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Alvaro de Campos* Poema em Linha Reta

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Academic year: 2021

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CONFLUÊNCIAS - REVISTA INTERDISCIPLINAR DE SOCIOLOGIA E DIREITO - PPGSD-UFF - página 65

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Alvaro de Campos*

Poema em Linha Reta

Nunca conheci quem tivesse levado porrada.

Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo. E eu, tantas vezes reles, tantas vezes porco, tantas vezes vil, Eu tantas vezes irrespondivelmente parasita,

I n descu I p a velm en te s u j o.

Eu, que tantas vezes não tenho tido paciência para tomar banho, Eu, que tantas vezes tenho sido ridículo, absurdo,

Que tenlio enrolado os pés publicamente nos tapetes das etiquetas, Que tenliosido grotesco, mesquinho, subm isso earrogante, Que tenlio sofrido enxovalhos c calado,

Que quando não tenho calado, tenho sido mais ridículo ainda; Eu, que tenho sido cômico às criadas de hotel,

Eu, que tenho sentido o piscar de olhos dos moços de fretes,

Eu, que tenlio feito vergonhas financeiras, pedido emprestado sem pagar, En, que, quando a hora do soco surgiu, me tenho agachado

Para fora da possibilidade do soco;

Eu, que tenho sofrido a angústia das pequenas coisas ridículas, Eu verifico que não tenlio par nisto tudo neste mundo.

Toda a gente que eu conheço e que fala comigo Nunca teve um ato ridículo, nunca sofreu enxovalho, Nunca foi senão príncipe - todos eles príncipes - na vida... Quem me dera ouvir de alguém a voz humana

Que confessasse não um pecado, mas uma infâmia; Que contasse, não uma violência, mas uma cobardia! Não, são todos o Ideal, se os oiço e me falam.

Quem há neste largo mundo que me confesse que uma vez foi vil? O principes, meus irmãos,

Arre, estou farto de semideuses! Onde é que há gente no mundo?

Então sou só eu que é vil c errôneo nesta terra? Poderão as mulheres não os terem amado, Podem ter sido traídos - mas ridículos nunca! E eu, que tenho sido ridículo sem ter sido traído,

Como posso en falar com os meus superiores sem titubear? Eu, que venho sido vil, literalmente vil,

Vil no sentido mesquinho e infame da vileza.

* Alváro de Campos é um doslieterônim os do poeta português Femado Pessoa (1 888-1935) que, todavia, em carta a Adolfo Casais Monteiro esclarece: “Álvaro dc Campos nasceu em Tavira, no dia 15 de Outubro de 1890 (...), é engenheiro naval (porGlasgow), mas agora está aqui em Lisboa em inactividade (...), tipo vagamente judeu português (...) Ensinou-lhc latim um tio beirão que era padre”.

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C O N FLU EN C ES - REVISTA INTERDISCIPLINAR DE SOCIOLOGIA E DIREITO - PPGSD-UFF - página 66

AUGUSTO DOS ANJOS*

VERSOS ÍNTIMOS

Vês?! Ninguém assistiu ao form idável

Enterro de tua última quim era.

Som ente a Ingratidão — esta pantera —

Foi tua com panheira inseparável!

A costum a-te à iama que te espera!

O Hom em , que, nesta terra m iserável,

Mora, entre feras, sente inevitável

Necessidade de tam bém ser fera.

Toma um fósforo. Acende teu cigarro!

O beijo, am igo, é a véspera do escarro,

A mão que afaga é a mesma que apedreja.

Se a alguém causa inda pena a tua chaga,

Apedreja essa mão vil que te afaga,

Escarra nessa boca que te beija!

* Augusto de Carvalho Rodrigues dos Anjos ((1884-1914), capixaba, foi professor de geografia do Colégio Pedro fl no Rio de Janeiro. Seu único livro de poemas, Eh, se caracteriza pela temática da morbidez e do pessimismo, em metrificação disciplinada repleta de extravagâncias vocabulares até então inusitadas.

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JOÃO DA CRUZ E SOUZA*

CONFLUÊNCIAS - REVISTA INTERDISCIPLINAR DE SOCIOLOGIA E DIREITO - PPGSD-UFF - página 67

Acrobata da dor

Gargalha, ri, num riso de tormenta,

como um palhaço, que desengonçado,

nervoso, ri, num riso absurdo, inflado

de uma ironia e de uma dor violenta.

Da gargalhada atroz, sanguinolenta,

agita os guizos, e convulsionado

Salta, gavroche, salta clown, varado

pelo estertor dessa agonia lenta...

Pedem-te bis e um bis não se despreza!

Vamos! retesa os músculos, retesa

nessas macabras piruetas d’aço...

E embora caias sobre o chão, fremente,

afogado em teu sangue estuoso e quente,

Ri! Coração, tristíssimo palhaço.

* João da Cruze Souza(1861-1898), catarinense, inaugurador do simbolismo no Brasil. Filho de escravos africanos alforriados, sofreu impiedosa campanha nos meios literários da época. Entre suas obras destacam-se Broqueis (1893) e Faróis (1900. publicada após sua morte).

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CONFLUÊNCIAS - REVISTA INTERDISCIPLINAR DE SOCIOLOGIA E DIREITO - PPGSD-UFF - página 68

ToRQuATo nEtO*

Let’s play that

quando eu nasci

um anjo louco muito louco

veio 1er a minha mão

não era um anjo barroco

era um anjo muito louco, torto

com asas de avião

eis que esse anjo me disse

apertando minha mão

com um sorriso entre dentes

vai bicho desafinar

o coro dos contentes

vai bicho desafinar

o coro dos contentes

let’s play that

* Torquato Pereira de Araújo Neto (1944-1972), nascido eniTeresina, no Piauí, 1'oi um dos menlores intelectuais do movimento tropicalista.Um dia após completar 28 anos de idade, ligou o gás do banheiro e suicidou-se. Deixou um bilhete: “Tenho saudade, como os cariocas, do dia em que sentia e achava que era dia de cego. De modo que fico sossegado por aqui mesmo, enquanto durar. Pra mim, chega! Não sacudam demais o Thiago, que ele pode acordar” . O poema acima foi musicado por Jards Macalé

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Fórum Social Mundial 2005: ensaio fotográfico

Wilson M adeira Filho

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