DIREITO NO BRASIL
AULA DE
DIREITO CONSTITUCIONAL I
Profª Lúcia Luz Meyer
atualizado em 07.2010
PONTO
10
– D
IREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS
Roteiro de Aula (13 fls)
SUMÁRIO:
10.1. Introdução. 10.2. Origem e evolução.
10.3. Teoria dos Direitos Fundamentais do Homem.
10.4. Declaração de Direitos nos Regimes constitucionais brasileiros.
10.5. Direitos e Garantias de Direitos.
Direitos fundamentais: gênero. A Constituição Federal de 1988 utilizou-se, em seu Título II, da expressão direitos fundamentais. Entretanto, a doutrina constitucional emprega,
ao lado dela, outras, com o mesmo sentido e alcance, como, por exemplo, as expressões liberdades públicas, direitos humanos, direitos subjetivos públicos e direitos fundamentais, que costumeiramente são empregados com a mesma significação.
Os direitos e garantias fundamentais constituem um amplo catálogo de dispositivos, onde estão reunidos os direitos de defesa do indivíduo perante o Estado, os direitos políticos,
os relativos à nacionalidade e os direitos sociais, entre outros.
(
LUIZ ALBERTO DAVID ARAÚJO
e
VIDAL SERRANO NUNES JÚNIOR
,
Curso de Direito Constitucional, 9ª ed. rev. atual. – São Paulo: Saraiva,
2005, p. 107 - grifo original)
10.1. INTRODUÇÃO:
Os direitos fundamentais são prerrogativas, liberdades públicas, direitos humanos ou
individuais de que gozam os cidadãos, face ao Estado Constitucional, onde o Poder Público não
pode invadir a esfera jurídica do cidadão. As garantias fundamentais são os meios assecuratórios
daqueles direitos.
Segundo leciona
DALMO DE ABREU DALLARI
(Elementos de Teoria Geral do
Estado, 23ª ed. São Paulo: Saraiva, 2002 - prefácio – grifamos):
Nesses anos todos o mundo tem passado por profundas transformações, o papel do Estado foi e continua sendo questionado, alteraram-se com maior ou menor amplitude suas formas de organização e atuação. Mas permanece o reconhecimento da enorme influência do Estado na vida da humanidade e, cada vez mais, é objeto de preocupação a conciliação da eficiência do Estado com a preservação dos direitos fundamentais da pessoa humana. A busca de preservação da liberdade, que foi um dos fatores de criação do chamado Estado Moderno, sucessor do absolutismo, continua presente, agora
com a consciência, resultante da experiência histórica, de que não basta a garantia formal da liberdade onde pessoas, grupos humanos, populações numerosas, sofrem profundas discriminações e não têm possibilidade de acesso aos benefícios proporcionados pelas criações da inteligência humana e pela dinâmica da vida social.
A Constituição Federal de 1988 – CF/88 -, em seu Título II - Direitos e Garantias
Fundamentais - alinha cinco Capítulos sobre o assunto (
ALEXANDRE DE MORAES
-
Constituição do Brasil Interpretada – e legislação constitucional, São Paulo: Atlas, 2002, pp.
164-165):
a) Capítulo I
-
Dos direitos e deveres individuais e coletivos
– ‘correspondem aos
direitos diretamente ligados ao conceito de pessoa humana e de sua própria
personalidade, como, por exemplo, o direito à: vida, dignidade, honra, liberdade.
Basicamente a CF de 1988 os prevê no art. 5º’;
Observe-se que não são apenas os explícitos nos 78 (setenta e oito) incisos desse art.
5º da CF/88, ou mesmo apenas os do regime e princípios constitucionais mas,
também, os de normas internacionais que passarem a interar nosso sistema jurídico,
conforme expressamente disposto no § 2º desse mesmo artigo:
§ 2° - Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte.
b) Capítulo II
- Dos direitos sociais
– ‘caracterizam-se como verdadeiras liberdades
positivas, de observância obrigatória em um Estado Social de Direito, tendo por
finalidade a melhoria das condições de vida aos hipossuficientes, visando à
concretização da igualdade social, que configura um dos fundamentos de nosso
Estado Democrático, conforme preleciona o art. 1º, inciso IV. A Constituição Federal
consagra os direitos sociais a partir do art. 6º ao 11’;
c) Capítulo III -
Da nacionalidade
– ‘nacionalidade é o vínculo jurídico político
que liga um indivíduo a certo e determinado Estado, fazendo deste indivíduo um
componente do povo, da dimensão pessoal deste Estado, capacitando-o a exigir sua
proteção e sujeitando-o ao cumprimento dos deveres impostos’ - (arts. 12 e 13);
d) Capítulo IV -
Dos direitos políticos
– ‘conjunto de regras que disciplina as
formas de atuação da soberania popular. São direitos públicos subjetivos que
investem o indivíduo no status activae civitatis, permitindo-lhe o exercício concreto
da liberdade de participação nos negócios políticos do Estado, de maneira a conferir
os atributos da cidadania.’ - (arts. 14 a 16);
e) Capítulo V -
Dos partidos políticos
– ‘a Constituição Federal regulamentou os
partidos políticos como instrumentos necessários e importantes para preservação do
Estado Democrático de Direito, assegurando-lhe autonomia e plena liberdade de
atuação, para concretizar o sistema representativo’. - (art. 17).
JOSÉ AFONSO DA SILVA
, baseando-se nessa divisão adotada pela Constituição de 1988,
classifica os direitos fundamentais nos seguintes grupos:
individuais;
b) direitos coletivos;
c) direitos de nacionalid
ade
- art. 12;
d) direitos políticos - arts. 14 a 17;
e) direitos sociais - arts. 6º a 11;
f) direi
tos fundamentais do homem-solidário
- arts. 3º, 4º, VI, e 225.
LOGO, dentro dessa sistemática, o termo “Direitos Fundamentais” é gênero, abrangendo
as seguintes espécies:
a) direitos individuais - (Ponto 11 do Programa de Direito Constitucional I);
b) direitos coletivos ( Ponto 11 do Programa de Direito Constitucional I);
c) direitos sociais ( Ponto 12 do Programa de Direito Constitucional I);
d) direitos nacionais ( Ponto 13 do Programa de Direito Constitucional I);
e) direitos políticos (assunto do Ponto 14 do Programa de Direito Constitucional I).
Observe-se que o Ponto 15 do Programa diz respeito às Garantias Individuais.
Atualmente, todas as Constituições escritas estão vinculadas às ‘Declarações de Direitos
Fundamentais’.
Precioso o ensinamento de
RODRIGO CÉSAR REBELLO PINHO
(Teoria Geral da
Constituição e Direitos Fundamentais – Sinopses Jurídicas, 17, 3ª ed. São Paulo: Saraiva, 2002,
pp. 65 e 70-71) ao considerar que:
Direitos Fundamentais são os considerados indispensáveis à pessoa humana, necessários para
assegurar a todos uma existência digna, livre e igual. Não basta ao Estado reconhecê-los formalmente; deve buscar concretizá-los, incorporá-los no dia-a-dia dos cidadãos e de seus agentes. (…).
Muitas expressões são utilizadas freqüentemente como sinônimas de direitos fundamentais, mas possuem conteúdo próprio ou refletem diversas concepções jurídicas. Como aponta Canotilho, os termos direitos fundamentais e direitos do homem distinguem-se quanto à origem e significado.
Direitos do Homem seriam os inerentes à própria condição humana, válida para todos os povos, em
todos os tempos. A Constituição não criaria esses direitos, apenas os reconheceria preexistentes à própria organização do Estado. Esse conceito reflete uma concepção jusnaturalista do direito.
A expressão direitos humanos é a utilizada com igual significado em tratados internacionais.
Direitos Fundamentais são os considerados indispensáveis à pessoa humana, reconhecidos e garantidos por uma determinada ordem jurídica. De acordo com a sistemática adotada pela
Constituição brasileira de 1988, a expressão Direitos Fundamentais é gênero de diversas modalidades de direitos: os denominados individuais, coletivos, difusos, sociais, nacionais e
políticos.
A expressão Direitos do Cidadão, consagrada na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, promulgada após a Revolução Francesa de 1789, reflete a dicotomia estabelecida entre os direitos que pertencem ao homem enquanto ser humano e os que pertencem a ele enquanto participante de certa sociedade. Direitos naturais seriam os inerentes à condição humana e civis, os pertencentes ao ser
humano enquanto participante de uma determinada sociedade. Direitos políticos são os exercidos pelos que possuem a denominada cidadania ativa, ou sejam pelos que podem participar da formação da vontade política do Estado, exercendo os direitos de votar e ser votado”.
Na lição de
JOSÉ AFONSO DA SILVA
(Manual da Constituição de 1988, São Paulo:
Malheiros, 9.2002, p. 24 – grifo original):
Direitos fundamentais do homem é a expressão que designa, em nível de Direito Constitucional
positivo, aquelas prerrogativas e instituições que ele concretiza em garantias de uma
convivência digna, livre e igual de todas as pessoas. No qualificativo fundamentais acha-se a
indicação de que se trata de situações jurídicas, sem as quais a pessoa humana não se realiza, não convive e, às vezes, nem sobrevive; fundamentais do homem, no sentido de que a todos, por igual, devem ser, não apenas formalmente reconhecidos, mas concreta e materialmente efetivados.
Diz
RICARDO CUNHA CHIMENTTI et alli
(Curso de Direito Constitucional’, São
Paulo: Saraiva, 2004, p. 51) sobre o assunto que:
A expressão ‘direitos e garantias fundamentais’ do Título II da Constituição deixa clara a existência de institutos diversos. As expressões utilizadas demonstram que cada uma tem sentido próprio. Em Direito Constitucional ‘direitos’ são dispositivos declaratórios que imprimem existência ao direito reconhecido. Por sua vez, as ‘garantias’ podem ser compreendidas como elementos assecuratórios, ou seja, são os dispositivos que asseguram o exercício dos direitos e, ao mesmo tempo, limitam os poderes do Estado.
Assim pode-se concluir que:
a) Direitos fundamentais formalmente constitucionais: são os previstos,
consagrados e reconhecidos no Texto Constitucional;
b) Direitos materialmente fundamentais: são os constante de leis e regras
aplicáveis de Direito Internacional, mas sem que as normas que os protege e
reconhecem tenham a forma constitucional.
10.2. ORIGEM E EVOLUÇÃO:
Com a evolução da sociedade, o aparecimento ou o reconhecimento da divisão de bens, que
inicialmente pertenciam a todos, fez surgir uma ‘dominação’ e, respectivamente, uma
‘subordinação’ das pessoas entre si.
O titular da propriedade impõe, subordina, oprime, surgindo daí uma forma de poder que,
por necessitar impor-se como válido, se torna político. Com as opressões políticas e sociais, surgem
as lutas para se libertar delas, limitando direitos e salvaguardando obrigações.
Vem a idéia de que “os interesses da sociedade são maiores que o dos indivíduos e devem
ser colocados numa relação harmônica. (…). A democracia no governo, a fraternidade na sociedade,
a igualdade de direitos e privilégios e a educação universal antecipam o próximo plano da
sociedade” (
JOSÉ AFONSO DA SILVA
- Curso de Direito Constitucional Positivo’, 23ª ed.
São Paulo: Malheiros, 01.2004, p. 1138).
Vale citar alguns antecedentes de Declarações de Direitos que vão sendo elaborados na
Roma antiga, como o ‘Interdicto de Homine Libero Exhibendo’, que deu origem ao habeas corpus
moderno.
Lembra
LOACIR GSCHWENDTNER
em artigo intitulado “Direitos Fundamentais”
(TEXTO Nº 0010 – fls. 01) que:
Numa breve abordagem histórica dos direitos fundamentais vamos encontrar traços gerais das primeiras Declarações de Direito nos Forais e nas Cartas de Franquia da Idade Média, que continham uma enumeração de direitos.
De fato, é na Idade Média que encontramos os mais diretos antecedentes das Declarações
de Direitos, com influência da Teoria do Direito Natural condicionando o aparecimento do
princípio das Leis Fundamentais do Reino, que limitava os poderes do rei, e também um conjunto
de princípios que ficou conhecido como Humanismo; surgiram e floresceram os Pactos, os Forais
e as Cartas de Franquias, já estudadas anteriormente no Ponto 01 de nosso Programa de Aula.
Vale aqui relembrar os mais famosos desses documentos, quais sejam: a Magna Carta, de
1215, a Petition of Rights, de 1628, o Habeas Corpus Amendment Act, de 1679, e o Bill of Rights,
de 1688, todos na Inglaterra; mas temos também o Mayflower Compact, de 1620, a Charter of New
England, de 1620, a Charter of Massachussetts Bay, de 1629, a Charter of Maryland, de 1632, a
Charter of Connecticut, de 1662, a Charter of Rhode Island, de 1663, a Charter of Carolina, de
1663, a Charter of Georgia, de 1732, o Massachussetts Body of Liberties, de 1641, o New York
Charter of Liberties, de 1683 e o Pennsylvania Chater of Privileges, de 1701, nas Colônias Inglesas
na América, dentre muitos outros.
Entretanto, as Declarações de Direitos nos termos modernos, aparecem apenas com o
advento das Revoluções Americana e Francesa, no século XVIII. Assim, considera-se como a
primeira Declaração de Direitos Fundamentais, em sentido moderno, a Declaração de Direitos do
Bom Povo de Virgínia (uma das treze colônias inglesas na América), de 12/01/1776, e anterior à
própria Declaração de Independência dos EUA, ambas inspiradas nas teorias de Locke, Rousseau e
Montesquieu.
Sobre a Constituição dos EUA, diz-nos
JOSÉ AFONSO DA SILVA
(09.2002: pp.142-143
– grifamos) que:
A Constituição dos EUA aprovada na Convenção de Filadélfia, em 17/09/1787, não continha inicialmente uma declaração dos direitos fundamentais do homem. Sua entrada em vigor, contudo, dependia da ratificação de pelo menos nove dos treze Estados independentes, ex-colônias inglesas na América, com que, então, tais Estados soberanos se uniriam num Estado Federal, passando a simples Estados-membros deste. Alguns, entretanto, somente concordaram em aderir a esse pacto se se introduzisse na Constituição uma Carta de Direitos, em que se garantissem os direitos
fundamentais do homem. Isso foi feito, segundo enunciados elaborados por Thomas Jefferson e
James Madison, dando origem às dez primeiras Emendas à Constituição de Filadélfia, aprovada em 1791, às quais se acrescentaram outras até 1975, que constituem o Bill of Rights do povo americano, em que se asseguram direitos fundamentais.
Sobre a Declaração Francesa de 1789,
JOSÉ AFONSO DA SILVA
acrescenta (09.2002: pp.
144-145 – grifo original):
Os autores costumam ressaltar a influência que a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, adotada pela Assembléia Constituinte francesa em 27/08/1789, sofreu da Revolução Americana, especialmente da Declaração de Virgínia, já que ela precedeu a Carta de Direitos, contida nas dez primeiras emendas à Constituição norte-americana, que foi apresentada em setembro de 1789. Na verdade, não foi assim, pois os revolucionários franceses já vinham preparando o advento do Estado
Liberal ao longo de todo o século XVIII. (…).
O texto da Declaração de 1789 é de estilo lapidar, elegante, sintético, preciso e escorreito, que, em dezessete artigos, proclama os princípios da liberdade, da igualdade, da propriedade e da
legalidade e as garantias individuais liberais que ainda se encontram nas declarações
contemporâneas, salvas as liberdades de reunião e de associação que ela desconhecera, firmada que estava numa rigorosa concepção individualista.
Consideram alguns doutrinadores que o ideário político dos revolucionários franceses de
1789 era resumido em uma grande palavra de ordem: “liberdade, igualdade e fraternidade”, daí
afirmar-se que existem aí três gerações de direitos individuais:
a) a primeira geração, correspondendo ao ideal de liberdade, são limites impostos à
atuação do Estado, uma prestação negativa, resguardando os direitos individuais da
pessoa humana;
b) a segunda geração, correspondendo ao ideal de igualdade, refere-se aos direitos
sociais, significando uma prestação positiva, de fazer do Estado em prol dos menos
favorecidos; surgiu num segundo momento do capitalismo, salientando-se as
Constituições mexicana de 1917 e a alemã, de Weimar, de 1919: salário mínimo,
aposentadoria, décimo terceiro salário, férias remuneradas, etc;
c) a terceira geração, correspondendo aos direitos de fraternidade, ao lado dos
interesses individuais e sociais, passou a proteger novas modalidades de direito: ao
desenvolvimento, à paz, ao meio ambiente, sobre o patrimônio comum da
humanidade, o direito de comunicação, proteção ao consumidor, à infância e à
juventude, ao idoso, ao eficiente físico, à saúde e à educação pública, etc;
Fala-se ainda em direitos de quarta geração:
d) a quarta geração, referente à autodeterminação, ao patrimônio comum da
humanidade, a um ambiente saudável e sustentável, à paz e ao desenvolvimento.
Ainda na esteira de
JOSÉ AFONSO DA SILVA
(01.2004:146-147 – grifo original),
anota-se que:
No plano jurídico, a Revolução de 1848, em Paris, inscreveu em sua Constituição de curta duração, o direito do trabalho, mas foi a Constituição mexicana de 1917 que, por primeiro, sistematizara o conjunto de direitos sociais do homem, restrita, no entanto, ao critério de participação estatal na ordem econômica e social, sem romper, assim, em definitivo, com o regime capitalista.
(…).
No mesmo sentido, seguiu-se a Constituição alemã de Weimar, de 1919, abrindo seu Livro II com a rubrica dos Direitos e Deveres Fundamentais dos Alemães.
(…).
Outro sentido, contudo, há de reconhecer-se à Declaração dos Direitos do Povo Trabalhador e
Explorado, aprovada em janeiro de 1918 pelo Terceiro Congresso Panrusso dos Sovietes. Fundada
nas teses socialistas de Marx-Engels-Lenin e conseqüente da Revolução Soviética de outubro de 1917, não se limitara a reconhecer direitos econômicos e sociais, dentro do regime capitalista, mas a realizar uma nova idéia de direito, que buscasse libertar o homem, de uma vez por todas, de qualquer forma de opressão.
Temos também a Carta das Nações Unidas, de 26/06/1945, impregnada da idéia do respeito
aos direitos fundamentais do homem, temos a Declaração Universal dos Direitos do Homem, de
Fundamentais, de 04/11/1950, por influência do Conselho da Europa, uma Comissão Européia de
Direitos do Homem e um Tribunal Europeu de Direitos do Homem; ainda, no continente
americano, a Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem, de maio de 1948, uma
Comissão Interamericana de Direitos Humanos, de 1960, uma Convenção Americana sobre
Direitos Humanos, de 1970, e a Corte Interamericana de Direitos Humanos.
JOSÉ AFONSO DA SILVA
(01.2004:149 – grifo original) ainda nos traz importante
informação ao ensinar que:
A Declaração Universal dos Direitos do Homem contém trinta artigos precedidos de um
Preâmbulo com sete considerandos, em que reconhece solenemente: a dignidade da pessoa humana, como base da liberdade, da justiça e da paz; o ideal democrático com fulcro no progresso
econômico, social e cultural; o direito de resistência à opressão; finalmente, a concepção comum
desses direitos.
10.3. TEORIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS DO HOMEM:
ALEXANDRE DE MORAES
(Constituição do Brasil Interpretada – e legislação
constitucional, São Paulo: Atlas, 2002, pp. 162-163 – grifamos) considera que:
O conjunto institucionalizado de direitos e garantias do ser humano, que tem por finalidade
básica o respeito a sua dignidade, por meio de sua proteção contra o arbítrio do poder estatal e o estabelecimento de condições mínimas de vida e desenvolvimento da personalidade humana, pode ser definido como direitos humanos fundamentais. A UNESCO, também definindo genericamente os direitos humanos fundamentais, considera-os, por um lado, uma proteção de maneira institucionalizada dos direitos da pessoa humana conta os excessos do poder cometidos pelos órgãos do Estado, e por outro, regras para estabelecer condições humanas de vida e desenvolvimento da personalidade humana.
(…).
O importante é realçar que os direitos humanos fundamentais relacionam-se diretamente com a garantia de não-ingerência do Estado na esfera individual e a consagração da dignidade humana, tendo um universal reconhecimento por parte da maioria dos Estados, seja em nível constitucional, infraconstitucional, seja em nível de direito consuetudinário ou mesmo por tratados e convenções internacionais.
Considera
JOSÉ AFONSO DA SILVA
(01.2004:158-160 – grifo original) que:
Pelo que se vê, não há propriamente uma inspiração das declarações de direitos. Houve reivindicações e lutas para conquistar os direitos nelas consubstanciados. E, quando as condições materiais da sociedade propiciaram, elas surgiram, conjugando-se, pois, condições objetivas e subjetivas para sua formulação. As condições reais ou históricas (objetivas ou materiais), em relação às declarações do século XVIII, manifestaram-se na contradição entre o regime da monarquia absoluta, estagnadora, petrificada e degenerada, e uma sociedade nova tendente à expansão comercial e cultural.
(…).
As condições subjetivas ou ideais ou ideológicas consistiram precisamente nas fontes de inspiração filosófica anotadas pela doutrina francesa: 1. o pensamento cristão, como fonte remota (...), 2. a
doutrina do direito natural dos séculos XVII e XVIII, de natureza racionalista, (...) 3. pensamento iluminista, com suas idéias sobre a ordem natural, sua exaltação às liberdades inglesas e sua crença
nos valores individuais do homem acima dos valores sociais, firmando o individualismo que exala dessas primeiras declarações dos direitos do homem.
Esses fundamentos acima citados acabaram sendo superados pelo processo de
desenvolvimento econômico, com o aparecimento de novas relações objetivas e de uma classe
proletária sujeita à burguesia capitalista.
Surgiram novas doutrinas sociais e novas fontes de inspiração dos direitos fundamentais:
a) Manifesto Comunista e as doutrinas marxistas;
b) Doutrina social da Igreja, a partir do Papa Leão XIII;
c) Intervencionismo estatal;
Formas das declarações de direitos:
a) inicialmente, eram proclamações solenes;
b) preâmbulo das Constituições;
c) integram as Constituições, adquirindo o caráter concreto de normas jurídicas
positivas constitucionais.
São características dos direitos fundamentais, segundo
JOSE AFONSO DA SILVA
(01.2004: p. 166):
a) historicidade – são históricos, como qualquer direito, vale dizer, nascem,
modificam-se e desaparecem; não são absolutos;
b) inalienabilidade – são intransferíveis e inegociáveis, pois não tem conteúdo
econômico-social;
c) imprescritibilidade – nunca deixam de ser exigidos;
d) irrenunciabilidade – pode até não ser exercido, mas não se pode renunciar a eles.
E
RODRIGO CÉSAR REBELLO PINHO
(2002:66), ainda acresce:
e) universalidade – todos os seres humanos têm direitos fundamentais;
f) limitabilidade – não são absolutos, podendo ser limitados sempre que houver uma
hipótese de colisão de direitos fundamentais.
Extraído de texto elaborado por
RAFAEL LANGHOFF
:
TEORIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS DO HOMEM:
A doutrina francesa indica o pensamento cristão e a concepção dos direitos naturais como as principais fontes de inspiração das declarações de direito. Mas na verdade houve inspirações objetivas ou reais e subjetivas ou ideais.
Inspirações Reais ou Objetivas: na verdade são condições, são as fases históricas em que o povo
não aceitava mais aquela sociedade de regime de monarquia absoluta, degenerada, pois existia uma nova sociedade de expansão comercial e cultural.
Essas contradições entre uma superestrutura atrofiada e uma sociedade progressista provocaram uma imensa crise na sociedade; e com isso o governo arbitrário desabou pois cedia a necessidade histórica que lhe impunha o desaparecimento do poder absoluto.
Condições Ideais ou Subjetivas: são as fontes de inspiração filosófica como:
1. Pensamento Cristão: o pensamento cristão primitivo, que continha uma mensagem da dignidade
iminente da pessoa humana, com uma igualdade fundamental de natureza entre os homens. Fala-se no pensamento cristão primitivo, porque o vigente no século XVIII era favorável ao status quo de então, uma vez que o alto clero apoiava a monarquia absoluta;
2. A Doutrina do Direito Natural dos séculos XVII e XVIII, fundada na natureza racional do
homem, era contra a divinização que sustentava o regime absolutista vigente;
3. Pensamento Iluminista: com suas idéias sobre a ordem natural, com sua crença nos valores
individuais do homem acima dos valores sociais.
A partir das mudanças econômicas que fizeram surgir um proletariado amplo, sujeito ao domínio da burguesia capitalista, deu origem a outros direitos fundamentais, os direitos econômicos e sociais; daí também surgiram novas doutrinas sociais e fontes de inspiração dos direitos fundamentais. Como o Manifesto Comunista e as doutrinas Marxistas, com as suas críticas ao capitalismo burguês, e o postulado de "liberdade e igualdade materiais num regime socialista", e a doutrina social da Igreja, a partir do Papa Leão VIII, no sentido de uma ordem mais justa, mas ainda que dentro do regime capitalista, mais recentemente evoluindo para uma igreja dos pobres que aceita os postulados sócias Marxistas, e também o intervencionismo estatal, que reconhece que o Estado deve atuar no meio econômico e social, a fim de cumprir uma missão protetora das classes menos favorecidas.
10.4. DECLARAÇÃO DE DIREITOS NOS REGIMES CONSTITUCIONAIS
BRASILEIROS:
A respeito da Declaração de Direitos no regime constitucional brasileiro leciona
JOSÉ
AFONSO DA SILVA
(01.2004: pp. 155-156 – grifo original) que:
As constituições brasileiras sempre inscreveram uma declaração de direitos do homem brasileiro e estrangeiro residente no país. Já observamos, antes, até, que a primeira constituição, no mundo, a
subjetivar e positivar os direitos do homem, dando-lhes concreção jurídica efetiva, foi a do Império
do Brasil, de 1824, anterior, portanto, à da Bélgica de 1831, a que se tem dado tal primazia.
Segundo
LOACIR GSCHWENDTNER
(no já citado artigo “Direitos Fundamentais”
(TEXTO Nº 0010 – fls 03):
Portanto, hodiernamente, a Constituição reconhece e assegura DIREITOS FUNDAMENTAIS explicitamente no art. 5º: Direitos cujo objeto imediato é a liberdade: de locomoção, de pensamento, de reunião, de associação, de profissão, de ação, liberdade sindical, direito de greve; Direitos cujo objeto imediato é a segurança: dos direitos subjetivos em geral, em matéria penal (presunção de inocência), do domicílio; Direitos cujo objeto imediato é a propriedade: propriedade em geral, artística, literária e científica, hereditária. Observamos, assim, que os direitos fundamentais do homem constituem uma variável ao longo da história dos últimos séculos, cujo elenco se modificou e continua se modificando, ao sabor das condições históricas, dos interesses, das classes no poder ou dos meios disponíveis para a realização dos mesmos. Os Direitos Fundamentais estão inseridos dentro daquilo que o Constitucionalismo denomina de Princípios Constitucionais Fundamentais, que são os princípios que guardam os valores fundamentais da ordem jurídica.
Pode-se fazer a seguinte cronologia:
a) a Constituição Imperial de 1824, em seu art. 179, enuncia, com garantias
pertinentes, os direitos do homem; uma ampla declaração de direitos destinados a
assegurar a inviolabilidade dos direitos civis e políticos dos cidadãos brasileiros –
“Das Disposições Gerais, e Garantias de Direitos Civis, e Políticos dos Cidadãos
Brasileiros”:
Art. 179. A inviolabilidade dos Direitos Civis, e Politicos dos Cidadãos Brazileiros, que tem por base a liberdade, a segurança individual, e a propriedade, é garantida pela Constituição do Imperio, pela maneira seguinte:
I. (...) […]. XXXV. […].
b) a Constituição de 1891 prevê a ampliação dos direitos individuais, com inclusão
do habeas corpus entre os direitos constitucionais dos cidadãos brasileiros - no
Título IV, Seção II, previa a “Declaração de Direitos”, prevendo, basicamente,
direitos e garantias individuais (arts. 72 a 78):
TÍTULO IV - Dos Cidadãos Brasileiros […].
SEÇÃO II
Declaração de Direitos
Art 72 - A Constituição assegura a brasileiros e a estrangeiros residentes no País a inviolabilidade dos direitos concernentes à liberdade, à segurança individual e à propriedade, nos termos seguintes:
[…].
c) a Constituição de 1934 incorporou direitos sociais, nova modalidade de direitos
fundamentais, representando uma prestação positiva do Estado (aposentadoria,
salário mínimo, jornada de 8 horas de trabalho, repouso semanal, licença
maternidade, etc); extensão constitucional do direito de voto às mulheres, quando
exercessem função pública remunerada; ampliação dos direitos e garantias
individuais, com a introdução do mandado de segurança e da ação popular; assim,
editada após a Constituição de Weimar, acresceu, no Título II - “Da Declaração de
Direitos”, aos direitos e garantias individuais já previstos, os de nacionalidade e os
políticos, e inovou incorporando o Título IV - “Da Ordem Econômica e Social”:
d) na Constituição de 1937, refletindo a mentalidade autoritária, os direitos e
garantias individuais foram restringidos, e o mandado de segurança e a ação popular
excluídos do texto constitucional; ditatorial, desrespeitou os direitos do homem,
principalmente os políticos;
e) a Constituição de 1946 procedeu à retomada do regime democrático, a
reintrodução do mandado de segurança e da ação popular do Capítulo dos Direitos
Individuais inserido no texto constitucional; acrescentou ao Título IV sobre a
“Declaração dos Direitos”, dois Capítulos: um sobre a “Nacionalidade e a
Cidadania” e outro sobre “Direitos e Garantias Individuais”;
f) a Constituição de 1967, e sua Emenda nº 1/1969, repetiu o enunciado da
Constituição de 1946, com os direitos econômicos e sociais mais estruturados;
redução dos direitos individuais, admitindo-se a possibilidade de suspensão desses
direitos em caso de abuso; cerceamento de liberdades democráticas e prática de
tortura e perseguição política; impregnada pela ideologia de ‘segurança nacional’.
RODRIGO CÉSAR REBELLO PINHO
(Da organização do Estado, dos
Poderes e Histórico das Constituições – Sinopses Jurídicas 18, 4ª ed. São Paulo:
Saraiva, 2002, p. 160) acrescenta sobre a CF de 1967 que:
A principal característica dessa Constituição era o art. 182 estabelecendo que continuavam em vigor o Ato Institucional nº 5 e os demais atos institucionais posteriormente baixados. Observa, com precisão, Jorge Miguel que ‘A Constituição de 69 é a anticonstituição’, pois o próprio Texto Constitucional admitia a existência de duas ordens, uma constitucional e outra institucional, com a subordinação da primeira à segunda. Pela ordem institucional o Presidente da República poderia, como fez, sem qualquer controle judicial, fechar o Congresso Nacional, intervir em Estados e Municípios, suspender direitos, cassar mandatos legislativos, confiscar bens e sustar garantias de funcionários, sobrepondo-se a direitos nominalmente tutelados pela ordem constitucional.
g) a atual Constituição, de 1988, adota uma técnica mais moderna, iniciando com
um Título I - “Princípios Fundamentais” e, no Título II - “Direitos e Garantias
Fundamentais”. Conforme leciona
RODRIGO CÉSAR REBELLO PINHO
(op.
acima citada, pp. 161-162 – grifamos):
Trata-se da ‘Constituição Cidadã’, na feliz expressão de Ulysses Guimarães, Presidente da Assembléia Nacional Constituinte, em razão de ser amplamente voltada para a defesa dos direitos dos cidadãos. Essa Constituição é fruto de um poder constituinte originário, que teve origem em um processo de transição pacífica do regime militar para o regime democrático. A maior evidência de que a atual constituição é fruto de um poder constituinte originário, muito embora tenha sido convocada por uma emenda à Constituição, foi a realização do plebiscito em que o povo brasileiro pôde escolher a forma de governo a ser adotada pelo Estado brasileiro: República ou Monarquia. A República era uma das cláusulas pétreas de todas as Constituições republicanas. Só foi possível a realização da consulta popular em razão de a Assembléia Nacional Constituinte possuir poderes próprios de um constituinte originário, não estando subordinado a limitações anteriormente existentes.
10.5. DIREITOS E GARANTIAS DE DIREITOS:
Diz-nos
JOSÉ AFONSO DA SILVA
(01.2004: p.169 – grifo original) que:
A afirmação dos direitos fundamentais do homem no Direito Constitucional positivo reveste-se de transcendental importância, mas, como notara Maurice Hauriou, não basta que um direito seja reconhecido e declarado, é necessário garanti-lo, porque virão ocasiões em que será discutido e violado. Ruy Barbosa já dizia que uma coisa são os direitos, outra as garantias, pois devemos separar, ‘no texto da lei fundamental, as disposições meramente declaratórias, que são as que imprimem existência legal aos direitos reconhecidos, e as disposições assecuratórias, que são as que, em defesa dos direitos, limitam o poder. Aquelas instituem os direitos; estas, as garantias: ocorrendo não raro juntar-se, na mesma disposição constitucional, ou legal, a fixação da garantia, com a declaração do direito’. Não são nítidas, porém as linhas divisórias ente direitos e garantias, como observa Sampaio Dória, para quem ‘os direitos são garantias, e as garantias são direitos’, ainda que procure distingui-los. Nem é decisivo, em face da Constituição, afirmar que os direitos são
declaratórios e as garantias assecuratórias, porque as garantias em certa medida são declaradas e, às
vezes, se declaram os direitos usando forma assecuratória. A Constituição, de fato, não consigna regra que aparte as duas categorias, nem sequer adota terminologia precisa a respeito das garantias. Assim é que a rubrica do Título II enuncia: ‘Dos direitos e garantias fundamentais’, mas deixa à doutrina pesquisa onde estão os direitos e onde se acham as garantias.
Celso Bastos Editora, 2002, pp. 258-259 e 274 – grifamos):
Em nossa época é quase que obrigatório fazer constar em todo Texto Constitucional uma declaração
de direitos que dizem respeito ao próprio homem. Isso ocorre por força de uma longa evolução
histórica, que parte da Idade Média e chega até os dias atuais. No entanto, o que é importante notar por hora – eis que essas afirmações merecerão comentários específicos a serem emitidos no momento adequado – é que esses direitos têm a característica de serem exercitados contra o Estado. Eles podem ser denominados de direitos individuais, ou se preferirmos, liberdades públicas, como denominam os franceses, ou até mesmo de direitos do homem e do cidadão. Eles apresentam sempre uma nota caracterizadora, qual seja, a de prescindirem de qualquer fato aquisitivo. Exemplo: todas as pessoas têm direito à vida, sem que se possa dizer que esse direito decorreu de determinada situação jurídica. (…).
A nossa Constituição Federal de 1988 no Título II assegura não somente os direitos fundamentais como também as garantias fundamentais, o que deixa claro que são coisas diferentes, embora muito próximas. Tanto os direitos como as garantias fundamentais não deixam de ser direitos: pertencem, portanto, a essa categoria ampla dos direitos individuais. A diferença repousa na circunstância de que as garantias não resguardam bens da vida propriamente ditos, tais como a liberdade, a propriedade, a segurança, mas fornecem instrumentos jurídicos ao indivíduo, especialmente fortes e rápidas para garantir os direitos individuais.
ALEXANDRE DE MORAES
(2002:169-170) aduz que:
Os direitos humanos fundamentais não podem ser utilizados como um verdadeiro escudo protetivo da prática de atividades ilícitas, nem tampouco como argumento pra afastamento ou diminuição da responsabilidade civil ou penal por atos criminosos, sob pena de total consagração ao desrespeito a um verdadeiro Estado de Direito. Os direitos e garantias fundamentais consagrados pela Constituição Federal, portanto, não são ilimitados, uma vez que encontram seus limites nos demais direitos igualmente consagrados pela Carta Magna (Princípio da relatividade ou convivência das liberdades públicas).
(…).
Apontando a relatividade dos direitos fundamentais, Quiroga Lavié afirma que os direitos fundamentais nascem para reduzir a ação do Estado aos limites impostos pela Constituição, sem, contudo, desconhecerem a subordinação do indivíduo ao Estado, como garantia de que eles operem dentro dos limites impostos pelo direito. Dessa forma, a regra, no Estado, é o pleno respeito às inviolabilidades constitucionais, permitindo-se, porém, excepcionalmente, a violação desses direitos e garantias (por exemplo: art. 5º, XI e XII).