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Direito de família: o reconhecimento de filho socioafetivo

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UNIJUÍ – UNIVERSIDADE REGIONAL DO NOROESTE DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

ELENIZE DALL’AGNESE PIRES

DIREITO DE FAMÍLIA: O RECONHECIMENTO DE FILHO SOCIOAFETIVO

Santa Rosa (RS) 2016

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ELENIZE DALL’AGNESE PIRES

DIREITO DE FAMÍLIA: O RECONHECIMENTO DE FILHO SOCIOAFETIVO

Monografia final apresentada ao Curso de Graduação em Direito, objetivando a aprovação no componente curricular Monografia.

UNIJUÍ – Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul.

DCJS – Departamento de Ciências Jurídicas e Sociais.

Orientador: MSc. Luiz Raul Sartori

Santa Rosa (RS) 2016

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Dedico este estudo em especial a minha família – aos meus pais, Joél e Inês; aos meus irmãos Reinaldo, Eliza e Elizandra –, pelo apoio, incentivo e amor incondicional que dedicaram a mim nesta caminhada acadêmica.

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AGRADECIMENTOS

A Deus, pela vida, força e coragem. Ao meu orientador, MSc. Luiz Raul Sartori, por me passar tranquilidade, por acreditar na minha capacidade e pela disponibilidade.

A todos que contribuíram de alguma forma para a conclusão deste estudo, meus agradecimentos!

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“Meu filho vai ter nome de santo, quero o nome mais bonito. É preciso amar as pessoas, como se não houvesse amanhã Porque se você parar pra pensar, na verdade não há. Me diz, por que que o céu é azul?

Explica a grande fúria do mundo

São meus filhos que tomam conta de mim.

Eu moro com a minha mãe, mas meu pai vem me visitar Eu moro na rua, não tenho ninguém, eu moro em qualquer lugar.

Já morei em tanta casa, que nem me lembro mais Eu moro com os meus pais.

É preciso amar as pessoas como se não houvesse amanhã Porque se você parar pra pensar, na verdade não há. Sou uma gota d’água, sou um grão de areia

Você me diz que seus pais não te entendem, Mas você não entende seus pais.

Você culpa seus pais por tudo, isso é absurdo, São crianças como você

O que você vai ser, quando você crescer?” (Legião Urbana, Pais e filhos, de Renato Russo)

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RESUMO

Este estudo consiste em explorar a importância da filiação e do reconhecimento de paternidade na vida das pessoas. O estudo se constitui em trazer o direito de família mais perto da realidade, através do que dispomos da matéria na doutrina, jurisprudência e legislação. A filiação, desde sua história repleta de discriminação entre os filhos legítimos e ilegítimos, a família como base para o legislador determinar suas leis, assim como a questão do homossexual que conquistou seus direitos, na busca de formação familiar. Neste sentido, compreender o princípio da dignidade da pessoa humana em relação a socioafetividade e o reconhecimento dessa nova entidade familiar que tem por objetivo a realização do ser humano. Cada vez mais está se exigindo uma demanda judicial para problemas que podem ser solucionados na via extrajudicial, tornando mais rápido e eficiente o serviço prestado.

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ABSTRACT

This study is to explore the importance of filiation and paternity recognition in people's lives. The study is to bring the family law closer to reality through what we have matter in doctrine, jurisprudence and legislation. The membership, from its history full of discrimination between legitimate and illegitimate children, the family as the basis for the legislature to determine its laws, as well as the issue of homosexual who won their rights in the pursuit of family formation. In this sense, understand the principle of human dignity in relation to socioafetividade and recognition of this new family entity that aims at realization of the human being. Increasingly is demanding a lawsuit to problems that can be solved on extrajudicial, making it fast and efficient service.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 09

1 HISTÓRIA DA FAMÍLIA ... 11

1.1 Evolução historica da família ... 11

1.2 Da filiação ... Erro! Indicador não definido.4 1.3 Filiação biológica ou natural ... Erro! Indicador não definido.7 1.4 Filiação adotiva ... Erro! Indicador não definido.8 1.5 Reprodução assistida ... 24

1.6 Filiação socioafetiva resultante da posse do estado de filho ... 25

2 RECONHECIMENTO DA FILIAÇÃO ... 27

2.1 Reconhecimento no ato do registro ... 29

2.2 Reconhecimento forçado ... 30

2.3 Reconhecimento de filho tardio ... 31

2.4 Reconhecimento judicial da filiação socioafetiva ... 32

2.5 Reconhecimento extrajudicial da filiação socioafetiva... 33

2.6 Príncipio da dignidade da pessoa humana ... 35

CONCLUSÃO ... 37

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INTRODUÇÃO

A família é a melhor parte de nós, é onde encontramos abrigo, amor e compreensão. Sabemos que com o passar dos anos foi mudando sua estrutura e também a razão da união entre os cidadãos pertencentes nesse meio familiar. Ao longo da história percebemos que a procriação, assim como o desejo patrimonial foi ajustado no termo casamento. Por sua vez, a família jamais continuou a mesma, devido aos acontecimentos históricos, como a industrialização, na qual fez com que a mulher conquistasse seu espaço no mercado de trabalho, e consequentemente contraindo-lhe direitos como cidadã.

Atualmente, as novas formações familiares se preocupam com seus membros, tirando quase por completo o preconceito quanto as diversas famílias que existem, as que são formadas apenas por um dos ascendentes e seus descentes, aqueles que são criados pelos avós, aqueles que tem mais de uma mãe ou pai, pois a condição é ter ânimo de ser parte daquele grupo familiar, estabelecendo um vínculo maior que o consanguíneo - é o que chamamos de socioafetividade. Há, neste sentido, uma preocupação com o ser humano, com seu desenvolvimento, essa vontade de pertencer à família de alguém, com status de filho ou de pai.

No entanto, no que concerne a família homoparental, o legislador não quis estabelecer leis, mas foi forçado a ditar regulamentações para não infringir normas da constituição federal.

Uma das regulamentações é a declaração procedente da Ação Direita de Inconstitucionalidade 4.277, foi uma forma de forçar a aplicação da união estável para as uniões entre pessoas do mesmo sexo, apesar de ser um avanço, este passo ainda é tímido, frente ao que ainda pode ser alcançado.

Nessa lógica, o estudo está dividido em dois capítulos. O primeiro traz um estudo direcionado à filiação, abordando a história da família e as espécies de filiações. O segundo capítulo apresenta as formas de reconhecimento da paternidade em sua diversidade, para entender o instituto da paternidade socioafetiva.

Em decorrência deste estudo, busca-se demonstrar que é possível o reconhecimento da filiação socioafetiva na via extrajudicial, pois em alguns Estados como o do Ceará,

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Pernambuco e Maranhã, editaram regras para este reconhecimento, como forma de proporcionar uma melhor satisfação e praticidade as partes envolvidas.

Visto que o judiciário está sobrecarregado com processos inacabáveis, é uma forma de tirar esse assoberbamento, trazendo para o Registro Civil das Pessoas Naturais, que tem por costume uma melhor aproximação das pessoas, com o propósito de estabelecer uma forma segura e rápida no serviço de atendimento as pessoas, que procuram cada vez mais resolver seus conflitos de modo eficiente.

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1 HISTÓRIA DA FAMÍLIA

Neste capítulo será apresentada a história da família, diante dos conflitos de valores que a sociedade impõe o aspecto da socioafetividade e diante do que a doutrina, a jurisprudência e a legislação nos colocam à disposição para compreender e conceituar a família atual.

Assim, será realizado um estudo sobre a filiação, utilizando-se da jurisprudência e também dos conceitos de alguns juristas, com a finalidade de compreender melhor essas novas formações familiares, na tentativa de trazer o Direito de Família mais perto da realidade.

Por fim, é estudado o instituto do reconhecimento de filho, que é o objetivo desde trabalho, e também como bônus compreender o princípio da dignidade da pessoa humana.

Em decorrência desse estudo, apresenta-se um novo olhar, não somente ao Direito de Família, mas ao também próximo, no sentido de que se torna essencial a uma pessoa, sabendo que a família é de forma pacífica a base de todo ser humano.

1.1 Evolução histórica da família

Historicamente a família sofreu inúmeras mudanças de composição, função e sobretudo a sua finalidade. Primeiramente o objetivo era a procriação de uma prole, como forma de preservar a espécie. (LISBOA, 2012).

Apesar desses agrupamentos serem rudimentares, era possível buscar um propósito dentro da família, como trabalhar para comprar o alimento, a reprodução e a proteção, como forma de defesa contra inimigos e também segurança na velhice. Esses agrupamentos, são considerados os primeiros núcleos familiares, na busca pela completude existencial. (GAGLIANO; PAMPOLHA FILHO, 2014, p. 55).

O Código Civil de 1916 tratou de conceituar família como uma comunidade fundada no casamento, hierarquizada e patriarcal. Os filhos concebidos dentro do casamento eram considerados legítimos e os demais eram chamados de ilegítimos. Aqueles filhos que eram de uma relação extraconjugal eram os chamados adulterinos, e por fim, aqueles que eram de uma

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relação entre parentes em grau próximo eram os chamados filhos incestuosos, tanto estes quanto os adulterinos eram chamados também de bastardos e espúrios. (CANEZIN; EIDT, 2012, p. 10).

Dessa forma, todas as uniões formadas entre um homem e uma mulher, que não fossem fundadas no casamento civil, nem advindas de uma união matrimonial, eram desconsideradas pela lei. Por consequência, seus filhos eram desprezados e recebiam tratamento diferenciado com previsão na legislação. Essas diferenças não eram apenas sobre o direito de filiação e da obtenção de uma família, mas também no que concerne o direito a sucessão. (CANEZIN; EIDT, 2012, p. 10).

A família só ganhou relevância no Direito Romano, onde a principal atividade dos membros versava-se na economia, política, militar e religiosa. O homem mais velho de determinado núcleo familiar, tinha autoridade sobre os demais descendentes, sendo que poderia decidir sobre a vida e a morte de cada membro nela pertencente. (GAGLIANO; PAMPOLHA FILHO; 2013, p. 50).

No século XVIII, com o advento da Revolução Industrial, as necessidades da coletividade eram maiores, aumentou a mão de obra, e as mulheres ingressaram ao mercado de trabalho, deixando o homem de ser o único provedor de sustento para a família. (GAGLIANO; PAMPOLHA FILHO, 2013, p. 52).

Portanto, a família reflete em cada momento histórico o que se foi vivenciado pela humanidade, por sua estrutura ter mudado por tantas razões, como na economia, na política, na religião, na procriação, entre vários outros fatores, mas que permanece sempre com a mesma finalidade, de unir as pessoas, seja por sua consanguinidade ou por puro afeto.

A Constituição Federal de 1988 mudou mais uma vez o conceito de família, pois o Estado passou a reconhecer a união estável entre o homem e a mulher, assim como, a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes. A mulher passou a obter os mesmos direitos e deveres que o homem, e por fim, os filhos advindos dentro ou fora do casamento tiveram tratamento igualitário, sendo proibido qualquer discriminação. (CANEZIN; EIDT, 2012, p. 11).

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Posteriormente, o Código Civil de 2002 regulou as disciplinas trazidas pela Constituição Federal, contemplando em alguns artigos os direitos já concedidos. Além de várias outras modificações que foram trazidas pela jurisprudência para tentar acompanhar essas relações familiares. (CANEZIN; EIDT, 2012, p. 11).

Com o passar dos anos percebemos, as mudanças significativas na sociedade em relação à família, pois não ela é mais formada apenas por pai, mãe e filhos, como se costumava ver nas famílias mais antigas. A família é formada por laços afetivos com total expansividade, pois começa do pai e da mãe se estendendo aos tios, avós, primos e demais familiares conviventes nessa união.

Gouveia (2011, p. 31) entende que: “O conceito de família, seguindo a evolução da sociedade, foi transformado e atualmente a família identifica-se pela comunhão de vidas, de amor e de afeto no plano da igualdade, da liberdade, da solidariedade e da responsabilidade recíproca entre os seus membros”.

Já para Gagliano e Pampolha Filho (2013, p. 47), o “Conceito ‘genérico’ de família é de um núcleo existencial integrado por pessoas unidas por um vínculo socioafetivo, teleologiamente vocacionada a permitir a realização plena dos seus integrantes”.

A sociedade ainda tem posição contrária quanto aos casais homoafetivos e as diversas famílias existentes, mas assim que for superada, trará importantes modificações no conceito de família, tendo que a legislação que se adequar. Porém, enquanto se aguarda a aceitação da sociedade, o Supremo Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, reconhece como entidade familiar a união entre casais homoafetivos em detrimento dos julgados do Supremo Tribunal Federal:

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. HABILITAÇÃO PARA CASAMENTO CIVIL ENTRE PESSOAS DO MESMO SEXO. POSSIBILIDADE. AMPLIAÇÃO DO CONCEITO DE ENTIDADE FAMILIAR. GARANTIA AOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DA IGUALDADE, NÃO-DISCRIMINAÇÃO, DIGNIDADE DA PESSOA E LIVRE PLANEJAMENTO FAMILIAR. RECENTES JULGAMENTOS DOS COLENDOS STJ E STF QUE PERMITEM A HABILITAÇÃO POSTULADA. APELAÇÃO MINISTERIAL DESPROVIDA. (RIO GRANDE DO SUL, 2013).

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No emaranhado de diversidade de ideias e conclusões de vários doutrinadores e pesquisadores da área jurídica, segundo Gagliano e Pampolha Filho (2013, p. 39):

[...] a uma primeira e importante conclusão: não é possível apresentar um

conceito único e absoluto de Família, apto e aprioristicamente delimitar a

complexa e multifária gama de relações socioafetivas que vinculam as pessoas, tipificando modelos e estabelecendo categorias. Qualquer tentativa nesse sentido restaria infrutífera e desgarrada da nossa realidade.

Diante desse argumento, compreendemos que a família não deve ser definida, pois ela carrega as melhores partes da nossa vida, e quando chegamos a um conceito, não conseguimos nos desvencilhar de alguns preceitos adotados na sociedade, por tanto, não a conceituamos.

1.2 Da filiação

Cada pessoa tem anseio de pertencer a alguém ou a uma família. Conforme interpreta Dias (2015, p. 388): “A absoluta impossibilidade do ser humano de sobreviver de modo autônomo - eis que necessita de cuidados especiais por longo período - faz surgir um elo de dependência a uma estrutura que lhe assegure o crescimento e o pleno desenvolvimento”.

Historicamente, as Ordenações Portuguesas decidiam sobre a solução dos conflitos familiares no Brasil, sendo que sua regulamentação jurídica somente alcançava os filhos legítimos. Assim, não se resta dúvida quanto à precariedade do tratamento jurídico aos filhos denominados ilegítimos, se percebe o quanto o casamento era importante para o Direito das Famílias. (FARIAS; ROSENVALD, 2015, p. 545).

A discriminação era tão grande, que mesmo que um homem quisesse e estando casado não poderia reconhecer um filho advindo de um relacionamento extraconjugal. Bem como, os filhos adotados eram discriminados, sendo indeferido o direito sucessório. (FARIAS; ROSENVALD, 2015, p. 546).

A existência de uma relação matrimonial preexistente entre as pessoas estava ligada a uma lógica patrimonialista, evidentemente preocupada com o prejuízo na transmissão do patrimônio, que era regulado através do casamento. Os bens deveriam estar concentrados dentro do núcleo familiar, e, por conseguinte deveria prosseguir pela transferência sucessória

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e permanecer entre os sujeitos de mesma consanguinidade para dar continuidade aquela entidade familiar. (FARIAS; ROSENVALD, 2015, p. 546).

A filiação historicamente era intrínseca aos laços consanguíneos, em uma relação entre os ascendentes e seus descendentes, por sua vez, os filhos denominados ilegítimos ou gerados fora do casamento não fruíam de direitos, como o de sucessão e até mesmo o direito ao patronímico paterno.

Somente com a Constituição Federal de 1988 ocorre o término da discriminação dos filhos havidos fora do casamento, tendo em sua redação contemplado todos os filhos de forma igualitária, com mesmos direitos, sem nenhuma distinção, conforme o artigo 227, §6º da Constituição Federal, que assim dispõe:

Art. 227. [...]

§6º - Os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação. (BRASIL, 1988).

A discriminação alusiva à filiação, que cita o artigo, está se referindo aos dados constantes no registro de nascimento, pois após a constituição se tomou providências para que não fosse permitido constar como filho ilegítimo, bem como nos assentos de filhos adotivos não poderia constar qualquer referência sobre a respectiva a adoção, pois a certidão é o primeiro documento do recém-nascido, e a partir dele que é emitido os demais documentos da vida civil. Não podendo, nesse sentido, diferenciar o registro em relação ao estado civil dos seus ascendentes, e até mesmo se este é derivado de ordem judicial, como por exemplo o reconhecimento de paternidade. (SALOMÃO; HAHN, 2016, p. 5).

Segundo Farias e Rosenvald (2015, p. 907): “A filiação passou a ser um momento de realização humana, de plenitude existencial, seja qual for a sua origem”.

No entanto, a prova de filiação é realizada através do registro de nascimento, onde consta quem são os pais. A lavratura do registro é imposta de forma obrigatória, mas não é tão somente esta cabível como prova, o artigo 1.605, do Código Civil de 2002:

Art. 1.605. Na falta, ou defeito, do termo de nascimento, poderá provar-se a filiação por qualquer modo admissível em direito:

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I - quando houver começo de prova por escrito, proveniente dos pais, conjunta ou separadamente;

II - quando existirem veementes presunções resultantes de fatos já certos. [...]

Outros meios de provas também podem ser a oitiva de testemunhas, o exame de DNA, e a juntada de documentos.

Essa comprovação genética que é realizada por exame de DNA não é o bastante para determinar a existência de uma relação entre pais e filhos, portanto, apesar da previsão biológica, o vínculo de filiação é mais importante, pois é no tratamento cotidiano na vida de uma criança é que vai se decidir a sua filiação. (FARIAS; ROSENVALD, 2015, p. 547).

Atualmente, não podemos partir de um pressuposto de que a filiação vem de uma relação jurídica entre um indivíduo e seus ascendentes, pois a filiação decorre de uma circunstância de afeto, portanto, pode ser por meio da adoção ou da socioafetividade.

Para se efetivar a filiação, cabe ressaltar que esta pode ser realizada não somente através dos mecanismos biológicos, mas também por meio da adoção, da fertilização que é assistida, ou pelo meio do vínculo afetivo na condição paterno-filial. Qualquer desses modos escolhidos, não haverá diferença no tratamento jurídico, pois todos são iguais perante a lei. (FARIAS; ROSENVALD, 2015, p. 544).

Portanto, para que seja vivenciada a experiência da filiação, não se faz necessário à geração biológica do filho, por conseguinte, para que de fato exista relação filiatória, não é necessário a transmissão de carga genética, pois o elemento principal está na convivência familiar, no desenvolvimento como pessoa e na realização como ser humano. Jamais se pode efetivamente determinar qual dos vínculos é o mais importante, pois se depende de cada situação concreta. (FARIAS; ROSENVALD, 2015, p. 543).

Conforme explica Farias e Rosenvald (2015, p. 548): “Sem dúvida, a prova da filiação pode decorrer da reciprocidade de tratamento afetivo entre determinadas pessoas, comportando-se como pais e filhos e se apresentando como tal aos olhos de todos”.

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A filiação é uma conexão de um ser humano a outro a partir do reconhecimento da paternidade ou maternidade do mesmo, ou seja, podendo essa ligação do filho com seus pais ser de natureza biológica, adotiva, socioafetiva ou ainda por reprodução assistida.

1.3 Filiação biológica ou natural

Historicamente, a filiação biológica era constituída por meio do casamento, sendo entendida como entidade legítima, imaculada e protegida pela lei. Deste modo, todos os filhos concebidos por uma mulher presumia-se ser de seu esposo, e aqueles havidos fora do casamento eram intoleráveis na sociedade. (CANEZIN; EIDT, 2012, p. 12).

Nessa concepção, o legislador elaborou o artigo 1.597 do Código Civil de 2002, sem deixar em aberto para discussões sobre a paternidade dos filhos, assegurando o casamento como fator indispensável para procriação, bem como a identificação direta da paternidade:

Artigo 1.597. Presumem-se concebidos na constância do casamento os filhos:

I - nascidos cento e oitenta dias, pelo menos, depois de estabelecida a convivência conjugal;

II - nascidos nos trezentos dias subsequentes à dissolução da sociedade conjugal, por morte, separação judicial, nulidade e anulação do casamento; Com o progresso da medicina no ano de 1980, se alcançou o progresso da genética, onde tudo mudou a partir do exame de DNA. Proporcionando além de uma certeza de 99,99% na filiação biológica, como também uma enorme repercussão na esfera jurídica, que até o momento não discutia o reconhecimento da paternidade frente ao matrimônio. Portanto, passando a ser direito fundamental de cada pessoa, buscar no âmbito judicial identificar sua origem genética, dando lugar às ações de investigação de paternidade e também de negatória de paternidade, que são bem comuns na atualidade. (CANEZIN; EIDT, 2012, p. 13).

Apesar da precisão do exame do DNA, no qual se utiliza como critério para determinar se determinado sujeito é pai ou não de outro, não atribui a filiação de fato de alguém, pois essa só se confirma com o vínculo existente entre duas pessoas, que estão ligadas por laços afetivos e não por laços de sangue. (CANEZIN; EIDT, 2012, p. 13).

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É direito de toda pessoa que conheça a sua origem genética, mesmo que não seja para estabelecer filiação de alguém, pois se trata de amparar a criança por meio financeiro, custear os alimentos que são devidos pelo genitor. Não há de se prevalecer da origem biológica diante da afetiva, visto que o grande interesse da relação é o que melhor atende aos cuidados da criança, que necessita de cuidados. (OTONI, 2012, p. 52).

1.4 Filiação adotiva

A filiação adotiva é bem definida por Rosenvald e Farias (2015, p. 907), da seguinte forma: “[...] a adoção é um dos variados mecanismos de determinação filiatória, baseada no afeto e na dignidade, inserindo o adotando em um novo núcleo familiar”.

No direito romano, havia-se duas modalidades de uma pessoa entrar em uma família, sendo elas: a arrogatio e a adoptio, pois a adoção era utilizada para prover a falta de filhos e prosseguir com a crença familiar. Conforme explica Lisboa (2012): “Enquanto a primeira se destinava à inserção de um estranho sem dependência de outra pessoa na família, a adoptio pressupunha que o estranho a ser integrado na família se achava sob o patrio potestas de outrem”.

No que tange sobre a matéria adoção da época, se observa a seguinte postura:

Nessa época, a permissão da continuidade da família não fundada na consanguinidade, ou seja, o instituto da adoção decorria não de um ato de amor, mas da necessidade de se perpetuar o fogo sagrado e o culto da família que seria interrompido caso não houvesse descendentes, sendo que a ideia era a de se dar um filho a quem não o tivesse. (FIUZA; COSTA POLI, 2013, p. 11-12).

Com o advento do Código Civil de 1916, estabelecia-se a adoção como forma de dar oportunidade de ser pais aqueles que não podiam ter filhos da forma natural, visando o bem estar dos pais e não se preocupando com a situação daquelas crianças e adolescentes que estavam sendo inseridos dentro de uma nova família. (FARIAS; ROSENVALD, 2015, p. 907).

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E depois, com a chegada da Constituição Federal de 1988, e também do Estatuto da Criança e do Adolescente, recebeu tratamento igualitário, sem qualquer distinção, ainda proporcionou o direito a sucessão. (FARIAS; ROSENVALD, 2015, 72).

O que se extrai da adoção atual é o seguinte:

A adoção contemporânea é o ato de desprendimento, de amor, é uma filiação jurídica que se fundamenta na afetividade. Ou para outros é um ato de negócio jurídico que cria relações de filiação e de paternidade, na qual decorre exclusivamente de um ato de vontade afetiva, ou seja, hoje implica dar pais a quem não os tem, ou melhor, dar família a quem não a tem. (FIUZA; COSTA POLI, 2013, p. 13).

A ideia de adoção é maior do que suprir um vazio de decepção, pois se apresenta da seguinte forma:

Contemporaneamente, a adoção está assentada na ideia de se oportunizar a uma pessoa humana a inserção em núcleo familiar, com a sua integração efetiva e plena, de modo a assegurar a sua dignidade, atendendo às suas necessidades de desenvolvimento da personalidade, inclusive pelo prisma psíquico, educacional e afetivo. (FARIAS; ROSENVALD, 2015, p. 908). Com a chegada da Lei n° 12.010 de 2009, passou-se a regulamentar a adoção por lei especial (ECA), que também passaria a ser aplicada de forma subsidiária na adoção de maiores. (GAGLIANO; PAMPOLHA FILHO, 2014, p. 748).

A adoção confere vários direitos e deveres ao adotante e ao adotado. A Lei nº 8.069/90 prevê alguns deles:

Art. 41. A adoção atribui a condição de filho ao adotado, com os mesmos direitos e deveres, inclusive sucessórios, desligando-o de qualquer vínculo com pais e parentes, salvo os impedimentos matrimoniais.

Trata-se de igualar os direitos que existem entre os filhos biológicos e os adotivos, fazendo com que o adotando não seja discriminado. Tanto é que na sequencia a mesma Lei citada determina que “Art. 43. A adoção será deferida quando apresentar reais vantagens para o adotando e fundar-se em motivos legítimos”.

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Verifica-se o que melhor atende ao interesse da criança ou adolescente, pois este deve ser acolhido dentro da família, em controverso ao dispositivo do código de 1916, que só atendia ao interesse do casal que não poderia ter filhos. Veja-se: “Art. 46. A adoção será precedida de estágio de convivência com a criança ou adolescente, pelo prazo que a autoridade judiciária fixar, observadas as peculiaridades do caso”. (BRASIL, 1990).

É verificado se a criança ou adolescente está se adequando ao novo lar, respeitando seus aspectos psicológicos e buscando que este se insira na família. Ou seja, “Art. 47. O vínculo da adoção constitui-se por sentença judicial, que será inscrita no registro civil mediante mandado do qual não se fornecerá certidão”. (BRASIL, 1990).

Na adoção, sabemos que muitas vezes a família natural já realizou o ato do registro de nascimento no momento em que nasceu a criança, neste caso, o assento será cancelado sem poder tirar segunda via e nem dar informações sobre o registro. Nesse sentido, “Art. 47, § 1º: A inscrição consignará o nome dos adotantes como pais, bem como o nome de seus ascendentes”. (BRASIL, 1990).

Consequentemente, após o cancelamento do registro anterior, será lavrado um novo assento de nascimento, no qual constará o nome dos genitores e seus descentes. Portanto, “Art. 47, § 4o: Nenhuma observação sobre a origem do ato poderá constar nas certidões do

registro”. (BRASIL, 1990).

Quando lavrado o novo registro de nascimento, não irá constar se veio por ordem judicial, nem mesmo se é referente a uma adoção, pois deve se resguardar qualquer ato que discrimine o adotando.

Art. 48. O adotado tem direito de conhecer sua origem biológica, bem como de obter acesso irrestrito ao processo no qual a medida foi aplicada e seus eventuais incidentes, após completar 18 (dezoito) anos. (BRASIL, 1990). Portanto, não é porque o adotado está inserido em uma nova família que ele deva esquecer de sua origem, muitas vezes os pais que adotam não querem que o filho tenha contato com a família natural, é importante saber que cada pessoa tem direito de saber de onde veio, quais são suas raízes para poder se descobrir.

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Artigo 49 [...]

§ 10. A adoção internacional somente será deferida se, após consulta ao cadastro de pessoas ou casais habilitados à adoção, mantido pela Justiça da Infância e da Juventude na comarca, bem como aos cadastros estadual e nacional referidos no § 5o deste artigo, não for encontrado interessado com

residência permanente no Brasil. (BRASIL, 1990).

A prioridade é que o adotando não saia do seu país de origem, por isso sempre se tem preferência aquele que mora no Brasil, para que ele tenha os costumes e conheça a cultura do seu país de origem. Mas, quanto aos estrangeiros, estes também podem adotar, desde que, atendam às exigências impostas pela legislação.

Contudo, a Lei não prevê a adoção de casais homoafetivos, e o legislador não fez questão de regularizar a entidade família. Apesar de os julgados do Supremo Tribunal Federal serem favoráveis, parece haver certa resistência por parte do legislador. Como bem entende Dias, (2015, p. 273): “O repúdio social a segmentos marginalizados acaba intimidando o legislador, que tem enorme resistência em chancelar lei que vise a proteger a quem a sociedade rejeita”.

Destarte, o casamento civil foi sancionado recentemente em 14 de maio de 2013, na redação da resolução nº 175, foi adquirido o direito de habilitar-se ao casamento, bem como a celebração civil ou a conversão de união estável em casamento entre pessoas do mesmo sexo. (CNJ, 2013).

Desse modo, Dias (2015, p. 271) explica: “A homossexualidade sempre existiu. Não é crime nem pecado; não é uma doença nem um vício. Também não é um mal contagioso, nada justificando a dificuldade que as pessoas têm de conviver com homossexuais”.

Ainda no domínio da adoção, existem decisões a favor da adoção homossexual. Como por exemplo, a decisão exposta pelo Supremo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, que reconheceu a adoção homoparental:

EMENTA: EMBARGOS INFRINGENTES. PEDIDO DE HABILITAÇÃO. ADOÇÃO CONJUNTA POR PESSOAS DO MESMO SEXO. Sendo admitida, pela jurisprudência majoritária desta corte, a união estável entre pessoas do mesmo sexo, possível admitir-se a adoção homoparental, porquanto inexiste vedação legal para a hipótese. Existindo, nos autos, provas de que as habilitandas possuem relacionamento estável, bem como

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estabilidade emocional e financeira, deve ser deferido o pedido de habilitação para adoção conjunta. EMBARGOS INFRINGENTES DESACOLHIDOS, POR MAIORIA. (RIO GRANDE DO SUL, 2010).

Assim como também a decisão prolatada pelo Supremo Tribunal de Justiça:

EMENTA: O relator é Min. Luiz Felipe Salomão. HOMOSSEXUAL. SITUAÇÃO JÁ CONSOLIDADA. ESTABILIDADE DA FAMÍLIA. PRESENÇA DE FORTES VÍNCULOS AFETIVOS ENTRE OS MENORES E A REQUERENTE. IMPRESCINDIBILIDADE DA PREVALÊNCIA DOS INTERESSES DOS MENORES. RELATÓRIO DA ASSISTENTE SOCIAL FAVORÁVEL AO PEDIDO. REAIS VANTAGENS PARA OS ADOTANDOS. ARTIGOS 1º DA LEI 12.010/09 E 43 DO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. DEFERIMENTO DA MEDIDA. 1. A questão diz respeito à possibilidade de adoção de crianças por parte de requerente que vive em união homoafetiva com companheira que antes já adotara os mesmos filhos, circunstância a particularizar o caso em julgamento. 2. Em um mundo pós-moderno de velocidade instantânea da informação, sem fronteiras ou barreiras, sobretudo as culturais e as relativas aos costumes, onde a sociedade transforma-se velozmente, a interpretação da lei deve levar em conta, sempre que possível, os postulados maiores do direito universal. 3. O artigo 1º da Lei 12.010/09 prevê a "garantia do direito à convivência familiar a todas e crianças e adolescentes". Por sua vez, o artigo 43 do ECA estabelece que "a adoção será deferida quando apresentar reais vantagens para o adotando e fundar-se em motivos legítimos". 4. Mister observar a imprescindibilidade da prevalência dos interesses dos menores sobre quaisquer outros, até porque está em jogo o próprio direito de filiação, do qual decorrem as mais diversas consequências que refletem por toda a vida de qualquer indivíduo. 5. A matéria relativa à possibilidade de adoção de menores por casais homossexuais vincula-se obrigatoriamente à necessidade de verificar qual é a melhor solução a ser dada para a proteção dos direitos das crianças, pois são questões indissociáveis entre si. 6. Os diversos e respeitados estudos especializados sobre o tema, fundados em fortes bases científicas (realizados na Universidade de Virgínia, na Universidade de Valência, na Academia Americana de Pediatria), "não indicam qualquer inconveniente em que crianças sejam adotadas por casais homossexuais, mais importando a qualidade do vínculo e do afeto que permeia o meio familiar em que serão inseridas e que as liga a seus cuidadores". 7. Existência de consistente relatório social elaborado por assistente social favorável ao pedido da requerente, ante a constatação da estabilidade da família. Acórdão que se posiciona a favor do pedido, bem como parecer do Ministério Público Federal pelo acolhimento da tese autoral. 8. É incontroverso que existem fortes vínculos afetivos entre a recorrida e os menores sendo a afetividade o aspecto preponderante a ser sopesado numa situação como a que ora se coloca em julgamento. 9. Se os estudos científicos não sinalizam qualquer prejuízo de qualquer natureza para as crianças, se elas vêm sendo criadas com amor e se cabe ao Estado, ao mesmo tempo, assegurar seus direitos, o deferimento da adoção é medida que não pode fechar os olhos para a realidade fenomênica. Vale dizer, no plano da realidade, são ambas, a requerente e sua companheira, responsáveis pela criação e educação dos dois infantes, de modo que a elas, solidariamente, compete a responsabilidade.

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11. Não se pode olvidar que se trata de situação fática consolidada, pois as crianças já chamam as duas mulheres de mães e são cuidadas por ambas como filhos. Existe dupla maternidade desde o nascimento das crianças, e não houve qualquer prejuízo em suas criações. 12. Com o deferimento da adoção, fica preservado o direito de convívio dos filhos com a requerente no caso de separação ou falecimento de sua companheira. Asseguram-se os direitos relativos a alimentos e sucessão, viabilizando-se, ainda, a inclusão dos adotandos em convênios de saúde da requerente e no ensino básico e superior, por ela ser professora universitária. 13. A adoção, antes de mais nada, representa um ato de amor, desprendimento. Quando efetivada com o objetivo de atender aos interesses do menor, é um gesto de humanidade. Hipótese em que ainda se foi além, pretendendo-se a adoção de dois menores, irmãos biológicos, quando, segundo dados do Conselho Nacional de Justiça, que criou, em 29 de abril de 2008, o Cadastro Nacional de Adoção, 86% das pessoas que desejavam adotar limitavam sua intenção a apenas uma criança. 14. Por qualquer ângulo que se analise a questão, seja em relação à situação fática e legal de primazia à proteção integral das crianças, chega-se à conclusão de que, no caso dos autos, há mais do que reais vantagens para os adotandos, conforme preceitua o artigo 43 do ECA. Na verdade, ocorrerá verdadeiro prejuízo aos menores caso não deferida a medida. 15. Recurso especial improvido. (BRASIL, 2010).

No entendimento de Lisboa (2012): “Não é a opção sexual, de fato, que serve de norte para se concluir se a pessoa tem ou não discernimento ou compreensão para cuidar de outra pessoa.”

Atualmente existem novas configurações familiares, as repressões decorrentes da não compreensão das pessoas em razão das mudanças que estão ocorrendo, como por exemplo, crianças que consideram a avó sua mãe, ou que afirma ter dois pais ou duas mães se os pais são separados, ou ainda quando afirma não ter pai, pois nunca o conheceu - são fatos da vida que não merecem ser julgados, como o argumento de afastar o reconhecimento do direito do casal homoafetivo. (KIM, 2010, p. 33).

Sendo ainda, recentes as decisões em matéria de superar esses ranços da sociedade, que nada tem a perder, visto que, a luta é pela igualdade social.

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1.5 Reprodução assistida

A medicina veio para auxiliar de modo eficaz na melhoria da qualidade de vida, assim como no desenvolvimento da reprodução humana e também da genética, na qual possibilitou a realização de um sonho que para muitos casais era impossível diante da infertilidade. Através deste progresso da medicina, foram desenvolvidas as técnicas de reprodução assistida, na qual teve grande e importante impacto na esfera jurídica, em especial na área de Direito de família e sucessão.

Desta forma, foi inserido na legislação, no artigo 1.597 do Código Civil de 2002, no qual se faz menção a algumas técnicas de reprodução assistida, algumas são: a fecundação artificial homóloga, que inclui post mortem do marido (III); a concepção artificial homóloga, que pode ser a qualquer tempo (IV) e, por fim, a reprodução por inseminação artificial heteróloga, na qual o marido deixou autorizado previamente. (DELFIM, 2011, p. 8).

Apesar de a norma regulamentar a reprodução assistida, ela não ficou bem clara. Para melhorar a compreensão da matéria é imprescindível conceituar algumas expressões e esclarecer mais detalhes sobre o assunto. (DELFIM, 2011, p. 9).

Conforme esclarece Rolf Madaleno (apud SALOMÃO; HAHN, 2016, p. 6):

A constante evolução da medicina genética permite a fecundação fora do corpo da mulher e sem a realização da cópula, fecundando in vitro um óvulo extraído de uma mulher, com o sêmen do marido ou da pessoa que com ela viva em união estável, ou pode decorrer da doação de material genético de uma terceira pessoa.

Portanto, entende-se como reprodução homóloga aquela que é utilizado o óvulo e sêmen de pessoas que convivam em união estável ou que sejam casadas. Já a reprodução heteróloga é aquela em que é utilizado o sêmen do homem ou o óvulo da mulher que pertença a um doador ou doadora anônimo. (SALOMÃO; HAHN, 2016, p. 6).

Lisboa (2012) entende: “A presunção de paternidade por inseminação artificial heteróloga concedida pelo marido gera, a bem da verdade, a filiação socioafetiva, porque geneticamente não conterá o produto da concepção qualquer traço da pessoa que o registrará como filho”.

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No que diz respeito ao Direito de Sucessão, o artigo 1.798 do Código Civil de 2002, prevê que são legitimadas a suceder, as pessoas já nascidas ou concebidas até o momento da abertura da sucessão. Tendo legitimidade para suceder tanto na sucessão legítima, quanto na testamentária. A condição para a legitimidade sucessória é a existência da gravidez no momento da abertura da sucessão e o fato de se obter título que outorgue seus direitos. Pois, neste sentido, cabe ressaltar que a herança deve ser partilhada entre os herdeiros, e se não sabendo da existência de um sucessor no momento que deva ser partilhada, não há como defender um direito de alguém que possa vir a existir, por isso, exige-se a existência do sucessor no momento da abertura do inventário. (PESSOA, 2013).

Neste sentido, o legislador manteve o critério formal de personalidade da pessoa no âmbito do sistema jurídico, como bem relata Lisboa (2012): “Enquanto não ocorrer a fecundação e a introdução do embrião no aparelho reprodutor feminino, a fim de que ele seja considerado um nascituro, não há, infelizmente, falar em ser vivo a merecer a proteção jurídica como pessoa”.

1.6 Filiação socioafetiva resultante da posse do estado de filho

Para entender o instituto da filiação socioafetiva, precisa-se ir além do aspecto biológico, trata-se de alcançar as relações fundamentadas no amor, no respeito e na convivência familiar.

Conforme ensina Dias (2015, p. 507): “[...] a filiação se define não pela verdade biológica, nem a verdade legal ou a verdade jurídica, mas pela verdade do coração”.

Canezin e Eidt (2012, p. 13) determinam a palavra filição como sendo um termo de: “[...] interpretação etimológica, do latim filiatio, significa o vínculo existente entre o filho e aqueles que o geraram, podendo ser entendido sociologicamente como vínculo existente entre sujeitos que sentem, pensam e agem como se fosse pais e filhos”.

A filiação socioafetiva está acima de qualquer critério biológico ou presunção legal, pois é resultante de um sentimento entre pais e filhos, é onde existe abrigo, carinho e atenção. Se for colocado em uma balança o pai socioafetivo e o biológico, devemos sempre levar em

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consideração os dois, pois os laços construídos ao longo dos anos nunca poderão ser substituídos pelo aspecto biológico. (CANEZIN; EIDT, 2012, p. 13).

A posse do estado de filho deve ser entendida como um conjunto de atos que formam uma realidade social, que transcendem na convivência familiar, e que é estabelecida na filiação socioafetiva. Apesar de não ter previsão expressa na legislação brasileira, a posse de estado de filho encontra sustentação na interpretação teleológica da Constituição Federal e dispõem-se como meio de prova do vínculo socioafetivo. Diante da omissão do legislador, cabe ao Judiciário interpretar através dos princípios constitucionais, buscando da melhor forma garantir seus direitos, através do princípio da dignidade da pessoa humana. (CANEZIN; EIDT, 2012, p. 15).

Dias (2015, p. 53) entende que: “A posse de estado de filho nada mais é do que o reconhecimento jurídico do afeto, com o claro objetivo de garantir a felicidade, como um direito a ser alcançado”.

Perante a sociedade, a exteriorização dessa relação familiar sobre a filiação é decorrente do fato em que o padrasto age como se pai fosse, e o enteado age como se filho fosse, sendo que não se tem qualquer parentesco consanguíneo, mas que é o bastante para configurar a posse de estado de filho. (CANEZIN; EIDT, 2012, p. 16).

Conforme preceitua Farias e Rosenvald, (2015, p. 548): “O papel preponderante da posse do estado de filho é conferir juridicidade a uma realidade social, pessoal e afetiva induvidosa, conferindo, dessa forma, mais Direito à vida e mais vida ao Direito”.

Em decorrência da posse de estado de filho, vem a ideia de que apesar de não ser filho biológico, se tem uma identificação com este sujeito que o criou, de tal forma que o desejo de ser de sua família seja exteriorizado na vontade de constituir seu patronímico.

Na decisão recente proferida do Supremo Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, reconhece a filiação socioafetiva resultante da posse de estado de filho:

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EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE FILIAÇÃO SOCIOAFETIVA. POSSE DE ESTADO DE FILHO. COMPROVAÇÃO. SENTENÇA MANTIDA. Presentes os elementos caracterizadores da posse do estado de filho, quais sejam, nome, trato e fama, não reclama reparos a sentença que julgou procedente o pedido de reconhecimento da maternidade socioafetiva. APELAÇÃO DESPROVIDA. (RIO GRANDE DO SUL, 2016).

O patronímico além de ser extremamente importante na designação do sujeito em sociedade, também relaciona o indivíduo a sua própria história, por isso quando há uma relação de vínculo de socioafetividade, capaz de configurar a posse de estado de filho entre enteado e padrasto, pode o enteado requer que seja incluso o patronímico de seu padrasto para expressar a sociedade a sua relação de afeto. (NEVES, 2013, p. 120).

Segundo Paulo Lôbo (apud DIAS, 2015, p. 53): “O afeto não é fruto da biologia. Os laços de afeto e de solidariedade derivam da convivência familiar, não do sangue”.

Portanto, a filiação socioafetiva tem sido cada vez mais aceita por essa gama de efeito que provoca nas pessoas, que é o anseio de proteger as crianças e oportunizar o desenvolvimento como ser humano de se sentir realizado no núcleo familiar.

2 RECONHECIMENTO DA FILIAÇÃO

O reconhecimento da Filiação é um ato espontâneo na qual se estabelecerá o parentesco entre os genitores e seus filhos. Poderá ser realizado por um dos genitores ou por ambos, como também poderá ser de forma voluntária ou forçada. (FARIAS; ROSENVALD, 2015, p. 601).

Conforme o Código Civil de 1916, eram reconhecidos como filhos ilegítimos aqueles nascidos de pais não casados, por sua vez, os filhos gerados dentro do matrimônio, também chamados como legítimos, eram dispensados do reconhecimento, pois a paternidade era presumida. Desse modo, a mulher que obtinha um filho e não era casada, necessitava que o pai da criança fizesse o reconhecimento da paternidade, se assim desejasse, ou sendo negado, deveria investigar a paternidade. No entanto, esse direito não era para todos, pois os

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considerados adulterinos e incestuosos, não poderiam investigar a paternidade, em razão de vedação expressa na legislação. (FARIAS; ROSENVALD, 2015, p. 601).

Apenas em 1942 foi permitido para o homem, que realizasse o reconhecimento dos filhos nascidos fora do casamento. Entretanto, somente era possível, se o genitor já estivesse desquitado de sua esposa. Neste sentido, a estrutura histórica do exercício do direito à filiação, sempre obteve limitações. Essas limitações se consolidavam em detrimento da concepção individualista e patrimonial, que permeavam no Direito Civil naquela época. (FARIAS; ROSENVALD, 2015, p. 601).

Mas somente com a Constituição Federal de 1988 é que se fez com que fosse suprimidas as discriminações filiatórias. E por sua vez, também é possível a investigação da paternidade, sem que seja vedada ou limitada. (FARIAS; ROSENVALD, 2015, p. 602).

O artigo 1.609, do Código Civil de 2002, traz em sua redação como se procede com o reconhecimento da paternidade dos filhos havidos de uma relação extraconjugal, sendo, portanto: a) reconhecimento no ato do registro, que é de forma voluntária (I); b) reconhecimento após o filho já ser registrado, mediante a escritura pública lavrada no Tabelionato de Notas ou por instrumento particular direto no Registro Civil das Pessoas Naturais, é o chamado reconhecimento tardio (II); c) por testamento, para não haver constrangimentos na família, e deixando o filho amparado (III); d) perante Juiz em manifestação direta e expressa, quando não foi a única causa do ato (IV). Além do reconhecimento por vontade espontânea, também têm a forçada, que é proferida pelo juiz mediante ao exame de DNA. Qualquer que seja a modalidade do reconhecimento ele tem caráter irrevogável.

Similarmente, o reconhecimento voluntário pode acontecer antes que a criança nasça, sendo, portanto, admitido o reconhecimento do nascituro, conforme disposto no artigo 26, parágrafo único do Estatuto da Criança e do Adolescente e artigo 1.609, parágrafo único do Código Civil. A doutrina defende a possibilidade do reconhecimento da paternidade do nascituro, visto que, tendo o genitor suspeita de vir a falecer, antes que a criança tenha nascido, deixando amparado. (FARIAS; ROSENVALD, 2015, p. 605).

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Outro possível reconhecimento é após o óbito do filho, também chamado de reconhecimento póstumo, apenas sendo permitido, se o falecido deixou descendentes, evitando-se, contudo, a pretensão de adquirir direito sucessório. Deste modo, o reconhecimento só será possível se a pessoa já falecida deixou descendentes ou se quem o reconhece não adquirir direitos de sucessão. (FARIAS; ROSENVALD, 2015, p. 605).

Todos os filhos de pessoas, sejam elas casadas, solteiras ou em uma união estável, precisam e merecem ser reconhecidas pelos seus genitores, através de ato voluntário ou pela intervenção judiciária. (FARIAS; ROSENVALD, 2015, p. 603).

Pois é através do reconhecimento, seja ele espontâneo ou forçado, que vai se receber o primeiro documento, a certidão de nascimento, onde se sobressai os demais que vão compor a vida do cidadão.

2.1 Reconhecimento no ato do registro

O reconhecimento espontâneo do genitor perante o Registrador deve acontecer quando os genitores não estiverem casados e com concordância da mãe.

Deste modo, segundo explicam Farias e Rosenvald, (2015, p. 603): “O reconhecimento voluntário se aperfeiçoa de forma desejada, espontânea, sem qualquer imposição ou constrangimento daquele que pratica o ato”.

Mas somente tem legitimidade para o reconhecimento da paternidade ou maternidade, os pais, podendo ser ambos, ou apenas um deles. Sendo apenas o pai, e estando casado com mãe, comparece este munido da certidão de casamento. Não sendo casados, poderá comparecer apenas o genitor, mas vivendo em união estável, há a possibilidade de proceder com o registro. Sendo a mãe casada, poderá registrar seu filho com o nome de seu marido. Se por acaso ser a genitora solteira, e não tiver como comprovar a sua união estável, terá que comparecer o genitor, caso queira colocar o nome deste. Mas, no entanto, se a genitora não quiser colocar o nome do pai e não indicar quem seja, não será forçada, mas ensejando indicar o suposto pai da criança, poderá ser instaurado o procedimento oficioso de paternidade, no qual será determinado por sentença judicial. (DIAS, 2015, p. 416).

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No mesmo sentido, Dias (2015, p. 415) complementa: “O reconhecimento voluntário da paternidade independe da prova da origem genética. É um ato espontâneo, solene, público e incondicional. Como gera o estado de filiação, é irretratável e indisponível”.

Admite-se que o menor relativamente incapaz, sem assistência, reconheça seu filho, pois se trataria de mera declaração fática. Podendo, deste modo, impor sua vontade. Tendo convicção do ato que está praticando é possível reconhecer seus filhos, mas na hipótese de escritura pública deverá ser assistido, em razão procedimental que o ato público exige. Adverso é o caso dos absolutamente incapazes, estes, em face da ausência de capacidade de discernimento do ato praticado, não poderão reconhecer a filiação, por ser de caráter da vontade. Neste sentido, o reconhecimento da paternidade será decidido por ordem judicial. (FARIAS; ROSENVALD, 2015, p. 605).

Sendo assim, percebe-se que o reconhecimento no ato do registro é meramente declaratório, sem que passe por qualquer exame de sangue, por consequência, as vezes, ensejam em ação judicial de exclusão de paternidade vinculada ao instituto da genética.

2.2 Reconhecimento forçado

O reconhecimento forçado acontece quando o genitor não tem interesse em registrar o seu filho, sendo, portanto, forçado pelo Judiciário a investigação de paternidade. É realizada através da ação de investigação da paternidade, tendo como finalidade regularizar a filiação, o nome e a qualidade de herdeiro.

Este reconhecimento se procede de forma simples, quando o juiz determina a paternidade de uma criança, manda o Oficial do Registro Civil das Pessoas Naturais proceder com a averbação à margem do livro, sem a necessidade de realizar a abertura de um novo registro.

O direito que uma pessoa tem de conhecer sua origem genética é um direito fundamental, que tem caráter personalíssimo e individual, sendo assim notório o seu direito a filiação, ou seja, ser filho de alguém. A paternidade vem do estado de filiação, e não depende de ser biológica, a origem genética é diferente, pois busca investigar a paternidade. (DIAS, 2015, p. 396).

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Como explica, Farias e Rosenvald (2015, p. 613): “O reconhecimento coativo do estado de filho, pois, decorre do reconhecimento do vínculo parental pelo Estado-juiz, através de sentença”.

Na mesma lógica, Lisboa (2012) ensina que: “O reconhecimento forçado advém de decisão judicial, motivada a partir de processo instaurado por pedido da pessoa que se diz filha do demandado”.

Então, verifica-se que a finalidade é garantir os direitos do menor que necessita de amparo financeiro através dos alimentos, como dever do genitor de lhe proporcionar fonte de subsistência até que se tenha capacidade.

2.3 Reconhecimento de filho tardio

O reconhecimento de filho tardio acontece quando a genitora já registrou a criança apenas em seu nome, podendo mais tarde o pai reconhecer a paternidade.

Segundo Dias (2015, p. 418), “Não é lavrado outro registro. É somente acrescentada a filiação que foi declarada. Assim, pode o pai reconhecer o filho já registrado pela mãe. Porém, é necessária a concordância dela para que o pai proceda ao registro”.

O reconhecimento pode ser por meio de uma escritura pública realizada no tabelionato de notas, por instrumento particular diretamente no Registro Civil das Pessoas Naturais, por testamento ou ainda por manifestação de vontade perante o juiz de direito, é o que prevê o artigo 1.609, do Código Civil de 2002.

Partindo do pressuposto de reconhecimento de paternidade, temos dois modos, um deles é quando a criança não obtiver maioridade, ficando a mãe com o dever de concordar com o reconhecimento. Se for plenamente capaz, poderá este consentir o reconhecimento. (SALOMÃO; HAHN, 2016, p. 7).

Neste sentido, a Consolidação Normativa Notarial de Registral do Estado do Rio Grande do Sul em seu artigo 133, relata essa hipótese:

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Artigo 133 – A averbação do reconhecimento de filho será concretizada diretamente pelo Oficial da serventia em que lavrado o assento de nascimento, independentemente de manifestação do Ministério Público ou decisão judicial, mas dependerá de anuência escrita do filho maior, ou, se menor, da mãe. (grifei).

Contudo cabe ressaltar que, obtendo capacidade poderá impugnar o reconhecimento, caso não queira aquele estado filiatório, pois “[...] o sistema jurídico autoriza a desconstituição do vínculo de parentesco motivada pela ausência de afetividade.” (FARIAS; ROSENVALD, 2015, p. 607).

Deste modo, abrem-se as portas para o reconhecimento da filiação socioafetiva, a qual veio com toda força nesses últimos anos, pois visa o bem estar do ser humano e sua completude.

2.4 Reconhecimento judicial da filiação socioafetiva

O reconhecimento judicial da paternidade muitas vezes é um processo moroso, de modo que dificulta a realização de um ato que é voluntário, pois é de interesse tanto da parte que reconhece, quanto da parte que está sendo reconhecida a paternidade.

Essa modalidade de reconhecimento, não está prevista na legislação, mas vem sendo produzida pela doutrina e a jurisprudência, a procura do apoio nos processos judiciais, que tem julgado procedente suas demandas. (SALOMÃO; HAHN, 2016, p. 7).

Deste modo, o Superior Tribunal de Justiça proferiu sentença favorável a seguinte demanda judicial:

EMENTA: APELAÇÃO. DIREITO CIVIL. FAMÍLIA. RELAÇÃO DE PARENTESCO. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE. DNA. RETIFICAÇÃO DO REGISTRO CIVIL. IMPOSSIBILIDADE. PREVALÊNCIA DA PATERNIDADE SOCIOAFETIVA. Estando demonstrada nos autos a filiação socioafetiva, esta relação impera sobre a verdade biológica. Incabível, assim, alteração no registro civil e qualquer repercussão patrimonial decorrentes da investigatória. RECURSO DESPROVIDO. (RIO GRANDE DO SUL, 2015). (grifei).

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De modo análogo, o reconhecimento da paternidade, vem sendo utilizado amplamente para atingir a família socioafetiva, do seguinte modo:

O reconhecimento da paternidade independe da prova da origem genética, até porque a ordem jurídica brasileira, após a Constituição de 1988, que equiparou os filhos de qualquer origem (biológica — inclusive por inseminação heteróloga autorizada pelo marido — por adoção, havidos ou não no casamento), privilegiou a família socioafetiva. (LÔBO, 2011, p. 257).

O reconhecimento da paternidade busca trazer segurança, comodidade e tranquilidade, desta forma, o reconhecimento depois de realizado passar a agregar tutela jurídica, de tal modo, é indisponível. Não sendo admitido arrependimento subsequente de quem reconhece. (LÔBO, 2011, p. 260-261).

O próprio genitor que reconhece a paternidade, não pode impugnar o ato de reconhecimento, sendo este direito concedido ao reconhecido, se este desejar impugnar. Porém a doutrina e a jurisprudência, têm compreendido que terá que provar que houve erro ou falsidade do registro, para suscitar a invalidação do registro de nascimento, mas não quanto ao ato de reconhecimento. (LÔBO, 2011, p. 261).

Havendo o pressuposto do reconhecimento da posse do estado de filho, não tendo mais objeção quanto a invalidação do ato, que está só poderá ensejar por ordem judicial, não há óbice para o reconhecimento na via extrajudicial.

2.5 Reconhecimento extrajudicial da filiação socioafetiva

Ao adentrar nesta proposta de reconhecimento, há muitas divergências entre as opiniões, pois se tem uma preocupação em não adentrar na premissa da adoção. Apesar de existir o instituto da adoção à brasileira, como explica Dias (2015, p. 494): “[...] o companheiro de uma mulher perfilhar o filho dela, simplesmente o registrando como se fosse filho seu.”

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No âmbito registral, não se tem 100% de certeza quanto à pessoa que vem registrar, deste modo, a paternidade é feita mediante a declaração de vontade do declarante. Nesse sentido, cabe ressaltar que não há óbice em não reconhecer a paternidade socioafetiva.

Deve-se levar em consideração o ensejo da paternidade, e tratando-se de uma vez por todas, regularizar o que de fato já existe em muitas famílias. Trazendo consigo uma segurança, um bem-estar aos participantes dessa união familiar e por consequência um avanço significativo no que tange o Direito de Família. (SALOMÃO; HAHN, 2016, p. 8).

Em alguns estados do Brasil, como Pernambuco, Ceará e Maranhã, existem normas de regulamentação da paternidade socioafetiva, onde é realizada diretamente no Registro Civil das Pessoas Naturais, sem burocracias, desde o ano de 2013. O pai que deseja reconhecer a paternidade socioafetiva comparece ao cartório junto com a mãe se o filho for menor, ou tratando-se de maioridade, o filho consentirá, tendo como base o vínculo de afeto existente entre ambos. (SALOMÃO; HAHN, 2016, p. 7).

De acordo com Dias (2015, p. 398), percebe-se que: “Tanto é assim que foi construída a diferença entre pai e genitor. Pai é o que cria, o que dá amor, e genitor é somente o que gera.”

Sabemos que os trâmites legais de um processo, muitas vezes demoram anos, dificultando a realização deste reconhecimento, pois este é somado as demandas de vários processos que se encontram na Vara de Direito de Família. (SALOMÃO; HAHN, 2016, p. 7).

Essa possibilidade de reconhecimento da filiação socioafetiva diretamente no Registro Civil das Pessoas Naturais, facilitará muito para as famílias que se encontram nessa situação. Nesse sentido, a desembargadora Iris Helena Medeiros Nogueira, editou o Provimento 013/2016, da Corregedoria Geral de Justiça, que além de alterar a redação do artigo 33 (que já foi visto), acrescentou o artigo 133-A, da Consolidação Normativa Notarial e Registral, no dia 11 de abril de 2016, com o seguinte teor: “Art. 133-A – As regras deste Capítulo aplicam-se, no que couber, ao reconhecimento de filho soacioafetivo”.

Nessa senda, será aplicada a regra do artigo 133, que se utilizará para a averbação do reconhecimento de filho, que estava sendo utilizada para, em tese, o aspecto biológico

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existente entre pai e filho, agora também utilizado para os futuros reconhecimentos de filhos socioafetivo.

Nesse ponto, atinge-se o grande ápice na área de Direito de Família, pois cada vez mais a legislação deve preceder de modo rápido e eficaz para atender melhor as demandas que a sociedade tem e por consequência solucionar com mais brevidade possível.

2.6 Princípio da dignidade da pessoa humana

O princípio da dignidade da pessoa humana veio através de uma concepção jusnaturalista, entre os séculos XVII e XVIII. Os filósofos Samuel Pufendorf e Immanuel Kant, tiveram a ideia quanto ao princípio da dignidade da pessoa humana, sendo, portanto, disseminado de começo a uma visão racional e laica. Para Kant, o homem não pode ser utilizado como objeto para obter algo, pois detém de valor inerente, não podendo ser substituído. (LEVY, 2011, p. 28).

Esse princípio é fundamental para a realização do Estado Democrático de Direito, sendo afirmado no primeiro artigo da Constituição Federal. Bem como está fortemente ligado ao direito de convivência familiar e a afetividade. (LÔBO, 2011, p. 60).

Nessa mesma ideia, Tartuce (2014) entende que: “Na concepção de dignidade humana, deve-se ter em mente a construção de Kant, segundo a qual se trata de um imperativo categórico que considera a pessoa humana como um ser racional, um fim em si mesmo”.

O princípio da dignidade da pessoa humana no ordenamento jurídico constitucional tem uma grande magnitude, na qual protege o sujeito e as suas necessidades, sendo atuante de forma particular dentro dos demais princípios constitucionais. (LEVY, 2011, p. 29).

Segundo Lôbo (2011, p. 60), “A dignidade da pessoa humana é o núcleo existencial que é essencialmente comum a todas as pessoas humanas, como membros iguais do gênero humano, impondo-se um dever geral de respeito, proteção e intocabilidade”.

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Sendo assim, a dignidade da pessoa humana, conforme Tartuce (2014): “[...] é algo que se vê nos olhos da pessoa, na sua fala e na sua atuação social, no modo como ela interage com o meio que a cerca. Em suma, a dignidade humana concretiza-se socialmente, pelo contato da pessoa com a sua comunidade”.

Em definição Gagliano e Pampolha Filho (2014, p. 88) cita que,

[...] é missão das mais árduas, muito embora arrisquemo-nos a dizer que a noção jurídica de dignidade traduz um valor fundamental de respeito à existência humana, segundo as suas possibilidades e expectativas, patrimoniais e afetivas, indispensáveis à sua realização pessoal e à busca da felicidade.

O princípio da dignidade humana é a prova que precisa para conceder o reconhecimento da paternidade socioafetiva. Desse modo, extrai-se que:

O Estado, a família e a sociedade devem propiciar os meios de realização da dignidade da pessoa humana, impondo o reconhecimento da natureza de família a todas as entidades com fins essencialmente afetivos. A exclusão de qualquer delas, sob impulso de valores outros, viola o princípio da dignidade da pessoa humana. (LÔBO, 2011, p. 87).

Portanto, Gagliano e Pampolha Filho (2014, p. 90-91) conclui que “[...] a dignidade humana somente é preservada na medida em que se garante o respeito à dimensão existencial do indivíduo, não apenas em sua esfera pessoal, mas, principalmente, no âmbito das suas relações sociais.”

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CONCLUSÃO

O Direito de Família anseia por uma nova regulamentação, principalmente no que se refere aos direitos dos homossexuais como entidade familiar e a diversidade de famílias que vem crescendo a cada ano. Tudo isso é provocado pela mudança que todos os seres humanos provocam em meio a todos o desenvolvimento tanto nas suas relações com os demais, bem como no aspecto individual de cada ser humano.

O desenvolvimento se deve a todos os direitos adquiridos, proporcionando um olhar diferente às pessoas ao redor, neste sentido, cabe lembrar que devido a evolução industrial a mulher foi forçada a entrar no mercado de trabalho e por consequência contraindo direitos. A Constituição Federal de 1988, sem dúvida foi marcada por forte aquisição de princípios que norteiam a garantia dos direitos humanos.

A busca para solucionar os problemas existentes é incansável, mas vale a pena quando se tem um bom propósito, que no caso em espécie visa trazer um bem-estar ao filho reconhecido e ao pai que o reconhece. O instituto da socioafetividade é realmente um instituto onde se constrói o amor entre pessoas, mesmo não existindo vínculo de sangue, mostra que o mais importante atualmente é o amor ao próximo.

O Estado do Rio Grande do Sul avançou ao alcance de mais uma importante conquista em matéria do Direito de Família, tanto na área de sucessão quanto na expansividade do âmbito familiar. Deste modo, se aguarda com esse instituto de reconhecimento atingir o seu grande propósito e, por conseguinte solucionar os problemas de modo prático.

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REFERÊNCIAS

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