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Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo

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Acórdãos STA Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo

Processo: 0640/11

Data do Acordão: 05-07-2012

Tribunal: 2 SECÇÃO

Relator: ISABEL MARQUES DA SILVA

Descritores: AUDIÊNCIA PRÉVIA

IVA

OPERAÇÕES SOBRE IMOVEIS RENÚNCIA

ISENÇÃO

Sumário: I - Decorrendo do artigo 5.º do Regime de Renúncia à isenção do IVA

nas operações imobiliárias, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 21/2007 de 29 de Janeiro, que o certificado de renúncia tem necessariamente que ser emitido antes da celebração da escritura pública de

transmissão e constatado que esta já tinha sido realizada, não havia como não indeferir o requerido, pelo que a não audição prévia do requerente deve ter-se como preterição de formalidade não essencial em face do princípio do aproveitamento dos actos.

II - A eventual admissibilidade de que o pedido de certificado de renúncia à isenção pelo segundo transmitente em contratos

simultâneos pudesse ter o mesmo efeito que a obtenção do próprio certificado - por imperativo do princípio da prevalência da substância sobre a forma, da neutralidade fiscal ou de outros princípios

nucleares convocáveis na matéria em apreço -, está necessariamente dependente da certeza - inverificada in casu - quanto à

impossibilidade de o segundo transmitente poder obter, em tempo útil, o certificado de renúncia à isenção.

Nº Convencional: JSTA000P14397

Nº do Documento: SA2201207050640

Data de Entrada: 14-11-2011

Recorrente: B..., S.A.

Recorrido 1: DIRGER DOS IMPOSTOS

Votação: UNANIMIDADE

Aditamento:

Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal

Administrativo: Relatório

-1 – B……, S.A., com os sinais dos autos, veio interpor recurso de revista excepcional, ao abrigo do artigo 150.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), do acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Norte em 4 de Março de 2011 (a fls. 204 a 228 dos autos), que negou provimento ao recurso por si interposto da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de

Penafiel, de 13 de Março de 2009, que julgou improcedente a acção administrativa especial por si instaurada contra a Fazenda Pública. Subidos os autos a este Supremo Tribunal e obtida a vista ao Ministério Público foi proferido, em 19 de Outubro de 2011, pela formação prevista no n.º 5 do artigo 150.º do CPTA, o Acórdão de fls. 321 a 332, no qual, considerando-se preenchidos os pressupostos a que se refere o n.º 1 do artigo 150.º do CPTA, foi admitido o recurso.

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A recorrente conclui as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões:

a) A questão decidenda subjacente ao presente recurso de revista pretende apreciar uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se reveste de importância fundamental, bem como a admissão do presente recurso é necessária para uma melhor aplicação do Direito, nos termos acima invocados, nomeadamente, porque a questão tem utilidade jurídica e prática, ultrapassa os limites da situação singular, excede o grau comum de dificuldade e evidencia interesses comunitários, bem como a melhor aplicação do Direito deve resultar na possibilidade de repetição num número

indeterminado de casos futuros, em termos de garantia de uniformização do Direito;

b) Deste modo, podemos concluir que se encontra cumprido o critério qualitativo do artigo 150° do CPTA, segundo o qual torna-se

necessária a intervenção do Supremo Tribunal Administrativo para apreciar a presente questão decidenda com relevância jurídica de importância fundamental e utilidade prática, bem como para aplicar melhor o Direito, pelo que se encontra legitimado o presente recurso de revista;

c) No caso sub judice era obrigatória, nos termos da alínea b) do nº 1 do artigo 60º da LGT, a audição prévia da Recorrente, dado que o fundamento que motivou a Decisão de indeferimento do pedido de renúncia à isenção do IVA não se revelou, por demais, como facto determinante e imperativo que pudesse «secar» potenciais

argumentos e factos relevantes, agora de novo aduzidos, que permitissem alterar a sentido da Decisão;

d) Considerando que a aplicação informática não permite informar que se está perante uma situação de contratos simultâneos, nem que é possível formalizar manualmente o pedido de renúncia à isenção, o exercício do direito de audição permitiria à Recorrente informar que se estava perante a realização de contratos realizados em simultâneo e assim aplicar-se-ia o nº 3 do artigo 2° do RRIIVA, bem como invocar o teor do Ofício-circulado n.° 30099/2007, de 9 de Fevereiro, da DSIVA, influenciando claramente o destino da decisão;

e) Tal exercício revelar-se-ia ainda mais útil, pois, o próprio Chefe do Serviço de Finanças teve várias dúvidas sobre a própria aplicação informática, o que permitira o debate alargado sobre a matéria. f) Pelo que, não tendo sido efectuada a audição prévia, se preteriu uma formalidade essencial do procedimento e, como tal, o Despacho aqui em crise encontra-se inquinado de tal ilegalidade, pelo que deverá ser anulado, com todas as consequências legais;

g) A posição do Tribunal a quo milita num erro de raciocínio ao considerar que, no caso de contratos realizados em simultâneo, o segundo transmitente possa, através da aplicação informática, encontrar-se na posse de um certificado prévio que demonstre a verificação da condição objectiva prevista na alínea b) do n.° 1 do artigo 2° do RRIIVA, quando a Recorrente já demonstrou que tal é impossível, sob pena de se denegar o próprio RRIIVA que prevê e permite a realização de contratos em simultâneo e obter, nesta lógica, o certificado prévio ou, pelo menos, dever ser suficiente o pedido

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desse certificado;

h) Deste modo, podemos concluir que a A…, na qualidade de segunda transmitente, ao ter solicitado o certificado para efeitos de renúncia, no caso de contratos realizados em simultâneo, deveria ser-lhe reconhecido o direito à renúncia, após a confirmação das

condições objectivas e subjectivas, nos termos dos artigos 2°, 3° e 5°, todos do RRIIVA, pelo que actuou de acordo com o regime legal, bem como com a instrução administrativa do Ofício-circulado n.°

30099/2007, de 9 de Fevereiro, da DSIVA;

i) Assim, é fácil concluir que o pedido de emissão do certificado de renúncia à isenção do IVA efectuado pela Recorrente e acima melhor referenciado não só foi tempestivo, como preenche todas as

condições objectivas e subjectivas previstas no regime da renúncia à isenção do IVA nas operações relativas a bens imóveis, de acordo com a melhor interpretação do RRIIVA e da melhor aplicação do Direito, de modo a cumprirem-se os objectivos pretendidos e os direitos protegidos pelo RRIIVA, qual seja, a renúncia à isenção do IVA;

j) E, em consequência, o Despacho do Chefe do Serviço de Finanças de Paredes aqui em crise padece do vício de violação de lei, por erro de aplicação nos pressupostos de direito e, por conseguinte, deve ser anulado, com todas as consequências legais, e substituído por outro que reconheça o direito à isenção do IVA, nos termos conjugados dos artigos 2°, 3° e 5°, todos do RRIIVA,

k) Bem como deve o presente recurso ser julgado procedente e revogado o douto Acórdão recorrido, com todas as consequências legais;

l) No presente litigio, caracterizado por um processo de direito público, onde se discute a aplicação do RRIIVA com influência num universo alargado de cidadãos e a violação de princípios basilares do Direito Fiscal, o Tribunal tem o dever de assumir um papel activo na

interpretação e aplicação do Direito,

m) Pelo que pode e deve sindicar as decisões recorridas quanto à verificação da conformidade do Despacho de indeferimento em apreço com os princípios da segurança jurídica e da confiança legítima, bem como com o princípio da neutralidade fiscal.

n) Assim, o Tribunal ad quem, num processo de direito público como o presente, tem o dever de sindicar o Despacho de indeferimento por violação do princípio da segurança jurídica e da confiança legítima, corolário do princípio da boa-fé (cfr. artigo 2° e n.° 2 do artigo 266°, ambos da CRP, artigo 6°-A do CPA e n.° 2 do artigo 59° da LGT), bem como do princípio da neutralidade (cfr. Directiva do IVA), o) Bem como deve o presente recurso ser julgado procedente e revogado o douto Acórdão recorrido, com todas as consequências legais;

p) As expectativas criadas na esfera do contribuinte que ordenou a sua actividade de acordo com a posição sufragada no Ofício-circulado n.° 30099/2007, de 9 de Fevereiro, da DSIVA, carecem de protecção jurídica assegurada pelo princípio da segurança jurídica e da

confiança legítima, corolário do princípio da boa-fé;

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confiança que, fundamente, despertou na Recorrente, ao actuar em desconformidade com aquilo que, previsivelmente, fazia antever o seu comportamento anterior, ou seja, com o teor da instrução

administrativa;

r) Assim, o Despacho de indeferimento em apreço violou o princípio da segurança e da confiança legítima, corolário do princípio da boa-fé (cfr. artigo 2° e nº 2 do artigo 266°, ambos da CRP, artigo 6°-A do CPA e nº 2 do artigo 59° da LGT), porquanto, a Administração Fiscal violou as orientações que tinha previamente definido, nas quais a Recorrente, com suporte na lei, agiu em conformidade, tendo

conferido legítimas expectativas de que o certificado ficava pendente e, por conseguinte, deve ser anulado, com todas as consequências legais, o Despacho indeferimento aqui em crise do Chefe do Serviço de Finanças de Paredes e substituído por outro que reconheça o direito à renúncia à isenção do IVA,

s) Bem como deve o presente recurso ser julgado procedente e revogado o douto Acórdão recorrido, com todas as consequências legais;

t) A errónea interpretação que o Tribunal a quo faz do n.° 1 do artigo 5°, em conjugação com a alínea b) do n.° 1 do artigo 2° com o nº 2 do artigo 2°, todos do RRIIVA, impede o exercício do direito à dedução pela Recorrente e viola claramente o princípio comunitário da

neutralidade fiscal do IVA;

u) Assim, o Despacho de indeferimento aqui em crise violou o

princípio da neutralidade fiscal e, por conseguinte, impediu o exercício do direito à dedução do IVA (cfr. artigo 167° da Directiva do IVA e artigos 19° e ss. do Código do IVA), porquanto a aplicação informática não permite ao sujeito passivo obter a renúncia à isenção do IVA, no caso de contratos realizados em simultâneo, e a aplicação que a Administração Fiscal e o Tribunal a quo fazem do Direito não é

conforme ao princípio da neutralidade fiscal, e, por conseguinte, deve ser anulado, com todas as consequências legais, o Despacho

indeferimento aqui em crise do Chefe do Serviço de Finanças de Paredes e substituído por outro que reconheça o direito à renúncia à isenção do IVA,

v) Bem como deve o presente recurso ser julgado procedente e revogado o douto Acórdão recorrido, com todas as consequências legais;

w) Se assim não se entender, e sem prescindir,

x) O n.° 3 do artigo 11º da LGT não se refere à interpretação dos termos próprios de outros ramos do Direito, como sugere o douto Acórdão recorrido mas sim, como expressamente o diz, às normas de incidência;

y) Assim, persistindo dúvidas sobre o sentido das normas de incidência aqui em crise, deve atender-se à substância económica dos factos tributários, e, por conseguinte, considerando-se que se encontram preenchidos integralmente todos os requisitos objectivos e subjectivos, e demonstrada que está a titularidade da propriedade do imóvel no segundo transmitente, dever-se-á aplicar o RRIIVA e assim a Recorrente beneficiar da renúncia à isenção;

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normas de incidência, na medida em que determinam os requisitos objectivos e subjectivos do RRIIVA, influenciando o campo de incidência do imposto;

aa) Deste modo, podemos concluir que o Despacho de indeferimento em apreço violou o princípio da prevalência da substância sob a forma (cfr. n.° 3 do artigo 11° da LGT), porquanto, a Recorrente ao cumprir todos os requisitos substanciais para o direito à renúncia à isenção do IVA legitima que se reconheça a legitimidade do seu direito, e, por conseguinte, deve ser anulado, com todas as consequências legais, o Despacho indeferimento aqui em crise do Chefe do Serviço de

Finanças de Paredes e substituído por outro que reconheça o direito à renúncia à isenção do IVA;

bb) Bem como deve o presente recurso ser julgado procedente e revogado o douto Acórdão recorrido, com todas as consequências legais.

PEDIDO

Nestes termos deve o presente recurso ser julgado precedente,

revogando o douto Acórdão recorrido, substituindo-o por outro em que seja julgado totalmente procedente o pedido de:

a) Ordenar a anulação do Despacho de 8 de Agosto de 2007, do Chefe do Serviço de Finanças de Paredes, alegadamente exarado na aplicação informática que suporta o RRIIVA, com todas as

consequências legais que daí derivam, porquanto no caso sub judice era obrigatória, nos termos da alínea b) do nº 1 do artigo 60º da LGT, a audição prévia da Recorrente, pelo que, não tendo sido efectuada, se preteriu uma formalidade essencial do procedimento, e,

consequentemente, deverá considerar-se que houve um vício de violação da lei; ou, se assim não se entender, e sem prescindir, b) Ordenar a anulação do Despacho de 8 de Agosto de 2007, do Chefe do Serviço de Finanças de Paredes, alegadamente exarado na aplicação informática que suporta o RRIIVA, com todas as

consequências legais que daí derivam, porquanto o mesmo padece de um vício de violação da lei por erro nos pressupostos de direito, e a consequente condenação à emissão de certificado que reconheça o direito à renúncia à isenção de IVA na transmissão onerosa do prédio inscrito na matriz predial urbana da freguesia de …, concelho de Paredes, sob o artigo 3172, ao abrigo do n.° 5 do artigo 12° do Código do IVA e do regime de renúncia à isenção de IVA nas operações relativas a bens imóveis, aprovado pelo Decreto-Lei n.° 21/2007, de 29 de Janeiro, já que o correspondente pedido foi tempestivo e de acordo com o regime legal enunciado.Pois só assim se fará inteira e sã JUSTIÇA!”

2 – Contra-alegou o recorrido, concluindo nos seguintes termos: a) Ao colocar-se numa esfera de ilegalidade efectuando a segunda escritura de compra e venda sem deter um certificado de renúncia ao IVA válido, não deve ser admitido o recurso de revista por não cumprir com os pressupostos inscritos no art°. 150º do CPTA, não sendo, deste modo, a questão a submeter a juízo, de utilidade prática com ultrapassagem dos limites do caso singular, nem excede o grau comum de dificuldade, nem evidencia interesses comunitários e nem

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contribui para uma melhor aplicação do direito;

b) Estando concretizada a segunda escritura sem existir a posse válida de um certificado de renúncia, não poderia conceder-se o direito de audição sobre um pretenso indeferimento, se se sabia, com base na lei, que o exercício da renúncia à isenção era ineficaz e como tal, nunca poderia produzir efeitos, pelo que tal formalidade sempre se degradaria em não essencial, dando oportunidade à aplicação do princípio do aproveitamento dos actos jurídicos, termos em que se não praticou qualquer preterição de formalidade essencial;

c) A posse válida de um certificado de renúncia para o segundo

contrato sempre seria possível, no caso concreto dos autos, por o seu pedido ter sido efectuado em momentos distintos (em Julho de 2007, para o primeiro contrato e em 01 de Agosto do mesmo ano, para o segundo) como resulta do probatório, dada a possibilidade legal de existência de uma tramitação manual do procedimento de renúncia a par do procedimento por via electrónica que permitiria sempre a posse válida de um segundo certificado de renúncia;

d) A aplicação informática não é a monopolizadora do procedimento de renúncia à isenção do IVA sendo compatível com a tramitação manual, caso em que a informação disponível naquela aplicação referirá a situação de pendente, pelo que a realização de contratos em simultâneo é compatível com a posse de certificados de renúncia válidos à data da realização das respectivas escrituras de modo a tornar eficaz o exercício da renúncia à isenção;

e) À míngua de uma dúvida relacionada com termos próprios de outros ramos do direito, que não se revelam no caso dos autos, não tem aplicação o princípio de prevalência da substância sobre a forma porque tal só ocorre nos casos de interligação entre os números 2 e 3 do artigo 11° da LGT;

f) Demonstrada a compatibilidade da lei com a realidade no que toca à concessão de certificados de renúncia nas situações de contratos em simultâneo que o ofício circulado n°. 30099, de 09.02.2007,

contempla, não está a A. Fiscal a desprezar o princípio da segurança jurídica e da confiança;

g) Nem a sentença, nem a decisão administrativa nem a aplicação informática formulam ou veiculam uma interpretação do RRIVA denegadora do princípio da neutralidade fiscal em matéria de IVA; Termos em que o recurso de revista não deve ser admitido por falta de pressupostos, e se for admitido não deve ser julgado procedente, mantendo-se a decisão de primeira instância, confirmada pelo

acórdão do TCA Norte.

3 - O Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto não emitiu parecer sobre o mérito do recurso por não se configurar nenhum dos casos previstos no n.º 1 do art.º 146.º do CPTA (fls. 338 dos autos).

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir. Fundamentação

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O Acórdão do STA que admitiu o presente recurso definiu a questão decidenda como sendo a de saber se nas operações relativas a bens imóveis, concretamente na celebração de contratos simultâneos, aquando da celebração do segundo contrato e para efeito de renúncia de isenção de IVA, o segundo transmitente, no momento em que celebra o segundo contrato simultâneo de compra e venda deve encontrar-se na posse do certificado válido de renúncia à isenção de IVA ou se é suficiente o pedido de declaração electrónica desse certificado de renúncia, o qual já havia sido feito, tudo isto após a confirmação das condições objectivas e subjectivas previstas nos artºs 2º, 3º e 5º do Regime de renúncia à isenção de IVA (RRIIVA), aprovado pelo Decreto-lei nº 21/2007 de 29/1, sendo certo que o facto da aplicação informática não permitir informar que se está perante contratos simultâneos, nem tão pouco autorizar o exercício do direito de audição prévia, impede que a mesma aplicação informática

cumpra com o disposto no artº 2º, nº 3 do predito Decreto-lei e que aquele actuou de acordo com a instrução administrativa do Ofício-circulado nº 30.099 de 9/2/2007.

5 – Matéria de facto

No acórdão recorrido foram dados como provados os seguintes factos:

A) Por escritura pública de alteração de contrato e compra e venda em final de leasing exarada em 02/08/2007, de folhas 132 a 134 verso, do livro n.° 170, do Cartório Notarial de C……, sito à Rua de ……, n.° ……, ….º andar …, no Porto, Banco D……, SA, pessoa colectiva n.° ……, vendeu a B……, SA, o prédio urbano composto por casa de cave, rés-do-chão e andar, para indústria de mobiliário, e logradouro, sito na Rua ……, n.° ……, freguesia de Lordelo, concelho de Paredes, descrito na Conservatória do Registo Predial de Paredes sob o número dois mil duzentos e trinta e seis, da freguesia de

Lordelo, inscrito na matriz sob o artigo 3172 (fls. 24 a 30);

B) Nesta escritura ficou consignado que esta venda, de acordo com o artº 12.° do Código do IVA e em conformidade com o Certificado de Renúncia à isenção emitido em trinta e um de Julho passado, pelo Segundo Serviço de Finanças de Lisboa, está sujeita a Imposto sobre o Valor Acrescentado à taxa normal, o qual fica a cargo da sociedade compradora (fls. 24 a 30);

C) O certificado de renúncia à isenção do IVA referido em B), ficou arquivado no cartório notarial (fls. 29);

D) O certificado de renúncia à isenção do IVA na transmissão de bem imóvel, do prédio inscrito no artigo 3172, da freguesia de Lordelo, do Banco D..., SA, para B…… SA, pelo valor de 1.199.799,58 €, foi emitido em 31/07/2007 (fls. 36);

E) Por escritura pública de compra e venda exarada em 02/08/2007, de folhas 140 a 141 verso, do livro n.° 170, do Cartório Notarial de C……, sito à Rua ……, n.° …, ….º andar esquerdo, no Porto, B……, SA, vendeu a E……, Lda, pessoa colectiva n.° ……, o prédio urbano composto por casa de cave, rés-do-chão e andar, para indústria de mobiliário, e logradouro, sito na Rua ……., n.° …., freguesia de Lordelo, concelho de Paredes, descrito na Conservatória do Registo

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Predial de Paredes sob o número dois mil duzentos e trinta e seis, da freguesia de Lordelo, inscrito na matriz sob o artigo 3172 (fls. 31 a 35); F) Em 01/08/2007 a autora fez um pedido de declaração electrónica de certificado de renúncia à isenção do IVA na transmissão de bem imóvel, relativo ao prédio inscrito no artigo 3172, da freguesia de Lordelo, do concelho de Paredes, para E……, Lda, pelo valor de 2.350.000,00 € (fls. 37 e 50);

G) Sobre o pedido referido em F) foi proferido, na mesma aplicação informática, em 08/08/2007, o seguinte despacho: «O acto gerador verificou-se a 02/08/2007, com a escritura lavrada no C. Not. de C……, sito à Rua ……, … - …º … . -Porto, a fls. 141-v°, do livro 170, pelo que indefiro o pedido» (fls. 49 a 51);

H) Este despacho ficou disponível para consulta da autora desde 08/08/2007 (fls. 49);

I) O despacho referido em G) foi notificado à autora em 23/06/2008 (fls. 49); e

J) A acção administrativa especial foi intentada em 02/09/2008 (fls. 2). 6 – Apreciando

6.1 Da preterição do direito de audiência prévia ao indeferimento do certificado de renúncia à isenção

O acórdão recorrido, a propósito do alegado erro de julgamento de direito quanto à apreciação da imputada ilegalidade da falta de audiência prévia, julgou-o não verificado, porquanto no caso dos autos, considerado que a emissão do certificado de renúncia teria necessariamente que ser emitido antes da celebração da escritura pública de transmissão, uma vez constatado que esta já tinha tido lugar, o sentido da prolação do despacho não podia ser outro que não o do indeferimento do pedido, mostrando-se despicienda a audiência prévia dos interessados ou destinatários do acto, tudo isto em

obediência ao princípio do aproveitamento dos actos

substancialmente válidos, pois que concretizada que estava a escritura pública de transmissão sem a posse do certificado de renúncia à isenção, não poderia conceder-se o direito de audiência sobre um pretenso indeferimento, porquanto o exercício da renúncia se configurava como ineficaz, degradando-se aquela formalidade em não essencial, por aplicação do princípio do aproveitamento dos actos administrativos (cfr. acórdão recorrido, a fls. 212 a 219 dos autos). Contra o decidido, alega o recorrente que no caso sub judice era obrigatória, nos termos da alínea b) do nº 1 do artigo 60º da LGT, a audição prévia da Recorrente, dado que o fundamento que motivou a Decisão de indeferimento do pedido de renúncia à isenção do IVA não se revelou, por demais, como facto determinante e imperativo que pudesse «secar» potenciais argumentos e factos relevantes, agora de novo aduzidos, que permitissem alterar a sentido da Decisão, pois que a aplicação informática não permite informar que se está perante uma situação de contratos simultâneos, nem que é possível formalizar manualmente o pedido de renúncia à isenção, o exercício do direito de audição permitiria à Recorrente informar que se estava perante a realização de contratos realizados em simultâneo e assim

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aplicar-se-ia o nº 3 do artigo 2° do RRIIVA, bem como invocar o teor do Ofício-circulado n.° 30099/2007, de 9 de Fevereiro, da DSIVA, influenciando claramente o destino da decisão, acrescendo que tal exercício

revelar-se-ia ainda mais útil, pois, o próprio Chefe do Serviço de Finanças teve várias dúvidas sobre a própria aplicação informática, o que permitira o debate alargado sobre a matéria. Conclui que, não tendo sido efectuada a audição prévia, se preteriu uma formalidade essencial do procedimento e, como tal, o Despacho aqui em crise encontra-se inquinado de tal ilegalidade, pelo que deverá ser anulado, com todas as consequências legais.

Contra-alegou o recorrido, concluindo neste ponto que estando concretizada a segunda escritura sem existir a posse válida de um certificado de renúncia, não poderia conceder-se o direito de audição sobre um pretenso indeferimento, se se sabia, com base na lei, que o exercício da renúncia à isenção era ineficaz e como tal, nunca

poderia produzir efeitos, pelo que tal formalidade sempre se degradaria em não essencial, dando oportunidade à aplicação do princípio do aproveitamento dos actos jurídicos, termos em que se não praticou qualquer preterição de formalidade essencial.

Vejamos.

O indeferimento do pedido de certificado de renúncia à isenção do IVA apresentado pela ora recorrente e questionado nos presentes autos não foi precedido de audiência prévia da requerente, pois que, ao que parece, a aplicação informática através da qual é solicitado e emitido não prevê a realização de tal “formalidade”.

Importa, pois, decidir se a preterição do dever de audição prévia deve determinar a anulabilidade do acto de indeferimento, como pretendido pela recorrente, se, pelo contrário, se deve ter como mera

irregularidade sem eficácia invalidante, como decidido.

Atento o disposto no artigo 60.º da Lei Geral Tributária (LGT) manifesto é que a audição do contribuinte pela Administração em momento anterior ao indeferimento do pedido de certificado de

renúncia não estava dispensada (cfr. o n.º 2 e 3 do artigo 60.º da Lei Geral Tributária), antes era imposta pela alínea b) do n.º 1 do mesmo preceito legal, daí que, a ser exacto que não se preveja a audiência prévia aos indeferimentos dos pedidos de renúncia à isenção de IVA nas operações imobiliárias, suporta a Administração fiscal o sério risco de anulação de tais actos de indeferimento, por preterição de formalidade essencial, pois que o direito de audiência prévia é um corolário do princípio da participação dos cidadãos na formação das decisões que lhes digam respeito.

A doutrina e a jurisprudência têm vindo, contudo, a sublinhar que a preterição do dever de audição, pode, em certos casos, degradar-se em formalidade não essencial e, portanto, ser omitida sem que daí resulte qualquer ilegalidade determinante da anulação do acto, não se justificando tal anulação nos casos «em que se apure no processo contencioso que, se ela tivesse sido realizada, o interessado não teria possibilidade de apresentar elementos novos nem deixou de

pronunciar-se sobre questões relevantes para determinar o conteúdo da decisão final, ou acabou por ter oportunidade de pronunciar-se, em procedimento de segundo grau (reclamação graciosa ou recurso

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hierárquico), sobre questões sobre as quais foi indevidamente omitida a audiência no procedimento de primeiro grau» - cfr. Diogo Leite

Campos, Benjamim da Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa, in Lei Geral Tributária Anotada, 4.ª edição, 2012, pág. 515.

Não obstante, como se consignou no acórdão deste Supremo

Tribunal Administrativo de 10 de Novembro de 2010 (rec. 671/10), e se reiterou no Acórdão de 11 de Maio de 2011 (rec. n.º 833/10), «A preterição da formalidade que constitui o facto de não ter sido

assegurado o exercício do direito de audiência só pode considerar-se não essencial se se demonstrar que, mesmo sem ela ter sido

cumprida, a decisão final do procedimento não poderia ser diferente». Ora, se o motivo do indeferimento do pedido de certificado de

renúncia à isenção tivesse sido o facto de o prédio não estar (ainda) inscrito na matriz em nome do recorrente - como exige, para a

generalidade dos casos, a alínea b) do n.º 1 do artigo 2.º do Regime da Renúncia à Isenção do IVA nas operações relativas a bens

imóveis (RRIIVA), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 21/2007, de 29 de Janeiro, condição esta que, porém, não é exigível, ex vi do n.º 3 do mesmo artigo, no caso de “contratos realizados em simultâneo” -, a alegação da recorrente de que se estaria perante contratos realizados em simultâneo mas que a aplicação informática não permite informar dessa circunstância nem é possível formalizar manualmente o pedido de renúncia à isenção -, necessariamente levaria a concluir que a preterição do dever de audiência prévia ao indeferimento constituía preterição de uma formalidade essencial, determinante da anulação do acto de indeferimento, dado o relevo dos argumentos aduzidos. No caso dos autos, contudo, não foi isso que se verificou, antes o motivo do indeferimento do pedido foi o da celebração do (segundo) contrato (simultâneo) em momento anterior ao da obtenção do

certificado de renúncia (cfr. a alínea G) do probatório), solicitado, aliás, no dia imediatamente precedente ao da realização da escritura (cfr. a alínea f) do probatório), sem que o requerente tivesse querido aguardar pelo termo do prazo concedido à Administração para a sua emissão (que é de 10 dias contados da data da confirmação pelo adquirente ou locatário dos elementos fornecidos pelo requerente vendedor ou locador – cfr. o artigo 4.º n.º 2 e 4 do RRIIVA).

Ora, assim sendo, nenhuma censura merece o acórdão recorrido ao considerar a preterição do dever de audição prévia como preterição de formalidade não invalidante do acto, em razão do princípio do aproveitamento destes, pois prescrevendo o n.º 3 do artigo 5.º do RRIIVA que “O exercício da renúncia à isenção sem que estejam reunidas as condições referidas no n.º 1 não produz efeitos” e

estabelecendo o n.º 1 do mesmo artigo que “A renúncia á isenção só opera no momento em que seja celebrado o contrato de compra e venda ou de locação do imóvel, desde que o sujeito passivo esteja na posse de um certificado de renúncia válido e se continuem a verificar nesse momento as condições para a renúncia à isenção”, a emissão do certificado de renúncia teria necessariamente que ser emitido antes da celebração da escritura pública de transmissão, pelo que constatado que esta já tinha tido lugar, o sentido da prolação do despacho não podia ser outro que não o do indeferimento do pedido,

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mostrando-se despicienda a audiência prévia dos interessados ou destinatários do acto.

Improcede, deste modo, a alegação da recorrente sintetizada nas conclusões c) a f) das suas alegações de recurso, sendo de confirmar o decidido no acórdão recorrido quanto aos efeitos não invalidantes do acto de indeferimento da preterição do dever de audição prévia. 6.2 Da questão de saber se nas operações relativas a bens imóveis, concretamente na celebração de contratos simultâneos, aquando da celebração do segundo contrato e para efeito de renúncia de isenção de IVA, o segundo transmitente, no momento em que celebra o

segundo contrato simultâneo de compra e venda deve encontrar-se na posse do certificado válido de renúncia à isenção de IVA ou se é suficiente o pedido de declaração electrónica desse certificado de renúncia, o qual já havia sido feito, tudo isto após a confirmação das condições objectivas e subjectivas previstas nos artºs 2º, 3º e 5º do Regime de renúncia à isenção de IVA (RRIIVA), aprovado pelo Decreto-lei nº 21/2007 de 29/1, sendo certo que o facto da aplicação informática não permitir informar que se está perante contratos

simultâneos, nem tão pouco autorizar o exercício do direito de audição prévia, impede que a mesma aplicação informática cumpra com o disposto no artº 2º, nº 3 do predito Decreto-lei e que aquele actuou de acordo com a instrução administrativa do Ofício-circulado nº 30.099 de 9/2/2007

O acórdão deste Supremo tribunal que admitiu o presente recurso excepcional de revista enunciou a questão decidenda como se reproduz em epígrafe.

Ora, a eventual admissibilidade de que o pedido de certificado de renúncia à isenção pelo segundo transmitente em contratos

simultâneos pudesse ter o mesmo efeito que a obtenção do próprio certificado, depois de comprovadas as condições objectivas e

subjectivas de que depende a validade da renúncia à isenção de IVA nas operações imobiliárias - por imperativo do princípio da prevalência da substância sobre a forma, da neutralidade fiscal ou de outros

princípios nucleares convocáveis na matéria em apreço -, está

necessariamente dependente da certeza quanto à impossibilidade de o segundo transmitente poder obter, em tempo útil, o certificado de renúncia à isenção.

No caso dos autos, porém, tal certeza inexiste.

Não há no probatório fixado nada que permita concluir nesse sentido, e a recorrente, ao não ter aguardado o termo do prazo normal para a emissão do certificado – antes tendo optado por celebrar o contrato no dia imediatamente seguinte àquele em que o requereu por via

electrónica – criou a legítima dúvida sobre tal alegada impossibilidade, contrariada, aliás, pela recorrida, que invoca que a posse válida de um certificado de renúncia para o segundo contrato sempre seria

possível, no caso concreto dos autos, por o seu pedido ter sido efectuado em momentos distintos e dada a possibilidade legal de existência de uma tramitação manual do procedimento de renúncia a par do procedimento por via electrónica que permitiria sempre a posse

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válida de um segundo certificado de renúncia, pois que a aplicação informática não é a monopolizadora do procedimento de renúncia à isenção do IVA sendo compatível com a tramitação manual, caso em que a informação disponível naquela aplicação referirá a situação de pendente, pelo que a realização de contratos em simultâneo é

compatível com a posse de certificados de renúncia válidos à data da realização das respectivas escrituras de modo a tornar eficaz o

exercício da renúncia à isenção.

No caso concreto dos autos, o apuramento de tais circunstâncias não se afigurou ao Tribunal Central Administrativo Norte essencial para a decisão, pois que esta acaba por ser condicionada pelo

comportamento posterior do requerente ao ter celebrado a escritura no dia seguinte ao do requerimento sem aguardar pela emissão do certificado (cfr. o acórdão recorrido, a fls. 225 a 228 dos autos), deste modo inviabilizando – ele próprio, pelo seu comportamento – a

possibilidade de válida e eficazmente poder renunciar à isenção. O decidido, no quadro fáctico fixado, não merece censura, sendo por referência a este – e não a qualquer outro que, embora alegado, ficou por demonstrar – que se julga improcedente o recurso, confirmando o acórdão recorrido, que não merece censura.

- Decisão -

7 - Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, em negar provimento ao recurso, confirmando o acórdão recorrido.

Custas pela recorrente.

Lisboa, 5 de Julho de 2012. - Isabel Marques da Silva (relatora) - Lino Ribeiro - Dulce Neto.

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