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Revisão sistemática da literatura norte-americana sobre a responsabilidade civil decorrente da publicidade infantil veiculada por Youtubers

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Academic year: 2023

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Revisão sistemática da literatura norte-americana sobre a responsabilidade civil decorrente da publicidade infantil

veiculada por Youtubers

Ana Luiza Masstalerz Pires ARAGÃO*

JesusmarXimenesANDRADE**

Dante Ponte de BRITO***

Cléber de Deus Pereira da SILVA****

RESUMO: Este artigo apresenta uma revisão sistemática da literatura referente à responsabilidade civil decorrente da publicidade infantil veiculada por YouTubers. O levantamento dos artigos foi realizado na base de dados eletrônica internacional HeinOnline, tendo sido consultadas também as bases Scopus e Web of Science. A questão norteadora desta pesquisa foi a seguinte: sobre quem recai a responsabilidade civil pela publicidade abusiva realizada pelos Youtubers? Foram incluídos somente artigos relativos a publicidade e defesa do consumidor, da criança e do adolescente, com foco específico no instituto da responsabilidade civil. No total, cinco artigos compuseram o corpus de análise da revisão. A síntese dos conhecimentos pode servir de alerta para os consumidores sobre a necessidade de maior proteção do público infanto-juvenil no ciberespaço.

PALAVRAS-CHAVE: Youtuber mirim; publicidade infantil; responsabilidade civil;

consumismo.

SUMÁRIO: 1. Introdução; – 2. Metodologia; – 3. Resultados; – 4. Síntese da literatura; – 5. Discussão dos resultados; – 6. Considerações finais; – Referências bibliográficas.

TITLE: Systematic Review of North American Literature on Civil Liability Arising from Child-Directed Advertising by Youtubers

ABSTRACT:This article presents a systematic review of the literature on civil liability arising from child advertising by youtubers. The survey of the articles was carried out in the HeinOnline database, also consulting the Scopus and Web of Science databases.

The guiding question of this research was: how to protect children from abusive consumption practices in the virtual environment? Only articles in the area of advertising and consumer protection, children and adolescents were included, with a specific focus on the civil liability institute. In total, five articles were used in the review analysis corpus. The synthesis of knowledge can serve as an alert for consumers about the need for greater protection of children and youth in cyberspace.

KEYWORDS: Juvenile youtuber; child-directed advertising; civil liability; consumerism.

CONTENTS: 1. Introduction; – 2. Methodology; – 3. Results; – 4. Synthesis; – 5. Result discussion; – 6. Final remarks; – References.

* Mestranda em Direito pela Universidade Federal do Piauí (UFPI), vinculado à linha de pesquisa

“Mudanças Institucionais na Ordem Privada”. Servidora do Ministério Público do Estado do Piauí.

Membro do grupo de pesquisa Relações de Consumo na Contemporaneidade – UFPI. E-mail:

analuiza@ufpi.edu.br.

** Doutor e Mestre em Controladoria e Contabilidade pela FEA/USP. Professor da Universidade Federal do Piauí (UFPI). Teresina – PI – Brasil. E-mail: jesusmar@ufpi.edu.br.

*** Pós-Doutor em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul - PUCRS. Doutor em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco - UFPE. Mestre em Ciências Jurídicas pela Universidade Federal da Paraíba - UFPB. Professor do Programa de Pós-Graduação em Direito da Universidade Federal do Piauí (UFPI). E-mail: dantephb@ufpi.edu.br.

**** Pós-Doutor em Ciência Política pelo Ibero-Amerikanisches Institut de Berlin (Alemanha). Doutorado em Ciência Política (Ciência Política e Sociologia) pelo Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro e Mestrado pela mesma instituição. Professor Associado da Universidade Federal do Piauí (UFPI).

Teresina – PI – Brasil. E-mail: dideus@ufpi.edu.br.

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1. Introdução

Na contemporaneidade, é cediço que as crianças já crescem cercadas por avanços tecnológicos. Ocorre que o acesso indiscriminado no ambiente virtual traz consigo reflexos sociais variados, entre eles o aumento da necessidade de as crianças serem protegidas também no ciberespaço, em virtude da imaturidade decorrente da tenra idade.

Uma das plataformas mais acessadas pelo público infantil é o YouTube, na qual é possível acessar conteúdos diversos em formato de vídeo. Apesar de a plataforma ter estipulado em sua política de uso a idade mínima de treze anos para acesso ao site1, essa não tem sido a prática social, levando em consideração que muitas crianças menores de treze anos assistem a vídeos on-line e inclusive se inscrevem em canais, para seguir as publicações dos chamados YouTubers (pessoas que possuem seu próprio canal na citada plataforma), mesmo que em um contexto hipoteticamente mais seguro, como é o caso da versão infantil da plataforma, o YouTube Kids.

Tais YouTubers, ou seja, pessoas que produzem conteúdo em vídeo para a plataforma, podem ter alto poder de influência sobre as crianças espectadoras, especialmente quanto à mudança de hábitos de consumo. Isso ocorre porque, por meio de publicidade (explícita ou sub-reptícia), os vídeos potencializam o desejo de aquisição de novos produtos/serviços, estimulando uma cultura consumista. Por isso, questiona-se: sobre quem recai a responsabilidade civil pela publicidade infantil praticada por tais produtores de conteúdo?

Esta pesquisa justifica-se, portanto, pela necessidade de investigar, frente ao avanço das tecnologias, que impactam diretamente as relações privadas (inclusive a consumerista), de que maneira as crianças que acessam canais de YouTubers estão sendo juridicamente tuteladas. No que tange aos objetivos do presente trabalho, o principal deles é verificar quais os instrumentos jurídicos existentes para a tutela da criança no ciberespaço e se esses instrumentos possuem mecanismos suficientemente adequados para regular a situação que, a cada dia, se torna mais presente no panorama nacional: o avanço das tecnologias e sua influência no público infantil.

Em relação aos demais objetivos específicos, pretende-se: (i) compreender a relação entre os influenciadores digitais/Youtubers com o público infantil; (ii) identificar instrumentos jurídicos do Direito do Consumidor que possam proteger as crianças de

1 WOLJCICKI, Susan. An update on kids and data protection on YouTube. Youtube Official Blog, 2019.

Disponível em: <https://youtube.googleblog.com/2019/09/an-update-on-kids.html>. Acesso em: 2 maio 2021.

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práticas abusivas de consumo no âmbito virtual; e (iii) analisar a possível responsabilização pela veiculação de publicidade infantil nos canais de Youtubers.

As seções do presente artigo estarão divididas da seguinte forma: primeiramente será apresentada a metodologia utilizada (revisão sistemática), em seguida os resultados das buscas nas bases de dados e, após, a síntese da literatura internacional. Por fim, se proporá a discussão do tema, apresentando as conclusões dos pesquisadores. Para realizar a revisão sistemática, será adotada a metodologia disposta a seguir.

2. Metodologia

O método utilizado por esta pesquisa foi o de Revisão Sistemática da Literatura (RSL), que consiste na seleção e análise de literatura com base em um problema de pesquisa, a fim de que a síntese e discussão dos trabalhos selecionados forneçam elementos capazes de contribuir com o escopo da investigação. Segundo Snel e Moraes2 a pesquisa jurídica carece de incrementos metodológicos, porque, em geral, o estado da doutrina ou de determinado fenômeno jurídico deve ser apoiado em dados precisos e com demonstração de evidências científicas, inclusive para que seja possível a replicação da pesquisa e a verificação de seus resultados. Na RSL o processo de seleção da literatura foi dividido em quatro fases: identificação, triagem, elegibilidade e inclusão.3

Na fase de identificação, foram realizadas buscas nas bases de dados internacionais HeinOnline, Scopus e Web of Science. Para a seleção foi utilizada a seguinte estratégia de busca: (child OR children OR kid*) AND (youtuber* OR “kid* youtuber*”) AND (“tort law” OR “civil responsibility” OR liability*) AND “consumer protection”.

Na fase de triagem os artigos identificados foram analisados, por meio do título e resumo, quanto a seu foco na questão central investigada (a questão de pesquisa da RSL). Em seguida analisou-se a elegibilidade dos estudos triados por meio dos critérios de inclusão e exclusão baseados nas características do artigo e específicas do estudo. Com base nas características do artigo foram incluídos os estudos que estavam disponíveis na íntegra, no idioma inglês e no período de publicação de 2015 a 2020 (todos usando a função de filtro das bases) e excluindo livros, capítulos de livros, editoriais, entre outros formatos que não fossem artigos revisados por pares. O período escolhido baseou-se no maior

2 SNEL, M.; MORAES, J. de. Doing a systematic literature review in legal scholarship. Netherlands:

Eleven International Publishing, 2018.

3 LIBERATI, A. et al. The PRISMA statement for reporting systematic reviews and meta-analyses of studies that evaluate healthcare interventions: explanation and elaboration. BMJ, n. 339, b2700, jul. 2009.

Disponível em <https://www.bmj.com/content/bmj/339/bmj.b2700.full.pdf>. Acesso em: 2 maio 2021.

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retorno de estudos relevantes com as palavras-chave procuradas em seu título ou no resumo. Posteriormente, ainda na fase de elegibilidade, os artigos elegíveis com base nas características do artigo foram lidos na íntegra. Nesse ponto, analisou-se novamente se o estudo tinha foco na questão central da revisão. A opção por artigos e pelo período de 2015-2020 se justifica, respectivamente, pelo processo de avaliação por pares, que garante aos artigos padrões de qualidade mínimos, e pelos estudos relevantes retornados no intervalo de tempo escolhido. O levantamento dos dados bibliográficos ocorreu nos meses de junho e julho de 2020. A seguir, são apresentados os resultados da RSL.

3. Resultados

Os artigos recuperados para a revisão foram originados exclusivamente da base de dados HeinOnline, pois não foram obtidos resultados nas bases de dados Scopus e Web of Science. Ao realizar a busca na HeinOnline, foram encontrados dez trabalhos, dentre os quais apenas nove eram de acesso livre. Não foi possível recuperar o artigo de acesso restrito pelo Google Scholar, restando este excluído da RSL.

Entre os nove trabalhados disponíveis, três foram excluídos por não terem relação com o tema e um por ser uma ampla lista bibliográfica, restando ao final cinco artigos que foram sintetizados e analisados nas sessões seguintes. A Figura 1 ilustra o processo da busca:

Figura 1 – Fluxograma do processo de busca de artigos da Revisão Sistemática

Fonte: elaboração dos autores.

Publicações potencialmente relevantes identificadas e em bases de dados Base Scopus: n= 0

Base Web of Science: n= 0 Base HeinOnline: n= 10

Publicações potencialmente relevantes após eliminar as duplicatas (n= 10)

Publicações rastreadas por Títulos e Resumos (n= 10)

Publicações em texto completo avaliadas para elegibilidade (n= 8)

Publicações incluídas em síntese (n= 5)

Excluídas pelos critérios de inclusão e exclusão (n= 2)

Texto inacessível: n= 1 Texto era lista bibliográfica = 1 Motivo 2: n=

Texto completo excluídos pelos critérios de inclusão e exclusão (n= 3) Falta de Pertinência Temática: n= 3

Excluídos por Duplicação (n= 0)

IdentificaçãoSeleçãoElegibilidadeIncluo

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Do ponto de vista metodológico, todos os estudos se assemelham, consistindo em pesquisas bibliográficas e documentais publicadas a partir de 2016. O Quadro 1 mostra essas e outras informações:

Quadro 1 – Comparativo entre os artigos analisados na pesquisa

Autoria do Estudo País

Ilust ra decis

ões admi

n/

judic iais

Alcance/Abo rdagem do

Estudo

Problema/

Questão/Objetiv o(s)

Principais conclusões

ARBEL, Yonathan A.

Reputation Failure:

The Limits of Market Discipline in Consumer Markets.

Wake Forest Law Review, v. 54, n. 5, p.

1239-1304, 2019.

EUA Sim Pesquisa descritiva com abordagem qualitativa.

Apresentar os problemas dos

“Sistemas de Reputação”

A reputação das informações é cercada de participação, seleção e vieses de desejabilidade social que a distorcem sistematicamente. Os limites da reputação

destacam a

centralidade da lei para o futuro do mercado.

Um sistema mais robusto de reputação pode preservar a

autonomia do

consumidor.

BONAR-BRIDGES, J.

Regulating Virtual Property with EULAS.

Wisconsin Law Review Forward, n.

79, p. 79-91, 2016.

Disponível em:

https://repository.la w.wisc.edu/s/uwlaw/

media/300201.

Acesso em: 2 maio 2021.

EUA Sim Pesquisa descritiva com abordagem qualitativa.

De que forma os contratos de licença de usuário final (EULAs), entre o editor e o usuário de jogos

online são

regulamentados.

O reconhecimento dos jogadores como uma classe de consumidor protegido pode ser necessário para salvaguardar os investimentos em jogos online.

CAMPBELL, Angela J. Rethinking Children's

Advertising Policies for the Digital Age.

Loyola Consumer Law Review. 2017.

Disponível em:

https://scholarship.la w.georgetown.edu/cgi /viewcontent.cgi?arti cle=2969&context=fa cpub. Acesso em: 2 maio 2021.

EUA Sim Pesquisa descritiva com abordagem qualitativa.

Estrutura regulatória da publicidade nos Estados Unidos e os fundamentos para regulamentar o marketing para crianças.

As mudanças no ambiente da mídia tornaram ineficazes as Proteções existentes para crianças contra práticas de marketing excessivas, enganosas e injustas.

CHAN, Vanessa.

When #AD Is #BAD:

why the FTC must

reform its

enforcement of disclosure policy in the digital age. Ohio State Business Law Journal, v. 13, n. 2, p.

303-333, 2019.

EUA Sim Pesquisa descritiva com abordagem qualitativa.

Distinção entre as mídias sociais e os meios

convencionais de publicidade e os métodos

insatisfatórios da FTC em relação as leis de divulgação.

A FTC deve ser mais rigorosa na regulação da propaganda por meio da educação e aplicação de punições.

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LUONG, Ashley. All that glitters is gold:

the regulation of hidden

advertisements and undisclosed

sponsorships in the world of beauty social media influencers.

William and Mary Business Law Review, v. 11, n. 2, February 2020, p.

565-607. Disponível em:

https://scholarship.la w.wm.edu/cgi/viewco ntent.cgi?article=1191

&context=wmblr.

Acesso em: 2 maio 2021.

EUA Sim Pesquisa descritiva com abordagem qualitativa.

Revisar as

diretrizes da FTC relativas aos anúncios ocultos e patrocínios não divulgados no

mundo de

influenciadores da mídia social de beleza.

Alguns obstáculos legais que permanecem e a necessidade de desenvolver diretrizes para atender às mídias sociais estratégias de marketing.

Fonte: elaboração dos autores.

4. Síntese da literatura

Ao confrontar a literatura selecionada, o objetivo foi responder compreender a relação entre os influenciadores digitais (YouTubers) e o público infantil, entendendo que, para que o entendimento seja completo, antes se mostra necessária a contextualização.

Nesse sentido, a mídia social é um elemento estabelecido na cultura contemporânea, que está ganhando credibilidade como uma poderosa ferramenta de marketing. Por isso, muitas empresas estão percebendo o grande potencial da utilização das mídias sociais para alcançar novos consumidores.4

De acordo com Campbell,5 a plataforma YouTube (lançada no ano de 2005 e comprada posteriormente pelo Google), tornou-se uma das mais importantes no acesso a vídeos.

Segundo o autor, só nos Estados Unidos da América (EUA), a plataforma tem espectadores com idade entre 18 e 49 anos em quantidade superior a qualquer rede de TV a cabo. Referida mídia social se tornou uma ferramenta confiável de marketing e os relacionamentos entre marcas e influenciadores passaram a ser parte central do sucesso e popularidade de produtos e marcas, como ocorreu também em outras plataformas.6 Nesse cenário, alguns YouTubers (criadores de conteúdo dentro da

4 CHAN, Vanessa. When #AD Is #BAD: why the FTC must reform its enforcement of disclosure policy in the digital age. Ohio State Business Law Journal, v. 13, n. 2, p. 303-333, 2019.

5 CAMPBELL, Angela J. Rethinking Children's Advertising Policies for the Digital Age. Loyola Consumer

Law Review. 2017. Disponível em:

<https://scholarship.law.georgetown.edu/cgi/viewcontent.cgi?article=2969&context=facpub>. Acesso em: 2 maio 2021.

6 LUONG, Ashley. All that glitters is gold, cit.

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plataforma de vídeos YouTube) acabaram por se enquadrar como influenciadores digitais.7

Para Chan,8 o marketing de mídia social é a forma mais orgânica de marketing, pois as empresas (fornecedoras) podem pegar carona nos relacionamentos e reputações que os influenciadores já possuem com o seu público. Nos EUA essa situação não poderia passar despercebida pelo órgão fiscalizador, que existe desde 1914, quando o Congresso aprovou a Lei da Comissão de Comércio Federal (FTCA) e criou a FTC (Federal Trade Comission), cuja missão é “proteger os consumidores e a concorrência, evitar práticas comerciais anticompetitivas, enganosas e desleais por meio da aplicação da lei, defesa e educação sem sobrecarregar indevidamente atividade comercial legítima”.9

Para promover a transparência no mercado e coibir falsas publicidades nos EUA, a FTC anunciou novas diretrizes em 2015. Isso porque com o crescimento das mídias sociais surgiu uma nova forma de avaliações de endosso por “influenciadores” (ou indivíduos que acumulam muitos seguidores). Estima-se que as empresas gastem bilhões de dólares pagando influenciadores para endossar produtos em suas contas nas redes sociais.10

Campbell11 afirma que a capacidade de segmentar publicidade com base nos interesses e características de indivíduos – conhecida como marketing direcionado ou publicidade comportamental on-line – permite que os anunciantes divulguem seus produtos/serviços com mais eficiência. Assim, aponta que, juntamente a esse marketing personalizado, surgem preocupações sobre o tipo e a quantidade dos dados coletados dos consumidores e a capacidade dos anunciantes de usarem esses dados para manipular consumidores.

Apesar de os termos de serviço do YouTube declararem explicitamente que a plataforma não é destinada a menores de treze anos, muitas crianças assistem a vídeos naquele site, e quando isso acontece, grande quantidade de informações a elas pertencentes é coletada.12 Todavia, a navegação de crianças na internet não é exclusiva das plataformas de vídeos (como o YouTube). O público infanto-juvenil também busca com frequência participar de jogos on-line. Bonar-Bridges explica que alguns jogos,

7 CAMPBELL, Angela J. Rethinking Children's Advertising Policies for the Digital Age, cit.

8 CHAN, Vanessa. When #AD Is #BAD, cit.

9 CHAN, Vanessa. When #AD Is #BAD, cit., p. 305.

10 ARBEL, Yonathan A. Reputation Failure: The Limits of Market Discipline in Consumer Markets. Wake Forest Law Review, v. 54, n. 5, p. 1239-1304, 2019.

11 ARBEL, Yonathan A. Reputation Failure, cit.

12 CAMPBELL, Angela J. Rethinking Children's Advertising Policies for the Digital Age, cit.

(8)

como World of Warcraft e Second Life, deram nova roupagem ao entretenimento moderno. Isso porque são espécies de mídia social em formato de videogames, nos quais os jogadores criam identidades on-line (ou avatares) para completar missões, coletar itens e interagir com outros avatares em um mundo digital.13

Tais jogos geralmente hospedam mercados on-line nos quais os jogadores podem comprar itens, terrenos e até personagens uns dos outros usando moeda virtual (que pode ser trocada por dinheiro verdadeiro). Todos os usuários que se registram por meio do Battle.net (a plataforma que possibilita acesso aos jogos on-line da Blizzard) assumem ter lido o documento e concordado com seus termos, e as contas só podem ser criadas por adultos.14 Contudo, é sabido que algumas crianças e adolescentes conseguem se cadastrar sem maiores dificuldades.

Diante dessa facilidade, a primeira ação de aplicação da lei da FTC foi contra os YouTubers de videogame Trevor Martin e Thomas Cassell, por “endossar de maneira enganosa o site de jogos de azar online CSGO Lotto (Counter-Strike: Global Offensive Lotto) sem revelar que eram os proprietários da empresa”. Na época (em 2015), inclusive, Martin postou vídeos de seu sucesso jogando no site e até mesmo fez declarações em outras plataformas de mídia social como Twitter e Instagram.15

No ano de 2015, o influenciador digital Thomas Cassell já havia enfrentado ação de execução por parte da FTC por seus endossos não divulgados com uma rede de entretenimento on-line com sede na Califórnia (a Machinima, Inc.) que pagou influencers para postar vídeos no YouTube endossando o Xbox One e outros jogos.16 Em razão da recorrência da situação mencionada, a FTC tem procurado exigir que os influenciadores divulguem seus interesses financeiros.17

De acordo com Chan, embora existam remédios cíveis para o descumprimento da lei norte-americana, a FTC optou principalmente por buscar a aplicação de advertências por meio de cartas.18 Ocorre que aparentemente o impacto dessas cartas de advertência

13 BONAR-BRIDGES, J. Regulating Virtual Property with EULAS. Wisconsin Law Review Forward, n. 79, p. 79-91, 2016. Disponível em: <https://repository.law.wisc.edu/s/uwlaw/media/300201>. Acesso em: 2 maio 2021.

14 BONAR-BRIDGES, J. Regulating Virtual Property with EULAS, cit.

15 LUONG, Ashley. All that glitters is gold: the regulation of hidden advertisements and undisclosed sponsorships in the world of beauty social media influencers. William and Mary Business Law Review, v.

11, n. 2, February 2020, p. 565-607. Disponível em:

<https://scholarship.law.wm.edu/cgi/viewcontent.cgi?article=1191&context=wmblr>. Acesso em: 2 maio 2021. p. 583-584.

16 LUONG, Ashley. All that glitters is gold, p. 586.

17 ARBEL, Yonathan A. Reputation Failure, cit.

18 CHAN, Vanessa. When #AD Is #BAD, cit.

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foi mínimo, pois no período de seis semanas após o recebimento as celebridades citadas por violações voltaram a divulgar produtos e serviços sem se preocuparem com as exortações da FTC.

Se os adultos são confundidos pelos anúncios de influenciadores digitais, as crianças se mostram ainda mais vulneráveis, pois mesmo que pessoas adultas entendam que determinado conteúdo é, na verdade, publicidade, as crianças não entenderiam.19 A isso se soma o fato de que, de maneira geral, os “sistemas de rotulagem” (com classificação etária) não são aplicados, razão pela qual as crianças podem comprar e desfrutar de música, filmes e jogos inadequados para a sua idade, com facilidade de acesso. Com o aumento do streaming on-line, qualquer pessoa com internet pode simplesmente realizar o download de quase tudo que se possa imaginar. A fim de se eximir de possíveis reprimendas, por exemplo, a empresa Blizzard impõe aos pais o dever afirmativo de monitorar o uso por seus filhos do software.20

Nesse sentido, Bonar-Bridges aponta dois objetivos para limitar o acesso das crianças a jogos on-line.21 O primeiro objetivo é o de livrar o criador do jogo (no caso analisado em seu artigo, a Blizzard Entertainment) de firmar contratos com crianças e adolescentes, além de corroborar com a política pública que busca limitar o acesso de menores a conteúdos excessivamente violentos ou mídia sexualizada. Campbell menciona que, diante da popularidade do YouTube entre crianças, bem como das preocupações dos pais que seus filhos sejam expostos a conteúdo inapropriado, a Google lançou o Aplicativo YouTube Kids em fevereiro de 2015. Dessa maneira, rapidamente o YouTube Kids se tornou um grande entretenimento infantil no ambiente virtual.22

Chan alerta que um dos grandes obstáculos para a fiscalização da FTC é o fato de a Internet ser um mundo enorme.23 Por isso, punir cada violação de direitos do consumidor é quase impossível com tantas celebridades e influenciadores postando novos conteúdos diariamente. Além disso, não há nenhuma maneira de a FTC verificar se uma postagem foi paga, ou se o próprio influenciador comprou o produto e postou uma revisão gratuita em sua conta. A essa situação, se soma o fato de que o envio de uma carta de advertência não repara o dano ao consumidor, quando a postagem já foi vista por milhões de pessoas.24

19 CAMPBELL, Angela J. Rethinking Children's Advertising Policies for the Digital Age, cit.

20 BONAR-BRIDGES, J. Regulating Virtual Property with EULAS, cit.

21 BONAR-BRIDGES, J. Regulating Virtual Property with EULAS, cit.

22 CAMPBELL, Angela J. Rethinking Children's Advertising Policies for the Digital Age, cit.

23 CHAN, Vanessa. When #AD Is #BAD, cit.

24 CHAN, Vanessa. When #AD Is #BAD, cit.

(10)

Vale ressaltar que, durante a navegação da criança no Youtube Kids, a plataforma recomenda outros vídeos (semelhantes aos assistidos anteriormente), com base em um algoritmo sem revisão humana,25 estimulando, portanto, a continuidade de interação da criança com o site.

Como conclusão do seu estudo, Bonar-Bridges indica para a necessária criação de regulamento com o reconhecimento dos jogadores como uma classe de consumidores a serem protegidos, cabendo aos pais fiscalizarem o uso do software por seus filhos.26 Por sua vez, Campbell considera que as mudanças no ambiente da mídia tornaram ineficazes as proteções existentes para crianças contra práticas de marketing excessivas, enganosas e injustas, razão pela qual propõe a reflexão de como tutelar as crianças na era digital e desenvolver nova regulamentação.27 No mesmo sentido, Loung argumenta que o grande fluxo de postagens de mídia social requer mais instruções do que as diretrizes da FTC fornecem, a fim de encorajar a transparência da idade e proteger os consumidores suscetíveis, particularmente crianças que também acessam sites de mídia social e podem não ser tão habilidosas, além de pessoas mais velhas, de forma a decifrar anúncios ocultos.28

Diante do problema em estudo, Chan ventila algumas soluções, sendo que a primeira delas consiste na proposta de que as plataformas de mídia social exijam que os influenciadores e empresas se submetam a um breve programa de treinamento sobre como divulgar adequadamente anúncios, a fim de continuarem usando a plataforma.29 A segunda solução seria que houvesse um efetivo acompanhamento dos infratores da política de divulgação, especialmente dos reincidentes, havendo aplicação de multa, como forma de punição pecuniária pela inobservância da lei. Como terceira solução, foi sugerida a cooperação do órgão fiscalizador (FTC) com as plataformas de mídias sociais, a fim de que houvesse ameaça de rescisão ou suspensão das contas dos influenciadores e empresas, caso eles sejam advertidos muitas vezes. Isso porque alguns influenciadores baseiam seus meios de subsistência na monetização de suas contas de mídia social.30

Campbell afirma que a FTC não fornece suporte de evidências para suas suposições sobre o que os consumidores esperam ou reconhecem como publicidade.31 O Guia de

25 CAMPBELL, Angela J. Rethinking Children's Advertising Policies for the Digital Age, cit.

26 BONAR-BRIDGES, J. Regulating Virtual Property with EULAS, cit.

27 CAMPBELL, Angela J. Rethinking Children's Advertising Policies for the Digital Age, cit.

28 LUONG, Ashley. All that glitters is gold, cit.

29 CHAN, Vanessa. When #AD Is #BAD, cit.

30 CHAN, Vanessa. When #AD Is #BAD, cit.

31 CAMPBELL, Angela J. Rethinking Children's Advertising Policies for the Digital Age, cit.

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publicidade também não faz referência a crianças, embora grande quantidade de publicidade seja assistida por e direcionada a crianças. Por fim, indica-se que o tratamento da falha de reputação (de um fornecedor ou influenciador digital/YouTuber) deve ser a pedra angular da futura política do consumidor.32

A partir desses pressupostos, passa-se à discussão dos resultados da Revisão Sistemática de Literatura.

5. Discussão dos resultados

Como forma de encabeçar a discussão, questionam-se inicialmente as possibilidades de proteção às crianças contra práticas abusivas de consumo no âmbito virtual. Em resposta a essa dúvida, Campbell afirma que, como as crianças naturalmente amam brinquedos e personagens, não se pode confiar nas forças do mercado para protegê-las de publicidade excessiva, enganosa ou injusta.33 Tendo em vista que as crianças estão passando mais tempo em frente às telas e assistindo a vídeos que integram perfeitamente marketing e programação, a necessidade de regulamentação ganhou nova urgência para proteger seu bem-estar.34

Logo, para tutelar as crianças de práticas abusivas de consumo no ambiente virtual (inclusive na plataforma do YouTube) seria necessária nova legislação para proteger as crianças, especialmente das práticas de marketing excessivas e enganosas.35 Em termos comparativos, muitos países têm limites mais rígidos voltados ao marketing para crianças (ou marketing em geral) do que os EUA, sendo que alguns limitam a publicidade de alimentos para crianças, enquanto outros tomaram medidas para deixar claro que os vídeos patrocinados são comerciais.

Para corroborar seu pensamento, Campbell menciona um relatório da Comissão Europeia, emitido em março de 2016, no qual consta que o atual regime regulatório não oferece às crianças proteção suficiente contra os efeitos adversos do marketing on-line, razão pela qual afirma que é provável que haja mais regulamentação.36 Por sua vez, Chan sugere que, nos EUA, a FTC seja mais rigorosa na aplicação de punição para

32 ARBEL, Yonathan A. Reputation Failure, cit.

33 CAMPBELL, Angela J. Rethinking Children's Advertising Policies for the Digital Age, cit.

34 CAMPBELL, Angela J. Rethinking Children's Advertising Policies for the Digital Age, cit.

35 CAMPBELL, Angela J. Rethinking Children's Advertising Policies for the Digital Age, cit.

36 CAMPBELL, Angela J. Rethinking Children's Advertising Policies for the Digital Age, cit.

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influenciadores digitais e empresas, adotando uma dupla ameaça, punindo monetariamente e suspendendo as contas respectivas nas redes sociais.37

A partir desse contexto de proteção internacional, resta questionar o problema específico dos YouTubers que influenciam o consumo por parte das crianças e como essa influência ocorre. Em resposta a essa pergunta Campbell explica que os anunciantes recorrem a influenciadores para comercializar seus produtos para públicos mais jovens.38

Observou-se que Loung citou casos de YouTubers que eram influenciadores digitais, e inclusive receberam sanção da FTC.39 Além disso, Arbel mencionou situação de evidente influência digital no YouTube, como no caso em que o músico Dave Caroll realizou o upload de sua música “United Breaks Guitars” no YouTube, criando informações de reputação que fizeram com que o preço das ações da empresa United caísse dez centavos, representando uma perda de valor de mercado de US$ 180 milhões.40

Verificou-se que dois autores-base dessa Revisão Sistemática mencionaram algumas práticas utilizadas por influenciadores digitais no YouTube com o intuito de divulgarem produtos e influenciarem o consumo de seus seguidores.

Dessa maneira, Campbell se referiu ao unboxing como sendo um gênero de vídeos no YouTube em que as pessoas desembalam um produto em frente à câmera.41 Os vídeos de unboxing não apenas documentam a experiência de abrir um produto, mas também a dramatizam e, por sua vez, assumem um espírito peculiar e divertido. No mesmo sentido, Loung citou que YouTubers como Tati Westbrook (também conhecida como GlamLifeGuru) publicam vídeos de unboxing, nos quais mostram aos espectadores os itens gratuitos enviados por empresas a influenciadores.42

Assim, percebe-se que os YouTubers podem ser poderosos influenciadores digitais, de modo a sugestionarem, manipularem ou induzirem crianças a consumirem determinados produtos ou serviços, por meio de vídeos como os de unboxing. Resta

37 CHAN, Vanessa. When #AD Is #BAD, cit.

38 CAMPBELL, Angela J. Rethinking Children's Advertising Policies for the Digital Age, cit.

39 LUONG, Ashley. All that glitters is gold, cit.

40 ARBEL, Yonathan A. Reputation Failure, cit.

41 CAMPBELL, Angela J. Rethinking Children's Advertising Policies for the Digital Age, cit.

42 LUONG, Ashley. All that glitters is gold, cit.

(13)

compreender, a partir dessa premissa, sobre quem recai a responsabilidade civil quando há a ocorrência de publicidade infantil propagada dentro da plataforma.

Diante desse questionamento, o presente trabalho identificou que muitas publicidades veiculadas por influenciadores digitais são realizadas de forma sub-reptícia, ou seja, sem menção expressa de que as postagens estão sendo patrocinadas pelas empresas fornecedoras de determinado produto ou serviço. Essa foi uma das principais críticas da literatura revisada.

Com relação à responsabilização civil, Loung defende a importância de penalizar as empresas fornecedoras e influenciadores digitais por meio da ameaça de dano à reputação (especialmente se o influenciador confiar na autenticidade), bem como pela aplicação de penalidades financeiras (multas), a fim de impedir a ocorrência de práticas abusivas ou enganosas.43

Por fim, importa mencionar que, em relação à responsabilização civil dos pais de crianças e adolescentes que navegam na internet, somente um autor, dentre os analisados neste trabalho, tocou sutilmente na questão44 e que em nenhum dos estudos foi mencionada a responsabilização civil da própria plataforma YouTube pelas publicidades abusivas veiculadas por YouTubers, especialmente quando direcionadas ao público infantil.

6. Considerações finais

Na seção final deste trabalho considera-se importante traçar breve paralelo entre o cenário brasileiro e este estudo baseado na literatura norte-americana. A presente pesquisa revelou a preocupação de muitos autores norte-americanos em analisar a responsabilização civil decorrente da veiculação de mensagens publicitárias nas mídias sociais.

Ademais, foi possível notar que não apenas os EUA como também vários países ao redor do mundo reputam como abusiva a publicidade direcionadas para crianças e adolescentes, tendo alguns artigos se referido à discussão dessa questão em países da União Europeia.

43 LUONG, Ashley. All that glitters is gold, cit.

44 BONAR-BRIDGES, J. Regulating Virtual Property with EULAS, cit., p. 82.

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No Brasil, o artigo 37 do Código de Defesa do Consumidor (CDC) explicita que “É proibida toda publicidade enganosa ou abusiva”. Em complementação, o parágrafo segundo do artigo 37 do CDC aponta como uma das definições para publicidade abusiva aquela que “se aproveita da deficiência de julgamento e experiência da criança ou é capaz de induzir o consumidor a se comportar de forma prejudicial a sua saúde ou segurança”.45

A Resolução CONANDA nº 163/2014 editada pelo Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente, no Brasil, dispõe em seu artigo 2º que a prática do direcionamento de publicidade e de comunicação mercadológica à criança, com a intenção de persuadi-la para o consumo de qualquer produto ou serviço utiliza, dentre outros, dos seguintes aspectos: (1) linguagem infantil, efeitos especiais e excesso de cores; (2) trilhas sonoras de músicas infantis ou cantadas por vozes de criança; (3) representação de criança; (4) pessoas ou celebridades com apelo ao público infantil; (5) personagens ou apresentadores infantis; (6) desenho animado ou de animação; (7) bonecos ou similares; (8) promoção com distribuição de prêmios ou de brindes colecionáveis ou com apelos ao público infantil; e (9) promoção com competições ou jogos com apelo ao público infantil.46

Na revisão da literatura internacional colacionada, verificou-se que nos EUA o órgão que possui atribuição para proteger o consumidor é a FTC (Federal Trade Comission) e que, apesar de existir regulamento que “proíbe métodos injustos de concorrência e práticas desleais ou enganosas ou que afetem comércio”, tais conceitos são demasiadamente vagos, o que acaba prejudicando a atuação da FTC.

Além disso, a FTC ainda não conseguiu desenvolver mecanismos efetivos de fiscalização e repressão das condutas de empresas e influenciadores digitais (como YouTubers) que ignoram as normas norte-americanas relativas à divulgação de publicidade nas mídias sociais. No Brasil, os órgãos que teriam atribuição similar seriam os PROCONS e o Ministério Público Estadual.

Uma das formas de publicidade abusiva identificadas ocorre por meio da não divulgação pelos influenciadores digitais de postagens patrocinadas. Essa prática

45 BRASIL. Lei n. 8.078, de 11 de setembro de 1990. Dispõe sobre a proteção do consumidor e dá outras providências. Brasília, DF: Presidência da República, 1990. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8078compilado.htm>. Acesso em: 2 maio 2021.

46 BRASIL. Conanda. Resolução n. 163, de 13 de março de 2014. Dispõe sobre a abusividade do direcionamento de publicidade e de comunicação mercadológica à criança e ao adolescente. Brasília, DF:

SEDH/CONANDA, 2014. Disponível em: <https://www.legisweb.com.br/legislacao/?id=268725>. Acesso em: 2 maio 2021.

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inclusive gerou autuação de YouTubers pela FTC, nos EUA, sendo caracterizada como prática desleal.

Esta pesquisa revelou, ainda, que não obstante o fato de o YouTube e outros canais de mídia social alertarem que seus serviços não devem seu utilizados por crianças e adolescentes, o ciberespaço, de fato, já está sendo navegado pelo público infanto- juvenil, muitas vezes sem a devida supervisão dos pais ou responsáveis.

Entre os achados deste trabalho, outro ponto que merece destaque é o alerta para a coleta de dados do público infanto-juvenil, enquanto ocorre o acesso ao YouTube, pois como evidenciado o próprio site já direciona seus espectadores a outros vídeos similares aos últimos que foram assistidos, por meio de algoritmos.

Além disso, percebeu-se que existe corrente doutrinária que defende a importância de penalizar duplamente fornecedores e influenciadores digitais/YouTubers tanto via sanções pecuniárias como também pela suspensão de suas contas nas redes sociais, em virtude das práticas abusivas ao consumidor, entre as quais se inclui a publicidade infantil, que geralmente é veiculada de forma subliminar, ou seja, sem menção clara de que se trata de um anúncio patrocinado. A presente pesquisa, no entanto, não encontrou estudos contundentes sobre a responsabilização civil dos pais pela exposição de seus filhos à publicidade infantil, especialmente quando eles acessam canais de YouTubers, tampouco foram abordadas as consequências que esse tipo de exposição inadequada pode trazer ao ambiente familiar.

No Brasil, o artigo 227 da Constituição de 1988 dispõe que é dever da família, da sociedade e do Estado colocar a criança, o adolescente e o jovem a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.47 Com base nesse dispositivo constitucional, questiona-se se poderia haver a responsabilização dos pais ante a exposição de crianças e adolescentes à publicidade abusiva, decorrente da negligência dos adultos responsáveis em supervisionar os conteúdos digitais consumidos por seus filhos em plataformas como o YouTube.

Por fim, embora o presente estudo tenha revelado que o YouTube tem ciência do crescente acesso de crianças e adolescentes em sua plataforma (tendo para isso criado o YouTube Kids), se fizeram ausentes na literatura revisada análises sobre

47 BRASIL. [Constituição (1988)]. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, DF:

Congresso Nacional, 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/

Constituiçao.htm>. Acesso em: 2 maio 2021.

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responsabilização civil da referida plataforma, nos casos em que o público infanto- juvenil foi exposto por YouTubers a publicidade infantil. Assim, conclui-se que a metodologia da Revisão Sistemática contribuiu significativamente para a investigação do problema de pesquisa, mas que a temática ainda carece de estudos mais aprofundados, especialmente para desvendar se seria possível ou não sustentar a tese da responsabilização civil dos pais e da plataforma YouTube por exposição de crianças e adolescentes à publicidade infantil decorrente do acesso a canais de YouTubers.

Referências bibliográficas

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Como citar:

ARAGÃO, Ana Luiza Masstalerz Pires; ANDRADE, Jesusmar Ximenes; BRITO, Dante Ponte de; SILVA, Cléber de Deus Pereira da. Revisão sistemática da literatura norte-americana sobre a responsabilidade civil decorrente da publicidade infantil veiculada por Youtubers. Civilistica.com. Rio de Janeiro, a. 11, n. 3, 2022.

Disponível em: <http://civilistica.com/revisao/>. Data de acesso.

Recebido em:

11.10.2021 Aprovado em:

24.10.2022

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