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A Ética e as Relações Contemporâneas

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Volume 1- No 1- Janeiro/dezembro de 2011

A Ética e as Relações Contemporâneas

Elizabeth da Costa Ribeiro

bethcostaribeiro@yahoo.com.br

Resumo

Este artigo introduz uma discussão sobre a ética na contemporaneidade, apresentando em linhas gerais, as concepções de ética da antiguidade até os nossos dias. Aborda a distinção entre moral e ética e as preocupações éticas atuais tais como: convivência, tecnologia e ecologia. O pensamento de autores como Edgar Morin, Hans Jonas, Martin Heidegger, Michel Foucault e Milton Santos servem de base para este estudo.

Palavras Chave: ética, contemporaneidade, individualismo, competição, convívio inter-humano.

Abstract

This article introduces a discussion about ethics in the contemporaneity, presenting the conceptions of ethics from antiquity until the current days. It approaches the distinction between moral and ethics, and the present ethical concerns, such as coexistence, technology and ecology. The study is based on the thoughts of Edgar Morin, Hans Jonas, Martin Heidegger, Michel Foucault and Milton Santos.

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Volume 1- No 1- Janeiro/dezembro de 2011

Introdução

A ética é um campo prático que emerge da urgência e da necessidade de encontrarmos formas e maneiras de nos comportarmos diante dos impasses da vida.

Em função das necessidades de cada tempo histórico encontramos vários sentidos para a ética: desde as concepções dos antigos gregos a uma ética que hoje é denominada como ética pós-metafísica. Pós-metafísica porque na concepção ética de hoje questiona-se o conceito universal de homem como um princípio para a ética. Desde a ética de Sócrates até a ética dos Modernos, como Kant, temos concepções éticas metafísicas porque se constroem a partir da concepção de uma essência humana universal. Nos dias de hoje isto muda por vivermos em um mundo plural em que a diversidade sócio-cultural é fator relevante. Torna-se, portanto, insustentável uma concepção única e a priori de homem.

As Diferentes Concepções de Ética

Vejamos, em linhas gerais, as concepções de ética da antiguidade até os nossos dias. Para Aristóteles a felicidade seria a finalidade da ética a qual seria alcançada, principalmente, pela prática da aretê ou virtude, que pode ser entendida como a qualidade do homem que governa a si mesmo. Assim, a ética aristotélica pode ser identificada com a racionalidade de uma vida equilibrada e justa que teria como conseqüência a felicidade.

Na era cristã esta felicidade, concebida pelos gregos, só se realizaria plenamente na eternidade e não na existência transitória. Aqui a ética identifica-se com a superação desta vida e a fé numa vida eterna.

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somente, segundo uma máxima tal, que possas querer, ao mesmo tempo, que se torne lei universal.” Aqui a ética identifica-se com a liberdade que impõe limites a si mesma.

Já a época contemporânea inaugura uma ética das relações de reciprocidade. O pensar ético de hoje não se dá mais pela idéia de auto-domínio, como na ética dos antigos gregos ou salvação pessoal, como na ética medieval ou auto-determinação da liberdade, como na ética moderna. A ética contemporânea diz respeito, ao como estamos no mundo, como se dão nossos vínculos sociais, relacionais e de convivência. (PEGORARO, 2005)

Ética e Moral

Também na época contemporânea passa-se a fazer uma distinção entre ética e moral. Antes estes termos eram usados como sinônimos. Moral, do latim mores, que significa costumes e ética, do grego ethos, que significa lugar, morada.

É Michel Foucault (1984) quem assinala, explicitamente, a diferença conceitual entre estes dois termos. Este filósofo afirma ser do campo da moralidade os valores e as regras de ação que são prescritas, estabelecidas a priori e sob as quais reina um consenso. Estas prescrições são os códigos morais que tem a finalidade de reger as condutas humanas. Assim temos os códigos religiosos, os códigos civis, os códigos organizacionais, os códigos profissionais ou deontológicos.

Já a ética refere-se as diferentes maneiras pelas quais um indivíduo pode conduzir-se, diz respeito as suas escolhas, a uma atitude tomada frente aos códigos.

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Ética e Contemporaneidade

Como afirmamos, no início de nosso texto, o tom das éticas corresponde às demandas de seu tempo histórico. As preocupações éticas atuais estão voltadas para a questão do convívio inter-humano, a relação entre países e, ainda, os temas relacionados à tecnologia e a biotecnologia como mídias, exploração dos recursos do planeta, clonagem, células tronco, prolongamento da vida, novos medicamentos e terapêuticas, etc. Enfim, as preocupações de hoje se dão por vivemos em um mundo dominado por um sistema econômico que visa, exclusivamente, a produção, o consumo, e o lucro aliado ao progresso tecnológico. A competitividade gerada pelo sistema econômico ameaça as relações de convivência e, aliada a tecnologia, ameaça a vida no planeta. Portanto, os problemas éticos da atualidade tem uma de suas raizes num modelo captalista hegemônico aliado ao progresso tecnológico que coloca em risco a vida no planeta e as relações humanas.

Vivemos dominados por um modelo de subjetivação individualista, competitivo e excludente que atravessa todos os campos da existência humana. A competitividade de hoje não é mais aquela velha competição. A competitividade de hoje é uma verdadeira guerra.

Vigora a ideia de que a todo custo se deve vencer o outro para tomar o seu lugar. Vemos a competição econômica entre as empresas (incorporações e fusões), a competição política (o cunho eleitoreiro, a troca de partidos), a competição social (a busca desenfreada por status, títulos). A competitividade atravessa todas as formas de convívio: familiar e de amizade, o convívio nas escolas e nos ambientes de trabalho.

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E isto se mostra também em muitas escolas dirigidas a classe média. Muitos pais preocupam-se não com educação mas com a performance do filho na escola. As escolas, por sua vez, tentam passar a imagem de que estão à frente e que seus alunos já são vencedores, para desta forma, não perderem alunos. O passar no vestibular tornou-se a meta a ser alcançada e o que justifica estar na escola. Ingressar numa universidade ter uma profissão para poder ter chances na corrida rumo ao sucesso profissional que se traduz como sucesso econômico. A idéia de trabalho dá lugar a concepção de “estar inserido no mercado”.

A maneira dos jogos que se dão entre as grandes corporações o desrespeito em relação ao outro nos ambientes de trabalho torna-se, muitas vezes, mascarado e entendido como garra e ingrediente para o sucesso. Christophe Dejours (2003) aponta que em função da competitividade e do temor em relação ao desemprego ocorre a “banalização do mal” nos ambientes organizacionais, o que gera, segundo este autor, sofrimento e adoecimento no trabalho.

Milton Santos (2001) afirma que a competitividade e o consumismo levam a uma carência ética, tudo passa pelo cálculo, há o esquecimento da emoção e das noções de generosidade e solidariedade. Afirma ainda que esta realidade faz esquecer a oposição entre a figura do consumidor e a do cidadão. A figura do consumidor se impõem em todos os setores da vida. Assim, a idéia “do que investi e o que estou tendo como retorno”, se impõe também às relações humanas.

Ética Técnica e Tecnologia

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O posicionamento da técnica requer que a energia escondida na natureza seja revelada, o descerrado seja transformado, o transformado armazenado, o armazenado uma vez mais distribuído e o distribuído novamente processado. Assim a natureza torna-se, como afirma Heidegger (2001), “fundo de reserva”, ou seja, objeto da provocação da ordem técnica.

A técnica se impõe como uma necessidade universal e indiscutível a qual se deve aceitar. E como tudo parece depender da técnica, ela aparece como uma força divina a qual os homens devem se render sem buscar entendê-la. Por isto Milton Santos (2001) afirma que a técnica se mostra como uma banalidade e um mistério porque a usamos indiscriminadamente, mas não a compreendemos. Como um deus a quem recorremos todo o tempo, mas não o compreendemos em sua essência.

A técnica conforma os comportamentos fazendo crer em sua inevitabilidade. Passa-se a acreditar que uma técnica cada vez mais sofisticada poderá livrar a humanidade deste ou daquele problema. A lógica da técnica atravessa toda a nossa vida e, assim, passamos a acreditar que as soluções para os problemas virão das novas descobertas tecnológicas. Soluções medicamentosas, cirúrgicas, soluções de engenharia e, até, soluções bélicas.

Considerações Finais

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Edgard Morin (2004) afirma que a ideia de progresso em seu caráter estritamente tecnológico e econômico ignora o que não é mensurável na existência humana. Esta idéia de progresso não leva em conta as riquezas humanas não calculáveis como a generosidade, a criatividade, a amizade, os sentimentos...

Desta forma entendemos que o sofrimento do homem pós-moderno refere-se ao que Rollo May (1980) denomina de vazio existencial. Para este autor, o vazio existencial decorre de uma cultura narcísica, que incita a disputa ente às pessoas e que fabula soluções mirabolantes para os problemas da vida.

Foucault (1984) afirma que “existem momentos na vida que pensar diferente do que se pensa, e perceber diferentemente do que se vê, é indispensável para continuar a olhar ou refletir”. A frase do filósofo nos ajuda a pensar nossa tarefa como pessoas, cidadãos, profissionais. Tentar sempre promover o encontro inter-humano e o diálogo, o respeito a alteridade para que assim possamos desenvolver novos sentidos de vida, saídas criativas, novos modos de pensar, sentir e agir. Facilitar o acontecimento de novos sentidos que subvertam a ordem do que se impõe no contamporâneo: o individualismo, a competitividade, a hegemonia do pensar calculante e maquinador que visa resultados imediatos.

Referências

DEJOURS, Christophe. A banalização da injustiça social. Rio de Janeiro: FGV, 2003.

FOUCAULT, Michel. Moral e práticas de si. In: FOUCAULT, Michel. História da sexualidade II. Rio de Janeiro; Graal, 1984.

HEIDEGGER, Martin. A questão da técnica. In: HEIDEGGER, Martin. Ensaios e conferências. Petrópolis: Vozes, 2001.

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Volume 1- No 1- Janeiro/dezembro de 2011

MAY, Rollo. O homem a procura de si mesmo. Petrópolis: Vozes, 1980.

MORIN, Edgard. No cerne da crise planetária. In: BAUDRILLARD, J. e MORIN, E. A violência do mundo. Rio de Janeiro: Anima, 2004.

PEGORARO, Olinto. Introdução à ética contemporânea. Rio de janeiro: UAPÊ, 2005.

PERLS. Fritz. A abordagem gestáltica e a testemunha ocular da terapia. Rio de Janeiro: LTC, 1988.

SANTOS, Milton. Por uma outra globalização. Rio de Janeiro: Record, 2001.

ZIMMERMAN, Michael E. Confronto de Heidegger com a Modernidade - Tecnologia/ Política/ Arte. Lisboa: Instituto Piaget, 1990.

Sobre a Autora

Elizabeth da Costa Ribeiro

Psicóloga, psicoterapeuta e profa. da Universidade Gama Filho. Mestre em Filosofia, Especialista em Psicoterapia Existencial, Gestalt-terapia e Formação em Constelações Familiares. CRP 05/9123. E-mail:

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