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Mudança social na comunidade rural de Vila São Marcos - Aracoiaba

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(1)

.t1~UDANÇA

soe

IAL COMIJN IDAO[ t fJRAl DE VILA

s~o

MA'

eos

ARACOlABA

arfa do Carmo a Costa Oliveira

Trabalho aprésPI f do ao Departa~ ment de Cfência~ Sociais e Filo sofia da UFC como exigência para

a

obtenção de grau de bacharel I em Sociologia

(2)

"

o

A N C A E X A H I N A D O R A

Orientadora: ~rofes~ora, Te~esa Maria Frota Hag~ette Professor, Andr~ Haguette

(3)

o

F E R E C I M E N TOS

A

Populaçio de Vila sio Marcos, razio de ser deste estudo

A9 meu esposo

José Cordeiro de Oliveira.

Ao nosso f.ilho Ricardo.

Aos meus pais,

Elesbio Pio da Costa (falecldo) e Mari~ de lourdes da Costa,

.a9e nte s f a c i,1i tadore s do .meu crescimento.

(4)

A

orientadora, Professora Teresa Harl~ Frota Haguette, pela colaboraçio efetiva na elaboraçio deste trabalho.

A

Comunidade de Vila sio Marcos, pela aceitaç;o e apoio dado, nio só no momento da pesquisa e das entrevistas " mas no decurso de todo o trabalho, estando sempre disp~ nrvel a informar nos momentos de dúvidas.

~

.

.

Aos amigos, que se fizeram presentes de varIas maneIras, tanto nos momentos difTceis como de conquista dos obje-tivos que quisemos alcançar.

(5)

INOICE

PRIMEIRA PARTE

I - Introdução

t.l. O Problema em estudo e sua Importância 1.2. Caractérização do Hunicfpio 1.3. Caracterização da Comunidade 1 2 3 11- Procedimentos Metodolõgicos Segunda Parte

-111- A posse e o uso da terra IV- Costumes

V- Relações de produção e de trabalho

6

10 12

Terceira Parte

VI- Relações de poder

6.1. Níveis de dependência 6.2. O Comércio

6.3. Os meios de Comunicação -6.4. O papel das Instituições

14 . 14 19 24 26 Quarta Parte VI I Conclusão

VIII Referências Bibliográficas IX Anexos

30

33 35

(6)

- 1

-Primeira Parte

I • Introdução

1.1. O problema em estudo e sua import~ncia

O presente trabalho objetiva o estudo da Mudança Social ocorrida na Comunidade Rural de Vila são Marcos no municTpio de Aracolaba·Ce~

Durante os

7

anos de nossa atuação nesta comunidade, em nome da Instituição educativo-promoclonal MEB(Movimento de Educa~ çao de Base), podemos perceber que a população divide sua histg -ria em dois perTodoscom duas situaçSes distintaso Cada uma des· sas situações é caracterizada pela comu~idade em situação A e si-tuação B.

Na situação A- a comunidade coloca como era ~ sua vida de 1912 a 1956. Na situação B- como ficou a vida da comunidade de 1956 a 1976 em dianteo O perfodo de 1956

é

caracterizado pelo ap~ recJmento no local das primeiras mã~uinas e de inovações no setor de estradas e transportes.

A população de VIla

são

Marcos estabelece uma compara ~ ção entre o passado da comunidade e a vida atual. Discrimina as I

f

mudanças ocorridas bem como as causas Imediatas de tais mudançaso De 1956 para cá, afirma a comunidade: liAs coisas cria -\ ram fins comerciais, diminuiu a produção e o povo ficou mais po-bre". Percebe-se que as mu d an ça s ocorridas afetaram os costumes,

l

as crenças, o relacionamento Intra-comunitãrio e familiar. Surgi-ram novos padrões de vida e de relacionamento tanto entre os mem-bros da própria comunidade, como entre esta e a sociedade global.

~ a partir, portanto, de situações vivenciais, q '9 mar-caram de certo modo a vida da população, qu~ pretendemos dar um tratamento ciêntifico

3S

Investigações sobre a existência de mu~ dança social e dos níveis em que se processaram essas mudanças,se ao nTvel da Infra-estrutura, se da super~estrutura ou de ambas, •

(7)

dentro de uma abordagem crTtlca.

Neste trabalho deter-nos-emos nas causas determlnantes da mu-dança e procuraremos analisar, 1) a estrutura de poder local, 2} a estrutura fundlárla, 3) o papel das instituições e as possTveis m~ nifestações de mudança social em Vila são Marcos. Constitui-se ele de quatro partes que englobam 4 capftulos principais e uma

conclu-são final.

A primeira parte: introdução onde aborda os seguintes aspectos: o problema em estudo e sua importância; caracterização do municfpio, caracterização da comunidade e procedlment~metodolôgicos.

A segunda parte aborda; posse e uso da terra, costumes e relações· de produção e de trabalho.

Terceira parte: cont~m relaç~es de poder, nfveis de dependancia, o comércio, os meios de comunicações e o papel das instituições.

A quarta parte: cont~m a conclusão, referências bibliograficas e anexos.

1.2. Caracterização do Municfpio

E

a seguinte a localização do MunicTpio de Aracoiaba no qual Ó Oc~"Çô

-se Insere o distritoe.- ao qual pertence a Vila S. Marcos; é um mu-nicfplo da zona de Baturit~ cujos limites são: Baturité, Redenção, Pacajus, Cascavel, Morada Nova e QuixadâQ

o

MunicTpio tem uma ~rea de "10446 Km2, com um cl ima que varia de 27 a 33 graus centrTgadoso

Os principais mercados compradores dos produtos do municTpio' sao: Fortaleza, Baturit~, Redenção e Quixadã. A pecuária não tem

importância econômica j~ que se limita ao fornecimento de leite e de carne ã população local sem atividade de exportação.

O municfpio surgiu mediante a concessão de terras pelo siste-ma de Sesmaria em 1803. Após 177 anos da primeira concessão de ter ras no municTpio surgiu a comunidade de Vila são Marcos, em 1912, cujo nome representa uma homenagem

ã

famTlia Marcos, pelo fato de ser a mais antiga e deter todo o poder local.

(8)

Vila sio ~arcos, objeto deste trabalho, ~ uma comunidade rural

localizada no municTpio de Aracolaba, Esta

do do Ceará. distando 44 Km par. a s~de do munlcTplo e 103 para For taleza.

Situa-se na regl~o de sert~o e lImita com as seguintes locali-dades:

~rte: Andrenópoles SU'I: Curupira

Leste: Deserto

Oeste: Ocara e Lagoa Torta.

Vila sio Marcos tem uma população de 1.123 habitantes distribuldos' em 83 famflias, em uma ãrea de 850 hectares.

A terra é caracterizada como sendo de posse~ embora os possei-ros nio tenham nenhum documento.oficializando a posse.

A agricultura ~ du~lmentar e voltada para a subsistência. Al~ guns agricultores, principalmente os que t€m mais condições,

usam-Instrumentos de trabalho mais modernos, como trator, arado, cultiva dor e

utilizam adubo quTmico e Inseticidao

A produção principal da Vila ~ constituTda da mandioca, do al-godio, do milho e do feijão, tendo peso signiflcante pa~a ~lguns agricultores a produção de castanhas de caju. A comercialização dos produtos está condicionada ao modelo agrário do paTs, nele intera -gindo a presença do intermediário.

A situaçio da terra e consequentemente da produção e comercia-lizaçio tem ge~ado em Vila são Marcos ~ãiios problemas co~o migra -çio. diminuiçio do tamanho das posses e, em alguns casos, a perda -total da mesma. Tudo isso retrata deferenças bã·sicas no modo de vi-da das famTltas e na posiç~o que elas ocupam na sociedade global •

. Nota: As informações contidas nesta parte do trabalho tiveram como fonte nosso conhecimento adquirido da comunidade durante os 7 anos de convivência com a mesma e os documentos MEB-Fortaleza -1978 e relat5rios de uma pesquisa realizada pelo CERIS-1979o

(9)

II - PROCEDIMENTOS METODOLnGICOS

2.1. .UNIDADE ESPACIAL DE ANALISE

Cmunldade de Vila são Marcos" MunicTpio de Aracoiaba-Ce.

2.2. UNIDADE TEMPORAL DE ANALISE

Dada a existência de alguns fatores que contribuiram para a realização da pesquisa, tais como convivência com a população dura~ te um perfodo razoável de tempo, foi-nos poss1vel delimitar a unid~ de temporal a partir da criação de Vila são Marcos em 1912,at; 1976 em diante.

Essa unidade temporal minadas como Situação A (1912 diante), divisão essa que foi

foi dividida em duas situações, deno-- 1956) e Situação B (1956 - 1976 em

•• •

caracterizada pela propr.a comunldadeo

2.3. UNIVERSO:

O universo da pesquisa constltul-se de 83 famTlias de agri-cultores residentes em Vila são Marcos, perfazendo um tvtal de 1123 habita n t es,

2.3010 AMOSTRA:

A amostra foi constituTda de 20% das famTlias de Vila

s

ã

o •

Marcos, ou seja, 18 famTiias foram pesquisadaso A escolha foi feita aleatoriamente. Foi interessante notar que em cada casa havia uma pessoa que se manteve permanente na comunidade, ainda hoje estabel~ cendo uma ligação com as que são remanecentes da êpoca de sua

cria

-çao.

Vale salientar que al;m dos 20%, entramos em contato com vã rias pessoas: procuramos conversar com os mais velhos, com os filhos dos mais velhos, com a juventude e algumas crianças. Isso para per-ceber a ~aneira de pensar das diversas faixas de idade$ fa~e a rea-lidade de Vila são Marcos.

2.3 .2. DAD OS:

a) Secundãrios Utilizamos dados secundários procedentes de fontes bibliográficas que continham informações referentes a

(10)

mudan-ça social, ocupações das terras, no munlcTplo de Aracolaba - Ceará, onde está localizada a comunidade de Vila são Marcose

·b} Primários:

Os dados primãrlos foram coletados em trabalho de campo abra~ gendo todos os objetivos traçados nos limites do problema para checá-gem, complementação e atualização de algumas informações já dlsponT ~ vels e explicação do que se queria conhecer sobre a mudança social em Vila são Marcos.

2.3.3.

INSTRUMENTOS DE COLETA:

O primeiro instrumento utilizado foi o questionãrlo~com apl i-cação Individual (vide anexo). Para aplicação do mesmo ficamos na co· munidade durante

3

dias convivendo com a população. As questões em r~

lação

ã

terra, comercio e instrumentos de trabalho foi multo difTcil8 do pessoal -colocar a verdade, porque o~ que exploram são da mesma fa mTlla dos explorados e os mesmos têm medo de fornecer certos dados.T~

~ -mos certeza de que se fossem pessoas desconhecidas da comunidade nao

teriam conseguido todos os dados necessários.

Quando da organizaç~o dos dados, sentimos que as respostas es tavam incompletas e pobres. Para que o tr~balho n~o ficasse prejudica do ou falho, voltamos ~ comuni~ade e ficamos mais tr~~ias, para man -ter outro contato com as mesmas famllias, através de um outro instru -mento, que foi a entrevista individual (vide modelo em anexo) onde vã rias questões do questionário se faziam presentes na entrevista e co~ locadas de maneira diferente.

Para que o trabalho fosse realmente fun~amentado na realidade, resolvemos fazer uma outra entrevista, desta vez coletiva, onde a po-pulação como um todo participasse. Antes desta entrevista visitamos I várias famflias, explicamos a finalidade e,

ã

noite nos reunimos no I salão comunitárloo Para esta entrevista elaboramos llffi roteiro (vide I anexo). Foi multo Interessante o contato com a população através da entrevista coletiva; aT verificamos que os dados da entrevista indivi dual correspondlam exatamente aos dados da entrevista coletiva.

(11)

- 6 -De posse de todos os dados partimos para organlzá-los de acordo com o conteúdo de cada capTtulo. Terminado este momento, veto a an

á-lise dos mesmos, procurando sempre fundamentar através d9 quadro te5 rico e de outras leIturas feitas posteriormente. Nesta análise não perdemos de vista os objetivos propostos~

SEGUNDA PARTE

111. A POSSE E O USO DA TERRA

As terras de Vila são Marcos são consideradas pelos s~us mo radores como sendo de posse. Os primeIros posseiros de Vila são Mar-cos foram: João Felipe e Cassiano Correia dos Santos. Eles tinham o domTnio sobre todas as terras. João Fellpe possuía grandes extensões de terra também em Ocara e Capivara, localidades pertencentes ao mu-nicTplo de Aracoiaba. João Feltpe exercia tambr.~ o controle sobre t~ do o comércio de Ocara (localidade vlzlnha)o Vale salientar que, ta~ to João Fellpe como Casslano Correia não moravam em Vila são Marcos' e sim em Ocara.

O primeiro habitante de Vila são Marcos foi João Correia Do dó, filho de João Felipe. Posteriormente vieram Raimundo Marcos da Silva e Marcos Gomeso Este, pai de vários filhos (as) e em seguida I

Pedra Alves Cavalcante, vindo de Maranguape com

7

filhos (as). Os fl lhos de Marcos Gomes casaram-se com os filhos de Pedra Alves Caval -cante. Esta foi a orfgem do povoado que teve por base as duas famT -lias. Todos eles se estabeleceram em Vila são Marcos por ordem de Jo ão Fellpe e Cassiano Correia, pois para uma pessoa morar em Vila são Marcos, antes tinha que pedir permissão a ambos. Os mesmos indicavam o local onde a famTlia deveria situar sua casa, mas não determinavam o tamanho da posse da terra, que era determinada pelo próprio possel ro.

Segundo seus moradores, em 1912 não era difTcil conseguir • terra para morar e trabalharo Em Vila são Marcos todas as famTI ias • tinham suas posses mais ou menos do mesmo tamanho, isto

é,

de 10 a

(12)

A partir de 1956 e principalmente -em 1962, quando co~eçaram a falar em desenvolvimento, lia terra passou a ter valorl/(depoimento de uma das pessoas mais velhas da comunidade).

As pessoas que viajavam para Fortaleza, Baturit~, Redenç;otf~ ram ficando mais Informadas e começaram a ter o desejo de possuir I

mais terras, de aumentar a produção para transportar para outros mu

nicTpios, pois as estradas

j

ã

começavam a ser melhoradaso Foi nesta

época também (1956) que faleceu João Felipe (João Correia

jS

havia

falecido em 1950)0

Com a valorização das terras, a necessidade de se produzir

t i ~ d ~.

ma s e as possibilidades de uma ma or expansao o comerCIO, as p es-soas que jã tinham iniciado uma relação com outros municTpios, come

çaram- a querer ter poder sobre as terras e daT foram comprando a

posse de outras famTlias e tambem se apossando de outras. Chegaraml

até a tomar pedaços da posse de muita gente. Cercavam e diziam ser

sua aquela irea de terra. Essa situação causov muita confusão entre

os posseiros e dar começaram a surgir as dificuldades, uns querendo

ser mais do que os outros, uns dominando os outros. Começavam a

mu-dar a~ relações sociais, as pessoas começavam também a expressar a

as~imtlaç~o da ideologIa capitalista. Essas pessoas na medida que

foram adquirindo mais terras foram se tornando donos do comercio.Fo

ram feitas novas amizades com pessoas na sede do municTpio como Pre

feito, ~adre, Propriet~rios d~ terra e Delegado.

Nesta época (1962) muitas famTlias foram cercando suas posses

para terem mais segurançao Os que estavam adquirindo controle sobre

a terra começaram a comprar instrumentos de trabalho mais modernos'

como trator, arado etc. Outras pessoas jã trabalhavam para eles, o

que favorecia a uma maior produção e consequentemente-um aumento do

capital.

O capital, a terra e a força de trabalho, apresentam-se ao ca

pitalista, ao proprietário fundiãrio e ao operãrio, como fontes

di-ferentes dos teus respectivos rendimentos, que sio o lucro, a renda

fundiária e o sa lâr lov ll)

Segundo depoimento da população, para comprar uma posse de

(13)

- 8

-quem mais adquiriram terra. Eles chegavam na casa do posseiro e diziam que estavam Interessados em comprar parte de sua posse. E logo faziam

uma oferta em dlnhelroo Se a oferta fosse boa o negócio (venda) já es-tava feito. Tudo era verbalmente, Em seguida mandavam cercar a terra e a mesma era considerada sua, Vale salientar que não havia escritura pois essas terras eram devolutas, Nenhuma pessoa da comunidade sabe I~ formar a respeito de escritura. Afirma-se que João Felipe e Cassiano I Correia foram os primeiros posseiros. Os mesmos diziam sempre que aque Ias terras eram devolutaso E daf

é

que eles como primeiros posseiros

estabeleceram poder sobre toda ~rea de terra, que

e

de 853 hectares, Hoje a situação da terra esta diferente, Como vimos de 1912 at~

1956 as posse.~ de terra eram mais ou menos do mesmo tamanho. As pes -soas tinham condições mais ou menos iguais. Atualmente a propriedade •

da terra está concentraóa nas mãos de 5 pessoaso A grande maioria pos -sui entre 2 a.10 hectares. Os que concentram a propriedade da terra,s~ mente eles, têm acesso ao banco, podem guardar a produção para venderl

por preços mais altos, s~o donos do comlrcio, são amigos dos polTtlcos;

têm armazém para guardar a produção, compram os produtos na folha de

grande parte dos agricultores e recebem financiamento e apoto de todos os lados: da EHATERCE, da Cooperativa, do B~nco, da Prefeitura,etco Sõ eles conseguem com que os filhos estudem em Aracoiaba, Baturite e em

Fortaleza.

A maioria tem dificuldades de colocar seus filhos ate na escola' da Prefeitura porque as condições econômicas não permitemo Vemos que, se cinco famrlias têm todas as condições de educar seus filhos em Batu rité, Fortaleza, etco,

e

porque estão explorando uma maioria, não es-tão devolvendo ao trabalhoro que ele tem direito. Segundo Marx, o capl tal compra a força de trabalho e paga em troca um salário, um salário' que não é justo ao trabalhadoro O operário produz um novo valor que

:nao é para ele e sim para o proprlet;rio.,

Podemos verificar ainda que as Instltulç~es estão ao :ado da

que-les que detém o poder econômico e consequentemente o polTtico, isto p~ ra que o capital se reproduza sempre mais. Aos pobres todos os direi -tos são negados; estes apenas vendem sua força de trabalho.

(14)

~ significativo perceber que a concentraç;o das terras nas m;os' de 5 famTlias gerou uma diferença acentuada na população. Vejamos:Exi~

te uma maioria que tem pequenos pedaços de terras, parte da população' que só tem o lugar para morar. Estes são forçados pela própria realtd~

de em que vivem a trabalhar .., arrendados ou na di~rta. Muitos emigram'

para outros lugares ã procura de melhores condiçõeso

Verificamos tambem que outra causa da diminuição das terras foi'

a divisão entre a própria famTl:a, Exemplo: um pai de famTlla que ti-vesse a posse de 7 hectares e tivesse 10 filhos, os 7 hectares Iam sen

do divTdldos com os 10 filhos e assim a terra para trabalhar foi dim i-nuindo e como não exlste~mais terras )ara se apossarem, essas pessoas·

trabalham para os que têm muitas terras,

~ notório ser a estrutura Agr;ria do paTs caracterizada por uma alta concentração da propriedade fundiãriao(2) O controle sobre os meios'de produção não apenas determina a posição de dominação ou su -bordlnação de cada grupo na sociedade, como tambem a estrutura social pOT inteiro dentro da qu~l tais relaç3es

iSo

exercid~$.

Se ftzermos uma relação dos acontecimentos de Vila são Marcos I

de 1956 - 1962, verificaremsque não são fatos isolados das transforma çSes ocorridas no PaTs. Sa~emos que de 1956 - 1962, assumiu os desti-nos do Pafs o Presidente Jucel ino Kubtescheko Foi ar que as idéias de desenvolvimento e Industrialização foram divulgadas mais profundamen

-te em todo o PaTs.

r

neste momento, como afirma a população de Vila são Marcos,que começam r ocorrer mudanças tanto em relaç;o

ã

terra, como em relaç;o aos Instrumentos de trabalho mais modernos. Surgiram tambem as e stra-das dando maior expansão ao comercio localo Vemos, portanto, que os

fatos colocados pela população vêm confirmar que não são isolados e nem acontecem por acaso, mas estão relacionados com a sociedade glo -balo

(15)

- 10 •

IV - COSTUMES

A comunidade divide sua hist8rla em duas epocas distintas:

Situação A:- a comunidade coloca como era sua vida de 1912 - 1956.Na

situação B:- como ficou a vida da comunidade de 1956 - 1962 em

dian-te

Na Situação A: Segundo depoimento da população, "0 pessoal

era multo unido, junto cortava madeira, fazia a casa uns dos outros,

pescavam, caçavam e dividiam com todas as famTI ias os resultados da

pesca e da caça~

COffi)raVam pouca coisao Somente aquIlo que eles não podiam'

produzir como 6leo, sal, açucar, alho, pimenta e cafl. Os trabalhos'

de roça eram feitos todos na base do mutlrãoo O dono do roçado

mata-va um porco ou um bode e o mesmo era dividido com todos. Quando se

casava uma pessoa, era uma festa multo grande, todas as famTlias

.

...•

eram convidadas e quase nao havia despesaso

Vale salientar que as famflias fabricavam quase tudo de

que necessitavam: sabão, louças, iluminação da casa, tecidos,

enfei-tes para as roupas, óleo, formas de acabar com as pragas e doenças •

da lavoura e a medicina era toda popular.

"Quando um trabalhador adoecia os outros cuidavam do seu

roçado" (depo imen to de um ag ri eu 1tor ) (;

Segundo depoimento de uma senhora que tem 83 anos, lias

fa-mílias eram muito unidas e ninguem sabia fazer nada sozinho,tinha di

flculdades porque tudo era difTcil, mas eram muito fortes porque

vi-viam todos como irmãos".

Na Situação B: O perTodo de 1956 e caracterizado pelo

apa-recimento das primeiras m~quinas e Inovaç~es no setor de transportes •

.As roupas passaram a ser feItas em m~quln~s, o milh passou a ser

moído no moinho, as casas de farinha passaram a funcionar a motor e

nao mais através da força do homemo DaT por diante as coisas

começa-ram a mudar. Em 1962 j~ se registraram mudanças em relação

ã

terra e

ao comércio. O'nTvel de vida das famTlias tambem j~ não era o mesmo

porque as condiç5es j~ estavam diferenciadaso Aquelas de mais

(16)

e pilar arroz. Os produtos passaram a ser transportados para outros

lugares através de carro.

Na medida que as pessoas que jã tinham mais condições foram se rela

cionando com outros municlpios, a comunidade foi tomando fisionomia

diferente. As coisas foram deixando de ser feitas em comum para s~

-rem feitas lnd lv lduaIs , (3) "As coisas criaram fins comerciais, não

se fala mais em troca e sim em dinheiro. Hoje tudo ~ com exploraçio~

Podemos observar que, antes a populaç~o de Vila são Marcos

produzia quase tudo que era necessário para o seu consumo. Na med

i-da que foi surgindo o processo industrializador a população foi

su-bstiturndo ós produtos artesanais por bens industriais. Isso fez

com que a população anulasse seu poder criativo e pass~sse a

consu-mir tudo o que vem da cidade. A id~ia de consumir se fortifica cada

vez mais através dos meios de comunicação, principalmente do rádioo

Como vemos, antes tudo era feito em comum, não era necessário

reunião para que o povo fosse unidoo Hoje se vive de reuniões e é

difTcil o pessoal compreender ~ sentido da uniãoo Esta; uma das

grandes dificuldades encontradas pelo grupo que está mais

ã

frente'

do trabalho da comunidade, porque a maioria só pensa em si próprio.

As propostas do trabalho são de que haja a participação de todos,de

que os pobres sejam unidos, etc. Por outro lado, está o sistema com

todo um aparato para que haja divisão entre todos e para que cada I

um cresça individualmenteo Esta ideologia está dentro de todos, não

por culpa própria, mas por causa do sistema econômico e polTtico I

que i organizado para que as coisas se processem assim. Esta

situa-çao permite que haja dominados e dominadores.

Outra constatação feita em relação ~ população; que antes, I

quando havia uma festa de casamento ou batizado, todos eram convida

dos. Hoje, os convites são feitos ~quelas pessoas que t;m as mesmas

condições econômlcaso são feitos por classe. A"forma de como a

so-ciedade foi sendo organizada conseguiu substituir os valores da co

(17)

- 12

-v -

RELAÇOES DE PRODUÇ~O E DE TRABALHO

~ - 1

Segundo depoimento da populaçao de Vila Sao Marcos as re

a-çoes de trabalho são de exploração. Os que det~m a propriedade da te~

ra e os instrumentos de trabalho pagam o dia de serviço da maneira

que entendam. Na compra dos produtos o preço ~ determinado não pelo

trabalhador e sim pelo proprietário. E assim os proprietários vão fi

-cando ricos a custa do suor dos pobres.

O homem do campo vem atravessando três anos de seca ( 1978,

~

1979 e 1980 ). Essa situação vem contribuir para aumentar o poder dos

que vivem em boas condiç3es e piorar .'situação do pobre. O apoio do

'Governo i para os ricos. Todos os proprietários que fizeram e

mpr~sti-mos, estes foram considerados a fundo perdido pelo Estado. Este mesmo

Governo que dispensa o pagamento ao Banco das dTvidas dos propriet~

-rios, permite que se pague Cr$ 82,00 ao agricultor pobre para traba

-lhar o dia todo, geralmente na terra do patrão.

Um dos crit;rios' da polTtica econ3mica do Governo ~ o apoio

aos proprietárIos para que os mesmos possam ajudar seus ~rabalhadoreso

Vemos ar uma contradição muito grande porque da forma que a sociedade

está organizada jamais o patrão irá dividir com seus trabalhadores os

resultados obtidos pela força de trabalho. Isto não ê possTvel porque

os interesses do patrão são opostos ao do trabalhadoro Enquanto o tra

balhador quer ganhar mais, o patrão quer pagar menos.

A maioria dos agricultores de Vila são Marcos tiveram pouca

produção, que foi dividida ao meio, metade para'o consumo da famTliaD

e metade para vender, o que significava muito poucOo A maioria

produziu ~e 2 a 3 sacos de 60 quilos de cada produto (m!lho, feijão e

farinha de mandioca)o

No ano passado (1979) muitos agricultores se alistaram no

Plano de Emergênciao Cada trabalhador ganhava uma diária de Cr$ 76,00.

As mulheres e os menores não se alistavam porque o GESCAPE não aceita

(18)

o

dinheiro do Plano de Emergência era somente para não morrer de fome

e criar uma imágem de que o Governo estava Interessado em ajudar a re

solver a situação, quando se observa que não

é

bem assim' "porque to

-das as medidas tomadas por todos os Governos em relação ~ seca sempre

foram de Emergênclall(palavra de Dom Fragoso no Encontro dos bispos em

limoeiro do Norte, Novembro, 1980).

Em 1979, os agricultores de Vila são Marcos plantaram feijão,ml

lho e mandioca. Poucos plantaram algodãoo Quanto i semente quase

nin-guém tinha, somente os proprietários. A grande maioria conseguiu atra

vés do Centro Comunitário que tinha guardado parte da produção da ro

-ça comunitária. A semente foi dividida com os mais necessitad0s,

~o plantio de 1979, 13 das 18 famTlias entrevistadas usaram tra

tor, arado e cultlvadoro O trator e o arado foram alugados, o cultiva

dor era próprio. 5 usaram enxada, foice, machado e chibanca.

Segundo os agricultores, em termos de pr~duçio, existe uma dlfe

rença multo grande entre os que usam instrumentos mais modernos e os

que usam somente Instrumentos atrasadoso Os primeiros usam também adu

bo qurmico e inseticidas. Os que não usam é porque as condições econô

mlcas não permitem, mesmo sendo financiados para pagar na safra ou de

acordo com as condiçõeso

Os instrumentos utilizados desde antigamente são considerados I

por todos os agricultores como atrasados e os novos instruementos,ad~

bos e Inseticidas, como fatores de aumento da produção e de facilita

-çao do trabalho.

Podemos constatar que os tratores e arados pertencem às 5

fam1-lias que concentram a propriedade da terrao Os que possuem cultivador

e compram adubos e inseticidas conseguem através de financiamento da

Campanha da Solidariedade da Arquidiocese de Fortaleza. A mesm~ só fi

nancia para agricultores pobres que não podem comprar no comercio e

não têm acesso ao Banco. Mas ainda rest~m agricultores pobres que não

podem comprar um rolo de arame porque trabalham na diária e o qu~ ga

-nham não dã nem para as despesas da famflia. 10% destes não possuem

(19)

- i4

-No ano passado (1979) os agricultores de Vila são Marcos recebe

ram através da Campanha da Solidariedade da Arquidiocese, financiame~

to de arame, cultivador, dinheiro, adubo, carroça e animalo O pagame~

to é feito na safrao Caso não haja safra, o prazo e adiado. Para os

pequenos agricultores os financiamentos da Campanha têm vantagens po~

que o pagamento e de acordo com as condições dos agricultoreso O

pla-no de pagamento é proposto pelo agricultor. Desta forma os

agriculto-res pobres têm condições de possuir o seu cultivador, pulverizador, I

comprar um pouco de aduboo Outra vantagem e que não existe burocracia,

isto facilita muito. Todoocontrole e feito com recibos e ninguem tem

.

~

preJulzo.

Com a deficiente safra de 1979 )s agricultores estão

conseguin-do manter suas famTlias da seguinte maneira: A maioria continua ins

-crita no Plano de Emergência, atualmente ganhando uma diária de Cr$

82,00. Como já falamos, em 1979 essa diária era de Cr$ 76,00. De um

ano para o outro houve um aumento de Cr$ 6,00, quando o preço dos pro

dutos de primeira necessidade subiram assustadoramente. Essa diaria I

de Cr$ 82,00, não significa nada porque

sg

o feijão est~ de Cr$90,OOO

o quilo, 250 g de cafe a Cr$ 45,00, e assim por dianteo

Podemos constatar atraves de depoimentos dos agricultores de Vi

Ia são Marcos que trabalham na Emergência, que o patrão vai ser o

grande beneficiadoo Quando chegar o inverno ele tem terra pronta para

plantar e o pobre vai ficar mais pobre, porque enquantd trabalha para

o patrão sua terra está no matoo Como a ajuda do Governo não da nem

~ara comprar um quilo de feijão, os agricultores são obrigados, vez

por outra, a vender uma galinha, um porco, ou na epoca do cajü,os que

têm cajueiros, conseguem algum dinheiro vendendo a castanha. As

famT-lias que têm filhos em Fortaleza ou em são Paulo recebem deles uma

ajuda esporadicamente.

VI - CAPTTULO - RELAÇ~ES DE PODER

601. NTvEIS DE DEPENDtNCfA

De 1912 ate 1950 e 1956, os moradores de Vila sio Marcos

de-pendiam muito de Cassiano Jose Correia que era Delegado, Chefe Polftl

(20)

Outra pessoa considerada como' autoridade era João Correia Fellpe,

que tinha o tftulo de Coronel: detinha o controle sobre as terras de Vi

Ia são Marcos e sobre o comercio de Ocara, Distrito vizinho. Como já

foi citado, para uma pessoa se apossar de uma ãrea de terra em Vila S.

Marcos, antes tinha que pedir permissão a eles. O relacionamento do

po-vo com eles era um relacionamento de obedl~ncla, do medo. O povo tinha

que obedecer as suas leis, principalmente de João Felipe. Este poder

que tinham estendeu·se a todos os campos de atividade, inclusive ao r

e-ligioso, como por exemplo: Nenhu~ crente (Protestante) podia morar na

Vila são Marcos sõtre.lltedepois da morte de João Felipe em 1956 e de Jose

Correia em 1950. Nenhum posseiro podia vender parte de suas posses, so·

mente quando eles morreram foi que as posses passaram a ser vendidas.

Em relação

ã

polTtica, os partidos que o povo conhecia eram UDN

e PSD. UDN era o partido liderado pelos dois Chefes PolTticos, Cassiano

José Correira e João Fe!lpeo Se o povo não votasse nos candidatos apon

-tados por eles, perdia a amizadeo No dia da eleição se eles encontras·

sem alguma pessoa com chapa (cedula) diferente das que eles haviam dis·

triburdo~., rasgavam-na e obrigavam a pessoa a votar no candidato deles.

Muita gente deixava de fazer sua vontade para fazer a deies, do cont

rá-rio havia confusão e era capaz da pessoa ser expulsa do lugar. Como

eles t·tnham o controle sobre as terras e o comercio, quem n~o seguisse'

a vontade deles ficava privado de comprar as mercadorias necessárias, I

porque eles não cediam em nada.' Essa era a forma de castigo e o povo Da

'-ra não se submeter a essa situação praticava tudo que eles queriam.

Ainda em relaçã6 ~ polTtica, os moradores afirmam que hoje está •

muito diferente, o povo vota em quem acha melhor. O ABC das Eleições,d~

cumento elaborado pela Arquidlocese de Fortaleza, ajudou a elevar a

consciência de muita genteo Antigamente se votava no partido, não se

procurava saber se os candidatos eram bons. Hoje, muita gente quer

sa-ber se o candidato tem interesse pelo povoo Ainda existe muita coisa er

rada porque tudo é feito com Interesse e a polTtlca está em tudo. Hoje

há mais e~clarectmento do que antigamente. Mas se as pessoa~ não forem

vivas, afirmam os moradores, os polTticos enganam os agricultores na

conversa e atraves de certos favores, como por exemplo: consultas, medi

(21)

- 16

-Com a morte de João Fellpe e Casslano Correia, as coisas começaram

~

a mudar. Surgiram outros comerciantes, outras pessoas tambem começaram a

querer obter o controle sobre as famTlias de Vila são Marcos. Estes

que-riam aumentar suas posses e conseguirem tanto atraves de compra quanto I

tomandolGri lagem).Cercavam e diziam ser sua aquela área de terra. Foi a

partir daT que a situação da terra e consequentemente da vIda das pessoa

começou a mudar. Vale salientar que não foi somente a morte de João Feli

pe e Casslano Correia que contribuiu para que ocorressem mudanças em

re-lação ã terra, comercio, comportamento das pessoas, etc. Mas foi toda

uma situação polTtica e econSmica que vivia o PaTs naquele momento.Na d!

cada de 1950, o Brasil embarcou na canoa da industrialização acelerada.

O governo Juscelino Kubschek resolveu atrair a Ind~stria Autom~bilistica

para cá. Os carros obviamente precisavam ter onde circular. Partiu-se,e~

tão, para multiplicação da rede de estradas. Foi neste mesmo perTodo que

surgiram as estradas para os municTpios vizinhos de Quixadã, Baturlté,R~

denção e melhoramento da estrada para Fortaleza. Tudo isso favoreceu a

uma maior expansão do comercio local, e o desejo, principalmente dos pr~

prletârios, de produzirem sempre mais para transportar para outros muni

-cTpios. A fim de que houvesse uma maior produção, muita gente começou a

ser explorada pelos que começavam a deter o controle das terras e do

co-mércio. Muitos agricultores já começavam a trabalhar na diãria e o pag

a-mento não correspondia ao trabalho feito, ou seja, trabalhavam multo e

recebiam pouco. E, no entanto, naquele dia, o trabalhador havia dado uma

boa produção para o proprietário. As relações ar, já estavam ao nTvel de

explorador e explorado.

Poder-se-ia perguntar: Essa situação acontece por acaso? Vemos que

não. Tudo isso é resultado de um processo social assumido pela classe do

minante.IIToda essa situação longe de ser resultante de fatores pSicológl.

cos ou de visões peculiares do mundo, o modo de vida roceiro e suas

atu-ais condições existenciais derivam basicamente de condicionamentos histõ

ricos e de "relações de poder que perneiam a Interação entre eles e a eli

te localll.(Martins 1978: 69).

Para os moradores de V i 1a são Harcos as pessoas mais importantes I

-

têm favores de necess Id a d e ,

sao as que recursos e as que prestam em caso

As que têm recursos sao

..,

os patroes

e os comerciantes que normalmente sao

-Os prestam favores

..•

Presidente do Sindicato dos

(22)

balhadores Rurais que tem ajudado muitos velhos a se aposentarem. Em caso de doença ele procura encaminhar o doent~ o mais breve possTvel para o hospital de Aracoiaba, Baturfte ou Fortaleza. Tem ,ajudado mui tos agricultores a conhecer melhor o Estatuto da Terra.

Os patrões são importantes porque fornecem as migalhas, vendem

fiado, enchem a cabeça dos pobres de conversa bonita. Pelo fato de terem dinheiro, multa gente respeita e obedece. O relacionamento da maioria da população com eles e muito superficialt se dando mais no

campo comercial: vender o produtot receber o dinheiro do dia de

tra-balho, pagar a conta da bodegat pedir dinheiro emprestadot etc.~ re-"

almente um relacionamento de patrão e empregado. Em relação ao Pres! dente do Sindicato e diferente: os agricultores v~o a sua casa,tomam café, almoçam, dormem, conversam durante muito tempo a respeito dos problemas da roça, da terra, da safra, etc. Fica claro que pertencem a uma mesma classe, embora e1e tenha um pouco mais de terra ou de pr~ dução, mas os problemas básicos são os mesmos. ~ diferente dos pa~ trões cujos interesses são opostos~~endo possTvel um relacionamento· de igual para Igual, porque enquanto o agricultor está querendo ga-nhar una diária maior, um melhor preço para os produtos, o patrão e~ tã querendo pagar o menor preço pela diária e um menor preço pelos I

produtos. Os interesses são antagônicos, as classes são diferentes e a (4) forma das relações são condicionadas pela produção.

~ importante observar que a maiorIa das famTllas, escolhe como padrinhos dos seus filhos, os comerciantes, os proprietários, o Pre-sidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais e os avós. Os avós por questão de tradição; o Presidente do Sindicato porque devem favores; os patrões e comerciantes, porque no dia que precisar de uma ajuda I

para a criança, esta ajuda está garantida porque eles t~m recursos. Vemos ar, que as relações do compadrlo são relações de interesses econômicos e polTtlcos. O pobre não representa vantagem porque não I oferece gar~ntia nenhuma para o afilhado e o pai. Toda essa relação' de compadrio aumenta o poder e o controle sobre a 'classe "daqueles que não detem nenhum poder, ou seja,dos pequenos proprietários e dos sem terra.Dever-se-ia perguntar até que ponto o Presidente do Sindi-cato dos Trabalhadores Rurais tambem não fomenta essa ideologia do I compadrio através dos favores prestados aos trabalhadores?

(23)

- 18

-Os agricultores de Vila sZo Marcos e localidades vizinhas não discordam das idéias ou decisões do Presidente do Sindicato. Atravês da confiança que o povo deposita nele o seu poder vai crescendo fren te aos trabalhadores rurais, ao mesmo temf,0 que ele vai sedimentando

o~\.e.\ (J,

Fuaposlç~o de

lrder

.

~

Faciltta-lhe~certos serviços na s~de do muni cfpto, como hospital, transportes, etc. Vemos que todo o interesse • do Prefeito em relação ao Sindicato dos Trabalhadores Rurais ~ uma • maneira de ele controlar a ação do Sindicato e o Presidente seria co mo que instrumentalizado por e le..; para que toda liderança seja exer cida de modo que beneficie o poder polTtico-econômico e como o povo confia cegamente no Presidente do Sindicato, com muita facilidade p~ deri ser ludibriado. Vale salientar que não s8 o MEB e como a equipe de Aratuba já começam a discutir este problema com a Diretoria a fim de que ela saiba se situaro Não

é

tão fácil porque a mesma tem dificuldade de compreender todo o jogo do Sistema e ver que os Slndi catos est~o mesmo atrelados ao Estado e da! a limitação de sua ação, porque o controle do Sindicato não est~ nas mãos do trabalhador e sim do Estado. As linhas de ação não são traçadas pelo trabalhador e '

sim pelos que detêm o poder po lÍ tlc o e econêm lc o , Na medida em que os 'Sindicatos começam a se organizar aparecem claramente as contradi -çõe~ como por exemplo: é um ~rgão que repr~senta a classe dos agrl -cultores mas não são eles quem mandam. No caso de Aracoiaba, o Presl dente anterior passou 15 anos rio poder. A partir de agosto deste ano

(1980) as Delegacias conseguiram colocar um outro do qual estamos f~

lando. Está nova Diretoria, mesmo com pespectivas de fazer um Sindi-cato diferente, esti encontrando muitas dificuldades, porque se dep~ rou com uma burocracia que deixa pouco tempo para ir às bases discu-tir com os agricultores os seus problemaso Como ,se vê ~ tudo muito' bem planejado. A burocracia j~ foi criada justamente pela classe do· minante, de modo que torne difTcl1 a participação e compreensão do

povo de todo o aparato burocr~tico.

Podemos observar ainda como está sendo difTcil para a Direto~ ria atual do Sindicato dos Trabalhadores Rurais se relacionar com Fe deração, Delegacia Regional do Trabalho, Banco do Brasil, etc. A di-ferença começa a partir da linguagem tecnica, que os agricultores n~o compreendem. Com este recurso essas organizações começam a

(24)

enga-nar, multas vezes ~m problema que poderia ser resolvido num expediente. O Presidente e o Secret~rlo têm que Ir a Fortaleza, 2 a 3 vezes, e is-so vai distanciando a Diretoria das Delegacias e das prioridades traç~

das com os agricultores, porque o tempo ~ todo ocupado com a burocra

-ela. E como dizia o atual SecretárIo do Sindicato dos Trabalhadores Ru

rais, "Não é tão fácil criar um Sindicato livre porque tem muito barão torcendo para que isso não aconteça, e os agricultores ainda estão de-sorganizados e são multo medrosos"o A Diretoria do Sindicato começa a observar, através de fatos concretos, que o poder polftico e econômico

é multo mais forte do que eles imaginavam. 6.2. Comércio:

Conforme depoimento dos moradores, todoocomercio pertencia aJo·

ao Felipe dos Santos. Ele fornecia mercadoria para todos os lugares vl zlnhos se abastecendo (comprava mercadoria) em Redenção. As famtlias I

compravam a dinheiro, quando tinham. Outros compravam fiado para pagar

com a safra ou trocavam muitos produtos por sal, querosene, pimenta e

outros. Depois que João Fellpe morreu, surgiram muitos comercianteso ' Foi tan~ém nesta época (1956) que as coisas começaram a ter valoro Foi a partir dar que Vila são Marcos começou a se relacionar com outros m~

nicfpios, como Redenção, Baturlte, Fortaleza e Quixadã, porque a pró -pria situação polTtica e econômica que vivia o PaTs favoreceu a uma multiplicação das redes de est~adas para os carros circularem e uma

maior expansão do comercio. Aos poucos o sistema de troca(escambo) foi desaparecendo, e atualmente tudo e na base do dinheiro. Existem vários comercianteso O maior deles e o Tarcfsio, filho de um dos proprietã- I rios e sobrinho do maior proprietãrioo O Tarcisio é o único que possui Inscrição do ICM. Ele compra as mercadorias em Fortaleza e atraves de um grande comerciante de Ideal (localidade vlsinha) que e também inter mediária. Esse comerciante compra os produtos e leva diretamente para as Fábricas em Fortaleza, Quixadã, Caucala e Aracati. Ele tanto compra os produtos na comunidade como abastece os comerciantes que não têm

Inscrição e por isso não podem comprar em Fortaleza. Muitos agriculto

-res vendem seus produtos ao comerciante de Ideal que leva para Fortal~

za. Os produtos são levados para as seguintes: Brasil Oiticica, Cione, Cajubrás e outras Indústrias de Caucaia e Aracati.

(25)

•• /. (I .•

o

maior relacionamento do com~rclo local com outros municTpios se

di

atravBs deste grande comerciante. Os produtos mais comerclalizados I

sio: fetjio, castanha de caju, farinha de mandioca e milho. Vemos que

somente o maior comerciante local, pode ~omprar diretamente em Fortale

-za porque tem a inscriçio no leM, tem acesso aos grandes centros comer~

ciais e por isso é quem mais tem poder e mais dominao A maioria rlos •

agricultores vende". seus produtos a ele, N30 existe nenhuma organlzaçio

que possa proteger 05 produtos dos pequenos agricultoreso

Muitos agricultores eram sScios d~ Cooperativa de Aracoiaba, mas

desistiram porque~~no passado (1979) ela não devolveu o retorno para os

"<I

-agricultores p dai eles nao acreditam mais neste tipo de CooperativH=o~

de tudo é decidido pela Diretoriao Eles acham que uma Cooperativa AgrfM

cola deve ser dirigida por agricultores pobres e que deve ser muito bem

organizada, para que todos participem das decis3es. Constata-se cada

vez mais que as instituições foram criadas não para servir ao pessoal

de baixa rend a e sim aos poderosos. O t lpo de Cooperativa que existe PE.,

ra agricultores esta beneficiando os patrões. Essa situação de falta de

apoio ao pequeno agricultor obriga-o a entregar sua produção nesta es~

trutura de comercialização, estrutura que exclui a participaç;o do pro

-·dqtor na estipulação do preço. Vejamos como esta situação se deu em

Vi-la sio Marcos no ano passado (1979)0 A maioria das pessoas vende~ seusl

produtos na folha, ao comercian~e local (TarcTsio) e ao intermedilrio ,

por um preço mu!to baixo.(S) 05 que venderam na folha ~firmam que ti

ve-ram roçado que foi vendido a Cr$ 1QOOO~OOo Os que venderam produtos, o

fizeram da seguinte maneira:

(o) • Fefjão •• o.ooooo,o.o,QOOoCr$

• Farinha de mandiocaooo.oCr$

~...e.reçoJ:.sperado de cada ..eroduto:

• Farinha de mandioca~ooQ9Cr$

• Castanha de caju09'0~OOOCr$

800tOO a saca de 60 quilos 770,00 a saca de 60 quilos 300,00 a saca de 60 qu l lo s 27,00 o qu i10 3~OOO,OO a saca de 60 q, i10$ 20000,00 a saca de 60 qu ilo s 10000$00 a saca de 60 quilos 32,00 o qu i 10

(26)

o

pre~do mercado:

• Feijão ••••••• o.o.ooo.o ••oo.oo.oooo •• Cr$ 30500,00

• Farinha de mandioca.oo.oooooo~oo.o.oCr$ 2~300,00

• Milhoo ••• o ••• o.o ••••• oooo.ooooooooooCr$ 1.250,00

• Castanha de caju •• o.ooooooo •• o ••• oo.Cr$ 35,00

Diferença entre o preço que foi vendido e o esperado:

• Feijão ••• o.o.ooo •••• ooo ••••• ooooooooCr$ 2.200,00

• Farinha de mandioca.oooooooooo~oooooCr$ 1.300,00

• Milhoo.o.o.o.o ••••• oooo.oo •• oooooo.oCr$ 700,00

• Cast~nha de caju •••• oooooooo •• ooooooCr$ 5,00

Diferença entre o preço que foi vendido e o pre~o do mercado:

Feij~o of o. o•o.o •o o o•• oooI'oI' • o oo00 o o •Cr $ 2o7 OO, O O

• Farinhy de mandtocaoooooooo ••• ~.o.ooCr$ 1.530,00,

• Milho ••• o.o.o ••• o •• oooo. o••• oo ••• oooCr$ 950,00

• Castanha de cajuoooooooo"'OOOOOOQ~oCr$ 8,00

Basta olharmos os dados para compree~der a situação do pequeno I

agricultor ou do homem sem terra.

d

r··...

d • 1 d

No ce s o ic r eij ao vemos que ca a pequeno aq rrcu to r per eu em c-,!

da saca de 60 quilos Cr$ 2.700,000 Ele que gastou parte de suas energl

as e que contribuiu para que houvesse essa produção j~ explorada. Deu

um lucro de Cr$ 2.700,00 para os grandes comerciantes e industriais.E~

te lucro que deveria ser do agricultor

e

que vai cada vez mais aumen

-tar o capital dos comerciantes e industriais. ~ 'desta forma que os po

-derosos continuam mais fortes e os pobres mais fracos e fica claro que

a riqueza deles é sugada do trabalho do pobre. Esta

e

a dinâmica do

sistema capitalista, que tem como lei fundamental o lucro e para que

ha ja 1u c r o é n e ces5âr io que h aja exp1o ração d a f orça d e tri:'!:>é!1hc(rnais

-valia). Esta não é uma situação vivida apenas por Vila são Marcos, mas

esti relacionada com o sistema globalo Podemos verificar que os oper~

-rios das Indústrias vivem essa nossa situação de exploração~ onde todo

(27)

- 22

-recebem apenas um salário para continuar vivos e reproduzir sua força de

trabalho. Todo lucro que deveria ser deles, porque foram eles que trab

a-lharam, fica para o dono das Ir.d~strlas. Assim é que conseguem se fortl~

ficar cada vez mais.

r

importante observar que, os que dominam no

\

e

ca

.

~

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mp

o

o

-

',

",

<,o

",e- _••

estão relacionados com os mesmos que dominam na cidade. O sistema~e o

mesmo.

Os pequenos proprietarios e produtores sem terra, em geral, estão

marginalizados do credito agrTcola oficial, fato que, ao lado da depen

-dincia da terra, os leva a se vincularém aos grandes proprietários de

terra, intermediários e comerciantes para conseguir recursos necessarios

i produçio. Com isto comprometem desde logo sua safra que tem que ser e~

tregue como pagamento das dTvidas contraTdas, fato que os leva a auferir

sempre preços muito baixos pelos produtos vendidos. Uma consequêncla di

-reta desta situação de depend~ncia em relaç;6 5 terra, ao cr&dito e 5

come rc la l lzaç âo é o baixo nTvel de renda desses pequenos produtores que

vivem apenas ao nTvel da sobreviv~ncia. Em virtude disso as condições de

saúde dessa população são muito precarias, provocando um alto Tndice de

mortalidade infantil, pois, como se sabe, os serviços de saúde que são

oferecidos no meio rural, alem de insuficientes, são de baixa qualidade,

Em Vila são Marcos a população conta apenas com o Funrural na sede do mu

nicfpio e com uma pequena Farmacinha Comunitária que atende apenas a

ca-sos de socorros de urgências e aplicações de injeção.

Uma outra consequ~ncia direta dessa situação ê o problema da Migr~

ção. Saiu muita gente de Vila são Marcos em 1958 e 1970, isto é,em anos

de seca o pessoal sai muito

ã

procura de melhores condições de vida. As

pessoas saem para são Paulo e Fortaleza. Normalmente quem sai são os

ho-mens pelo fato de serem eles que assumem mais diretamente as despesas da

famflia. Dos que sairam muitos já voltaram porque os empregos não são se

guros, os salários são baixos, dando só para pagar o ônibus. Antes de sa

irem pensavam que logo ao chegar em Fortaleza ou são Paulo conseguiriaml

emprego e em seguida mandariam buscar a famfliao Acontece que em pouco •

tempo eles voltam desiludidos com a cidadeo Só conseguem adquirir os co~

tumes, maneira de vestir, andar, falar e pensar. Muitos não se acostumam

mais na comunidade e daT saem para outros lugares maiores como Aquiraz ,

Redençio, Messejana e Ideal. Dificilmente querem continuar a trabalhar I

(28)

Os que conseguem ffc~r na cidade normalmente sg t~m uma opç:o em termos de moradia, serem favelados. Esses são os que quase· sempre não têm terra e por-isso nao vêem nenhuma vantagem em voltar para o meio t rural. Vaie saiientar que as pessoas que saíram por causa da seca n

un-ca foram grandes proprtet~rfos. Para os grandes, tanto faz em perTo6o'

~

.,

.-de seca como de Inverno, eles estao garantidos. Dai e que a seca ap

e-nas aguça mais a situação de miséria, ela não é causa. Outro aspecto I interessante é que fundamentalmente a seca só atinge os pobres,

Não é apenas

a

seca que expulsa o homem do campo mas

e

,

sobretu~

do, o problema da concentração de terras nas mãos de poucos, o não

acesso ao crédito e consequentemente

ã

comerc'alização dos produtos.Tu

do isso'é próprio do sistema capitalista, que

e

um sistema excludenteo

Tanto no campo como na cidade o trabalhador assalariado

é

marginaliza -do do processo econômico, polYtico e social.

Essa situação do campo contribui para que haja nas cidades um au me nto das fav ela ss Ié ) II~ a migração rural ~ urbana que contribui para o grand~ surto da urbanização (o •• ) De outro lado, a urbanização tam -bém afeta o pérfil geral e o volume da demanda para bens industrialfz~

·dos. A história do desenvolvimento do capitalismo tem mostrado uma con trnua penetração das relações do mercado nas várias atividades humanas. Isto é particularmente claro no que tange

ã

migração do campo para a I cidade e na adoção de valores urbanos".

Em Vila sio Marcos, as pessoas que sairam e que voltaram não qu~

rem mais participar das atividades comunitárias. Acham que

besteira viver discutindo problemas que nos como pobres não temos condições de

resolver, temos que ser mais vivos, não podemos viver pensando só n05 outros, não adianta confiar demais nas pessoas, cada um deve se esfor-çar para melhorar sua vida e de sua famTl ia". (7)·

No depoimento destas duas pessoas podemos detectar o seguinte:l) a rejeição do trabalho comunit5rio, Parece-nos que"este tipo de organl

zaçio não est~ encaminhado para resolver os problemas fundamentais da população. Não está organizado de modo que os agricultores possãm senQ

tir que são uma força e que atrav;s do centro comunit~rio eles são ca -pazes de encontrar saTdas.para os seus problemas. Vamos que ~ Estrutu

(29)

-- 24 -ra do Centro Comunitário de Vila são·Marcos é a mesma dos centros comuni tários criados pelo Estado e como estã estruturado não permite que os agricultores como um todo se reúnam para discutir os problemas que mais os afligem. Não e uma estrutura criada pelo povo,

é

um modelo de organi-zação da classe dominante imposta

ã

classe dominadao DaT a necessidade' dos pequenos agricultores, da Diretoria do Centro e das Instituições que atuam na comunidade de refletirem essa forma de organização, verem até que ponto está ajudando e ate que ponto está fomentando na população a

ideologia da classe dominante atraves das atividades do Centro Comunitã-rio.

2) Na afirmação de que não adianta viver pensa rido s5 nos outr~s , cada um deve be preocupar em melhorar sua vida e de sua famTI ia.Vemos ar a assimilação da ideologia do Sistema Capitalista; a ascenção pessoal e não coletiva. A concretização desta ideologia que se dã através dos

meios. de comunicação incentiva os pobres a continuarem desorganizados, I

não acredita~2oem sua força. Vemos também que a maneira como a sociedade' está organizada afeta diretamente o comportamento das pessoas obrigando--as a fazer algo ou impedindo-as de fazer aígoo A pessoa que saiu da c~-munldade e voltou, se tinha uma certa liderança, com muita facilidade ela influenciará outras pessoas a pensarem da mesma maneirao ~ interes -sante observar o que

é

um pobre pensando com a cabeça da classe dominan-te: chega a negar a sua pr5pria classe achando que não deve confiar e nem se preocupar com os problemas da mesma.

6.3. OS MEIOS DE COMUNICAÇ~O

De 1912 ate 1950, aproximadamente, a pop~lação de Vila. são I Marcos não possuia rádioo Muita gente não o conheciao As pessoas 55 sa-biam o que se passava em ~ua pr5pria Vila e em Ocara(localiddde vizin

-O primeiro rádio apareceu na comunidade em 19500 O povo se re para escutar os cantadores, músi~s sertanejas e a missao

(30)

ditavam muito nas propagandas~ Com o rádio o povo começou a ter vontade

de comprar e possuir as coisas da cidade, a saber de tudo- que se

pensa-va no mundo e conhecer história de outros lugares. Muita gente se esfor

çou para comprar um rádio: em torno dele se reunia muita gente numa mes

ma casa. Os assuntos a respeito do que ouviam no rádio eram discutidos'

na bodega e no roçado. Os assuntos do povo começaram a mudar; j~ não se

falava somente de Vila são Marcoso

Ainda hoje o rádio tem grande influência na vida das pessoas, com

uma diferença: hoje nem tudo que o rádio fala, o pessoal acha que é ver

dade. Exemplo: as vantagens que o rãdio anuncia para o homem d~ campo,

ninguém quase acredita. O povo não acredita porque não vê tornar-se rea

lidade:" propaganda de Máquinas AgrTcolas para pequenos agricultores.

Quando o pequeno agricultor vai ate Fortaleza, para ver a possibilidade

de comprar, constata que não

ê

verdcde. Ele descobre que era uma

manei-ra do grande enganar o pequen09 Como sabemos, & propaganda ~ uma forma

de introduzir e fortalecer nas pessoas a ideologia capitàlista.Crfa nas

pessoas a vontade de consumir. Constatamos isso claramente em Vila são

Marcos. Antes o pessoal fabricava sabão, suas próprias roupas, utencT

-lios domésticos (panela, prato, alguida~ etc.) Aos poucos as pessoas f~

ram deixando de fabricar tudo isso para comprar produtos

industrializa-dos, como sabão omo, detergente, bombril, produtos elatados como, carne~

peixe, 5leo, manteiga. E essa forma de pensar foi sendo adquirIda

atra-vés dos meios de comunicação, principalmente do rádio e com a ~abertura

de estradas ligando a comunidade a Fortaleza e a outros municTpios.

Se-gundo um agrIcultor, o rádio leva as pessoas, através de certos

progra-mas, e das propagandas, a criarem novos ~ostumes, Os jovens principal

-mente, ficam com muita vontade de comprar roupas novas," sapatos, reIS

-glos e a vontade de muitos irem morar na cidade porque a cidade é

apre-sentada como sendo o melhor lugar, pois tudo é fácil, pelo menos essa é

a impressão" que deixam as propagandas e não adianta o pai explicar que

isso nio ; verdade, porque o poder do rld!o ; mais' forte."

Os moradores de Vila são Marcos chegam a detectar o que o rádio I

também tem de bom. Hoje, nas reuniões da comunidade, discutem-se muitas

coisas que são ouvidas pelo rádio, exemplo: posição da Igreja em rela

(31)

26

-sll mas tamb~m de outros paTses, como a Polônia, Françat etc. Ele aproxl

ma os pequenos lugares do resto do mundo,

Podemos perceber que (8) as sociedades camponesas estão ligadas

através de comunicação, mercado, estrutura de poder e assim por diante

ã

sociedade mais ampla.

Não devemos esquecer, no entanto, que os meios de comunicação, mes

mo tendo seus valores estão a serviço da classe dominante e são um ins~

trumento muito forte utilizado por ela para reprodução do sistema capit~

1 i stao

Assim, a ideologia dominante

e

destilada por toda parte: a competl

çao, o indivIdualismo, o consumismo, o cultivo das aparSnciasQ Os confil

tos tendem a ser encobertos pela propaganda. A felicidade parece estar I

ao alcance de todos.

o

tipo de famTlia idealizada serve aos interesses da classe doml

-nante e corresponde ao ideal e aos valo~es burgueses plantados sobre o

indivTduo e sua vida privadao A.famTlia é sujeito consumidor. Parece-nos

que quanto mais houver famTlia nuclear melhoro O tipo de economia que t~

mos baseada no consumo tem que se propagar por todos os meios possíveis'

e a famrlia é um bom meio que corresponde a essa expectativa.

6.4. O PAPEL DAS INSTITUIÇ~ES

O Estado e a Igreja são duas Instituições que sempre se

fize-ram presentes em Vila são Marcos desde o seu inrcio (1912)0, são elas tam

bém respons~veis pela formação da população no que diz respeito

ã

manei-ra de pensar (ideologia) e a seu posicionamento frent~ ~s. transformações

ocorridas tanto na comunidade, como da comunidade em .oelação ao sistema'

global.

A catequese, segundo depoimento da população, ensinava, sobretudo,

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que morava em Ocara. Ela orientava não só a catequese como a educação. Todos os domIngos ela reunia o povo, lia o Evangelho e explicava. Toda

a explicação era para o povo ser obediente. Ela tinha um~ moral rfgida

e autoritária tanto na escola como na religião: se os alunos não fizes sem o que ela queria, eram expulsos e não tinham maneira de voltar a estudar. Muita gente hoje

e

analfabeta porque foi expulsa da escola e 'consequentemente da catequese. Toda moral era controlada por ela. Hoje

ainda existem muitos resquTcios tanto na educação como na religião. As pessoas que foram educadas por ela são hoje na comunidade as pessoas mais tradicionais. Essa professora marcou muito a vida da população.

Vários padres passaram por Vila são Marcoso Os que mais marcaram foram ~s Mlsslon~rios porque suas pregaçSes eram muito fortes. Falavam muito do inferno, da condenação. Eram pregaçSes, todas em torno da

mo-ral. Os Missionários diziam quelltal vida tal mo rt e!", Essa expressão ainda está bem presente na cabeça dos mais velhos. A reI igião ensinava muito o perdãoo A criança desde o catecismo já começava a ouvir que tu do era pecado. Os filhos ficavam velhos mas só faziam o que os pais querién. A religião não tinha nada a ver com os problemas do povo. Se-gundo depoimento das famTlias atraves da entrevista coletiva, IIhoje a

Igreja está diferente, ela está se decidindo pelos pobres". As crian ..•

ças sao catequisadas de acordo com a realidade, os bispos vão às comu-nidades discutir com os agricultores os problemas dos agricultores,co~ versam com os pobres. Antigamente os bispos só falavam com pessoas que

tinham recursos; quando falavam com um pobre era para reclamar alguma' coisa que para eles era errada.

Sempre houve por parte da Igreja uma preocupação muito grande com a unidade da famflia.Essa preocupação foi bastant~ assimilada pela população de Vila são Marcos. No inTcio de sua história os casamentos' eram endogâmicos. Essa situação mudou um pouco'quando o pessoal come -çou a sair' para outros municTpios e dar foram se dando casamentos com pessoas de outros lugares. Ainda ~10je moças ou rapazes de outros muni-cfpios que se casaram com pessoas de Vila são Marcos, são consideradas forasteiros, porque vieram de outros lugares. A população como um todo tem um zelo muito grande pela famTIIa, muitas vezes foi difTcil detec-tar alguns dados, principalmente sobre dependência porque não mavia

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28

-multa abertura. Fot possTvel detectar estes dados através das pessoas

que sao consideradas forasteiras porque suas raTzes não estão em Vila são Marcos. Podemos ver que é um tipo de famTtia muito fechada~

A Igreja, através de um dos seus documentos oficiais) a IIGaudlum et Spesll afirma que a famTlia é a célula da sociedade, formadora de

pessoas, educadora da fé e promotora do desenvolvimento., ~ um modelo proposto a todas as famTliaso ~ significativo lemb ar que não podemos falar de famTlla como sendo algo Isolado; deve-se~{na sociedade global na qual ela está inserida.

(10)

omo sabemos, na sociedade c ap lta l lsta , a célula fundamental

é

a grande empresa, onde a famllia foi deslocada do papel de célula fu~ damental pela sociedade capitalista e passou a ser valorizada na medi' da em que contribui para a reprodução dessa socledadeQ A empresa capl

taltsta nega aos pobres seus direitos mais fundamentais, inclusive o

direito de serem famTlia. Por causa do sistema polTtico e econômico I

em que vivemos os pobres são forçados a emigrar, a desfazer sua famT-lia e a entregar como força de trabalho barato para poder sobreviver~ Portanto, parece-nos ser bastante difTcil, neste tipo de sociedade9~

.

- , ~

a" ~ fam I1 ia seja formadora das pessoas, educadora da fe e promotora do

desenvolvimento~ t interessante observar que atraves da Igreja e do

Estado outras Instituições começaram a atuar em Vila são Marcos,como: MEB(Movimento de Educação de Base), Ancar (atual,EMATERCE) e Campanha da Solidariedade da Arquidiocese de FortalezaQ

Segundo depoimento da população o MEB foi sempre uma entidade I

de confiança porque convive muito com a~ famTlias da comunidade e por ser tambim uma instituição da lyreja. A Ematerce d~ muita orientação'

importante, mas fica pouco tempo na comunidade; os contatos são pou -cos, nunca seus tecnicos vão aos roçados. O credito bancário orienta-do por ela é muito bom para os que podemo Para o agricultor pobre não

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29 -adianta, mesmo os que têm condições ~ dlf1ctl por causa da burocracia.'

A Campanha da Solidariedade da Arquldlocese de Fortaleza

e

uma en tidade que ajuda atraves de pequenos projetos comunitários'o Não faz ne" nhum trabalho educatlvo; libera recursos para continuar os trabalhos Iniciados.

Em relação ~ Prefeitura, ela apenas paga os professores e, vez por outra, a supervisora do municTpio vai às escolas para verificar se o funcionamento está bem, se os alunos estão frequentando) se o plano I

de ~urso est~ sendo desenvolvido. Não há nenhuma preocupação em discu -tir os problemas locais, ou de orientar os professores para que no pl

a-no de unidade sejam colocados coisas referentes ~ realidade 10LJlo Exis

tem na comunidade 5 escolas do municTplo e 1 de Educação Integrada sob a orientação do MEB. Nesta há mais espaço para discutir os problemas da

comunidade e ajudar os alunos a terem senso crftico.

A respeito do Sindicato dos Trabalhadores Rurais, como já falamos

anteriormente, ele não correspondia aos interesses dos trabalhadores

porque seu Presidente era comprometido com o poder polTtico e não com

os asso~iados. As diretrizes do Sindicato eram traçadas pelos polTtlcos

para os associados executarem. Essa situação começou a ser discutida nas reuniões das diversas comunidades do municTpioe As comunidades pedl

ram ajuda do MEB nestas reuniões para ajudar a refletir o Estatuto do Sindicato e a partir deste estudó os trabalhadores foram tomando consci incia de toda a dominação do Presidente que

hl

15 anos estava no poder.

Essas reuniões eram feitas com trabalhadores das diversas Delegacias Sindicais. A decisão foi a de substituir o Presidente por um outro Pre-sidente que fosse escolhido pelos trabalhadores ruraiso Foi uma luta

muito grande porque o Presidente que estava para ser deposto contava com o apoio dos polTticos e da polTcia e os trabalhadores contavam ape-nas com a força de sua união. E esta força da união fez com que eles fossem vitoriosos: conseguiram mudar toda a Diretoria e a nova foi com -posta por representantes das d;vers~s comunidadeso O Presidente ê da co

munidade de Vila são Marcos.

A proposta desta nova Diretoria ~ o de dar prioridade aos associa dos através de u~a maior permanência nas Delegacias para manter contato com os associados e informar-se dos problemas vividos por todas elas.

(35)

30 -Através das dlscursões dos problemas, ajudar aos trabalhadores a terem senso crTtlco, a reconhecerem o valor da sua classe e a lutar por um Sindicato mais livre. Mesmo com estas propostas a nova Diretoria está· enfrentando problemas, porque a burocracia é ~uito grande e isso está levando a se ausentar da base. Os polTticos se mostram amigos oferecen do facilidades. Todo um jogo para que as propostas desta nova Direto

ria não sejam postas·em prática. As Delegacias já começam a reclamar a ausência da Diretoria. Vemos que as propostas são como se o Sindicato· fosse livre sem ser atrelado ao Estado. As contradição são claras. Se um certo modo isso é bom porque ajuda o povo a se consclentizar de que as Institul~~es foram criadas pela classe dominante para defender os seus interesses.

(36)

Mediante todo um processo de conhecimento da comunidade de Vila sio

Marcos, podemos afirmar que embora tendo suas especificidades ela

nao está desvinculada da realidade global.

~ importante verificar que as transformações vividas por Vila

são Marcos se deram de maneira exógena. Em todo o trabalho está bas

tante evidente que, no momento em que houve a abertura de estradas/

ligando a comunidade a outros lugares mais IIdesenvolvidosll começa

-ram a surgir mudanç~s em relaçio ~ maneira de ser, de pensar e de

viver. da população, assim como em relação ã terra e aos instrumen

-tos de trabalho.

A expansão da rede de estradas não foi um acontecimento apenas

local, mas estava relacionado a toda a política econômica do Pars,

conforme discutido ao longo .deste trabalho. O Pars estava por demais

interessado na expansio da indústria automobilfstica, d3f a impleme~

taçio das estradas. Esse acontecimento não se deu isolado de outros

fatores; a abertura de estrad~s favoreceu ~m relacionamento da

comu-nidade com outros municfpios propiciando o desejo de produzir mais e

de exportar a produção para outros municfpios. Para que isso

aconte-cesse era necess~rio o acesso a mais terras para trabalhar e

mão-de-obra disponível. A partir dar as relações de trabalho passaram a ser

de exploração. Começaram a surgir divis~es entre a

população,enquan-to que os interesses foram ~e tornando antagônicos.

Ficou bastante claro que a tomada de consciência da população

com relação ãexploração em que estava vivendo se deu após a expr~

priação da ~errao Antes a comunidade achava que· tudo estava bem,nio

havia consciência da exploração e da dominação de João Felipe e Cas

siano Co~reia. sê se verifica essa consciência quando começa a pe~

der suas posses.

A partir dar a maioria da população chega a relacionar a problem~t!

ca da terra com a expansão da rede de estradas e transportes que fa

(37)

2

-Hoje, 5 famrllas'detem a propriedade da terra e do comercio local. Cada vez mais essas famrlfas v;o se tornando poderosas, enquanto ~ maio-ria da população vai ficando excluida de partl~ipar dos frutos do desen-volvimento. Isto porque a maneira como o sistema econSmico e polrtico es tá organizado não oferece espaço para o pobre ?artlcipar das riquezas g~ radas por sua pr6pri~ força de. traG~lho.

S e g u n do F 1o res ta m Fe rnan de s(197(.: p .1GG ) " P. e co n o mia A9rãria evo -lul na direção dO,capltalismo modernb mantendo os laços de dependência I

diante das economias centrais ou criando novos laços de dependência face aos focos In~ernos de crescimento econômico urbano comercial e Urbano in dustrlal".

Osvaldo Sunkel (1979:57) acrescenta lias mudanças sociais no s-etor agrfcola são acompanhadas por importantes inovações técnieas na agricul-tura. A partir do momento em que se produzem tais mudanças, a concentra-ção urbana passa a ser estimulada. E 'ao mesmo tempo em que a mio-de-obra artesanal é substituida pela m;o - de -obra quem opera as máqulnas,tran~ muda-se o artesão em operário, e o capitalista comerciante em empresario capitalista".

Como Já foi citado no decorrer deste trabalho, em Vila são Marcos - tO

no momento em que foram se dando as mudanças em relaçao a terra, muita gente saiu ã procura de trabalho em outros lugares, principalmente em S. Paulo e Fortaleza, Ao chegarem nestas cidades se localizaram na perife -ria assumindo empregos em fábricas de tecidos, hoteis e industrias de f~. brlcação de peças de carro. Vemos que estas pessoas deixaram de fabricar os seus próprios objetos de consumo para serem operários de fábricas e produzirem o que eles mesmos não podem comprar. Todo esse processo con -tribul também para acabar com o poder criativo da populaç;o.

Um outro fat6r que teve grande Influência nas transformações de Vila são Marcos foram os Meios de Comunicação de Massa, principalmente o rádio, levando o povo, através das propagandas a ~os prQgramas a consu -mlr os produtos Industrializados ~oncomlntantlmente introduzido a ideolo gla capitalista que foi assimilada passivamente pelo o povo conforme pl~ neJadopelo próprio sistema dominante.

Referências

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