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PRIMEIRAS ENTREVISTAS EM PSIQUIATRIA E PSICANÁLISE

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Academic year: 2021

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PRIMEIRAS ENTREVISTAS EM PSIQUIATRIA E PSICANÁLISE

Júlia Alram Moreira1, Luciano Souza2, Bárbara do Nascimento3, Diego Gracia4, Rodrigo Basso5.

RESUMO: A realização de uma boa entrevista inicial é de extrema importância para o progresso de qualquer paciente e qualquer especialista. O manejo das entrevistas iniciais em pacientes com queixas mentais é de grande dificuldade para o estudante da área de saúde. As entrevistas iniciais devem ser cômodas o suficiente para facilitar as próximas entrevistas e o tratamento. O presente trabalho tem como objetivo salientar e auxiliar em algumas dificuldades que podem aparecer durante a obtenção dos dados referentes ao paciente e no manejo da ansiedade, que atinge tanto o entrevistador quanto o entrevistado. Palavras-chave: Entrevistas. Psiquiatria. Psicanálise

ABSTRACT: The achievement of a good initial interview is extremely important for the progress of any patient and specialist. The management of the initial interviews of patients with mental complaints is very difficult for the student in the health area. The initial interview must be comfortable so as to facilitate the subsequent interviews and the treatment. The present work has as its objective, to emphasize and help in certain difficulties, which can appear during the process of obtaining details referring to the patient and in the management of anxiety, both for the interviewer and the interviewed.

Keywords: Interviews. Psychiatry. Psychoanalysis.

1. Introdução

O manejo da primeira entrevista médica é estudado nos primeiros anos do curso de medicina. A abordagem da queixa, do histórico pessoal e familiar e das condições de vida do paciente são exemplos de itens de importância que devem ser investigados e a maneira como isso deve ser feito é muito bem repassada aos alunos. Porém, ao lidar com pacientes que apresentam queixas psíquicas ou mentais, é nítida a dificuldade dos alunos, principalmente nos primeiros contatos.

1

Estudante do 5º ano de medicina da Universidade Federal do Paraná;

2 Médico Psiquiatra da Universidade Federal do Paraná; Coordenador do Grupo de Pesquisa Entrevistas

Preliminares em Psiquiatria e Psicanálise; Professor do Curso de Pós-Graduação da Faculdade Dom Bosco: Psicanálise: Teoria e Prática.

3 Estudante do 5º ano de medicina da Universidade Federal do Paraná; 4 Estudante do 5º ano de medicina da Universidade Federal do Paraná; 5 Estudante do 5º ano de medicina da Universidade Federal do Paraná.

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Considerando esse fato, o estudo do manejo das primeiras entrevistas com pacientes desta área é de extrema importância. Sua comparação com a entrevista médica básica é pertinente, mas algumas peculiaridades devem ser respeitadas, quanto a questionamento e abordagem de certos fatos.

2. Obtenção dos dados

As histórias, atual e passada, tanto do paciente quanto da família, devem ser muito bem investigadas, como feito por Freud no caso Dora, quando obteve uma história pessoal e familiar completa e rica em detalhes. Um dos pontos mais importantes de toda entrevista, muito bem frisado por Freud, é que todo paciente chega com uma história pronta e sem desvios. Não deve o entrevistador aceitar, passivamente, a história da maneira como é contada, mas sim acreditar que ainda existem lacunas a serem preenchidas no decorrer da entrevista. Portanto, “quando se trata de coisas que se tornaram patogênicas por seu afã de ocultar-se, decerto não se deve esperar que o doente vá ao encontro do médico exibi-las, nem tampouco deve este se contentar com o primeiro ‘Não’ que se oponha às investigações” (FREUD, 1905).

Muitas vezes a história vem “pronta”, pois alguns relatos são considerados irrelevantes ou até mesmo podem ser omitidos por vergonha ou medo. Contudo, algumas vezes o paciente realmente acredita estar relatando todos os fatos importantes, pois não está consciente da existência de outros.

Com Dora não foi diferente: Freud indaga por que Dora havia ficado tão ofendida com a situação com Sr. K, quando poderia ter ficado lisonjeada e também por que havia demorado tanto para culpar o pai pela situação. Um entrevistador pouco perspicaz talvez tivesse “concordado” com a primeira versão da história de Dora e perdido grande oportunidade de obter uma história mais compatível com a realidade dos fatos. A perspicácia de Freud para, no tempo certo, questionar pontos chaves foi essencial para a evolução do caso.

Outro componente da entrevista com pacientes desta área, pacientes que apresentam queixas psíquicas ou mentais, é o exame do estado mental, muito importante para a avaliação do funcionamento cognitivo e emocional atual do

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paciente (CARLAT, 2007). É necessária muita atenção para identificar possíveis alterações ou discordâncias de aparência, pensamento, fala, atitude, comportamento, humor e afeto, por exemplo. Assim, “mesmo se o paciente enviasse um e-mail” (CARLAT, 2007) e listasse todas as suas queixas, ainda seria de extrema importância que fosse feito um encontro ao vivo entre os dois para que a avaliação de seu sofrimento e a necessidade de tratamento fossem bem avaliadas. A realização do mini exame do estado mental (MEEM), apesar de útil em situações de emergências, deve ser muito cautelosa. As perguntas muito focadas e, aparentemente, aos olhos do paciente, muito distantes podem afastá-lo e, com isso, prejudicar a relação entre os dois pois, ao se pedir que o paciente memorize o nome de objetos durante uma entrevista, o foco pode ser alterado e o paciente se importar mais em memorizar os objetos do que narrar sua história. Os mesmos pontos avaliados no MEEM podem ser devidamente abordados durante a entrevista sem que seja necessário tirar o foco da narrativa da história do paciente. Ou ainda, se, antes de se iniciar a entrevista, por exemplo, o entrevistador perguntar se o paciente teve alguma dificuldade de encontrar o local do consultório e o paciente responder que ‘Não’, isso já mostra que está lúcido, consciente e que sabe a data em que se encontram. Dessa forma, sem perceber, a entrevista já foi iniciada e o exame do estado mental também já está em curso.

3. Ansiedade e temas delicados

Outro ponto importante é que existe muita ansiedade por parte do paciente nos primeiros encontros. Nessa situação ele estará nervoso, entre outros motivos, por ter que falar sobre temas tão delicados e íntimos com uma pessoa que ele mal conhece. Entretanto, a necessidade de falar sobre temas delicados é verdadeira e não pode ser desconsiderada. A ansiedade ao redor desses assuntos está presente não só para o paciente, mas também para o entrevistador, que não sabe exatamente como questionar tópicos que acredita causarem desconforto ao paciente. Um entrevistador despreparado, ao não questionar temas que exigem cautela ou prudência pode, até mesmo, perder créditos com seu paciente. Freud comentou um caso específico que atendeu: sua paciente, que antes relutava em

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comentar temas de cunho sexual, confessou que, no final das contas, a forma como ele havia abordado era “muito mais decente” do que a conversa que tivera com outro senhor. Temas como drogas, vícios, violência, vida sexual, relações extraconjugais são normalmente os mais complicados e os mais evitados pelos pacientes. Por isso, é de suma importância que o paciente confie no entrevistador. Este não deve mostrar nenhum tipo de preconceito e deve ter paciência para saber o momento mais adequado de indagar o assunto, sem, de maneira alguma, deixar de fazê-lo. Porém, deve perceber o que é e o que não é relevante saber, mantendo assim a discrição e a ética, sem transformar o caráter investigativo em curiosidade. Dessa forma, Freud recomendava que primeiramente se desperte nos pacientes a convicção de que falar sobre estes assuntos é imprescindível.

Considerando que, no caso em questão, a paciente era uma jovem de apenas dezenove anos e que pontos importantes de sua história se passaram antes mesmo dos quinze, muitos podem inferir que uma menina não teria “conhecimento” suficiente para responder questões de cunho sexual e, por isso, achar uma ousadia fazer perguntas ou comentários desse tipo a uma pessoa tão jovem, principalmente naquela época. Deve-se estar atento para perceber, durante o relato, o nível de conhecimento que o paciente tem sobre os assuntos. Assim, Freud mostrou-se objetivo e cauteloso, para não mostrar insegurança nem introduzir conhecimentos ainda inexistentes.

4. Conclusão

O tema ‘primeiras entrevistas’ é extremamente rico em particularidades e possibilidades a serem exploradas. Porém, a dificuldade dos estudantes de medicina em entrevistar pacientes com queixas mentais e psíquicas existe e deve ser trabalhada. Procurou-se neste trabalho mostrar que, apesar da dificuldade inicial, a obtenção detalhada de dados pode ser feita de maneira natural. Estando o entrevistador atento aos detalhes narrados, sendo objetivo e cauteloso em sua fala e consciente de que o relato inicial pode ter outras versões ainda ocultas nas primeiras entrevistas, a ansiedade do paciente pode ser amenizada. Porém, não

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é intuito do presente trabalho esgotar esses temas, mas apenas salientar alguns pontos a serem mais explorados e investigados no futuro.

REFERÊNCIAS

CAMPBELL, R. J. Dicionário de psiquiatria. Tradução de CABRAL A. São Paulo: Martins Fontes, 1986.

CARLAT, D. J. Entrevista psiquiátrica. Tradução de DORNELLES, C.; CALEFFI, A. 2. ed. Porto Alegre: Artmed, 2007.

ETHEGOYEN, R. H. Fundamentos da técnica psicanalítica. Tradução de FERNANDES C.G. Porto Alegre: Artmed, 1987.

FREUD, S. Fragmento da análise de um caso de histeria – edição standard brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro: Imago Editora, 1905.

________ Artigos sobre a técnica – edição standard brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro: Imago Editora, 1914.

LACAN, J. Escritos Tradução de Ribeiro V. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1998.

LAPLANCHE, J.; PONTALIS J. B. Vocabulário da psicanálise. Tradução de Tamen P. São Paulo: Martins Fontes, 1992.

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