Introdução à arquitetura
Este livro resume, numa visão geral e unitária, o desenvolvimento da arquitetura ocidental através do tempo, desde suas origens remotas até nossa própria contemporaneidade; não é nem pretende ser uma história convencional da arquitetura, mas uma introdução ao seu es-tudo que desvele seus códigos e permita compreender sua realidade tanto ao profissional quanto ao amador, especialmente para quem se aproxima da arquitetura pela primeira vez. Esta obra busca propor uma reflexão sobre a especificidade da arquitetura, tentando abrir nossos olhos para ela e percebê-la como uma realidade ontologica-mente nova e diferente de quaisquer outras já conhecidas.
Uma característica diferencial que identifica a arquitetura para um arquiteto é o caráter de experiência e de processo com que ela se apresenta. De um ponto de vista eminentemente arquitetô-nico, esta publicação se volta, portanto, ao processo de projeto de arquitetura, formulando o saber histórico como meio fundamental para o conhecimento da composição e da construção das edifica-ções, atendendo aos problemas que cada sociedade e seus arqui-tetos tentaram resolver, e focando aquelas questões que explicam o porquê das permanências e das evoluções. Afinal, a história não pertence a um passado mais ou menos distante, mas faz parte ope-rativa do presente. E, conforme se diz, fazer edifícios novos sempre foi uma crítica aos edifícios do passado, não é verdade?
A história da arquitetura
Nesta tarefa, a história é o veículo útil e necessário para a aborda-gem da arquitetura. Por intermédio dela se individualizarão pou-co a poupou-co seus pou-componentes e seus elementos específipou-cos. É na história onde se pode e se deve encontrar o sentido da ação e a reflexão arquitetônica, iluminando o presente desde o passado e convertendo seu campo intelectual em uma verdadeira sala de
cirur-gia. A história é o instrumento vital que, como uma vara de salto,
nos propulsiona.
Existem diferentes formas de entender e explicar a história da
arquitetura. Ela pode ser a história da arte concebida como história
Considerações Gerais:
das Origens ao
Século XXI
dos monumentos singulares e independentes ou uma história do urbanismo entendida como a história dos tecidos urbanos. Contu-do, a história que vamos apresentar foi concebida como um estudo holístico que considera as obras concretas como partes de uma obra
total que, por sua vez, é configurada pela construção, linguagem e
forma arquitetônica.
Espaço e tempo são as variáveis essenciais trabalhadas pela
arquitetura e a história. A arquitetura brinca com espaços de três dimensões, embora os dinamize mediante a variável temporal. A história brinca com esta variável temporal, tornando-a essência de sua trajetória.
O lugar e o tempo são as bases de partida da história e os de-terminantes da sua arquitetura. Toda a arquitetura tem sido deba-tida nos infinitos desenvolvimentos e transformações de ambos os conceitos. E com esse caráter se inicia a abordagem da sua história, a partir de uma visão ampla que compreende a arquitetura como fato cultural de caráter plural, ampliado do projeto das edificações e para o projeto da cidade, expandindo o conceito de arquitetura à história urbana, pois, como escreveu Leon Battista Alberti: “A cida-de é uma casa grancida-de, e a casa é uma cidacida-de pequena”.
Os conceitos de arquitetura
A primeira abordagem da arquitetura passa pela determinação dos seus limites, pela fixação do território da arquitetura. Por isso – e partindo do fato de que a pergunta “o que é arquitetura?” não leva apenas a uma resposta, mas a uma busca –, chega-se a esta definição pela via da história: através da apresentação sequencial de realidades arquitetônicas bem contrastadas e definidas no tempo. Os diferen-tes problemas específicos da arquitetura se apresentarão claramente enquadrados na sua sequência histórica, coisa que a essa altura nos interessa mais do que a multiplicidade das respostas concretas.
Para isso, nas páginas seguintes trabalharemos com uma dúzia de ideias-chave que ressurgirão ao chegarmos ao fim do nosso tra-balho: a ideia de território da arquitetura como marco de definição de sua atividade; a ideia de ordem, tipo e método como instrumentos de controle da arquitetura e, em consequência, as ideias de tipolo-gia arquitetônica e de metodolotipolo-gia da composição; a ideia da arqui-tetura como processo, como experiência e como construção; a ideia da escala humana ou monumental dessa construção do hábitat: as ideias da geometria e da forma arquitetônica; a ideia linguística, como linguagem ou como estilo arquitetônico; e a ideia de cidade como síntese e limite superior da arquitetura, a qual dá sentido às arquiteturas concretas e delas exige uma inserção histórica.
Para o melhor desenvolvimento dessas ideias-chave e para al-cançar os fins propostos, devemos perguntar – nos unindo a Bruno Zevi – “se seria conveniente pegar um edifício e o analisar a fundo,
com a descrição exaustiva de seus valores urbanísticos, sua essên-cia espaessên-cial, sua volumetria, seus detalhes plásticos; ou, ao contrá-rio, se seria conveniente esboçar de forma superficial as principais concepções que se encontram ao longo da história da arquitetura ocidental com um método que omita algumas regras importantes e infinitas exceções”. E, também com Zevi, preferimos esta segunda opção “em favor do público ao qual se destina”.
A análise detalhada de um objeto arquitetônico singular exige uma ampla preparação cultural e uma longa crítica que o aluno que ingressa numa escola de arquitetura não possui nem necessita. O percurso sequencial e polarizado ao longo da história lhe permite, ao contrário, utilizar sua bagagem geral de conhecimentos obtidos no ensino médio, e sua aplicação discreta, mas progressiva e conti-nuada, à arquitetura.
Por isso é preferível, sem dúvida, traçar uma linha histórica contínua, desde as origens da arquitetura até o presente, formando assim uma trama clara e simples sobre a qual seja possível inferir qualquer noção posterior e qualquer experiência arquitetônica. Das origens ao século XXI
Começaremos, então, falando do menir, da caverna e da cabana, entendidos, respectivamente, como os símbolos físicos da arte, do abrigo e da racionalidade materializada em uma construção. Ainda que ao longo da história esta última tenha sido o núcleo da ativida-de arquitetônica, pensamos que não convém começar com ela, mas com o menir ou a caverna como arquiteturas primárias, uma vez que os princípios que ambas representam têm polarizado o desen-volvimento histórico da arquitetura e resumem seu conceito. A par-tir dessa ideia geral e ampla, desenvolveremos a história da arqui-tetura seguindo sua evolução através dos séculos, sobrepondo em todo momento cidade, arquitetura e estilo como um tema unitário.
Assim, organizaremos o texto em sete grandes temas correspon-dentes aos grandes ciclos da arquitetura ocidental, subdividindo-os em 30 capítulsubdividindo-os ou lições de extensão e complexidade simila-res. Nesses grandes temas serão apresentados progressivamente aqueles conceitos fundamentais que servem para orientar desde os primeiros passos a atividade de aprendizado e de estudo, tentan-do em totentan-do momento despertar o interesse tentan-do aluno ou tentan-do leitor. Utilizaremos para isso um rico apoio gráfico que conta com mais de 500 ilustrações: algumas acompanhando o texto, desenhadas ou redesenhadas especialmente para maior expressividade e caráter didático; outras, em fotografias, como um caderno complementar que proporciona uma leitura diferente e paralela, mas, ainda assim, global e conjunta, da história.
A partir das abordagens indicadas, vamos apresentar a ampla transformação da arquitetura ocidental através da análise da
arqui-tetura da Antiguidade, da Idade Média e da Idade Moderna, assim como dos períodos mais recentes, que são a base e o fundamento da realidade contemporânea.
Partindo, então, do menir, da caverna ou da cabana como
ori-gens da arquitetura, entenderemos o Egito como um verdadeiro
la-boratório, em que o espaço, a geometria e a forma se desenvolvem de um modo quase atemporal, e cujas permanências impregnarão para sempre a arquitetura ocidental.
Esta atemporalidade contrasta com a importância do fator tempo no Mundo Clássico. Nele, a arquitetura define um território e lhe confere leis próprias. O tempo no mundo clássico define a arquitetura, fazendo desta construção a base de uma linguagem: a linguagem clássica da arquitetura, de projeção ulterior transcenden-tal. Galgando sobre o mundo helenístico, Roma coloniza, estrutura e começa a edificar o mundo ocidental, que entra definitivamente na história da arquitetura.
A Idade Média reformula as características tipológicas e cons-trutivas da arquitetura, num longo trânsito entre os sistemas de massa ativa e de vetor ativo, que tem seu fundamento numa nova maneira de pensar que reúne a álgebra, a escolástica e a arquitetura nos séculos góticos. Ainda que tenha sido iniciada no período ro-mânico, será no período gótico que a estrutura urbana das cidades ocidentais se cristalizará.
Mas se a Idade Média estrutura a realidade urbana e territo-rial da Europa, a Idade do Humanismo vai edificá-la; vai construir e dar forma a suas cidades e vai estender a arquitetura ocidental à América. O Renascimento dos séculos XV e XVI abre o mundo oci-dental às correntes humanistas do Quattrocento e do Cinquecento, ao Maneirismo e ao Barroco, tanto nos edifícios como nas cidades, dando forma a sua realidade histórica antes que a revolução cultural do Iluminismo e a revolução social da industrialização nos condu-zam ao mundo moderno e contemporâneo.
O Iluminismo representa o despertar dos tempos modernos. Apoiando-se em suas bases culturais, se desenvolve no século XIX uma forte aceleração social e econômica ligada à Revolução
Indus-trial que não tarda em se fazer notar nas edificações. Mas enquanto
a técnica impõe soluções agressivamente diferentes, a tradição tei-ma em tei-manter os estilos habituais. A composição arquitetônica dará unidade de conteúdos ao ecletismo e à industrialização, embora esta unidade apareça disfarçada sob uma multiplicidade de formas.
No século XX, a arquitetura busca novas bases metodológicas e novas codificações linguísticas relacionadas com as abordagens do Movimento Moderno, o qual foi gerado nos anos anteriores à Se-gunda Guerra Mundial. Depois dela, o mundo inteiro enfrenta um crescimento progressivo muito acelerado, o qual acarreta uma for-mulação metropolitana e globalizante da arquitetura, abrindo assim o período contemporâneo: Nosso Presente, tema que foi
completa-mente reescrito para a presente edição, numa aposta corajosa que combina o questionamento histórico com a crítica da atualidade.
Este trânsito entre história e contemporaneidade, devido à complexidade de suas abordagens e à diversidade de suas soluções, condiciona o processo arquitetônico e sintetiza ou resume esta
In-trodução à história da arquitetura.
Editado originariamente pela Universidad de La Coruña em 1995, este livro foi objeto de sucessivas reedições e reimpressões. Agora, na primavera de 2005, ao lançar uma nova edição por outra editora, o autor não quis se limitar a escrever uma apresentação nova e uma atualização final, mas revisou a totalidade do texto, re-formulando seu corpo, abreviando alguns temas teóricos e refazen-do os capítulos sobre urbanismo. Turefazen-do isso sem alterar o espírito e o frescor original da publicação, que têm garantido sua aceitação e difusão nos últimos anos.
Assim, sem prejuízo do rigor científico, o caráter didático pró-prio desta obra justificou e ainda reitera a ausência de citações, notas ou referências bibliográficas de rodapé. Entretanto, além de remitir à bibliografia geral, o autor não pode deixar, mais uma vez, de relembrar sua dívida de gratidão com a atividade acadêmica de Fernando Chueca, e com as sugestões, estímulos e reflexões teóri-cas de Leonardo Benevolo, Bruno Zevi, Aldo Rossi, Ernst Gombri-ch, Sigfried Giedion e todos aqueles mestres sem cuja contribuição intelectual esta publicação jamais teria sido concebida.