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Infanticídio no direito penal: a culpabilidade e o grau de influência do estado puerperal

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UNIJUÍ – UNIVERSIDADE REGIONAL DO NOROESTE DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

ADRIANA CRISTINA CICHORSKI

INFANTICÍDIO NO DIREITO PENAL: A CULPABILIDADE E O GRAU DE INFLUÊNCIA DO ESTADO PUERPERAL

SANTA ROSA (RS) 2015

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ADRIANA CRISTINA CICHORSKI

INFANTICÍDIO NO DIREITO PENAL: A CULPABILIDADE E O GRAU DE INFLUÊNCIA DO ESTADO PUERPERAL

Monografia final do Curso de Graduação em Direito da Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul – UNIJUI, apresentado como requisito parcial para a aprovação no componente curricular Metodologia da Pesquisa Jurídica. DEJ – Departamento de Estudos Jurídicos.

Orientador: MSc. Fernando Antonio Sodré de Oliveira

Santa Rosa (RS) 2015

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“O sucesso nasce do querer, da determinação e persistência em se chegar a um objetivo. Mesmo não atingindo o alvo, quem busca e vence obstáculos, no mínimo fará coisas admiráveis.”

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Dedico o meu TCC para todos aqueles que fizeram do meu sonho real, me proporcionando forças para que eu não desistisse de ir atrás do que eu buscava para minha vida. Muitos obstáculos foram impostos para mim durante esses últimos anos, mas graças a vocês eu não fraquejei. Obrigado por tudo família, noivo, professores, amigos e colegas.

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AGRADECIMENTO

Agradeço primeiramente a Deus por mais esse sonho concretizado, ao ensinamento de todos os professores, ao apoio da minha família, amigos e a mim que mantive o meu foco para não desistir dos meus ideais.

Ao meu orientador Ms Fernando Antônio Sodré que dedicou muito do seu tempo me orientando, embora tivesse outros interesses a resolver. Obrigada pelos ensinamentos, atenção, amizade e dedicação ao longo deste período.

À minha família, pоr sua capacidade dе acreditar еm mіm е investir еm mim. Mãe, sеυ cuidado е dedicação fоі que deram, еm alguns momentos, а esperança pаrа seguir. Pai, sυа presença significou segurança е certeza dе qυе não estou sozinho nessa caminhada. Pai e Mãe sem vocês nada disso seria possível. Obrigado pelo apoio, carinho e compreensão. Essa vitória não é só minha, é nossa!

Ao meu noivo pessoa cоm quem аmо partilhar а vida. Obrigado pelo carinho, а paciência е pоr sua capacidade dе me trazer pаz nа correria dе cada semestre.

E о qυе dizer а vocês minhas irmãs. Obrigada pеlа paciência, pelo incentivo, pela força е principalmente pelo carinho. Principalmente a você Andressa, valeu а pena toda distância, tоdо sofrimento, todas аs renúncias... valeu а pena esperar.... Hoje estamos colhendo, juntas, оs frutos dо nosso empenho! Esta vitória é toda nossa.

“Vô Carol (in memorian) e nono Leo (in memorian), tenho certeza que de onde vocês estiverem, vocês estão felizes assim como nós. Vocês permanecerão eternamente em nossas lembranças e, principalmente em nossos corações”.

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RESUMO

Este estudo desenvolve-se sobre o tema “infanticídio no Direito Penal: A culpabilidade e o grau de influência do estado puerperal”, e teve como objetivo geral realizar a análise do crime de Infanticídio, buscando entender e discutir as diferentes correntes que tratam do estado puerperal como elementar atenuante nesta prática. Buscando alcançar resposta à questão problema “a gestante sob total influência do estado puerperal deveria ser considerada inimputável? Ou deveria apenas ter sua culpabilidade diminuída dependendo do grau em que foi acometida pelo estado puerperal?” Para tanto utilizou-se o método de abordagem dedutivo, partindo de uma visão geral sobre o estado puerperal, o qual pode ser enfrentado por todas as mulheres ao entrarem em trabalho de parto causando efeitos que variam em cada mulher, tanto no corpo como na mente; podendo provocar o desejo e a concretização do ato de matar o próprio filho caracterizando o crime insculpido no artigo 123 do Código Penal Brasileiro como Infanticídio. O modelo de investigação empregado foi o bibliográfico, uma vez que, utilizou-se doutrina e legislação, para sua elaboração. Com base no estudo verificou-se que o Infanticídio é um crime privilegiado por envolver alterações fisiológicas que se refletem como incapacidade do executor em avaliar a intensidade do delito que se está cometendo. No entanto, a comprovação de que o crime foi de fato produzido sob efeito do estado puerperal tem sido o grande desafio dos aplicadores do Direito.

Palavras-chave: Infanticídio. Estado puerperal. Crime.

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ABSTRACT

This study develops on the theme of “infanticide in the Criminal Law: culpability and the degree of influence of the state post-partum”, and had as general objective to perform the analysis of the crime of Infanticide, by seeking to understand and discuss the different currents that deal with the state's puerperal as a elementary mitigating factor in this practice. Seeking to achieve the answer to the question problem“, the woman under the complete influence of the state post-partum should be considered harmless? Or should just have his guilt diminished depending on the degree in which it was affected by the state post-partum?” For both, we used the method of approach is deductive, starting from a general overview about the state post-partum, which can be faced by all the women to enter into labor causing effects that vary in every woman, both in body and in mind; may cause the desire and the realization of killing his own son characterizing the crime valuable in Article 123 of the Brazilian Penal Code as infanticide. The employee research model was the literature, since it was used doctrine and legislation to make it. Based on the study it was found that the Infanticide is a privileged crime because it involves physiological changes which are reflected as executor 's inability to assess the intensity of the crime that is committing. However, the evidence that the crime was actually produced under the influence of puerperal state has been the great challenge of the law enforcers.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 08

1 INFANTICÍDIO ... 11

1.1 O INFANTICÍDIO NO BRASIL ... 12

1.2 PUERPÉRIO E ESTADO PUERPERAL... 13

1.3 TIPOLOGIA DO INFANTICÍDIO NO DIREITO PENAL ... 16

2 A PROBLEMÁTICA ENVOLTA DO CONCURSO DE PESSOAS NO CRIME DE INFANTICÍDIO ... 22

2.1 POSICIONAMENTOS DOUTRINÁRIOS E JURISPRUDENCIAIS ACERCA DO CONCURSO DE AGENTES NO CRIME DE INFANTICÍDIO ... 24

2.2 CORRENTE DEFENSORA DA INCOMUNICABILIDADE ... 26

2.3 CORRENTE DEFENSORA DA COMUNICABILIDADE ... 28

3 O INFANTICÍDIO E A TEORIA DO CRIME ... 31

3.1 CONDUTA TÍPICA, ANTIJURÍDICA E CULPÁVEL ... 31

3.2 A CULPABILIDADE E O GRAU DE INFLUÊNCIA DO ESTADO PUERPERAL . 34 CONCLUSÃO ... 39

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INTRODUÇÃO

Este trabalho monográfico apresenta o tema “Infanticídio no Direito Penal: A culpabilidade e o grau de influência do estado puerperal”.

O estado puerperal é definido por apresentar fatores psicológicos e fisiológicos que atingem todas as gestantes, possui diversos estágios de influência e intensidade sob a psique das mesmas.

Assim, com base nesta condição do estado puerperal, o desenvolvimento deste estudo, parte do problema o qual, questiona-se: “a gestante sob total influência do estado puerperal deveria ser considerada inimputável? Ou deveria apenas ter sua culpabilidade diminuída dependendo do grau em que foi acometida pelo estado puerperal?”

Para tanto parte-se das hipóteses de que o Estado Puerperal é enfrentado por todas as mulheres ao entrarem em trabalho de parto trazendo efeitos (de intensidades que variam de mulher para mulher) pelo corpo e na cabeça da parturiente. Estes podem provocar-lhe o desejo e a concretização do ato de matar o próprio filho caracterizando o crime insculpido no artigo 123 do Código Penal Brasileiro como Infanticídio.

Além disso, hipoteticamente, o Infanticídio é um crime privilegiado por envolver alterações fisiológicas que se refletem como incapacidade do executor em avaliar a intensidade do delito que se está cometendo. Este estado puerperal pode ser identificado como fator elementar na execução deste crime diferenciando o tratamento especial dado a este crime de matar pelo Código Penal Brasileiro.

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divergências entre os doutrinadores e os aplicadores do Direito. Isso, em função da dificuldade de comprovação do Estado Puerperal. Em muitos casos, a constatação efetiva da ocorrência do mesmo fica dificultada porque a mulher acaba sendo submetida ao crivo dos médicos e psicólogos quando já se passou um longo período da data do fato. Isto acaba ensejando, na quase totalidade dos casos de Infanticídio, a presunção de ocorrência do Estado Puerperal, já que se deve optar pela solução mais benéfica ao réu, em decorrência do princípio in dubio pro reo que permeia o Direito Penal e o Processual Penal Brasileiro.

Este trabalho monográfico tem como objetivo geral realizar a análise do crime de Infanticídio, buscando entender e discutir as diferentes correntes que tratam do estado puerperal como elementar atenuante nesta prática.

Especificamente objetiva-se definir o conceito legal e doutrinário do crime de Infanticídio; além de pesquisar sobre o entendimento do direito a respeito da influência do estado puerperal nesta prática; de modo a entender e discutir as duas correntes que tratam sobre o estado puerperal.

A escolha do tema justifica-se em função de que a partir do Código Penal de 1940, no caso do infanticídio passaram a serem considerados aspectos fisiopsicológico, estabelecendo necessariamente a presença da influência do estado puerperal para configurar o crime. Esta alteração se deu com base levando em conta os transtornos psíquicos os quais as mães apresentam em decorrência do parto, antes e depois deste, os quais são provenientes do chamado estado puerperal.

Com isso, diversos estudos voltados ao crime de infanticídio levantam uma questão controvertida sobre a possibilidade ou não de comunicar as circunstâncias pessoais do referido tipo penal àquele que colabora em concurso de pessoas.

Sobre este aspecto, alguns doutrinadores defendem o não cabimento da comunicação das circunstâncias pessoais ao concurso de pessoas no crime em estudo, pois entendem ser estas circunstâncias de caráter personalíssimas e

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intrinsecamente ligadas ao autor, fato este intransferível e se transferível poderia confrontar com o ideal de justiça, pois o coautor ou partícipe estaria em uma posição privilegiada sem o devido merecimento.

Por outro lado, existe outra corrente que defende a tese de que, mesmo sendo circunstâncias pessoais, estas devem ser transmitidas aos que cometeram o crime de infanticídio.

Desta forma, as discussões que permeiam o tema central deste estudo, justificam esta pesquisa, considerando ainda que não se trata somente de uma questão de Direito, mas, envolve ainda aspectos referentes à psicologia.

Para se alcançar os objetivos propostos, gerais, a pesquisa realizada foi do tipo exploratória, na qual utilizou-se a coleta de dados em fontes bibliográficas disponíveis em meios físicos e na rede mundial de computadores, sendo utilizada também a documentação direta: por observação direta intensiva (observação).

Como resultado desta pesquisa, apresenta-se este trabalho em três capítulos. No primeiro capítulo apresenta-se um breve resgate histórico do infanticídio no Brasil, abordando-se ainda aspectos sobre o que é o puerpério e estado puerperal e também sobre a tipologia do infanticídio no direito penal.

No segundo capítulo trata-se da problemática envolta do concurso de pessoas no crime de infanticídio, trazendo o posicionamentos doutrinários e jurisprudenciais acerca do concurso de agentes no crime de infanticídio, destacando e explicando tanto a corrente defensora da incomunicabilidade como a corrente defensora da comunicabilidade.

No terceiro e último capítulo, faz-se a abordagem do infanticídio e a teoria do crime, considerando sobre a conduta típica, antijurídica e culpável e finalizando com a discussão sobre a culpabilidade e o grau de influência do estado puerperal.

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1 INFANTICÍDIO

O infanticídio, no decorrer dos tempos, teve várias formas de definições e maneiras de ser punido. Nenhum outro crime foi de um extremo ao outro quanto o infanticídio, nota-se que ele variava entre a impunidade absoluta à severidade brutal das penas.

Na Bíblia, por exemplo, existe o primeiro relato histórico de um possível Infanticídio na sociedade. Este está descrito no livro do Gênesis (capítulo: 22 e versículos: 1 a 14) a respeito do sacrifício de Isaque, filho de Abraão.

No império Romano e entre algumas tribos bárbaras o Infanticídio era uma prática aceita com naturalidade, pois a oferta de alimentos era pouca e o Infanticídio era uma das formas de diminuir a população. Eliminando-se crianças, diminuía-se a população e gerava um pseudo-controle administrativo por parte dos governantes.

Se a criança infortunamente nascesse com alguma deformação física ou até mesmo se o pai tivesse algum outro motivo, o recém-nascido seria abandonado e morreria por falta de alimento. Assim, a prática do Infanticídio não era vista como um delito grave nos primórdios da sociedade.

Capez (2008, p. 109) menciona que:

Na Idade Média não se diferenciava a figura do homicídio da figura do infanticídio, sendo certo que este era incluído entre os crimes mais severamente apenados. As penas previstas para a mulher que matava o próprio filho eram de extrema atrocidade. Nesse diapasão, a Carolina (Ordenação penal de Carlos V) previa que as malfeitoras deveriam ser enterradas vivas, empaladas ou dilaceradas com tenazes ardentes. O Direito Romano igualmente não distinguia o infanticídio do homicídio, também prevendo penas bastante atrozes, tal como o cosimento do condenado em um saco com um cão, um galo, uma víbora e uma macaca, após o que era lançado ao mar. Somente no século XVIII a pena do infanticídio passou a ser abrandada sob o influxo das ideias dos filósofos adeptos do Direito Natural. A partir daí, o infanticídio, quando praticado, honoris causa, pela mãe ou parentes passou a constituir homicídio privilegiado.

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1.1 O infanticídio no Brasil

No Brasil, os povos nativos tinham o infanticídio como algo natural e o praticavam indiscriminadamente, o que ainda ocorre em algumas tribos indígenas brasileiras. Com a chegada dos colonizadores originaram-se as primeiras formas de Direito Penal escrito, não abordando, porém, o infanticídio.

Capez (2008, p. 109-110) explica que: “Beccaria e Feuerbach foram os primeiros a conceber o homicídio como tal em um diploma legislativo, o Código Penal austríaco de 1803. No Brasil, o Código de 1830 foi o primeiro diploma legislativo a abrandar a pena do infanticídio.”

Mirabete e Fabrini mencionam que:

O infanticídio seria, na realidade, um homicídio privilegiado, cometido pela mãe contra o filho em condições especiais. Entendendo o legislador, porém, que é ele fato menos grave que aqueles incluídos no art. 121, § 1º, e na linha de pensamento de Beccaria e Feuerbach, definiu-o em dispositivo à parte, como delito autônomo e denominação jurídica própria, cominando-lhe pena sensivelmente menor que a do homicídio privilegiado [...] optou o legislador pelo sistema fisiopsicológico ou fisiopsíquico, apoiado no estado puerperal. (MIRABETE; FABRINI, 2008, p. 56-57).

Tal crime foi tipificado no Brasil com o Código Criminal do Império de 1830, sendo tratado como uma figura excepcional, e tendo por consequência um abrandamento da pena. A pena era abrandada para a mãe que matasse o filho por motivo de honra (art. 198), ficando claro o desamparo legal em face do recém-nascido (BITTENCOURT, 2011).

Bittencourt (2011, p. 143) explica que o Código Penal de 1890 trouxe algumas mudanças em seu art. 298:

Matar recém-nascido, isto é, infante, nos sete primeiros dias do seu nascimento, quer empregando meios diretos e ativos, quer recusando à víctima os cuidados necessários à manutenção da vida e a impedir sua morte: pena – de prisão celular por seis a vinte e quatro anos. Parágrafo único. Se o crime for perpetrado pela mãe, para ocultar a desonra própria: pena de prisão cellular por três a nove anos.

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Este autor afirma que “o legislador de 1890 cominou, equivocadamente para o infanticídio a mesma pena que cominara para o homicídio (seis a vinte e quatro anos)” (BITTENCOURT, 2011, p. 144). Pois dessa forma, o legislador cominou a mesma pena do homicídio (6 a 24 anos) para o infanticídio, havendo abrandamento de pena no caso de cometimento do crime pela própria mãe e por motivo de honra.

O Código Penal vigente traz o infanticídio descrito no seu artigo 123, como sendo: “Matar, sob a influência do estado puerperal, o próprio filho, durante o parto ou logo após: Pena – detenção, de 2 (dois) a 6 (seis) anos”.

Com essa nova redação podem ser tirados dois conceitos básicos que devem ser detalhados para que se compreenda melhor o crime de infanticídio. O primeiro deles é o ato de matar, que pode ser definido como tirar a vida de alguém. O segundo que deve ser compreendido é a influência do estado puerperal, o que caracteriza o crime de infanticídio. (RIBEIRO, 2004, p. 29).

Nesse sentido, entende o legislador pátrio que o infanticídio é um homicídio privilegiado, cometido pela mãe contra o recém-nascido, estando esta sob influência de condições fisiológicas especiais, ou seja, referido estado puerperal.

1.2 Puerpério e estado puerperal

O Estado Puerperal é a elementar do Infanticídio. É aquela circunstância que envolve a mãe durante a expulsão da criança do ventre, podendo ter profundas alterações psíquicas e físicas, transtornando a parturiente deixando-a sem plenas condições de compreender o que está realmente fazendo.

França define o puerpério como sendo:

[...] o espaço de tempo variável que vai do desprendimento da placenta até a involução total do organismo materno às suas condições anteriores ao processo gestacional. Dura em média, seis a oito semanas. Seu diagnóstico é muito importante nas questões médico-legais ligadas a sonegação, simulação e dissimulação do parto e da subtração de recém-nascidos, principalmente nos casos em que se discute a hipótese de aborto ou de infanticídio, ou ainda de parto próprio ou alheio. (FRANÇA, 2001, p. 225).

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Já Mirabete e Fabrini, citam Almeida Jr. e Costa Jr., para definirem o puerpério, citando que:

[...] é o período que vai da dequitação (isto é, do deslocamento e expulsão da placenta) à volta do organismo materno ás condições pré-gravídicas. [...] Nele se incluem os caso em que a mulher, mentalmente sã, mas abalada pela dor física do fenômeno obstétrico, fatigada, enervada, sacudida pela emoção, vem a sofrer um colapso do senso moral, uma liberação de impulsos maldosos, chegando com isso a matar o próprio filho. (ALMEIDA JR.; COSTA JR.; apud MIRABETE; FABRINI, 2008, p. 57).

Ainda sobre o puerpério, Bittencourt explica que:

O estado puerperal pode determinar, embora nem sempre determine, a alteração do psiquismo da mulher dita normal. Em outros termos, esse estado existe sempre, durante ou logo após o parto, mas nem sempre produz as perturbações emocionais que podem levar a mãe a matar o próprio filho. Nosso Código Penal, que adota o critério fisiológico, considera fundamental a perturbação psíquica que o estado puerperal pode provocar na parturiente. É exatamente essa perturbação decorrente do puerpério que transforma a morte do próprio filho em um delictum exceptum, nas legislações que adotam o critério fisiológico (BITTENCOURT, 2011, p. 146).

Assim, o Estado Puerperal é uma hipótese de semi imputabilidade que foi abordada pelo legislador com a criação de um tipo especial diferente do homicídio simples, que possui apenas a elementar matar. Isso porque, conforme Capez explica, o próprio Código Penal, em seu artigo 123, faz menção ao estado puerperal, considerando que este se trata de um período:

[...] de perturbações, que acometem as mulheres, de ordem física e psicológica decorrentes do parto. Ocorre, por vezes, que a ação física deste pode vir a acarretar transtornos de ordem mental na mulher, produzindo sentimentos de angústia, ódio, desespero, vindo ela a eliminar a vida de seu próprio filho. (CAPEZ, 2008, p. 113).

O atual Código Penal Brasileiro considera fundamental essa perturbação psíquica que o estado puerperal pode provocar, é essa perturbação que transforma a morte do próprio filho em um delictum exceptum, se não ficar provado que a mãe tirou a vida do próprio filho nascente ou recém-nascido sob a influencia desse estado, a morte irá se enquadrar na figura típica do homicídio, mesmo que o crime tenha sido praticado durante o parto, nesse sentido e torna indispensável uma relação de causalidade entre o estado puerperal e a ação delituosa, caso contrario

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manter esse privilegio representaria: [...] “uma inversão odiosa da ordem natural dos valores protegidos pela ordem jurídica” (BITENCOURT, 2011, p. 146).

Capez aborda sobre as possíveis psicoses puerperais após o parto, referindo que:

Além das psicoses que afloram na mulher durante o parto ou logo após, podendo constituir o privilegium, sucede, às vezes, que, dias após o parto, outras psicoses já presentes anteriormente na genitora, mas ainda não manifestadas, se aflorem agravadas pelo puerpério. Nessa hipótese, pelo fato de não decorrerem do estado puerperal e por se manifestarem algum tempo após o parto, a genitora responderá pelo delito de homicídio, incidindo, no entanto, a regra do art. 26 do Código Penal.

Ocorre, por vezes, que o parto pode provocar transtornos psíquicos patológicos que suprimem inteiramente a capacidade de entendimento e determinação da genitora. Nessa hipótese, em que o estado puerperal ocasiona doença mental na mãe, a infanticida ficará isenta de pena diante da aplicação da regra do art. 26, caput, do CP (inimputabilidade). Se, contudo, em decorrência desse estado, a mãe não perder inteiramente a capacidade de entender o caráter ilícito do fato e de determinar-se de acordo com esse entendimento, incidirá o parágrafo único do art. 26 do CP (há simples perturbação da saúde mental). Se, por fim, a mãe sofrer mera influência psíquica, que não se amolde às hipóteses supramencionadas, responderá pelo infanticídio, sem atenuação. (CAPEZ, 2008, p. 114).

Sobre essas psicoses, Mirabete e Fabrini, expõe que:

Não há que se confundir o estado puerperal, de simples desnormalização psíquica, com as denominadas psicoses puerperais (ou sintomáticas) que configuram doenças mentais, levando-se o fato a exame nos termos de inimputabilidade da agente por força do art. 26, caput. (MIRABETE; FABRINI, 2008, p. 58).

Em relação aos efeitos que o estado puerperal pode vir a causar, Bitencourt dispõe:

[...] podem apresentar-se quatro hipóteses: a) o puerpério não produz nenhuma alteração na mulher; b) acarreta-lhe perturbações psicossomáticas que são a causa da violência contra o próprio filho; c) provoca-lhe doença mental; d) produz-lhe perturbação da saúde mental diminuindo-lhe a capacidade de entendimento ou de determinação. Na primeira hipótese, haverá homicídio; na segunda, infanticídio; na terceira, a parturiente é isenta de pena em razão de sua inimputabilidade (art. 26, caput, do CP); na quarta, terá redução de pena, em razão de sua semi imputabilidade. (BITENCOURT, 2011, p. 146).

O Estado Puerperal é um momento de influência por uma situação específica pós-parto, interessando somente de 3 a 7 dias após o parto, salienta-se que este

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período é bastante discutido, pois há aqueles que entendem que só pode durar por algumas horas após o parto e outros que entendem que poderia perdurar por um mês.

1.3 Tipologia do infanticídio no Direito Penal

Com o Código de 1940, o motivo de honra passou a não mais ser considerado uma elementar do crime, “determinando-se a adoção do estado puerperal como circunstância elementar para a diminuição da responsabilidade.”

Assim, o infanticídio refere-se a um homicídio cometido pela mãe contra seu filho, nascente ou recém-nascido, sob a influência do estado puerperal, e por este motivo, trata-se de uma hipótese de homicídio privilegiado, em função exatamente das circunstâncias, de modo que o legislador lhe conferiu tratamento mais brando.

De acordo com Mirabete e Fabbrini (2008), o infanticídio seria um homicídio privilegiado praticado pela mãe, contra seu filho, desde que se encontre sob influência de condições especiais.

O Código Penal de 1940 dispõe: “Infanticídio Art. 123 - Matar, sob a influência do estado puerperal, o próprio filho, durante o parto ou logo após: Pena - detenção, de dois a seis anos.”

A partir das contínuas mudanças da lei penal, ocorreram significativas alterações na concepção do delito, sendo adotado pela legislação dois critérios para tipificarem o crime, os quais levam em consideração o estado psicológico ou fisiopsíquico da mulher.

O primeiro é chamado de psicológico, o qual leva em consideração o motivo de honra, ou seja, o medo da vergonha por haver concebido um filho fora do casamento, ou quando o concepto é resultado de relações adulterinas, esse critério foi usado pelo Código Criminal de 1830 e pelo Código Penal de 1890.

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O Código Penal vigente seguiu orientação diferente, e considerou o critério fisiopsicológico baseado no fundamento o estado puerperal da mulher, levando em conta o desequilíbrio fisiopsíquico oriundo do parto.

Para Bittencourt (2011), o infanticídio apresenta as seguintes particularidades: qualidade ou condição dos sujeitos ativo e passivo da ação delituosa, influência biopsíquica ou fisiopsicológica do estado puerperal e circunstância temporal contida no tipo.

A partir do momento em que o Código Penal de 1940 resolveu adotar o critério fisiopsicológico atrelando ao tipo penal a influencia do estado puerperal, criou um desafio para a perícia medico legal, pois foi transferida ao exame medico toda a responsabilidade de documentação material do crime.

Sobre o momento da prática do crime, cabe ressaltar, que se este for realizado antes do início do parto, não se tratará de crime de infanticídio, mas sim de aborto e se for muito tempo após o parto, configurará crime de homicídio.

Assim, para que haja o infanticídio, faz-se necessário que a agressão seja cometida durante o parto ou logo após; de modo que é importante que seja delimitado o início e o fim do parto. Mirabete e Fabbrini (2008), afirma que o início do parto se dá com a contração do útero e o descolamento do feto, terminando com a expulsão da placenta.

Percebe-se, porém, que não foi fixado pelo legislador um prazo determinado para o cometimento da citada agressão, acarretando grande divergência doutrinária. Alguns autores interpretam a aludida expressão de acordo com seu significado psicológico, ou seja, enquanto durarem as alterações psíquicas da mulher, ao ponto que outros se atêm a um conceito meramente cronológico.

A respeito do aspecto temporal, Bittencourt cita Roberto Lyra:

O que ninguém nega, o que todos reconhecem e proclamam, sem sombra de dúvida, é que, durante o parto ou logo após, há estado puerperal. Não importa se começa antes ou vai além, o fato é que, infalivelmente, com

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maior ou menor intensidade, ocorre durante o parto ou logo após, isto é, no período mencionado pelo Código, podendo ter ou não a indispensável relação com o crime (LYRA apud BITTENCOURT, 2011, p. 147).

Sobre a questão temporal, Hungria (1942, p. 228), traz o seguinte posicionamento sobre o assunto:

[...] O que se faz essencial, porém, do ponto de vista jurídico-penal, é que a parturiente ainda não tenha entrado na fase de bonança e quietação, isto é, no período em que já se afirma, predominante e exclusivista, o instinto maternal. Trata-se de uma circunstância de fato a ser averiguada pelos peritos médicos e mediante prova indireta.

Bem como explica Mirabete (2006, p. 60):

Não fixa a lei o limite de prazo em que ocorre infanticídio e não homicídio. Almeida Jr., que se referia a um prazo preciso, de até sete dias, passou a admitir que se deve deixar a interpretação ao julgador. Bento de Faria refere-se ao prazo de 8 dias, em que ocorre a queda do cordão umbilical. Flamínio Fávero também se inclina para a orientação de deixar ao julgador a apreciação. Costa e Silva afirma que ‘logo após’ quer dizer ‘enquanto perdura o estado emocional’. Damásio estende o prazo até enquanto perdurar a influência do estado puerperal.

Porém, França (2001), se expressa em sentido contrário que:

[...] não há na verdade nenhum elemento psicofísico capaz de fornecer à perícia elementos consistentes e seguros para se afirmar que uma mulher matou seu próprio filho durante ou logo após o parto motivada por uma alteração chamada ‘estado puerperal’, tão somente porque tal distúrbio não existe como patologia própria nos tratados médicos.

Isso porque a caracterização do infanticídio constitui o maior de todos os desafios da prática médico-legal pela sua complexidade e pelas inúmeras dificuldades de tipificar o crime, em se tratando de caracterizar o elemento do estado puerperal.

Sendo que Capez (2008, p. 133) inclusive explica que:

nem sempre o fenômeno do parto produz transtornos psíquicos na mulher, de forma que não é uma regra a relação causal entre ambos. Por vezes, a mulher mata o próprio filho nesse período de tempo sem que tenha qualquer deficiência psíquica produzida pelo puerpério, o que pode no caso configurar não o privilegium legal, mas o delito de homicídio, caracterizado pela frieza e perversidade. Assim, o tão só fato de a genitora estar no período de parto ou logo após não gera uma presunção legal absoluta de

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que ela esteja sofrendo de transtornos psíquicos gerados pelo estado puerperal, pois, via de regra, o parto não gera tais desequilíbrios.

Ou seja, a simples condição da mulher estar no período pós parto, não pode ser considerada como elementar que desagrave o seu ato. Pois a conduta praticada pela infanticida pode ser para salvaguardar a reputação que os outros possuem dela, fazendo de tudo para que essa reputação se mantenha integra, mesmo que sua consideração provoque a destruição de uma vida, dessa forma a sociedade ao se deparar com o delito deve reagir de forma piedosa para com o agente.

Assim, a melhor solução seria analisar o caso concreto, conforme Jesus (2005) ensina, entendendo-se que existirá o delito de infanticídio, enquanto a mãe se encontrar sob influência do estado puerperal. Desta forma, conclui o autor, que a mãe que der fim à vida de seu próprio filho, estando sob influência deste estado, se estará diante da expressão “logo após o parto”.

O infanticídio é um crime material, motivo pelo qual admite-se o fracionamento da conduta, sendo assim a tentativa pode ocorrer a partir do primeiro ato de execução, desde que a morte não ocorra por circunstâncias alheias a vontade da autora, para que realmente ocorra a tentativa, a autora deve ter a intenção de produzir um resultado mais grave do que aquele que consegue, sendo o elemento subjetivo da tentativa o dolo (BITTENCOURT, 2011).

Capez (2008, p. 115) neste sentido afirma: “trata-se de crime material. A consumação se dá com a morte do nonato ou nascente.” Porém existe a possibilidade de tentativa, ao que Capez explica:

Por se tratar de plurissubsistente, a tentativa é perfeitamente possível, e ocorrerá na hipótese em que a genitora, por circunstâncias alheias a sua vontade, não logra eliminar a vida do ser nascente ou neonato (CAPEZ, 2008, p. 116).

Segundo Jesus (2005), admite-se o dolo direto, onde a mãe quer exatamente a morte do filho, e o dolo eventual, onde assume o risco de lhe causar a morte. Não existe previsão legal sobre a forma culposa do infanticídio, por isto não é admitido.

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Mirabete e Fabbrini (2008, p. 61) afirmam que, “se a mãe, por culpa, causar a morte do filho, responderá por homicídio culposo, ainda que tenha praticado o fato sob a influência do estado puerperal”.

Bittencourt (2011) menciona ainda que este crime pode ser interrompido por dois motivos: a) pela vontade da agente, onde ocorre apenas o arrependimento eficaz ou desistência voluntaria, nesse caso não ha o que se falar em tentativa; b) por circunstância alheias a vontade da autora, nesse caso se iniciou a fase de execução, porém o resultado não se verificou existindo a tentativa punível.

Ainda conforme o entendimento expresso por Bittencourt (2011), o momento consumativo do crime se da com a morte do filho nascente ou recém-nascido, sendo que para o crime existir é indispensável que exista um sujeito passivo que só pode ser alguém nascente ou recém-nascido. Haverá o crime impossível quando a mãe praticar o fato com a criança já morta, também não haverá crime se a criança nascer morta e a mãe com a ajuda de um terceiro se desfazer do cadáver abandonando em um lugar ermo.

Ao infanticídio é atribuída a qualidade de crime próprio, onde se exige uma condição especial daquele que o pratica. Por esse motivo, prevê expressamente o Código Penal, que somente a mãe é quem pode figurar no polo ativo deste delito, atendendo, portanto, ao requisito especial do crime próprio, além do fato de somente esta se encontrar sob influência do estado puerperal, o que configura circunstância elementar do tipo.

O artigo que trata do infanticídio é omisso em relação a participação de terceiros na realização do delito. Sobre a questão do concurso de pessoas, Capez explica que existem três situações possíveis, e as expõe:

1ª) Mãe que mata o próprio filho, contando com o auxílio de terceiro: a mãe é autora de infanticídio e as elementares desse crime comunicam-se ao partícipe, que, assim, responde também por infanticídio. A “circunstância” de caráter pessoal (estado puerperal), na verdade, não é circunstância, mas elementar; logo, comunica-se ao partícipe.

2ª) O terceiro mata o recém-nascido, contando com a participação da mãe: o terceiro realiza a conduta principal, ou seja, “mata alguém”. Como tal comportamento se subsume no art. 121 do CP, ele será autor de homicídio.

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A mãe, que praticou uma conduta acessória, é partícipe do mesmo crime, pois o acessório segue o principal. Com efeito, a mãe não realizou o núcleo do tipo (não matou, apenas ajudou a matar), devendo responder por homicídio. No entanto, embora esta seja a solução apontada pela boa técnica jurídica e a prevista no art. 29, caput, do CP (todo aquele que concorre para um crime incide nas penas a ele cominadas), não pode, aqui, ser adotada, pois levaria ao seguinte contra-senso: se a mãe mata a criança, responde por infanticídio, mas como apenas ajudou a matar, responde por homicídio. Não seria lógico. Portanto, nesta segunda hipótese, a mãe responde por infanticídio.

3ª) Mãe e terceiro executam em coautoria a conduta principal, matando a vítima: a mãe será autora de infanticídio e o terceiro, por força da teoria unitária ou monista, responderá pelo mesmo crime, nos expressos termos do art. 29, caput, do CP. Não pode haver coautoria de crimes diferentes, salvo nas exceções pluralísticas do § 2º do art. 29 do CP, as quais são expressas e, como o próprio nome diz, excepcionais. (CAPEZ, 2008, p. 116-117).

Porém, o tema também é controverso, pois conforme bem expõe Bittencourt (2011), neste crime, tem-se duas correntes:

Uma corrente sustenta a comunicabilidade da influência do estado puerperal (Roberto Lyra, Magalhães Noronha, Frederico Marques, Basileu Garcia, Bento de Faria e Damásio de Jesus, entre outros). Outra respeitável corrente (Nélson Hungria, Heleno Cláudio Fragoso, Galdino Siqueira, Aníbal Bruno e Salgado Martins, entre outros, somente para citar os penalistas mais antigos) entende que referido estado não se comunica, e, por isso, o participante deve responder pelo crime de homicídio. Essa conhecida controvérsia ganhou um argumento sui generis patrocinado por Nélson Hungria, que ‘criou’ uma circunstância elementar inexistente no ordenamento jurídico brasileiro: o estado puerperal seria uma circunstância ‘personalíssima’ e, por isso, sustentava Hungria, não se comunicaria a Outros participantes da infração penal! Com essa afirmação Hungria pretendia afastar a aplicação do disposto no antigo art. 26 do Código Penal (atual art. 30), que estabelecia o seguinte: ‘Não se comunicam as circunstâncias de caráter pessoal, salvo quando elementares do crime’. (BITTENCOURT, 2011, p. 152).

Com isso, o coparticipe responde pelo crime de homicídio, sendo que somente a parturiente responderá pela forma privilegiada do homicídio, qual seja o infanticídio, esse privilégio legal não pode ser estendido, uma vez que o crime somente é reconhecido quando praticado sobre a influência do estado puerperal, o terceiro que pratica o crime o faz de maneira consciente, e como tal deve responder.

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2 A PROBLEMÁTICA ENVOLTA DO CONCURSO DE PESSOAS NO CRIME DE INFANTICÍDIO

Inicialmente é importante adentrar ao estudo específico do concurso de pessoas, de modo a se compreender quais seus implicantes conforme a doutrina.

Para Masson (2010, p. 480) “É a colaboração empreendida por duas ou mais pessoas para a realização de um crime ou uma contravenção penal”.

Explica de Jesus (2004, p. 136) que:

A infração penal nem sempre é obra de um só homem. Com alguma frequência, é produto da concorrência das várias condutas referentes a distintos sujeitos. Por vários motivos, quer para garantir a sua execução ou impunidade, quer para assegurar o interesse de várias pessoas em seu consentimento, reúnem-se repartindo tarefas, as quais, realizadas, integram a figura delitiva. Neste caso, quando várias pessoas concorrem para a realização da infração penal, fala-se em co-delinquência ou concurso de delinquências (concursus delinquentium). O Código Penal emprega a expressão “concurso de pessoas”.

Capez (2009b, p. 338) ao lecionar sobre o concurso de pessoas explica que este “é também conhecido por co-delinqüência, concurso de agentes ou concurso de delinquentes. Com a reforma penal de 1984, passou-se a adotar, no Título IV, a denominação “concurso de pessoas” no lugar de “coautoria””, denominação esta, de maior abrangência.

Por sua vez, Greco (2009, p. 427) explica que ocorre co-delinquência “quando duas ou mais pessoas concorrem para a prática de uma mesma infração penal. Essa colaboração recíproca pode ocorrer tanto nos casos em que são vários os autores, bem como naqueles onde existam autores e partícipes”.

Mirabete (2004, p. 225) define concurso de pessoas “como a ciente e voluntária participação de duas ou mais pessoas na mesma infração penal”.

O concurso de pessoas é a colaboração de duas ou mais pessoa, prévia ou concomitantemente acordadas, com a finalidade de praticarem condutas criminosas ou contravenções penais.

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Para a configuração do concurso de pessoas é necessário o atendimento de alguns requisitos.

Greco (2009, p. 428) relaciona os requisitos que são necessários ao concurso de agentes, que compreende: “pluralidade de agentes e de condutas; relevância causal de cada conduta; liame subjetivo entre os agentes, e; identidade de infração penal”. Masson, de forma mais completa, esquematizou os requisitos da seguinte forma: “pluralidade de agentes culpáveis; relevância causal das condutas para a produção do resultado; vínculo subjetivo; unidade de infração penal para todos os agentes e existência de fato punível”. (MASSON, 2010, p. 480).

Quando se fala em pluralidade de agentes culpáveis, significa que necessariamente no concurso de pessoas conte com a colaboração de no mínimo dois agentes e também exista no mínimo, duas condutas. “Essas condutas podem ser principais, no caso da coautoria, ou então uma principal e outra acessória, praticadas pelo autor e pelo partícipe, respectivamente”. (MASSON, 2010, p. 480)

Greco (2009, p. 428) enfatiza que:

A pluralidade de agentes (e de condutas) é requisito indispensável a caracterização do concurso de pessoas. O próprio nome induz sobre a necessidade de, no mínimo, duas ou mais pessoas que, envidando esforços conjuntos, almejam praticar determinada infração penal.

Da redação do artigo 123 do Código Penal não resta dúvida que o sujeito passivo tem que ser sempre o próprio filho nascente ou neonato, mas é em torno do sujeito ativo que surge a discussão doutrinária a respeito da possibilidade ou não do concurso de pessoas neste crime, ou seja, se o terceiro pode ser coautor ou participe no infanticídio ou se responderia por homicídio doloso.

Tal discussão faz sentido do ponto de vista secundário, ou seja, da pena a ser fixada. Sendo que pelo infanticídio este terceiro teria uma pena base entre o mínimo de 2 (dois) anos podendo chegar até o máximo de 6 (seis) anos e no caso de responder por homicídio doloso a pena cominada estaria entre o mínimo da forma simples 6 (seis) anos até o máximo da forma qualificada de 30 (trinta) anos.

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Estes posicionamentos divergentes na doutrina se dão pela leitura do artigo 29 e 30 do Código Penal:

Artigo 29: Quem de qualquer modo, concorre para o crime incide nas penas a este cominadas, na medida de sua culpabilidade.

Artigo 30: Não se comunicam as circunstâncias e as condições de caráter pessoal, salvo quando elementares do crime.

O motivador de grandes discrepâncias doutrinárias encontra-se nos artigos 29 e 30 do Código Penal Brasileiro. O artigo 29, embasado na teoria unitária, prevê que todos, de qualquer modo, que concorreram para o crime, incidirão nas penas a este cominadas, no limite de sua culpabilidade, ou seja, todos respondem pelo mesmo crime ao qual concorreram. Pela teoria monista só existe um tipo de crime para todos os executores e participantes e não um tipo penal para o autor, outro específico para o coautor e para o partícipe como sustenta a teoria pluralista. (GRECO, 2009, p. 430).

O artigo 30 do mesmo Ordenamento Jurídico, por sua vez, fala sobre a incomunicabilidade das circunstâncias e das condições de caráter pessoal. Estas só irão se comunicar aos coautores e partícipes, se elementares do crime.

Através de todo desenvolvimento textual acima, nota-se que o crime de infanticídio é munido de elementares que o transforma em um tipo penal específico. Veja-se que por ser um crime de mão própria, somente a mãe, sob a influência do estado puerperal, pode cometer a conduta de matar o filho, nascente ou recém-nascido, no parto ou logo após.

2.1 Corrente defensora da comunicabilidade

Uma corrente doutrinária defende a comunicabilidade, ou seja, o coautor ou partícipe que junto com a mãe, de alguma forma, participa da execução do crime deve responder por infanticídio, assim como a mãe. Hoje este é o posicionamento da maioria dos doutrinadores, os quais se apoiam no argumento que se a lei não faz distinção entre condição pessoal e personalíssima, não cabe a ninguém fazê-la. Logo, fosse o delito de infanticídio previsto simplesmente como um parágrafo do art.121 do Código Penal, deveria ser reconhecido como modalidade de homicídio

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privilegiado e, consequentemente, seus dados deixariam de ser elementos do crime e passariam a ser circunstâncias, deixando, a partir de então, de acordo com a regra já apontada no art. 30 do mesmo diploma legal, de se comunicar aos co-participantes.

Não obstante, a corrente doutrinária que propaga a comunicabilidade das elementares do infanticídio, informa que o terceiro responde por infanticídio e não por homicídio, pelo simples fato da influência o estado puerperal ser uma elementar do tipo penal em estudo e este estende-se aos coautores e partícipes por força do artigo 29 e 30 do Código Penal Brasileiro, “salvo quando estes desconhecer a sua existência, a fim de evitar a responsabilidade objetiva”. (CAPEZ, 2009a, p. 121).

A tese desta corrente doutrinária funda-se na defesa de que a influência do estado puerperal é circunstância de caráter pessoal, “mas também é particularidade de caráter elementar do infanticídio, sem a qual a morte do infante caracterizaria homicídio, deixando o delito de ser crime próprio e excepcional”. (DEITOS, 1999, p. 23).

Em defesa da tese da comunicabilidade, Magalhães Noronha (1996, p 52) assegura que:

Não há dúvida alguma de que o estado puerperal é circunstância (isto é, estado, condição, particularidade, etc.) pessoal e que, sendo elementar do delito, comunica-se, ex vi do artigo 30, aos co-partícipes. Só mediante texto expresso tal regra poderia ser derrogada. (...) A não comunicação ao co-réu só seria compreensível se o infanticídio fosse mero caso de atenuação do homicídio e não um tipo inteiramente à parte, completamente autônomo em nossa lei.

Bittencourt (2003, p.148) acrescenta que:

Ninguém discute o fato de que a “influência do estado puerperal” constitui uma elementar típica do infanticídio. Pois é exatamente essa unanimidade sobre a natureza dessa circunstância pessoal que torna estéril e sem sentido a discussão sobre sua comunicabilidade. Como elementar do tipo, ela se comunica, e o terceiro que contribuir com a parturiente na morte de seu filho, nas condições descritas no art. 123, concorrerá para a prática do crime de infanticídio e não de homicídio, como sugeria Hungria.

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Não tendo sido essa a opção do legislador, ainda que por erro, não há o que se discutir, todos aqueles que juntamente com a parturiente praticarem os atos de execução tendentes a produção do resultado, se conhecerem o fato de que aquela atua influenciada pelo estado puerperal, deverão ser beneficiados com o reconhecimento do infanticídio.

2.2 Corrente defensora da incomunicabilidade

Outros doutrinadores entendem que o infanticídio é um crime próprio, onde somente a mãe pode ser sujeito ativo, isto porque estar influenciada pelo estado puerperal constitui condição personalíssima, tendo em vista que o crime só é reconhecível quando a mãe estiver sob influencia do estado puerperal durante a prática do crime, caso contrário nem mesmo ela responderia por infanticídio.

A corrente doutrinária que defende a incomunicabilidade das elementares do infanticídio, entende que o terceiro será julgado pelo crime de homicídio e não pelo do crime de infanticídio. A influência do estado puerperal é circunstância de caráter “personalíssima” da mãe que executou o crime, sendo esta intransferível a terceiro.

Dessa forma “cuidando de estudar o crime de infanticídio, asseverava Hungria que se trata de um delito personalíssimo em que a condição ‘sob a influência do estado puerperal’ é incomunicável”. (JESUS, 2009b, p 442).

Conclui-se que “a ‘influência do estado puerperal’ no ‘infanticídio’, embora elementar, não se comunica aos cooperadores, que responderão pelo tipo comum do crime”. (JESUS, 2009b, p 442).

Jurista também adepto da incomunicabilidade aos terceiros que colaboram no crime de infanticídio, Heleno Fragroso (1981, apud, RIBEIRO, 2004, p. 122-123) opina que:

O infanticídio constitui homicídio privilegiado porque a ação de matar o próprio filho é praticada pela mãe sob a influência do estado puerperal. Surgem, em consequência de tal elemento, problemas difíceis relativamente à participação e a coautoria. Trata-se de saber se os que eventualmente participam da ação praticam o crime de infanticídio ou o de homicídio. [...]

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Entendemos que deve ser adotada a lição de Hungria, fundada no direito suíço, segundo a qual o concurso de agentes é inadmissível. O privilégio se funda numa diminuição da imputabilidade que não é possível estender aos partícipes. Na hipótese de coautoria [...] parece-nos evidente que o crime deste será o de homicídio.

Importantes palavras trazem Aníbal Bruno (1979, apud, RIBEIRO, 2004, p. 123) seguidor também do pensamento da não comunicação, explica que:

Só se pode participar do crime de infanticídio a mãe que mata o filho nas condições particulares fixadas na lei. O privilégio que se concede à mulher sob a condição personalística do estado puerperal não pode estender-se a ninguém mais. Qualquer outro que participe do fato age em crime de homicídio. A condição do estado puerperal, em que se fundamente o privilégio é que só se realiza na pessoa da mulher que tem o filho impede que se mantenha sob o mesmo título a unidade do crime para o qual concorrem os vários partícipes. Em todos os atos praticados trata-se, direta ou indiretamente de matar, mas só em relação à mulher, pela condição particular em que atua, esse matar toma a configuração do infanticídio. Para outros mantém o sentido comum da ação de destruir uma vida humana, que é o homicídio.

Nesta linha de reflexão, Álvaro Mayrink da Costa (1990, p. 152) sustenta:

Entendemos que o grupo de autores que se filiam à hipótese (a) estão com a melhor doutrina, sendo incontestável que um tipo privilegiado não pode ser adequado por sujeito que não apresenta requisito normativo personalíssimo. O extraneus que participa de infanticídio comete crime de homicídio.

Igualmente, na defesa da incomunicabilidade Marcelo Fortes Barbosa (1973, p. 315) afirma: “Na verdade, o terceiro que colabora na destruição da vida do neonato pela mãe, é antes um homicida que um infanticida, nada justificando que se beneficie do privilégio legal.”

Por esta tese, entende-se que aquele que concorre para o crime de infanticídio, seja na figura do coautor ou partícipe, juntamente com a mãe puérpera, deve responder por homicídio, haja vista não possuir a condição ‘personalíssima’ compreendida pela ‘influência do estado puerperal’.

Para o doutrinador Masson, (2010, p. 61) “cuida-se de crime próprio, pois somente pode ser praticado pela mãe. Admite, todavia, coautoria e participação”.

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Com mesmo entendimento leciona Capez (2009a, p. 115) que:

Trata-se de crime próprio. Somente a mãe puérpera, ou seja, a genitora que se encontra sob influência do estado puerperal, pode praticar o crime em tela. Nada impede, contudo, que terceiro responda por esse delito na modalidade de concurso de pessoas.

É importante salientar que a perturbação gerada por este estado puerperal é tão importante para a figura típica que este tem de ser provado mediante perícia, visto que toda elementar do tipo deve ser provada. E que este tal estado mesmo que a medicina legal diga que vai de seis a oito semanas, varia de organismo para organismo e isto nos remete novamente à figura da mãe que sofre tal perturbação.

De modo que esta corrente doutrinária entende que é inadmissível o concurso de pessoas no crime de infanticídio, argumentando que o privilégio se funda numa diminuição de imputabilidade, que não é possível estender aos participes. Na hipótese de coautoria, parece-nos evidente que o crime deste será o de homicídio.

2.3 Posicionamentos doutrinários e jurisprudenciais acerca do concurso de agentes no crime de infanticídio

Além dessas duas principais correntes acerca do concurso de pessoas existe uma terceira também chamada mista, que observa a conduta principal. Esta preconiza a punição por homicídio se o agente pratica ato executório consumativo, e por infanticídio se apenas é partícipe.

Entende-se que o partícipe e o coautor deveriam responder pelo crime de homicídio, segundo o disposto pela segunda corrente doutrinária, antes apoiada por Nélson Hungria, por se tratar da maneira mais justa, tendo em vista que o estado puerperal é uma condição personalíssima da parturiente, sendo impossível que tal condição se comunique com outra pessoa que não a própria mãe.

Porém, infelizmente, por força do artigo 30 do Código Penal brasileiro, legalmente o estado puerperal de fato se comunica com o partícipe e o coautor, por ser uma elementar do crime, ou seja, trata-se de uma das condições para que se caracterize o crime, uma espécie de requisito essencial daquele tipo penal, que

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somente mediante texto expresso pode ser derrogado. O mesmo acontece no tipo penal do peculato (art. 312, Código Penal), onde o terceiro que sabia da condição de funcionário público do outro, junto com este pratica o crime de peculato incorre na pena a este cominada mesmo não sendo este terceiro funcionário público.

Dentre os juristas adotantes da teoria da comunicabilidade, entretanto com a ressalva de que o colaborador no crime tenha participação meramente acessória na efetivação da conduta criminosa, como assim leciona José Frederico Marques (1961, apud DEITOS, 1999, p. 23):

O infanticídio é crime próprio, pois somente o pode cometer a mãe em relação ao filho recém-nascido (...). Outras pessoas, no entanto, podem figurar como coautores; e como se trata de delito privilegiado, mas autônomo, comunicam-se as circunstâncias subjetivas que integram o tipo, aos coautores (...), muito embora pense de modo contrário o insigne Nelson Hungria. Mas é preciso que o coautor tenha, como é óbvio, participação exclusivamente acessória. Se for ele o autor da morte, isto é, a pessoa que executa a ação contida e definida no núcleo do tipo, então a sua conduta, matando ao nascente ou ao recém-nascido, será enquadrada no artigo 121.

Damásio de Jesus (2009a, p 112) contradizendo os defensores desta teoria, expõe que não compactua “da opinião dos que afirma que o terceiro só responde por infanticídio se participar de maneira meramente acessória,” e instrui que “diante da lei, tanto faz que pratique o núcleo do tipo ou participe do fato induzindo ou instigando a autora principal. De outra forma, haveria soluções díspares”. (JESUS, 2009a, p. 112).

O crime de infanticídio é tipo penal autônomo e depende de elementares específicas para sua configuração. Se ausente qualquer dos elementos, ocorre a desclassificação do crime para outra figura penal.

Assim, entende por esta linha doutrinária, por ser o crime de infanticídio um tipo penal autônomo, se a autora do delito está revestida das elementares previstas no tipo, o terceiro colaborador, sabendo da existência destas elementares, responde também por infanticídio e não por homicídio. A ‘influência do estado puerperal é elementar do tipo e por isto categoricamente comunica-se ao coautor.

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A corrente defensora da comunicação aponta a fragilidade do argumento da tese dos que defendem a não comunicação ao colaborador do crime de infanticídio. Para essa corrente um dos fatos mais estridentes é a falta de previsão legal que dê sustentação às ideias defendidas por estes doutrinadores. As chamadas circunstâncias ‘personalíssimas, resguardada pelos defensores da não comunicação simplesmente não são amparadas normativamente. (JESUS, 2009a).

Ao falar da falta específica de previsão legal para o tratamento do terceiro participante nos crimes próprios, destaca Damásio de Jesus (2009a, p. 443) crer não ser correto “o raciocínio dos que dizem que o terceiro só responderia por infanticídio se a lei de maneira expressa, como fazem alguns códigos, a ele fizesse referência”. Ressalta ainda que se assim fosse, o coautor do peculato responderia por furto, por não ter a qualidade de funcionário público, haja vista que neste tipo penal não tem a previsão expressa admitindo a codelinquência. (JESUS, 2009a, p. 443).

Tratou-se desta divergência o IV Congresso Nacional de Direito Penal e Ciências Afins, que foi realizado na cidade de Recife, dos dias 02 a 08 de agosto de 1970. De acordo com o entendimento unânime dos presentes, disse entender que “o coautor ou partícipe do fato responde por infanticídio. Sugerimos a conversão do infanticídio em causa de diminuição de pena do homicídio (homicídio privilegiado), inovação que recebeu aplauso geral”. (JESUS, 2009a, p 443).

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3 O INFANTICÍDIO E A TEORIA DO CRIME

3.1 Conduta típica, antijurídica e culpável

Para que seja considerado crime, faz-se necessário que a conduta seja típica, antijurídica e culpável.

A fragmentariedade do Direito Penal tem como consequência uma construção tipológica individualizadora de condutas que considera gravemente lesivas de determinados bens jurídicos que devem ser tutelados. A lei, ao definir crimes, limita-se, frequentemente, a dar uma descrição objetiva do comportamento proibido, cujo exemplo mais característico é o homicídio, “matar alguém”. No entanto o legislador utiliza-se de outros recursos, doutrinariamente denominados elementos “normativos ou subjetivos” do tipo, que levam implícito um juízo de valor. (BITTENCOURT, 2013, p. 344).

Como se observa o que determina a decisão e o juízo sobre uma determinada é variável, sendo norteado por elementos que podem ser normativos ou subjetivos. Assim, verifica-se que tipo é o conjunto dos elementos do fato punível descrito na lei penal. O tipo exerce uma função limitadora e individualizadora das condutas humanas penalmente relevantes. É uma construção que surge da imaginação do legislador, que descreve legalmente as ações que considera, em tese, delitivas. Tipo é um modelo abstrato que escreve um comportamento proibido. Cada tipo possui características e elementos próprios que os distinguem uns dos outros, “tornando-os todos especiais, no sentido de serem inconfundíveis, inadmitindo-se a adequação de uma conduta que não lhes corresponda perfeitamente.” (BITTENCOURT, 2013, p. 344).

Há uma operação intelectual de conexão entre a infinita variedade de fatos possíveis da vida real e o modelo típico descrito na lei. Essa operação, que consiste em analisar se determinada conduta se adapta aos requisitos descritos na lei, para qualificá-la como infração penal, chama-se “juízo de tipicidade”, que, na afirmação de Zaffaroni, ”cumpre uma função fundamental na sistemática penal. Sem ele a teoria ficaria sem base, porque a antijuricidade deambularia sem estabilidade e a

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culpabilidade perderia sustentação pelo desmoronamento do seu objeto”. (ZAFFARONI apud BITTENCOURT, 2013, p. 345).

Quando o resultado desse juízo for positivo significa que a conduta analisada reveste-se de tipicidade. No entanto, a contrário sensu, quando o juízo de tipicidade for negativo estaremos diante da atipicidade da conduta, o que significa que a conduta não é relevante para o Direito Penal, “mesmo que ilícita perante outros ramos jurídicos (v. G., civil, administrativo, tributário etc.).” (BITTENCOURT, 2013, p. 345).

Quando se fala em conduta típica significa dizer que a mesma deve estar enquadrada no tipo penal incriminador, devendo haver os elementos conduta, resultado jurídico, nexo de causalidade e tipicidade. Ausente algum dos elementos, fica descaracterizado o fato como criminoso.

A tipicidade é uma decorrência natural do princípio da reserva legal: nullum crimem nulla poena signe praevia lege. Tipicidade é a conformidade do fato praticado pelo agente com a moldura abstratamente descrita na lei penal. “Tipicidade é a correspondência entre o fato praticado pelo agente e a descrição de cada espécie de infração contida na lei incriminadora” (BITTENCOURT, 2013, p. 346).

A adequação típica pode operar-se de forma imediata ou de forma mediata. A adequação típica imediata ocorre quando o fato se subsume imediatamente no modelo legal, sem a necessidade da concorrência de qualquer outra norma, como, por exemplo, matar alguém: essa conduta praticada por alguém amolda-se imediatamente ao tipo descrito no art. 121 do CP, sem precisar do auxílio de nenhuma outra norma jurídica. No entanto, “a adequação típica mediata, que constitui exceção, necessita da concorrência de outra norma, de caráter extensivo, normalmente presente na Parte Geral do Código Penal, que amplie a abrangência da figura típica” (BITTENCOURT, 2013, p. 346).

O Código Penal pátrio prevê a tipicidade por extensão, que é a aplicação conjunta do tipo penal incriminador, previsto na Parte Especial com uma norma de

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extensão, prevista na Parte Geral, tendo por finalidade construir a tipicidade de determinado delito. É o que se dá com a tentativa.

A doutrina moderna afirma que o tipo penal tem duas funções. Uma é a da garantia, oriunda do princípio da legalidade. A outra é a de indicar a antijuridicidade do fato, sendo a tipicidade o seu indício. Praticado o fato típico, presume-se que seja antijurídico, presunção que apenas cessará diante da existência de uma causa que a exclua. Se uma pessoa mata outra, é uma conduta típica (matar alguém) e a princípio antijurídica, porém se comete tal conduta em legítima defesa, não é antijurídico o fato.

A ausência de tipicidade é chamada de atipicidade, que

pode ser total, como, por exemplo, no exercer o meretrício, ou específica, quando inexistente um elemento objetivo que caracteriza determinado crime, como, por exemplo, não ser recém-nascida a vítima morta pela mãe (em se tratando de infanticídio). (MIRABETE, 2004, p. 116).

Muitas vezes, é possível aplicar diferentes normas a um mesmo fato natural, o que é chamado de conflito aparente de normas. São dois seus requisitos: unidade de fato e a pluralidade de normas que identificam o mesmo fato delituoso. Para resolver esse problema são aplicados os princípios da especialidade; o da subsidiariedade, da consunção e o da alternatividade.

No que tange à ilicitude, basta verificar se há a presença de alguma excludente, sendo elas o estado de necessidade, a legítima defesa, o estrito cumprimento do dever legal, o exercício regular do direito e o livre e eficaz consentimento do ofendido. Caso haja excludentes, o fato não será considerado ilícito ou antijurídico, e consequentemente não existirá crime.

Para determinar se o fato é culpável, indispensável a presença dos elementos: imputabilidade, potencial consciência sobre a ilicitude do fato e exigibilidade de conduta diversa.

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Ao se imputar um ato a alguém, está se atribuindo a ele a responsabilidade pela conduta praticada, devendo o indivíduo, à época dos fatos, ter consciência do caráter criminoso de sua prática e não estar sob coação moral irresistível ou obediência hierárquica (art. 22 do Código Penal Brasileiro). “Em suma, a capacidade de imputação jurídica depende da razão e do livre-arbítrio do agente do crime.” (PALOMA, 2003, p. 197).

Nos casos de doença mental (art. 26 do CP), menoridade penal (art. 27 do CP), embriaguez completa proveniente de caso fortuito ou força maior (art. 28, § 1º, do CP) ou condição de silvícola inadaptado, não há imputabilidade, já que existe a presença de excludente de culpabilidade.

3.2 A culpabilidade e o grau de influência do estado puerperal

A maior discussão entre os doutrinadores enfoca, como já foi citado, uma elementar do crime de infanticídio, ou seja, o estado puerperal.

A influência do estado puerperal na caracterização do crime de infanticídio é vital, pois a existência do delito de infanticídio depende da verificação da influência deste estado. É preciso existir um nexo de causalidade entre os dois, ou seja, é preciso que haja a presença do estado puerperal para que se caracterize o delito. Por possuir tanta influência no mundo jurídico e social, acaba por gerar repúdio de alguns doutrinadores, que não aceitam o critério fisiopsicológico adotado pelo Código.

O critério fisiopsicológico não se apoiava no motivo de honra, para a fundamentação do crime de infanticídio, passando a admitir para tal função, a influência do estado puerperal.

O estado puerperal refere-se ao conjunto das perturbações psicológicas e físicas sofridas pela mulher em face do fenômeno do parto. (JESUS, 2005). É válido lembrar que o estado puerperal ainda é um conceito muito abstrato, uma vez que não é possível afirmar ao certo quando se inicia, qual o período de seu término, o que o ocasiona, apesar a Medicina Legal ter fixado que esse estado provém do

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puerpério. Acima de tudo, o estado puerperal é um fenômeno de difícil comprovação científica.

O legislador, para resolver as injustiças que o critério psicológico trazia, abandonou a motivação de honra, optando por utilizar como motivação a influência do estado puerperal. No caso do critério psicológico, a motivação de honra, em que a mãe, preocupada em ocultar sua própria desonra perante a sociedade, matava o filho, não estava a altura do valor que a vida humana possui, ainda que considerando os costumes da época.

Com a reformulação do Código Penal e a utilização do critério fisiopsicológico, o legislador deixa de privilegiar uma situação de injustiça, procurando entender, o que leva a mãe a matar o próprio filho.

Assim, ele leva em consideração as alterações físicas do parto, que em alguns casos provocam dores alucinantes, em comunhão com as alterações psíquicas sofridas pela parturiente em decorrência justamente daquele, do parto.

Ante a brutalidade do crime, o critério fisiopisicológico é mais humanitário, pois visa proteger a vida do recém-nascido, que não possui condições de defesa; visa proteger a vida em primeiro lugar, e não mais um status social.

O estado puerperal é um fenômeno de difícil especificação, muitas vezes sendo confundido com problemas de saúde mental, o que leva os doutrinadores anegar sua existência, justificando não passar de um transtorno psíquico já existente na mãe. Sobre esse estado psicológico, Júlio Fabrini Mirabete (2000) cita Almeida Jr. e Costa Jr., referindo que neste caso se incluem os casos em que a mulher, mentalmente sã, mas abalada pela dor física do fenômeno obstétrico, fatigada, enervada, sacudida pela emoção, vem a sofrer um colapso do senso moral, uma liberação de impulsos maldosos, chegando por isso a matar o próprio filho. De um lado, nem alienação mental, nem semialienação (casos estes já regulados pelo Código). De outro, tampouco frieza de cálculo, a ausência de emoção, a pura crueldade (que caracterizariam, então, o homicídio). Mas a situação intermédia, podemos dizer até ‘normal’, da mulher que, sob o trauma da parturição e dominada

Referências

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