembro9. Até leva uma banda da câmara municipal de São Tomé para Paris e ganha o

primeiro lugar. Nós ganhámos, num concurso mundial das bandas charangas10.

Então, como é que que se constrói isto? Tem que primeiramente fazer uma estratificação. Porque o forro só anda até 1800 e pouco. Depois tem os tongas. Eles têm cosmos, cada fazenda é um país dentro do próprio país. Depois, se virmos os cosmos, vemos também outra estratificação das origens - angolanos, cabo-verdianos. Moçambicanos, muito pouco, não foi determinante, nem guineenses. Mas são os angolanos e os cabo-verdianos que vão determinar os comportamentos, aquilo que nós determinamos por estereótipos. Depois temos o forro, mas de que origem? Porque o tipo tem atitudes! Ele tem atitudes e é contra os cosmos.

7 Refere o Dr. Rito Aragão como único linguista santomense, seu professor de liceu.

8

Casamansa é uma região do Senegal localizada ao sul de Gâmbia e a norte da Guiné-Bissau, atravessada pelo rio Casamansa.

9 Estanislau Augusto Pinto foi um funcionário português no tribunal de São Tomé. Foi ele que, em Junho de 1880,

fundou em São Tomé a “Sociedade Africana 23 de Setembro”, associação recreativa, dramática e musical.

10 Charanga é uma banda de música geralmente composta apenas por instrumentos de sopro, embora também possa

(17)

Então temos que balizar isto. Do ponto de vista sócio-cultural, biológico, comportamental, o forro é diferente. Temos que dividir.

|11:47|

O colore (cultura) no grego é muito vasto. Do ponto de vista sócio-cultural é um indivíduo de personalidade soberba porque vive muito de complexos e de estereótipos também. Ele não aceita as regras científicas. E ele tem sempre atitude, que é sempre superior. Todo o mundo que vem para São Tomé, para ele (forro), é mansé, que significa intruso (a ideia, o sentido). Não é daqui e veio, logo é mais baixo. Não é mais alto que um forro. Então, um mansé, pode ser "mansé colomba", porque é um branco e veio de Portugal. Já será "mansé gabom" quando se trata de um escravo e "mansé cabovede", se veio com contrato de Cabo Verde para vir trabalhar aqui. E o forro sa sumu sun não sei quê... sumu sun fulano, samu san fulana. Percebeu a grande diferença? Quanto ao forro, ele nunca é mansé. É sum sun, sumu sun... Percebeu? E isto para Deus é igual, você não diz Deus mansé, você quando se refere a Deus diz "sumu sun Dêsu padê". Agora, sim, é "Senhor meu Deus, o pai". E o forro tem a mesma categoria, todos os outros são mais baixos, até o branco. E isto é muito complicado para perceber o comportamento de um santomense, sobretudo porque ele é arrogante.

Qual a razão que leva o forro a considerar-se parte de uma raça pura de cá?

|14:30|

Não, o forro não se julga nessa posição. O forro tem uma coisa que....

É por causa da conquista dos documentos?

|14:43|

Sim, é só isso. Foi muito poder que foi dado. Eles, com tanto poder atribuído, usavam-no. Também são esclavagistas. Somente o forro chegou à independência. E nós só nos enfraquecemos por causa dos tongas que vieram das fazendas que não têm o estatuto que nós (forros) temos. Esses são mais baixos, mais fracos. Só que nós também estamos, agora tecnicamente falando e muito sério, nós também incorremos num erro porque não sabemos tirar bom partido daquilo que temos, da bonança que temos na mão. Nós somos tal Brasil, tal Kuwait, e da Nigéria não falo. Porque não houve raça pura aqui, se bem que no Brasil há uma diferença, com os tupi-guarani, os índios. Mas não é significativo.... Aqui houve uma simbiose que garante uma riqueza cultural muito vasta. Eu sou de origem árabe, tenho o progenitor brasileiro também. O Alcântara vem do Brasil, o D. Pedro de Alcântara foi o primeiro imperador do Brasil. Agora quem é que me garante a origem do Alcântara, se Angola tem, Cabo Verde tem (que eu saiba!), Guiné e Portugal também. Então não sei de onde veio. O Leite veio de Portugal, tenho a certeza. Aqui está uma simbiose tão forte que nos garante que as nossas origens são heterogéneas, não são homogéneas, não têm tribo.

Por outro lado, parece que os santomenses tendem a lidar mal com a mistura/a diferença...

|18:00|

A culpa não é nossa, isso é uma construção colonial. E eu peço imensas desculpas aos tongas por isso... porque também eu sou assim. Ainda hoje de manhã eu estava na polícia porque levei um indivíduo que estava em minha casa com falta de respeito. Porquê? É tonga... Tem que respeitar as nossas ordens e se não respeitar... eu mandei chamar a polícia para ele obedecer às ordens. Até no apelido você não pode ter igual a um tonga, eles não têm "de". O registo deles era feito aqui na curadoria11, é o ancoradoiro, era o que tratava

de pedir gabãos e tongas. Nós não, temos que estar registados em cada um dos serviços públicos da comarca e freguesia.

Então não pode ser considerado um cidadão santomense?

(18)

|19:23|

Não, porque nem se quer pode estar registado. É filho de uma única fazenda.

E quando ele vem morar para São Tomé e começa a relacionar-se com os santomenses...

|19:43|

Mas ele não tem. O filho nem é registado como filho dele. A menos que seja com uma forra.

Então, socialmente....

|20:06|

Ele é um excluído. Ele nem pode circular na freguesia. O forro tem direito a bater-lhe e prender, por causa da polícia rural. É entregue ao regedor na freguesia e devolvido à mesma fazenda. Só com a independência em 1975 é que isto mudou, e mudou mal! Porque os sanzaleiros são sempre sanzaleiros. Eles comungam comportamentos, atitudes e relações, no mesmo sítio. O forro é cada um no seu quintal. A atitude do forro é muito separatista. A atitude do sanzala é comum, porque ele caga no mesmo sítio, na mesma retrete, cozinha no mesmo sítio, usa a mesma sala. Ele não tem voz, nunca aprendeu a ter voz. O forro tem, o forro dá ordens. Depois, o forro tem roças e ele não. Por mais que se tivesse distribuído lotes agora. Pelo contrário, só veio complicar a situação, porque o tonga que recebeu o lote envolve-se com a mulher do forro. Porque o forro está fraco, não tem recursos, e ele (tonga) tem porque tem lote.

Como foram distribuídos esses lotes?

|21:49|

Isso é com a política fundiária. São eles que distribuem lotes a quem estava nas fazendas e não aos forros. E isso só complicou a situação! Como ele vivia na fazenda, sabia trabalhar e ficou com poder porque tem um espaço de terra seu e produz. Já o forro não. Então o que acontece é que ele está a produzir comida e a mulher do forro - que não tem espaço para produzir - vai comprar e ele pode ludibriá-la. Esta guerra é complicada e tem que se alterar...

É uma luta entre o poder económico e social?

|22:45|

É uma luta pelo reconhecimento de personalidades. Porque, por exemplo, um cabo-verde deveria estar lá. Ele deve ter atenção porque ele tem por hábito, apesar de ter nascido em São Tomé, de dizer que é cabo-verdiano. Ele deveria assumir que é santomense de origem cabo-verdiana. Nem querem a língua santomense. Neste momemto 98% dos moradores da ilha do Príncipe são cabo-verdianos. O lunguyé já foi abafado, não há nem 30 falantes. O crioulo cabo-verdiano é que se sobreleva.

Então o lunguyé deveria ser estudado e preservado?

|24:24|

(19)

E cá em São Tomé?

|27:00|

Cá, tem pés para andar porque há muitos elementos que nos ajudam. A primeira coisa é o coeficiente das músicas. Noventa e tal porcento da produção nacional é em línguas nacionais.

E em relação a São Tomé, que línguas podemos considerar ainda vivas?

|28:13|

Nacionais ou que vieram? O kaboverdianu de São Tomé é uma variante, chamado idioma Kaboverdianu veiculado em São Tomé. Não é original porque não nasceu aqui. Nós não determinamos em cima disto. Nós só trabalhamos com quatro línguas que são o santomé, lunguyé, ngola, fa d’Ambô (que é falar de Ano Bom). E estas quatro línguas - nenhuma oficializada - fazem parte de um grupo linguístico especial no mundo e nasceram em São Tomé. São o resultado de uma proto-língua com sucessivos abonos de diferentes épocas. Depois houve o desmembramento, cada um com sua época e com resgates diferentes. Quer dizer que houve abonos, o superestrato12 e o adstrato13. Mas o angolar ganhou muitos (falantes) que vieram da costa africana

depois de 1520 com os resgates vindos de Angola, os quimbundo e umbundo. Para a ilha do Príncipe é os que vieram da Nigéria, os Calabares. São Tomé, como estava aqui no meio termo, ganhou influências dos portugueses que estavam aqui. Por isso, a maioria das nossas palavras são do português daquele tempo. Então como fazemos uma reconstrução cultural? Eu tive a sorte de estar agora com a Celina Pereira, que reconstruiu o lundú de Cabo Verde em 1976. Temos que levar para a frente este projecto de reconstrução do lundú. E quem tem? Nasceu em Angola, foi para o Brasil, São Tomé, Cabo Verde e Portugal, os outros não têm, nós é que temos! Há muitos elementos que nos unem culturalmente. Todos passaram por aqui, nós somos o Brasil de África. Do ponto de vista fisiológico, biológico, antropológico, nós não somos da costa africana, nem no nome! Somos insulares, um encontro entre a África e Europa. Somos um encontro, não o absoluto!

Agora gostaria que me identificasse sítios e locais de interesse em São Tomé e Princípe. [que os santomenses valorizam - associados a histórias de vida, à tradição oral, à história da ilha]

|35:10|

Isso requer, outra vez, uma estratificação. Se estivermos a falar dos tongas, os exemplos são bastantes. Se quisermos falar dos últimos que vieram da região de Angola, os quimbundos e umbundos, os BasaCongos, assim se pode dizer. Temos Monte Café como última estratificação, Bela Vista, Monte Macaco, Rio do Ouro (roças). Houve um grande movimento para aldeamentos como, por exemplo, Oque del Rei - aldeia Moça, Conde - Água Casada e Ferreira Governo. Todas as fazendas têm cabo-verdianos. Em relação aos Moçambicanos o meu registo está desactualizado.

Por isso, se quisermos dividir os valores culturais, também temos que dividir por grupos de gente, eu chamo a isto grupo sócio-histórico-cultural. Os valores deles não são iguais aos outros.

Agora se falarmos da cultura dos forros, isso é falar do indivíduo que não sabe que ele, é ele próprio. Estamos a falar da individualidade cultural. Tem uma personalidade muito elevada. Ele é equiparado a um europeu, tem direito à função pública e tudo, mas é um estúpido! Então deram-lhes poder, a maioria deles era polícia rural. E tinham roças em que, grande parte, estava por plantar. E é uma coisa que se mantém. Isto é,

12 Em linguística o superestrato engloba o conjunto de características lexicais, fonéticas e gramaticais deixadas numa

língua já consolidada por falantes de um grupo invasor ou estrangeiro que fala uma língua diferente.

13 Adstrato é a designação utilizada para descrever a influência mútua entre duas línguas de diferentes proveniências

(20)

ele tem uma personalidade muito elevada, mas não a sabe usar. Nem da lei ele sabe, nem de casamento que é uma grande fonte dos problemas e dos filhos que dele advêm.

A obrigação de acasalamento foi muito influenciada por África. A gente não quer europeus porque os mulatos não têm pátria, não sabem defender um sítio. Então a tendência foi acasalar somente com negras. Por exemplo, a minha mãe era uma célebre dançarina de gramafinola14 e o meu avô proibiu-a de ir para o

ambiente das fazendas para que nenhum branco se apaixonasse por ela. A minha mãe tinha que ficar com um forro e preto.

No seu ponto de vista, o que deveria ser feito para preservar a cultura em São Tomé? [para a construção de uma memória colectiva e referências identitárias comuns]

|48:00|

Agora vamos falar dos elementos sócio-culturais, que não sócio-linguísticos. Ora, temos que continuar a

fazer uma estratificação. Temos que referenciar os elementos.

Embora havendo um apetite para a produção de músicas em línguas nacionais, há um grande problema que é, não se consegue escrever correctamente, nem se diz correctamente, então é uma luta contra a maré.

São as atitudes comportamentais que também se reflectem na língua, o savoir faire. Por exemplo há uma divisão do pronome de tratamento que o português não tem. É o sumusum, sumun, sum e cada um se refere a um sujeito e comportamento diferentes. Isto para o santomé. Refiro-me ao facto da língua reflectir a cultura de um povo. Por isso, é difícil.

Eu não aceito a tchabeta ou batuko como de São Tomé, mas sim como manifestações culturais em São Tomé, que são de Cabo Verde.

O Tchiloli é nosso, nós assumimos. Porque nós reconstruímos. Vem desde 1300 e pouco. Os textos importados são todos em verso e nós trabalhámos em cima deste texto. Acrescentamos personagens, o anacronismo do telefone... com o apoio do professor Ferreira da Silva e Estanislau Augusto Pinto, provavelmente, no ano de 1880.

Até a puita é nossa. Foi construída em São Tomé com o apoio dos escravos vidos de Angola. Na mesma altura do semba15 e lundú. Puita e almandage é nosso, somente tafúa é que veio [de fora] e o toque é

diferente.

Que outras manifestações culturais consegue incluir nas importações que se manifestam cá e nas que são cá criadas?

|55:17|

Então vou dizer-te tudo. Temos puita, almandage, o semba foi feito aqui, danço de congo, plo mon dessu, stleva, estas últimas são filhas do lundú. Foram todas construídas aqui, quando uma morreu criou-se a outra. Aladá e goma não são de cá mas manifestam-se aqui. São muitos rituais animistas. E ainda o baile. Foram todas sofrendo mutações.

E podemos dizer que continuam todas vivas?

|56:39|

Não. O lundú está morto. O baile eu penso que está quase... porque o stleva16, havia em Santana, se o senhor

estiver vivo é o único que faz isto. O plo mon dessu, o único grupo é de Ototó, está praticamente

14 De gramofone.

15 Semba é um dos estilos musicais angolanos mais populares. A palavra semba significa umbigada em quimbundo

(língua de Angola). Foi também chamado batuque, dança de roda, lundú (ou lundum), chula, maxixe, batucada e partido alto, entre outros, muitos deles convivendo simultaneamente.

(21)

desmembrado. Almandage (irmandade) só o grupo Formiguinha da Boa Morte é que toca, no final do Tchiloli. Eles fazem isto para preservar, é de 1800 e tal. Foi criado na mesma altura do lundú. É original da Trindade, com o grupo Uémbé. Como vê esta zona está perto de Monte Café, e foram os tongas vindos de Angola que ajudaram a construir isto.

Haverá já alguns traços (materiais/imateriais) da cultura Santomense que se perderam? Quais?

|59:30|

Bastantes. Uma das coisas é o traje. O São Tomense já não respeita a indumentária clássica. Antes era muito rigoroso. O uso de um bastão/bengala era utilizado como defesa pessoal, que também está representado nas personagens do Tchiloli. O chapéu, o bigode.... Aquele que é conservador tem grandes problemas de reconhecimento na sociedade multicultural. A entrada dos tongas desfavorece o comportamento dos forros. Os tongas normalmente falam de mais, mentem, não têm carácter, porque é muito sanzaleiro. A sanzala é sempre comum e o forro é muito reservado e não admite que a conversa transborde, é discreto. Com o advento da independência, os tongas também ganharam liberdade e vêm incomodar a matriz do forro.

Há um conflito entre o comportamento cultural de um realmente forro e os que são descendentes de fazenda. Um tem tradição de sanzala e o outro de quinté (quintal). Há um diferendo. Estão de costas voltadas.

Mas voltando aos traços que se estão a perder. A stleva está quase mas ainda há memórias, o plo mon dessu só ficou um reduto e o lundú morreu. Eu tinha um projecto de resgate do lundú, o ressurgimento ou reconstrução. Eu tenho todo o material na mão, até as letras e pautas de 1800 e pouco. É um género musical dançado com roda e alteamento (dos braços). Não tem traje. Tem coreografia e é muito lascivo e por isso foi proibido em Portugal durante quase 100 anos. Saiu de Angola com o nome de batuco e no Brasil ganha o nome de lundum/lundu. E lá ainda há até hoje.

E a letra é em que língua?

|1:13:24|

Houve várias. E é a Celina Pereira que estudou o de Cabo Verde que é só instrumental. Em São Tomé eu conheço letras em santomé. A letra e o gesto só se referem ao acto sexual.

Tem a ver com um modo de vida?

|1:14:40|

Claro que sim. Reflecte tudo. A maioria é voltada para a relação homem/mulher/filho/criança.

O léxico é muito reduzido, não é?

|1:15:09|

Dois mil e tal. Mas a maioria é relacionada com isto!!!

|1:15:40|

Em termos comportamentais também já perdeu um bom bocado. Anteriormente o santomense tinha uma carga de religiosidade muito alta e agora baixou. E cada vez que baixa a religiosidade também baixa a relação e o amor mútuo. Já não há relação de parentesco. Sinal de parentesco não é por ser família mas sim parente. Basta ser da mesma freguesia que já és parente, ou madrinha, ou associado a um amigo. O parentesco aqui são relações sociais que se estabelecem. A palavra lumón não é porque é irmão mas sim parente. Trata-se de uma relação que exige respeito.

Quer acrescentar alguma coisa aos traços culturais que se perderam?

(22)

Na extracção vinícola perdeu-se o calebasse (cabaça) e é grave, porque é um elemento de conservação do vinho que garante a mais alta qualidade do estado do vinho. Digo isto porque tenho um manuscrito de 1506 que dizia que já se extraía vinho em São Tomé com calebasse por negros vindos da costa africana (eu penso que eram nigerianos).

E que vinho era?

|1:20:00|

Vinho da palma.

Que agentes culturais (instituições/indivíduos) identificaria em São Tomé?

|1:22:41|

Produção cultural em São Tomé começou naquela altura.... porque eu tenho memória. É que eu não gosto de falar desacertado. Não havia instituições. A Liga de Interesses Indígenas é esta casa aqui, por isso é que se tornou na Casa da Cultura. Sede da Liga entre 1911 e 1927. E o estado mandou assaltar e pegou fogo a todos os documentos. Só que havia um problema, eles só defendiam homens de bens, não os pobres. Mas já no ano de 1880 havia sido constituída a Sociedade Africana 23 de Setembro para defender todas as causas culturais. No ano de 1906, o príncipe real D. Luís Filipe veio para São Tomé. Aqui é a casa da câmara e havia cá uma banda. E foi para França, a convite daquele príncipe, e ganhou o primeiro lugar num concurso, com apenas 14 elementos. E cruzou-se com a banda da Guarda Nacional Republicana com 1500 homens.

E o que interpretou?

|1:25:42|

O Lundú de São Tomé. Tem um compasso de andamento de quatro passos.

Era aqui a casa da Câmara Municipal de São Tomé. Vê que tem mármore e esta tem estátuas em todos o quadrantes. Esta é de 1800 e qualquer coisa.

E quando foi reabilitada?

|1:27:06|

Há coisa de 10/15 anos, com o apoio da UNESCO. Foi recuperada para restituir o seu valor cultural. Preservaram todas as suas características. Isto já tinha sido um hotel. Tornou-se Casa da Cultura por ter sido a sede da Liga dos interesses Indígenas. Porque a Associação de Socorros Mútuos veio depois na Trindade.

Então e agora, consegue indicar alguns criadores culturais?

|1:28:33|

Nós temos o Sum Canalim17, de Santana, que é muito importante. Ele é um pintor naive e é pai de um estilo.

Antes do Brasil e é o primeiro em África, com baixos-relevos e tudo. Depois não vamos ter mais nada se não os grupos de baile. Não é por serem realmente grupos de baile, é um clube. Temos o Sporting Clube de São Tomé, que não é do Sporting, é cultural e político, e há várias manifestações culturais lá dentro, mas também com procedimentos políticos para a independência de São Tomé. Há também os grupos como Coimbra Nova, o Almense que também são grupos, em algumas freguesias, que se agregam para realizaram actos culturais, que também têm por trás actos políticos. Isto viveu, mais ou menos, uma centena de anos. Depois, logo a seguir, o que vamos encontrar, são os movimentos culturais, que já não são clubes. Que são as zonas que criam, o Tchiloli, bulawés. E isto desenvolve-se por quase toda a ilha. Depois de 1976 encontramos a morte dos bailes e socopés e encontra-se o surgimento dos bulawés, contudo alguns grupos culturais

17 Pascoal Viana de Sousa Almeida Viegas Lopes Vilhete (nascido no séc. XIX), conhecido com o nome de Sum

(23)

resistem. É isto que vamos encontrar. Independentemente daquilo que chamamos de conjunto que é uma forma copiosa, ou internacional, ou desta paragem da costa. Porque para os ritmos de São Tomé o que mais marcou é ússua e só ficou marcado com Ayder Índia até ao mais alto grau com Seu Lula (1978/9).

Fora disso não se construiu mais nada em São Tomé. Angola regressou para a rebita. São Tomé ainda não regressou para a sua raiz original. Está a cantar coisas dos outros. Nós temos também o bimbá que está extremamente ameaçado. É um tipo de arpado tradicional, harpa. Só há um homem em São Tomé que toca isto e vai morrer. E temos um mais alto tocador de nguené - que o Brasil chama berimbau - também está à beira da morte.

Parte II: Um museu em São Tomé

Conhece o museu de São Tomé?

|1:35:26| De lés a lés.

Que outra tipologia de museu gostaria que houvesse em São Tomé?

|1:35:41|

Deveria dividir as memórias dos grupos sócio-historico-culturais. Nós não somos todos iguais. O Ferreira da Silva é que fez aquilo como a cabeça mandou para o V Centenário da Descoberta de São Tomé, em 1970. Não foi uma coisa seriamente construída. Se reparar, quantas peças estão lá? Estão lá peças de ordem, de religião católica. Não tem mais nada. Cama do Barão de Água-Izé... não representa nada! Não representa São Tomé.

Por exemplo, um devasson é muito representativo para São Tomé, tanto que até no Tchiloli está presente, e porque é que lá não tem? Lá tem moquixi, tem coisas à toa. Coisas de animismo. Não tem coisas que represente São Tomé. No Tchiloli, o Reinaldo de Montalvão traz uma cruz nas costas porque por tradição da família ele é católico, mas ele traz também um devasson (defensor)18 na mão ao lado da bengala. E porque é

que não há lá isto? Tem que estar descrito. E falta muito mais...

Lá no museu tem uma flauta de prata que foi o prémio que São Tomé ganhou em França, em 1906, com as fardas brancas com botões de ouro e capacete tingido de ouro. Mas o Sr. Barros dizia que aquilo é da monarquia e não é... as coisas de São Tomé não estão escritas e cada um diz o que a cabeça manda.

O que gostaria de ver num museu de/sobre São Tomé?

|1:39:47|

Tem que estar interpretado. Tem que ser feita um estratificação social. E representação dos grupos sócio-culturais. Estratifica primeiro e depois apresenta os grupos. Estão lá coisas à toa... Há lá coisas de fazendas. Eu gosto, no entanto, é preciso falar dos forros, dos tongas.

De que forma se pode apelar à participação da população na constituição de um museu?

|1:41:00|

Eu continuo a dizer que para o equilíbrio social, a primeira coisa é que todo o mundo tem estatuto de gente, desde o momento em que nasce. Logo a seguir, como é que eles estão cá, qual é o estatuto deles? Então é estratificação. Dá-lhes categorias. Fazer a representação deles lá. Os valores deles, desde linguístico, manifestações culturais, tudo isso. Porque, por exemplo, o djambi não é nosso. Pelo menos não é meu. Mas passou a ser nosso porque os filhos de São Tomé também manifestam o djambi. Mas o que substitui o djambi, para o meu grupo é aladá e goma. Mas eu também já assisti ao djambi, não vou dizer que aquilo não

(24)

presta, também é bom. É um resquício de animismo. São manifestações ancestrais diferentes. No djambi entram em transe, saem fora do juízo. Djambi significa Deus em quimbundum.

Como foi construído por um católico ele tem que escamotear estas coisas. As coisas são contadas de forma conduzida.

Onde deveria ser um museu de/para as pessoas?

|1:46:17|

Fotxi pedassu. Onde se fez o Hotel Pestana. Há lá uma fortaleza que foi semi-destruída pelos Holandeses. Está lá uma estrutura em pedra e cal. O estado Santomense devia ter-se preocupado com a sua preservação.

|1:48:48|

Eu sou presidente da associação cultural santomense que defende todos os valores culturais de São Tomé e Príncipe e diásporas. Zelamos pela preservação de valores ou pela reconstrução ou reabilitação dos valores em vias de extinção. O lundú morreu em 1800 e pouco.

E de que forma fazem esse trabalho?

|1:49:39|

É necessário investigar, adquirir elementos e depois disso afectar todos os recursos. Por exemplo eu trabalho directamente com as bandas para que voltem a tocar coisas antigas. Dou-lhes as pautas e, neste momento, está vivo. E também somos membros da FONG.

E há mais algumas associações deste tipo?

|1:51:05|

Com o nosso nível, não! Eu só respeito todas a que pertenço: UNEAS, LEC (Liga de Escritores dos 5 Países de Língua Oficial Portuguesa), ACS. Só não pertenço à AAPLAS, e é a única que respeito com pendor cultural. Os outros não têm o know how.

Mas há mais?

|1:51:52|

Os divertidos, Intercultura, Associação Cultural de Guadalupe. Mas não tem serventia porque não actuam.

E quais são as estratégias que vocês utilizam?

|1:53:40|

Aqui não há nada disso. As coisas não são lineares.

(25)

III. Conversa com Nelson Campos, realizada na Casa da Cultura, no dia 7 de Novembro de 2011, às 16h.

Identificação

Nome: Nelson Campos Idade: 35 anos

Localidade: Água Porca, São Tomé

Actividade profissional: Professor, Director da Casa da Cultura

Habilitações literárias: Bacharlato em Línguas e Literaturas Modernas; Licenciatura em Língua e Cultura Portuguesa

Gostaria que me falasse das datas importantes acerca desta estrutura.

|0:01:35|

Sobre a Casa da Cultura, uma das maiores dificuldades com que nos confrontamos são as fontes documentais. No passado, a Casa da Cultura foi o centro da Liga dos interesses indígenas que era um grupo organizado que defendia os interesses do homem santomense. Eu de momento não posso precisar a data, mas caso esteja interessada, tenho documentos e posso facultar-lhos. Tenho alguma informação daquela organização ainda da era colonial. E depois, este edifício pertenceu a uma família, cujo nome não consigo precisar agora porque eu tratei de fazer o levantamento quando assumi esta divisão, fui ao museu mas dificilmente se consegue alguma coisa...ouve-se, as pessoas vão dizendo... As pesssoas mais velhas têm alguma informação mas são memórias, não há suporte escrito, documental.

A Casa da Cultura, depois da era colonial, serviu muito os interesses da população, do povo santomense, depois veio para cá residir uma família, a família Aguiar, já depois da independência (inclusive eram primos do Dr. Armindo Aguiar, professor de História e historiador), inclusive uma das filhas foi a ex-directora da Direcção Regional de Cultura, Yolanda Aguiar.

Depois de terem deixado esta casa, ela caiu num estado de esquecimento e abandono e como tal, se não fosse a qualidade desta estrutura da época colonial... Só em 2006 é que o Estado Santomense recuperou a estrutura, reabilitou-a e entregou ao sector da cultura como sendo a Casa da Cultura, património nacional. Foi recuperada com o apoio da cooperação espanhola.

Quais os principais intervenientes para a existência deste espaço?

|0:06:50|

Enquanto Casa da Cultura posso garantir-lhe que a figura de proa, o número um, é o Ministro da Educação, tal como do Instituto Superior Politécnico (ISP) e a Biblioteca Nacional são instituições tuteladas directamente pelo ministro. E depois está o director da Casa da Cultura, que neste caso sou eu. Também estamos ligados à Direcção Geral de Cultura devido ao tipo de estatuto que a Casa da Cultura tem e, apesar de não parecer, ela não é totalmente autónoma porque depende também da Direcção Geral de Cultura.

A gestão é partilhada?

|0:07:58|

A gestão não porque os estatutos deixam muito claro que a Casa da Cultura goza de plenos poderes de gerir os recursos financeiros e patrimoniais. Mas, no entanto, há ali uma ambiguidade na interpretação que deixa em crer a interferência da Direcção Geral de Cultura em alguns assuntos.

A que se refere quando fala em gestão patrimonial?

(26)

Eu estou a falar concretamente da preservação/manutenção do edifício/imóvel.

Portanto, esse é o património pelo qual a Casa da Cultura zela. E há algum acervo?

|0:08:47|

Não, não tem. Já houve algum acervo mas foi tudo entregue ao Arquivo Histórico. Tratava-se de um acervo documental.

(...)

Agora, no que diz respeito à planta de raiz do edifício, não se trata da planta originária. Ela foi alterada porque nós não conseguimos precisar quantos anos esta estrutura, este edifício, tem. Deve ter sido construído na altura da edificação da cidade, porque todos estes edifícios devem ser da mesma época, têm estruturas semelhantes. A Câmara, o Gabinete do Primeiro Ministro...

Antigamente, as ex-empresas agrícolas tinham necessidade de ter a sua sede aqui na capital e foi com este intuito que se foram construindo estes edifícios. Não sei, por isso, até que ponto este edifício não terá sido um escritório de uma das empresas agrícolas. Não posso avançar mais porque não tenho a informação precisa. Ainda não consegui fazer uma pesquisa exaustiva porque não é fácil pesquisar no Arquivo Histórico uma vez que está com grandes dificuldades de preservação dos documentos. Não têm material técnico, os documentos já estão num estado muito avançado de degradação e há um trabalho em que a directora está muito empenhada que é a informatização dos dados (que se perderam com o desaparecimento - roubo - dos antigos computadores).

De que forma é que a programação da Casa da Cultura veicula a sua missão?

|0:12:57|

Quando eu assumi a direcção da Casa da Cultura, encontrei um programa que havia sido estruturado pelo antigo director, o Frederico Gustavo dos Anjos. O que tenho feito é tentar alargar o programa de forma a poder responder às necessidades actuais, às demandas, que são naturalmente muito prementes, como os valores em crise/decadência, e vamos ver se conseguimos reabilitar esta parte.

Sabe, uma Casa da Cultura, deve trabalhar no sentido de preservar todos os valores, desde a língua até aos objectos. Mas isso depende muito dos recursos que a instituição tenha ao seu dispor e da política do próprio país. Depende muito da política cultural e da vontade dos políticos. Porque o sector cultural nunca mereceu muita atenção, está sempre focada na educação. Daí a necessidade de realizarmos este Fórum Nacional da Cultura, para termos um suporte único, um documento oficial que possa ser entregue ao Governo e que este possa encontrar recursos para o desenvolvimento do sector da cultura.

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Posso ainda acrescentar que o ministro, numa das viagens ao Brasil, entrou em contacto com o governo brasileiro e trouxe para cá a Casa Brasil19, a equipa da Casa Brasil, que zela pela preservação dos valores

culturais brasileiros. Nós vamos assinar uma parceria com a Casa Brasil. Já vieram equipas 2 vezes a São Tomé. Há 2 meses esteve cá uma equipa constituída por engenheiros da construção civil que vieram fazer a prospecção e um levantamento das necessidades do espaço das traseiras, para o transformar, talvez, num anfiteatro. Eles estão a trabalhar sobre a planta. Eles trouxeram um projecto e já fizemos uma adaptação à realidade nacional, eu e outra representante do Ministério da Educação, é que estamos a trabalhar com a equipa. E quando o projecto chegar, a Casa da Cultura vai deixar de ser o que é. Haverá muitos serviços, uma rádio comunitária que funcionará a partir daqui, um tele-centro, sala de informática muito bem equipada com cerca de 20/30 computadores, sala de leitura, e muitos outros serviço. Virão técnicos do Brasil e irão alguns jovens santomenses para o Brasil receber uma formação de curta duração intensiva para poderem trabalhar connosco. O projecto visa a inclusão social.

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Só para citar, nós temos quatro grandes áreas que são: instituir o espaço “À conversa com...” que é um espaço radiofónico. Inclusive eu já estive a tratar com o Director da Rádio Nacional porque a Direcção Geral da Cultura tem um espaço institucional e gostaria de o recuperar com o objectivo de informar o público, principalmente os jovens, acerca das especificidades de cada um dos géneros literários porque vamos promover concursos literários. Também gostaria de promover entrevistas radiofónicas com escritores, representantes de grupos culturais. Inventariar e informar o público sobre as particularidades culturais santomenses, quer sejam locais, regionais ou nacionais. Também gostaríamos de ter um espaço para promover e dinamizar o teatro nacional, formação no domínio do teatro, organização de espectáculos teatrais, comemoração do dia mundial do teatro, realização de um concurso anual de teatro. Organização de digressões culturais para a região autónoma do Príncipe e para os distritos em estreita parceria com o governo regional e com as câmaras distritais; reedição do Auto de Floripes e da Tragédia do Marquês de Mântua e do Imperador Carloto Magno; promoção de textos dramáticos susceptíveis de serem representados. Incentivar o gosto pela leitura e promover a escrita através da iniciativa “Vem ler” que se trata da leitura recreativa de textos de autores santomenses; Concurso “A poesia do mês”; Concurso “A prosa do mês”; ilustrar contos populares santomenses em jeito de concurso; adaptar os contos populares santomenses a banda desenhada; publicar os textos e trabalhos seleccionados nos concursos; activar um sítio da Casa da Cultura na internet (é um trabalho que já está a ser realizado); criar uma revista mensal da Casa da Cultura. Organizar e manter um espaço de encontro e animação cultural chamado Kinteli flogá, um espaço de interacção, com participação das actividades comemorativas do dia da música, dia da Casa da Cultura (28 de Setembro).

Promover debates e palestras em torno de temas da actualidade. Promover e incentivar os artistas nacionais a exporem as suas obras ao público. Promover um concurso de músicos e músicas nacionais, sobretudo jovens. Realizar sessões (noites e tardes) de rumba, ússua, socopé que são as danças tradicionais. Homenagear músicos e artistas nacionais já falecidos. Promover sessões de cinema e contos infantis para crianças. Promover sessões de pintura, escultura, música e outras mais formas de expressão artística ao ar livre. Registar para arquivo os referidos acontecimentos como forma de preservar as informações recolhidas em suportes audiovisuais e escritos, caso haja.

Promover iniciativas de estudo e pesquisa que contará com o apoio do Centro de Estudos em Ciências Sociais, cujo coordenador é o Dr. Armindo Aguiar.

19 O Projecto é uma iniciativa do Governo Brasileiro, que envolve vários Ministérios. A Casa Brasil é um espaço

Referências

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