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Arte e formação a distância: gestão colaborativa e perspectiva pedagógica criadora

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Academic year: 2021

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Arte e formação a distância: gestão colaborativa e perspectiva pedagógica

criadora

Clarissa L. Suzuki1

clarissa@artenaescola.org.br Instituto Arte na Escola / IAE

Julia M. Kenski2

jkenski@siteeducacional.com.br Instituto Arte na Escola / IAE

Sirlene M. Gianotti3

tapiroicos@gmail.com Instituto Arte na Escola / IAE

Resumo: Este artigo relata a experiência de um curso livre de formação continuada em arte para professores da

Educação Básica em duas modalidades, semipresencial e totalmente a distância, cujo objetivo é refletir sobre a forma de gestão e a perspectiva pedagógica. Estruturado por uma proposta de gestão colaborativa de equipe, que se orienta por princípios educativos como autonomia e diálogo em sintonia com uma perspectiva pedagógica criadora e afetiva que faz jus às especificidades formativas da área das Artes, o curso Aprendendo com Arte atende durante o ano de 2016 um total de 640 professores de todos os estados brasileiros e busca trazer para o ambiente virtual o propósito que tantos educadores almejam em suas salas de aula: conquistar uma atmosfera de aprendizagem significativa alinhada às tendências contemporâneas de ensino das artes em sintonia com as ferramentas tecnológicas.

Palavras-chave: EaD. Arte. Formação de Professores. Gestão Colaborativa.

Abstract: This article presents one experience of a free arts course on continuing education for primary

education teachers that is offered in two configurations: completely online and blended learning. The main goal is to discuss about the way it’s managed and its pedagogic perspective. The project is structured on the basis of a collaborative team managerial proposal that is settled on educational principles like autonomy and dialogic perspective, synchronized with a creative and affective pedagogic perspective. Aprendendo com Arte (Learning with Arts) 2016 attends 640 teachers from every part of Brazilian country and aims to bring to the virtual environment the same purposes that many educators had seek for their classrooms: conquer an environment of meaningful learning aligned to contemporary tendencies in arts teaching, synchronized with technologic tools.

Keywords: Distance Learning. Arts. Teacher Training. Colaborative Management.

1 Mestre em Artes Visuais pela USP. Licenciada em Educação Artística pela UNESP. É Coordenadora de Projetos do Instituto Arte na

Escola e do Prêmio Arte na Escola Cidadã. Coordenadora Geral do curso Aprendendo com Arte. Pesquisadora do Grupo Multidisciplinar de Estudo e Pesquisa em Arte e Educação da ECA-USP.

2 Doutora em Administração de Empresas pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Professora do UNIFIEO e Supervisora de EAD

no curso Aprendendo com Arte do Instituto Arte na Escola. Desde 2013 atua em Educação a Distância, sendo Especialista em Design Instrucional pela UFJF. Pesquisa a influência das tecnologias na cultura organizacional e nas formas de gestão. Sócia da SITE Educacional.

3 Antropóloga pela PUC/SP; Mestre em Educação pela USP em Linguagens. É Coordenadora Pedagógica do curso Aprendendo com

Arte do Instituto Arte na Escola; Pesquisadora do Grupo Multidisciplinar de Estudo e Pesquisa em Arte e Educação da ECA-USP. Compõe a equipe da Pós-Graduação em Educação Lúdica no Instituto Superior de Ensino Vera Cruz; Arte-educadora atuante na formação de educadores pelo CENPEC, IAE, MAC-USP; Alana, Ashoka, SESC-SP e em seu próprio estúdio Tapir Ateliê.

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1. A estrutura de um curso a distância: projeto Aprendendo com Arte

O projeto Aprendendo com Arte é um curso gratuito de formação continuada em Arte e Educação, apresentado em duas modalidades: semipresencial e totalmente a distância. Resultado da parceria entre a Fundação Volkswagen e o Instituto Arte na Escola, ele se destina a professores de Artes do Ensino Fundamental e da Educação Infantil, gestores de escolas e coordenadores pedagógicos. Em seu segundo ano de realização, o Aprendendo com Arte tem como objetivo envolver e auxiliar o educador na compreensão aprofundada do papel da arte, da cultura, dos potenciais educativos da disciplina, dos espaços culturais e causar um impacto real no ensino da Arte em sala de aula.

Os conteúdos do Aprendendo com Arte nas duas modalidades, semipresencial e totalmente a distância, abordam a história do ensino da arte, mediação cultural, artes brasileiras, artes híbridas, metodologias de projetos em arte, patrimônio cultural, além de conteúdos virtuais e introdução ao uso das tecnologias como recurso didático. Os participantes recebem um artigo inédito, texto-base elaborado pelo autor convidado, que trata do tema específico de cada módulo. Vídeos com entrevistas e/ou depoimentos desse mesmo autor são gravados e editados pela equipe técnica do projeto e disponibilizados ao cursista no ambiente virtual. Texto e vídeos constituem a base dos repertórios sobre os quais os tutores disparam as suas proposições pedagógicas.

As turmas do semipresencial contam ainda com a presença do autor convidado que desenvolve uma oficina no encontro presencial.

Nas proposições semanais que cada sala vivencia virtualmente, e que são criadas por seus tutores em diálogo com a coordenação, obras artísticas e processos de criação conduzem leituras, produções e debates nos fóruns, exigindo, dessa forma, comprometimento, responsabilidade na preparação de materiais expressivos e também posicionamento crítico, o que faz com que o professor-cursista se desloque da passividade para a aventura de refletir e dialogar colaborativamente.

Nesta atmosfera de comprometimento e compromisso, o envolvimento no trabalho formativo a distância é garantido pelo entusiasmo e motivação dos tutores, que trabalham em sintonia, trocando proposições e sugestões sobre as diferentes formas de abordagem dos temas. A dinâmica é facilitada pelos encontros síncronos quinzenais com toda a equipe, nos quais parte do grupo participa presencialmente e, outra, por videoconferência, além de espaço específico no fórum virtual para troca de ideias sobre cada tema trabalhado. As trocas informais por e-mail também são constantes, o que leva a caracterizar a equipe como virtual, pois, apesar de estarem dispersos geograficamente, os tutores e os coordenadores atuam em conjunto para o alcance de um objetivo comum, como apontam Orengo, Zornoza e Peiró (2011).

Como o curso culmina com a proposta de elaboração de um projeto em artes e seu desenvolvimento na escola, todo o processo vivenciado pelos cursistas no resgate e reflexão do cotidiano de suas práticas educativas propicia a passagem da prática à teoria e vice-versa, salientando que os saberes docentes podem ser reelaborados e reapropriados pelo professor de forma crítica, ao reconhecer-se como um profissional investigativo de sua prática e transformador de sua realidade (ZEICHNER, 1993; GIROUX, 1997). Tal condição é compartilhada por todos os participantes da equipe do projeto, pois há o entendimento de que não basta os profissionais da educação somente se instrumentalizarem tecnicamente, mas que existe a necessidade da reflexão crítica e da transformação coletiva.

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2. Formação a distância

Em março do corrente ano, 4.466 professores de todo o Brasil se inscreveram para as 200 vagas oferecidas para o curso. Como o número de inscritos foi muito maior que o previsto e reconhecendo a importância do projeto para a formação dos educadores, a Fundação Volkswagen e o Instituto Arte na Escola ampliaram o projeto, disponibilizando mais 320 vagas. Portanto, até dezembro de 2016, serão 520 professores de todo o Brasil a participar da formação a distância.

A participação nas atividades realizadas a distância acontece na Plataforma do Letramento, um Ambiente Virtual de Aprendizagem (AVA) de base Moodle, que conta com material exclusivo e moderação de profissionais especializados. A formação on-line consiste em 150 horas de aprendizagem totalmente a distância, distribuídas em seis módulos de atividades práticas e teóricas, além de sessões de videopalestra com profissionais de destaque nas temáticas abordadas. Nessa modalidade, o aprofundamento se dá principalmente por meio de fóruns de discussão e compartilhamento de práticas e experiências entre os participantes, mediados pelos tutores, de modo a promover a interação entre os participantes, levando também a uma reflexão sobre a prática cotidiana em sala de aula.

São oito tutores que acompanham o trabalho junto aos cursistas, cada um ficando como responsável por duas turmas de 40 participantes cada. O trabalho das tutorias, em ambos os cursos que acontecem nos Ambientes Virtuais de Aprendizagem (AVA), visa ampliar conhecimentos e vivências nos campos da Arte e da Educação, no sentido de relacionar conhecimento e cultura; cultivar o diálogo, a curiosidade, a cooperação, a pesquisa, a experimentação, a inventividade e, ainda, instaurar processos de criação e de realização de projetos significativos para os professores, para os alunos e para a comunidade em que vivem.

Por ser utilizado o Moodle, que é reconhecidamente um AVA de proposta colaborativa, o espaço no qual as aulas e atividades acontecem virtualmente é, em si, um facilitador de trocas e de construção coletiva de conhecimento. Dessa forma, toda a experiência educacional dos cursistas está centrada em um processo de construção coletiva de conhecimentos, por meio de práticas mediadas e a reflexão sobre elas, além de uma proposta aberta, na qual as atividades devem evoluir para os diferentes espaços de atuação dos professores-cursistas, como as salas de aulas, trajetos e trajetórias pessoais e profissionais.

3. Formação semipresencial

No ano de 2016, esta modalidade conta com a parceria das Secretarias Municipais de Educação de Diadema e de Carapicuíba, cidades do estado de São Paulo, e tem a participação de 120 educadores. Em 2015, a formação semipresencial foi realizada para professores de Cariacica (ES) e de Aracaju (SE). O conteúdo para o ano de 2016 foi reestruturado e está distribuído em seis módulos, sete encontros presenciais, além de um seminário e uma mostra de trabalhos. No total são 150 horas de curso durante o ano, sendo 56 horas presenciais e 94 horas a distância.

Um dos diferenciais de 2016 em relação a 2015 foi o aumento significativo da carga horária. Em 2015 eram 85 horas de formação semipresencial, mas, em função da própria evolução do curso e com a proposta de

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contribuir para o plano de carreira do professor, as alterações foram realizadas. Um ponto positivo do curso semipresencial é o trabalho de mapeamento dos espaços e equipamentos culturais nas cidades participantes, tendo como resultado um material educativo com propostas de trabalho voltadas para a construção de percursos e trajetórias dos educadores, focando a mediação nos patrimônios culturais de suas cidades, contribuindo, assim, para o fortalecimento da identidade cultural dos professores-cursistas com suas cidades e, consequentemente, nas propostas educacionais junto a seus alunos.

O encontro presencial funciona como um disparador do tema que será trabalhado no módulo, também em ambiente virtual, apoiado em leituras e debates em fóruns temáticos, mediados pelos tutores, acompanhado de diálogos virtuais com especialistas, de modo a contextualizar todo o aprendizado desenvolvido.

Dessa forma, ambos os cursos - totalmente a distância e semipresencial - devem proporcionar experiências estéticas e artísticas, organizadas em torno do princípio dialógico e por um viés afetivo, buscando construir colaborativamente a compreensão do direito de conhecer e desfrutar do patrimônio cultural local e da humanidade. Nos dois formatos de curso, o objetivo final é a apresentação de um projeto a ser implementado na escola.

4. Gestão colaborativa de equipe

A partir da primeira experiência do curso Aprendendo com Arte, em 2015, foi percebida a necessidade de reformular o projeto, o que levou à ampliação da equipe, agregando novos profissionais e reorganizando funções para pensar outra forma de gestão mais colaborativa. Com esse propósito, atualmente a equipe é composta por quatro profissionais de gestão (Geral, Pedagógico, Tecnológico e EaD), oito professores-tutores, três assistentes (Administrativo, Tecnológico e de Comunicação), além dos profissionais que viabilizam os conteúdos (webdesigner, designer instrucional, videomaker e editor de vídeo).

Passados sete meses experimentando a nova estrutura, foi escrito o presente artigo, confirmando as mudanças e as conquistas que agora se fazem compartilhar, a partir da nova perspectiva/modelo de gestão.

Parte da equipe do projeto atua de forma remota, desde suas residências, tendo somente duas reuniões presenciais mensais (para os residentes na cidade de São Paulo), complementadas por participação síncrona, pelo Google HangOuts, para os que não podem se deslocar até o escritório. Esse formato de trabalho, por si, já exige maior autonomia de cada ator do projeto (TREMBLAY, 2002). A equipe de gestão monitora todo o trabalho nas “salas do ambiente” cotidianamente, mas os tutores possuem autonomia para conduzir as atividades da forma que considerar mais apropriada.

Pensando ainda na prática de gestão colaborativa, são realizados encontros avaliativos individuais entre cada tutor e a equipe de coordenadores para acompanhamento do trabalho pedagógico. Da mesma forma que as reuniões sistemáticas, essas também ocorrem de forma presencial, para os que estão na cidade de São Paulo, ou via HangOuts para os demais, no final de cada semestre. O objetivo principal desses momentos de reunião individualizada é dar suporte pedagógico apropriado para os tutores, a partir da observação da prática do grupo como um todo, e focar no alinhamento dos objetivos gerais e específicos do projeto. Esse momento de acompanhamento individual é feito com a presença de toda a equipe gestora, que acolhe as críticas e avaliações

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de todos os profissionais envolvidos no projeto, bem como entrega ao tutor contribuições para o aprofundamento e fortalecimento de suas ações e encaminha as mudanças sugeridas pelo grupo.

Por módulo, cada tutor constrói sua pauta, tendo como princípio atender às necessidades do seu grupo, privilegiando a troca dos diferentes repertórios profissionais, sempre alinhados às diretrizes do projeto. O diálogo individualizado entre tutor e coordenação pedagógica se dá antecipadamente à abertura dos módulos, a fim de oferecer contribuições que visem manter objetividade e clareza na linguagem, coerência e foco no conteúdo, além de estímulo e motivação na participação dos alunos, como mais detalhadamente será descrito a seguir, legitimando o caráter colaborativo dos mecanismos educativos que estruturam o curso.

Assim, o trabalho com a equipe de tutores foi, desde o princípio, organizado de forma a garantir que cada um pudesse ter autonomia para conduzir o trabalho da maneira como se sentisse mais confortável, mas sem deixar de ter uma unidade central, tanto com relação aos temas abordados, como na quantidade de atividades exigidas dos participantes em cada módulo.

A estrutura de gestão da equipe remota de tutores teve que ser examinada a fim de prever formas de contornar as desvantagens do trabalho remoto apontadas por Cascio (2000), como o sentimento de isolamento e a falta de confiança. Para isso, foi criado, desde o início do ano, um espaço para os tutores no ambiente virtual, a Sala dos Tutores, em que é discutida a pauta de cada módulo antes de se decidir o que será proposto aos alunos. Nessa oportunidade, todos apresentam ideias sobre a maneira como pretendem abordar e tratar os assuntos e em que ordem, sempre apoiados pela coordenadora pedagógica, para mediar as ideias e fechar as discussões com as proposições finais do grupo. Somente após, as pautas individuais para cada turma e tutor serão geradas.

Nesse sentido, tanto o trabalho da coordenação pedagógica como o da supervisão de EaD operam no apoio ao desenvolvimento do trabalho de cada tutor, especialmente na indicação de melhores caminhos, proposições e indicação da viabilidade das ideias. Para Cascio (2003), os coordenadores adequados para lidar com o trabalho remoto devem possuir uma atitude aberta e positiva, focando em soluções para os problemas e em resultados, facilitando a performance da equipe, além de saberem delegar e acompanhar o trabalho remotamente. Esse posicionamento é essencial para que cada tutor se sinta confiante em desenvolver o seu trabalho, sabendo que conta com o apoio necessário. Nessa atmosfera é exercitada a horizontalidade que se deseja multiplicar nas relações entre tutores e cursistas. De fato, após sete meses, é possível confirmar o impacto da postura adotada na dinâmica dos fóruns das 16 salas do Aprendendo com Arte e recolher diversos depoimentos motivadores.

Um aspecto importante desse formato de gestão é o vínculo afetivo exercitado tanto entre a equipe do projeto como pelos tutores no trato com os cursistas. Trata-se de um vínculo tecido por meio do diálogo, respeitando as diferenças, acessando as experiências de vida, compreendendo a práxis pedagógica como o lugar de produção do saber. Concepções educativas que contemplam as histórias de vida e que possibilitam o resgate de experiências e práticas pedagógicas, como defendem Dominicé (1988), Josso (2004) e Nóvoa (1992), dão voz aos sujeitos, incluem as identidades e aproximam-os do processo educativo, isto é, respeita as distintas maneiras de ser e estar na profissão docente.

Nesse sentido, não há imposição de uma forma de trabalhar que seja percebida como única ‘correta’, pois as diferentes leituras e linguagens de cada tutor são respeitadas. A posição da coordenação é produzir

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harmonia nas pautas dos tutores, mantendo o respeito aos temas previstos no projeto Aprendendo com Arte, que também devem estar alinhadas ao texto-base para cada módulo.

Um dos aspectos que também auxilia no caráter colaborativo do trabalho da equipe é a proximidade do autor do texto-base com todos os agentes do processo de produção e oferecimento de cada módulo do curso. Depois que o texto é escrito e validado pela equipe coordenadora, todos os tutores e o designer instrucional passam a ter acesso a ele e é agendado um dia para que o texto seja discutido com o autor. Assim, os tutores já levantam questões sobre o tema do texto, interrogam o autor, pedem esclarecimentos e materiais complementares para algum assunto que necessite de conhecimentos prévios e levam as indicações para o trabalho com os alunos. Muitas vezes, algum aspecto que não está muito claro, ou que precisa de outros exemplos, é apresentado, levando ao desenvolvimento ou indicação de materiais de apoio.

Os sete meses de atuação do Aprendendo com Arte 2016, como projeto de criação coletiva, é uma experiência formativa conduzida exatamente como uma criação artística, aquela que se elabora nos próprios processos nos quais se realiza (OSTROWER, 1996).

5. Perspectiva pedagógica criadora para a formação online de professores de Artes

Nos últimos anos, surgiram muitos cursos de formação continuada oferecidos online. Diante da entrada dessa modalidade de EaD na área de formação de professores, houve resistência por parte de muitos formadores experientes em aulas presenciais. O argumento de tal resistência se fundamenta na crença de que os encontros presenciais disparam um vínculo entre formador e cursistas que o ambiente virtual não é capaz de gerar. Esses formadores apontam a frieza das relações interpessoais, via ‘monitores’ de vídeo, como impedimento para a construção dos laços que aprofundam a aprendizagem significativa.

De fato, é fácil desconfiar da educação a distância quando são encontrados exemplos que reproduzem modelos arcaicos de ensino, centrados na transmissão de dados, indiferente e esvaziada de sentido para o cursista. Lamentavelmente, cursos assim, com foco somente na transmissão de conteúdo e homogeneizantes, são mais frequentes que experiências mais criativas e dialógicas. Tais exemplos corroboram com esse preconceito, pois subjugam o potencial de interatividade e subaproveitam as possibilidades de criação coletiva que os AVAs contêm, porque, na verdade, por trás de toda ação formativa, existe uma concepção filosófico-pedagógica acerca de como se aprende e como se ensina.

O uso de novas mídias nos cursos de formação de educadores exige, sim, muitos cuidados específicos, mas, do ponto de vista pedagógico, exige os mesmos cuidados que os encontros presenciais. O paradigma do ensino tradicional calcado na transmissão unilateral dos conhecimentos reside em qualquer modalidade de ensino. Um projeto formativo que vislumbre a educação emancipadora (RANCIÉRE, 2002) requer a busca de formas democráticas do fazer pedagógico. Os tutores do Aprendendo com Arte convocam, convidam e motivam à pesquisa, o posicionamento, a reflexão, a revisão das práticas dos cursistas muito mais do que explicam ou demonstram, pois “a experimentação de novas possibilidades de recombinação, a interatividade e a frequente conectividade são algumas das características que vão permear as novas estratégias de ensino centradas no ambiente digital” (KENSKI, 2003, p. 82).

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Propor um curso de educação a distância, sobretudo na área de formação de educadores, requer potencializar a interatividade e reconfigurar a ação docente dos tutores, abrindo espaço para que ofereçam um curso com personalidade na conectividade.

Composta por uma equipe comprometida com a renovação da educação, o Aprendendo com Arte é um projeto que vislumbra trazer para o ambiente virtual o mesmo propósito que tantos educadores almejam em suas salas de aula: conquistar uma atmosfera de aprendizagem significativa.

À luz da Teoria da Aprendizagem de Ausubel, que propõe que os conhecimentos prévios dos alunos sejam considerados e valorizados para ancorar novos conhecimentos, a coordenação pedagógica deste projeto orienta os tutores a elaborarem proposições que recuperem a experiência e as concepções dos cursistas sobre os temas de cada módulo, que favoreçam o diálogo entre os participantes, revelando também suas próprias concepções e experiências. É nesse diálogo que os conteúdos dos módulos são apresentados. Em tal atmosfera, os cursistas sentem-se ouvidos, amparados e estimulados a participar das interações e do processo de ensino-aprendizagem virtual.

Por meio de proposições que questionam a prática dos cursistas, que expõem seus fundamentos, que convidam à reflexão de suas legitimidades, os tutores promovem a interação entre os participantes e estimulam a revisão dos condicionantes dessas práticas.

Ciente de que os processos educativos são extremamente complexos e também de que se lida com realidades muito distintas, pois participam do projeto professores de todos os estados do país, o Aprendendo com Arte ousa conectar a diversidade desses contextos e buscar uma unidade na coerência dos fundamentos e na significância da aprendizagem para os professores.

Isso implica dizer que todos os conteúdos dos módulos do projeto são abordados a partir de consignas que recuperam a experiência e a compreensão dos cursistas sobre os assuntos estudados. Diante do levantamento inicial, outras questões são trazidas e, por sua vez, motivam novas interações, estabelecem distintas relações conteúdo-experiência e o tutor conduz a discussão de modo a promover singularidade nas interpretações. Esse caminho absorve e contempla a diversidade inerente à natureza humana, como indica Zabala (1998, p. 90):

(...) ensinar envolve estabelecer uma série de relações que devem conduzir à elaboração , por parte do aprendiz, de representações pessoais sobre o conteúdo objeto de aprendizagem. A pessoa, no processo de aproximação aos objetos da cultura, utiliza sua experiência e os instrumentos que lhe permitem construir uma interpretação pessoal e subjetiva do que é tratado. Não é necessário insistir no fato de que em cada pessoa o resultado desse processo será diferente, trará coisas diferentes, e a interpretação que irá fazendo, da realidade também será diferente; apesar de possuir elementos compartilhados com os outros, terá determinadas características únicas e pessoais.

As avaliações voluntárias dos participantes confirmam que o convite à expressão das experiências e ao debate constante encorajam e potencializam as suas práticas de ensino.

São muitos os exemplos dessa abordagem. Um deles acontece no módulo sobre Patrimônio Cultural, no qual cada tutor inicia com uma proposição em que os cursistas são convidados a escolher, entre seus guardados, alguns objetos que se configurem como patrimônio pessoal. Representados como um resgate das subjetividades, os objetos, que serão fotografados e postados no ambiente, compõem uma instalação que servirá posteriormente

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para a elaboração coletiva da noção de patrimônio. Só então os conceitos de patrimônio material e imaterial, entre outros do módulo, são tratados juntamente com o vídeo e o texto-base.

O percurso empreendido, das subjetividades ao conceito e do pessoal ao informativo, contempla a absorção das temáticas pelos cursistas, tanto os iniciantes quanto aqueles experientes na prática educativa. E a solicitação da experiência de criação de cada cursista potencializa a consciência do papel inexorável da vivência em processos expressivos da arte na formação de professores.

Para solidificar essa abordagem na equipe de tutores, antes do início do curso, todos passaram por um processo formativo, no qual cada um foi convidado a se apresentar utilizando-se de expressões artísticas efetivamente envolvidas. Confiante nas formulações de Machado (2004) sobre a formação do “artista educador”, duas instâncias que se integram em uma prática profissional que convida seus pares a se apropriarem de novos saberes, a coordenação pedagógica procurou articular projetos individuais ao projeto coletivo Aprendendo com Arte. Ou seja, a breve formação dos tutores que iriam se responsabilizar pelas salas do curso contou com o exercício da articulação das subjetividades e suas expressões em criações artísticas pertinentes aos objetivos e propósitos do projeto.

6. Conclusão

Articulando o pensar ao fazer, a experiência à reflexão, o conhecimento à prática, as proposições que os tutores são motivados a criar exploram as abordagens do ensino da arte, a reflexão das práticas educativas, por meio de atividades que possibilitam a ampliação do vocabulário específico da área e o repertório estético dos cursistas, bem como desencadeiam processos de autopercepção e reconhecimento dos paradigmas pedagógicos que fundamentam suas aulas.

Sem jamais fornecer um plano ou “receita” de trabalho, o Aprendendo com Arte convida todos os profissionais de educação envolvidos no projeto para o aprofundamento sensível e reflexivo das relações horizontais de ensino-aprendizagem, permeado pelo diálogo, pesquisa, apreciação, reconhecimento e acolhimento das diferentes leituras em torno de obras de arte e processos de criação. Dessa forma, todo o trabalho se dá confiando no potencial pedagógico transformador da Arte. Cada atividade, fórum, etc. visa desencadear processos de aprendizagem em que, ao construir sentidos individuais para conteúdos discutidos coletivamente, o educador reinvente sua prática. Os temas dos módulos e a condução dos tutores alimentam-se da intenção secreta de instigar no cursista-educador a consciência de que a aula é um processo de criação artística (MATTAR, 2010).

Os professores iniciam o curso esperando informação e repertório de práticas. Aos poucos, no diálogo com seus tutores, vão compreendendo e aceitando o convite que o Aprendendo com Arte lhes faz: reconhecer seus próprios propósitos no ensino de arte, pois como afirma Mattar (2010, p. 181):

A oportunidade de refletir sobre seus desígnios faz com que o aluno-professor reconheça seus princípios e formule suas próprias justificativas para atuar com o ensino de arte. À busca dos motores de sua existência, muitas vezes, ele se encontra ou reencontra simbolicamente com artistas e educadores cujas finalidades se aproximam das suas, com eles estabelecendo um diálogo inspirador e fortalecedor de seus próprios propósitos.

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Quanto a esse ponto, trata-se de promover a inteligibilidade de que os enunciados poéticos contidos nas produções da arte e no fazer artístico são, como metáforas do real, matrizes de sentido, de visões de mundo, de “fábricas de sentido” (RANCIÉRE, 2009, p. 63).

Assim, o nosso objetivo é que haja diálogo entre os cursistas, a partir das proposições dos tutores, provocando reconhecimento e posicionamento, ao criar um ambiente que transcenda o ‘ordinário’ escolar rumo ao encontro da ‘excepcionalidade’ do ensino de arte e que, dessa forma, se reconfigure o ânimo dos professores-cursistas através da visibilidade tanto das práticas de excelência quanto do questionamentos e reflexões sobre a própria prática.

Ainda que o curso conte com um tempo reduzido de oito meses, pode-se afirmar que a vivência profunda desse processo contribui para a compreensão do potencial da prática educativa em arte. As postagens dos professores-cursistas confirmam o entusiasmo e a capacidade inventiva do educador que escolhe a disciplina de Artes. A tutoria afetiva recolhe suas subjetividades e promove a ampliação dos conteúdos e do repertório em arte, recuperando o sentido de suas práticas. Os resultados vislumbrados confirmam que a busca pela dimensão humana de ensinar e aprender pela Arte coletivamente também pode se dar em um curso a distância.

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