Abordagens antropológica, linguística e sociológica curso de
análise
dasinterações
verbais
sessão 1 | 09 Outubro 2015Etnometodologia e Análise das
interações verbais
Michel G. J. Binet
Licenciado em Sociologia – Mestre em Ciências Sociais – Doutor em Antropologia Professor Auxiliar na Universidade Lusíada de Lisboa
Etnometodologia: Heranças e filiações
Etnociências Erving Goffman (1922-1982) Alfred Schütz (1899-1959) Harold Garfinkel (1917-2011) Harvey Sacks (1935-1975) ACBibliografia
• Garfinkel, H., 1984 [1967]. Studies in
Ethnomethodology, Cambridge: Polity Press.
• Garfinkel, H., 2007. Recherches en
ethnométhodologie, Paris: PUF.
• Garfinkel, H. & Sacks, H., 2007. Les structures
formelles des actions pratiques (1967). In
Recherches en ethnométhodologie. Paris: PUF,
Bibliografia
Alfred Schütz: o antecessor
• Schütz, A., 1962. Collected Papers (Vol. 1), The
Hague: Martinus Nijhoff.
• Schütz, A., 1964. Collected Papers (Vol. 2), The
Hague: Martinus Nijhoff.
• Schütz, A., 1998. Éléments de sociologie
phénoménologique, Paris: L’Harmattan.
• Schütz, A. & Luckmann, T., 1974. The
Structures of the Life-World, London:
Bibliografia
Erving Goffman: co-autoria / intertextualidade / Polifonia
• Goffman, E., 1953. Communication Conduct in an Island
Community. PhD dissertation. Chicago: University of
Chicago.
• Goffman, E., 1972 [1961]. Encounters: Two Studies in the
Sociology of Interaction 2nd ed., Harmondsworth: Penguin
Books.
• Goffman, E., 1999a. A situação negligenciada (1964). In Y.
Winkin, ed. Os momentos e os seus homens. Lisboa: Relógio
d’Água, pp. 148-153.
• Goffman, E., 1974. Frame Analysis - An Essay on the
Organization of Experience, Boston, Massachusetts:
Northeastern University Press.
• Goffman, E., 1999b. A ordem da interacção (1982). In Y.
Winkin, ed. Os momentos e os seus homens. Lisboa: Relógio
d’Água, pp. 191-235.
Bibliografia
Harvey Sacks: aluno e continuador
• Sacks, H., 1995. Lectures on conversation (Vol. 1 & Vol. 2), Oxford: Blackwell. [1964-72]
• Sacks, H., Schegloff, E. & Jefferson, G., 1974. A Simplest Sistematics for the Organization of Turn-Taking for Conversation. Language, 50(4), pp.696-735.
• Sacks, H., Schegloff, E. & Jefferson, G., 1977. The Preference for Self-Correction in the Organization of Repair in Conversation.
Language, 53(2), pp.361-382.
• Schegloff, E., 2006. Interaction: The infrastructure for social
institutions, the natural ecological niche for language, and the arena in which culture is enacted. In N. J. Enfield & S. C. Levinson,
eds. Roots of Human Sociality: Culture, cognition and interaction. London: Berg, pp. 70-96.
• Schegloff, E., 2007. Sequence Organization in Interaction - A Primer
Etnometodo
logia
• A Ordem social: Níveis de organização e escalas de análise (Macro
v/s Micro)
• Interaccionismo metodológico (Adriano Duarte Rodrigues) • A situação negligenciada
• A Ordem da interação: método “idiográfico” v/s método
nomotético ? Da dicotomia (opções mutuamente exclusivas) ao “trajeto investigativo plural” (Michel Binet & David Monteiro, 2012)
• Etnométodos: os interactantes como metodólogos práticos • Compreensão e Perspectiva émica: ciência objectiva da
subjectividade dos actores (Max Weber)
• Tipificações: sociólogos profissionais & sociólogos profanos
«Os analistas da conversação são os próprios falantes» (Adriano Duarte Rodrigues)
• Etnometodologia conversacional: ações concertadas e metodicamente organizadas
Etnometodo
logia
• Pano de fundo dos saberes partilhados
Estruturadas e estruturantes mediante a sua incorporação cognitiva e disposicional (Bourdieu, 2001a: 204), padronizadas e padronizantes («standardized and
standardizing»; Garfinkel, 1984: 36; 2007: 99), as estruturas objectivas são
estruturas objectivadas em contexto situacional no e pelo discurso e na e pela acção dos agentes.
Schütz: Atitude natural(izante)
Saberes partilhados de um modo tácito formam o pano de fundo das interacções quotidianas, partilha postulada como dada à partida, mas interactivamente revista sempre que necessário.
• Membership Categorization Analysis (Sacks, 1995)
A troca conversacional se efectua dentro de mundos cognitivos por ela convocados, partilhados em maior ou menor grau pelos falantes. Representações, categorizações e saberes configuram mundos ordenados mentalmente que funcionam na conversação como quadros ou contextos interpretativos.
Troca de SMS (08/10/2015):
– Onde estás? – Na ponte
Etnometodo
logia
• Harold Garfinkel « empiriciza » a fenomenologia,
retraduzindo-a em instruções de pesquisa permitindo a
localização de situações e de comportamentos que
possibilitam
a
observação
dos
processos
de
microconstrução da ordem social.
• A cunhagem de acções reconhecíveis é um processo activo
de produção endógena da ordem da interacção. Garfinkel
desloca o foco da análise, convertendo um problema de
método do observador (como reconhecer o valor accional
dos comportamentos observados ?) num problema de
método (ou etnométodo) de co-produção da interacção,
problema atendido pelos seus participantes (como tornar
reconhecível o valor accional do meu comportamento ?),
por meio de competências interaccionais e comunicativas
a investigar.
• John
Gumperz:
Pistas
de
contextualização
(contextualization cues)
Etnometodo
logia
• Esta deslocação do foco da análise operada por Garfinkel tem o mérito de converter uma abordagem inicialmente cognitivista numa
abordagem comportamentalista centrada na acção situada,
proporcionando um programa de investigação empírica que converte a fenomenologia numa ciência observacional do
comportamento humano em contexto situacional.
• Empenhado em estranhar frente a um «mundo teimosamente
familiar» (2007: 101) ao ponto de arriscar passar despercebido,
Garfinkel também explorou com a ajuda dos seus alunos técnicas de observação “reactiva” em contextos naturais, breaching
experiments (Garfinkel, 2007: 120–6) consistindo em violações
deliberadas de normas tácitas inferidas mais do que directamente
observadas, para quebrar as expectativas que formam o pano de fundo das interacções, gerando espanto, vergonha, desconforto, irritação, confusão, perturbando situações e desorganizando interacções, no intuito de provocar a explicitação endógena das
expectativas, normas e rotinas de fundo, pela via de protestos e de
pedidos de explicação que as tornam então visíveis, operando a sua transferência do campo inferencial para o campo observacional .
O saber de 1º grau não se articula em primeira
instância no discurso sobre a prática, mas, sim, dentro
da própria prática no curso da sua realização
A ação situada e a sua organização metódica são o nicho ecológico da fala
Etnometodo
logia
• Reflexividade: os membros ordenam a sua interacção se observando, descrevendo, interpretando e tipificando mutua e continuamente. Garfinkel escreve: «(…) os inquéritos dos membros são elementos
constitutivos das situações que analisam» (2007: 61).
Os etnométodos, objecto de estudo da etnometodologia, são práticas observacionais, descritivas e interpretativas «omnipresentes», realizadas de dentro de cada uma das situações de interacção que contribuem em constituir, pelos membros que nelas participam reflexivamente.
• Indexicalidade: a âncora situacional da ação concertada
Os valores referenciais dos pronomes e dos nomes bem como as
orientações no espaço e no tempo operadas na e pela linguagem usada in
situ, são fixados e organizados em redor de uma âncora situacional, axis mundi de toda a actividade enunciativa.
O comportamento se indexicaliza ancorando-se numa situação tornada « familiar » por um processo já mencionado de tipificação-padronização que remete para dimensões da organização social.
A analisabilidade da acção como acção ocorrendo num micro-contexto em construção que incorpora na sua definição interactiva uma representação estruturada e estruturante da ordem social.
Etnometodo
logia
Incompletude das regras sociais e práticas ad hoc : ceteris
paribus, factum valet e et cetera
Incompletas e genéricas, as regras introduzidas localmente
pelas
pré-definições
socio-institucionais
das
situações
precisam de serem completadas por um trabalho interactivo
de co-ordenamento da interacção, atento às contingências e
singularidades da mesma.
• Esta tese potencia o retorno do actor na agenda da
investigação sociológica. Um actor situado, a quem compete
agir em contextos inacabados, incompletamente definidos e
regulamentados.
«A ordem social (...) não é uma "ordem
encontrada", mas sim "realizada" [practical
Etnometodo
logia
Accountability
As acções são activamente cunhadas como observáveis, descritíveis, relatáveis, analisáveis, intencionais, consequentes, justificáveis, numa palavra: racionais.
Esta racionalidade, reivindicada de dentro (e não atribuída de fora por um observador exterior) e incorporada numa prática ciosa da sua descritibilidade e justificabilidade, projecta e performa uma ordem social ordenando a prática (Garfinkel, 2007:95).
Cada interactante, guardião zeloso da racionalidade das suas acções na interacção com os outros, antecipa qualquer eventual incompreensão fornecendo informações e justificações prévias à realização de um acto ou à produção de uma fala susceptível de não ser compreendido; ou, em caso de mal interpretação não antecipada, investe em dar conta e responder a posteriori pela sua conduta ou pelas suas palavras. A trama da interacção é composta
Etnometodo
logia
• a «temporalidade interna» (organização
sequencial) dos cursos de acção como
dimensão-chave da ordem interaccional:
decomposição analítica, sob a forma de
uma estrutura multi-operacional (Garfinkel,
2007: 91), caminho investigativo continuado e
aprofundado por Harvey Sacks, que, sob a
designação de Análise da Conversação (Sacks,
1995), se tornou uma corrente de investigação
de âmbito internacional.
Etnometodo
logia
• A etnometodologia, i.e. o estudo dos métodos práticos de
organização do curso temporal das acções concertadas à
escala
situacional,
encontra
nas
interacções
conversacionais um terreno privilegiado de observação e
análise da produção social e cultural de “eventos” e de
“identidades” reconhecidos porque tornados localmente
reconhecíveis. As identidades são «realizações práticas e
contingentes» (Garfinkel, 2007: 286), que, longe de operar
num vazio social, convocam, ratificam e incoproram
«expectativas socialemente padronizadas» (Garfinkel, Op.
Cit.: 289), no decurso de um «trabalho de organização
invisível [aos próprios membros da sociedade]» (Op. Cit.:
288), por uma parte importante de teor conversacional,
passível de descrição detalhada mediante o seu registo por
observação
directa
ou
gravação,
vasto
programa
investigativo que define a Análise da Conversação.
«Posso…..?»
• Os próprios interactantes subordinam a
realização de certos actos a um «pedido de
licença» prévio:
• Trecho 1 – 5.2.(02
)
469
Técnica1
posso pôr aqui dentro?
470
Utente
pode pode claro
• Trecho 2 – 5.2.(02)
1955 Técnica1
posso lhe fazer uma pergunta?
1956 Utente
pode
1957 Técnica1
quem é que faz a sua higiene
A prova administrada pelos próprios
falantes
• Trecho 3 – 5.2.(02)
249 Técnica1
não gosto nada de abrir as
Bibliografia
• Amiel, P., 2004. Ethnométhodologie appliquée. Éléments de
sociologie praxéologique, Paris: Presses du LEMA (Laboratoire
d’Ethnométhodologie Appliquée - Université Paris 8).
• Binet, M., 2013. Microanálise etnográfica de interacções
conversacionais: atendimentos em serviços de acção social. Tese de
Doutoramento em Antropologia (dir. Adriano Duarte Rodrigues ). Lisboa: FCSH-UNL.
• Coulon, A., 1987. L’ethnométhodologie, Paris: PUF.
• Fornel (de), M. & Léon, J., 2000. L’analyse de conversation: de l’ethnométhodologie à la linguistique interactionnelle. Histoire
Épistémologie Langage, 22(I), pp.131-155.
• Heritage, J., 1987. Ethnomethodology. In A. Giddens & J. Turner, eds. Social Theory Today. Cambridge: Polity Press, pp. 224-272.
• Heritage, J., 1998. Harold Garfinkel. In R. Stones, ed. Key
Sociological Thinkers. Basingstoke: Palgrave Macmillan, pp. 175-188.
• Wolf, M., 1979. Sociologias de la vida cotidiana 2nd ed., Madrid: Cátedra.
Abordagens antropológica, linguística e sociológica curso de