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Grupo de Trabalho Comunidades Indígenas Grupo de Trabalho Migrações e Refúgio

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Academic year: 2021

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Nota Técnica ao SCD nº 07 de 2016/ PL nº 2.516/2015 / PLS nº 288 de 2013, que institui a Lei de Migração

Trata-se de Nota Técnica dos Grupos de Trabalho Migrações e Refúgio e Comunidades Indígenas da DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO acerca do Substitutivo da Câmara dos Deputados (SCD) nº 07/2016 ao Projeto de Lei nº 2.516-A/2015 (PLS Nº 288/2013 na Casa de origem), que institui a Lei de Migração, especialmente no que se refere à

mobilidade indígena.

O atual “Estatuto do Estrangeiro” (Lei n. 6.815/1980) e o “Estatuto do Índio” (Lei n. 6.001/1973) são normas editadas à época do regime militar, de viés autoritário, que não trazem disposições específicas a respeito da mobilidade indígena transfronteiriça.

Os povos indígenas são vítimas de uma “invisibilidade” histórica, resultado de séculos de perseguição e extermínio, o que tem acarretado deficiência na produção de normas e na formulação de políticas públicas de apoio.

Esta invisibilidade se evidencia até mesmo por meio da análise dos dados demográficos, tendo em vista que, apenas no Censo Demográfico 1991, o “indígena” é retratado na composição da sociedade brasileira, caracterizado como “cor”, ao lado das categorias branco, preto, amarelo e pardo. A etnia e a língua falada pelos indígenas vieram a ser consideradas como objeto de investigação somente no Censo 2010.1

Além disso, a intensidade dos fluxos migratórios atualmente tem suscitado estudos e produção normativa sobre a figura do migrante, a exemplo da Convenção da ONU sobre Trabalhadores Migrantes e dos Membros das suas Famílias. Contudo, no tocante à “mobilidade indígena”, os debates são escassos.

De acordo com o Panorama Social da América Latina 2006 da CEPAL2, a migração

internacional indígena é subdividida em migração indígena internacional propriamente dita, migração transnacional, mobilidade forçada e mobilidade no território ancestral.

1 IBGE. Censo Demográfico 2010. Características gerais dos indígenas. Resultado do universo. Disponível em:

<http://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/periodicos/95/cd_2010_indigenas_universo.pdf>

2 COMISSÃO ECONÔMICA PARA A AMÉRICA LATINA E O CARIBE - CEPAL. Panorama Social da América

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A mobilidade internacional propriamente dita trata dos povos indígenas que migram para outros países e não mantém laços com a comunidade de origem. Na mobilidade transnacional, há manutenção dos laços com a comunidade de origem, bem como a criação de novos vínculos no país receptor. A migração internacional forçada trata do deslocamento decorrente de perseguição por parte do Estado, guerras civis ou conflitos internos, ou forma de resistência diante da pobreza no país de origem.

Por sua vez, a mobilidade territorial ancestral – que é, ao nosso ver, objeto do §2º do art. 1º do Projeto de Lei de Migração – trata dos povos indígenas cujas fronteiras étnicas vão além dos limites dos Estados-nacionais. Nesse sentido, de acordo com a CEPAL, existe um costume jurídico de deslocamento no interior das fronteiras étnico-culturais.

O Brasil apresenta diversas comunidades em região de fronteira. Apenas para exemplificar, cita-se os Guarani, nas fronteiras do “Mercosul”, grupo hoje extremamente vulnerável; os Yanomami, na fronteira brasileira/venezuelana, drasticamente reduzidos na época da ditadura militar, em razão da exploração mineral, nuclear e do desflorestamento para construção de estradas na Amazônia.3 No Acre, há diversos grupos isolados que ocupam a

região de fronteira com o Peru.4 Na tríplice fronteira Brasil, Colômbia e Peru há grande

mobilidade indígena e, também, notícias de graves violações a esses povos por empresas mineradoras, garimpeiros, grileiros e madeireiras5, entre tantos outros.

Fator importante a ser observado é que, aos povos indígenas transfronteiriços, a mobilidade no território ancestral é essencial para manutenção de sua cultura, de sua identidade e, consequentemente, de sua sobrevivência digna.

A preocupação com os povos indígenas e tribais em região de fronteira encontra expressão desde a Convenção da Organização Internacional do Trabalho (OIT) n. 169 de 1989, que dispõe em seu artigo 32:

Os governos deverão adotar medidas apropriadas, inclusive mediante acordos internacionais, para facilitar os contatos e a cooperação entre povos indígenas e tribais através das fronteiras, inclusive as atividades nas áreas econômica, social, cultural, espiritual e do meio ambiente.

3 DAVIS, Shelton H. Vítimas do milagre. O desenvolvimento e os índios do Brasil. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1978,

p. 130-133.

4 AQUINO, Terri Valle de. A fronteira dos isolados. In: Revista da sociedade brasileira para o progresso da ciência,

ano 65, n. 1, jan./mar. 2013, p. 33.

5 SILVA, Reginaldo Conceição da. Conflitos por terra e água no alto Solimões envolvendo povos e comunidades

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Em redação mais avançada, a Declaração da ONU sobre os Direitos dos Povos Indígenas de 2007 assegura, em seu artigo 36, o direito de trânsito no território ancestral, nos seguintes termos:

1. Os povos indígenas, em particular os que estão divididos por fronteiras internacionais, têm direito a manter e desenvolver os contatos, as relações e a cooperação, incluídas as atividades de caráter espiritual, cultural, político, econômico e social, com seus próprios membros assim como com outros povos através das fronteiras.

2. Os Estados, em consulta e cooperação com os povos indígenas, adotarão medidas eficazes para facilitar o exercício e garantir a aplicação deste direito.

No mesmo sentido, a Declaração Americana sobre os Direitos dos Povos Indígenas, aprovada em 15 de junho de 2016, traz a seguinte previsão:

Artigo XX. Direitos de associação, reunião, liberdade de expressão e pensamento

[...]

3. Os povos indígenas, em particular aqueles que estão divididos por fronteiras internacionais, tem direito a transitar, manter, desenvolver contatos, relações e cooperação direta, incluídas as atividades de caráter espiritual, cultural, político, econômico e social, com seus membros e com outros povos.

4. Os Estados adotarão, em consulta e cooperação com os povos indígenas, medidas efetivas para facilitar o exercício e assegurar a aplicação desses direitos. 6

Vale lembrar que o contingente indígena na região de fronteira é fator de promoção da segurança nacional e de garantia da soberania brasileira, uma vez que, nas palavras do Prof. Dalmo de Abreu Dallari, “o que se sabe, por fatos divulgados pela imprensa, é que a ameaça à soberania brasileira sobre terras indígenas vem de brasileiros não-índios associados a empresas estrangeiras ou trabalhando para elas, visando a exploração econômica de riquezas existentes em terras indígenas”.7

Ademais, os povos indígenas em região de fronteira não tem manifestado qualquer intenção de construir Estados independentes, de modo que eventual temor nesse sentido não

6 Tradução livre do original.

7 DALLARI, Dalmo de Abreu. Nota Técnica – Índios na Fronteira. Data: 03/06/2008 Disponível em:

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se sustenta. Com efeito, a própria Declaração da ONU sobre os Direitos dos Povos Indígenas de 2007 assevera em seu artigo 46:

1. Nada do disposto na presente Declaração se interpretará no sentido de que concede a um Estado, povo, grupo ou pessoa, qualquer direito de participar em qualquer atividade ou realizar qualquer ato contrário à Carta das Nações Unidas, nem se entenderá no sentido de que autoriza ou fomenta qualquer ação direcionada a desmembrar ou afetar, no todo ou em parte, a integridade territorial ou a unidade política de Estados soberanos e independentes.

Igualmente dispõe a Declaração Americana de 2016:

Artigo IV. Nada do contido na presente Declaração [...] será interpretado no sentido de que autoriza ou encoraja qualquer ação tendente a desmembrar ou prejudicar, totalmente ou em parte, a integridade territorial ou a unidade política de Estados soberanos e independentes.8

Portanto, o Projeto da Lei de Migração vem, de modo salutar, promover a atualização e adequação da legislação brasileira ao atual cenário de proteção dos direitos dos povos indígenas e garantir a soberania nacional, ao reconhecer, em seu artigo 1º, §2º: Art. 1º Esta Lei dispõe sobre os direitos e os deveres do migrante e do visitante, regula a sua entrada e estada no País e estabelece princípios e diretrizes para as políticas públicas para o emigrante. [...]

§ 2º São plenamente garantidos os direitos originários dos povos indígenas e das populações tradicionais, em especial o direito à livre circulação em terras tradicionalmente ocupadas.

Vale lembrar que o PL teve, ao longo de sua tramitação, forte influência das propostas apresentadas no “Anteprojeto de Lei de Migrações e Promoção dos Direitos dos Migrantes”, elaborado por Comissão de Especialistas do Ministério da Justiça, com a participação de especialistas, instituições internacionais, governamentais e sociedade civil, por meio de inúmeros e democráticos debates, que resultou em uma das mais avançadas propostas de legislação migratória do mundo contemporâneo.9

8 Tradução livre do original.

9 MINISTÉRIO DA JUSTIÇA. Entenda o Anteprojeto de Lei de Migrações. Disponível em:

<http://www.justica.gov.br/noticias/proposta-de-nova-lei-de-migracoes-devera-substituir-estatuto-criado-durante-a-ditadura/entenda_novo_estatutoestrangeiro2.pdf> Acesso em: 24 jun. 2016.

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Assim, conclui-se que o art. 1º, §2º, SCD 07/2016, alinha-se à Convenção da OIT 169, bem como à Declaração da ONU e à Declaração de Americana sobre os Direitos dos Povos Indígenas, garante a soberania nacional e se apresenta como dispositivo essencial ao respeito dos direitos dos povos indígenas, que o Brasil tem o dever de respeitar diante dos preceitos constitucionais e dos sistemas internacionais de direitos humanos. Brasília, 12 de maio de 2017.

Referências

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